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Contributo dos textos de Alexandre Herculano (1837-1839) para apoio aos professores na lecionação dos programas da História e Geografia de Portugal

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UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO

VILA REAL, 2014

Orientador: Professor Doutor João Bartolomeu Rodrigues

Contributo dos Textos de Alexandre Herculano

(1837-1839) para apoio aos professores na lecionação

dos programas da História e Geografia de Portugal

Maria Goretti Fraga de Além

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM ENSINO DO 1º E 2º CICLO

DO ENSINO BÁSICO (2º CICLO)

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Maria Goretti Fraga Além

UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO Vila Real, 2014

Área científica que se inscreve:

Educação

Sob a orientação do Professor Doutor:

João Bartolomeu Rodrigues

CONTRIBUTO DOS TEXTOS DE

ALEXANDRE HERCULANO (1837 - 1839)

PARA APOIO AOS PROFESSORES NA

LECIONAÇÃO DOS PROGRAMAS DA

HISTÓRIA E GEOGRAFIA DE PORTUGAL

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Dissertação expressamente elaborada com

vista à obtenção do grau de Mestre em

Ensino 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico (2º

Ciclo), de acordo com os Decretos-Lei

nº74/2006,de 24 março e nº 43/2007, de 22

fevereiro

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RESUMO

O presente trabalho enquadra-se no contexto da educação, com especial enfoque no campo da História e Geografia de Portugal. Dividido em duas partes distintas: a primeira parte aborda, revela quer o contexto político e educativo do tempo em que o jornal foi escrito, quer uma abordagem ao jornal O Panorama, com toda a sua história, sem esquecer o papel do seu Diretor, no contexto do século XIX; a segunda parte consta de uma breve antologia de textos, cujo conteúdo versa sobre temáticas relacionadas com os conteúdos da História e Geografia de Portugal.

A investigação segue o seguinte esquema organizativo: Parte I

O capítulo I é dedicado aos procedimentos metodológicos;

O capítulo II aborda a figura de Alexandre Herculano e a sua Obra; O capítulo III trata do Jornal O Panorama, no contexto da sua época; O capítulo IV evidencia o papel da Educação no Jornal O Panorama. Parte II

Breve Antologia de Textos de História e Geografia de Portugal de O Panorama.

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ABSTRACT

This work fits in the context of education, with special focus in the area of History

and Geography of Portugal. Divided into two distinct parts: the first part approaches,

reveals either the political and educational context of the time when the Journal was written, or an approach to the “O Panorama” Journal, with all its history, without forgetting the role of its Director, in the context of the nineteenth century; the second part consists of a brief anthology of texts whose content deals with topics related to the contents of the History and Geography of Portugal.

The investigation follows this organizational scheme: Part I

Chapter I is dedicated to the methodological procedures;

Chapter II addresses the figure of Alexandre Herculano and his Work; Chapter III deals with the “O Panorama” Journal, in the context of his era; Chapter IV expounds on the role of education in the “O Panorama” Journal; Part II

Brief Anthology of texts related with History and Geography of Portugal in the

“O Panorama” Journal.

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1

ÍNDICE

ÍNDICE……….1 INTRODUÇÃO………...5 Capítulo I – METODOLOGIA……….……….7 1. Introdução………...7 2. Tema………7 3. Justificação……….……….7 4. Problematização……….………8 5. Hipóteses……….……….8 6. Objetivos……….……….8 7. Procedimentos……….9

Capítulo II – ALEXANDRE HERCULANO: O HOMEM E A OBRA………11

1. Alexandre Herculano – O Homem………...…11

1.1. Herculano – O Romancista………...14

1.2. Herculano e a Poesia Romântica……….……….15

1.3. Herculano – O Historiador………...16

1.4. Herculano – O Doutrinário e Polemista……….………….17

2. O contributo de Herculano na Educação………...18

Capítulo III – O JORNAL “O PANORAMA” E O SEU TEMPO……….21

1. Breve Contextualização Histórica da Época em que “O Panorama” foi publicado………...……….21

1.1. Desenvolvimento Político………..………….21

1.2. A Passagem da Esperança à Desilusão com o Segundo Liberalismo………….22

1.3. A Regeneração………24

2. “O Panorama” entendido como jornal instrutivo………..……24

2.1. Os Colaboradores e o Anonimato……….………26

2.2. Temas Predominantes………27

2.3. A Sociedade Oitocentista e a Influência do Jornal “O Panorama”………...….29

Capítulo IV – A EDUCAÇÃO NO JORNAL “O PANORAMA”……….………….31

1. A Educação do Homem todo e de todo o homem……….……….……….31

2. Propostas de Reorganizar o Ensino……….35

(7)

2

2.2. Proposta de Silvestre Pinheiro Ferreira………...………36

2.3. Proposta de José de Torres……….…………..……….41

3. Herculano, a educação e “O Panorama”……….43

3.1. Educação Intelectual………..………44

3.2. Educação Física……….……….45

3.3. Educação Moral……….……….46

Conclusão…………..……….47

II PARTE………49

Breve Antologia – Textos de História e Geografia de Portugal de “O Panorama”.51 Introdução……….……….53 1837: Vol. I……….55 A Arquitetura Gótica………55 A batalha de Aljubarrota……….……….56 Judeus em Portugal………...56 Cortes Portuguesas……….………...58

Origem da Tipografia - Tipografia Portuguesa……….……….60

Quadros da História Portuguesa - Morte do Conde Andeiro e do Bispo de Lisboa (1383)……….………….……….61

Primeiros Reis Portugueses – Antigas Dissensões com Roma I………66

Primeiros Reis Portugueses – Antigas Dissensões com Roma II………...69

Primeiros Reis Portugueses – Antigas Dissensões com Roma III……….73

Cálculo curioso sobre a agricultura, população de Portugal……….……76

1838: Vol. II………...……….78

Máquinas de Vapor em Portugal……….78

Quadros de História Portuguesa – Motim em Lisboa (1506)………78

Breve História das Máquinas de Vapor……….……….80

Quadros de História Portuguesa – Regência do infante D. Pedro. Batalha d’Alfarrobeira.1439 a 1449………...81

Terremotos em Portugal………...86

Origem da Inquisição em Portugal……….……….91

Moedas Portuguesas……….……….92

Origem do Titulo de Dom……….95

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3

Instituição das Ordens Militares em Portugal – Ordem de Aviz………….……….97

Mahomed e os Árabes – Os Árabes………100

A Padeira D’Aljubarrota……….………...…103 CONCLUSÃO……….……….107 BIBLIOGRAFIA……….109 FONTES………...109 ESTUDOS……….109 ANEXOS………...113

Anexo I – Planificação 5º ANO………...115

Anexo II – Planificação 6º ANO……….117

Anexo III – Estatutos da Sociedade Propagadora de Conhecimentos Úteis….….119 Capítulo I – DA SOCIEDADE………..……….119

Capítulo II – DOS ACCIONISTAS…………..……….119

Capítulo III – DA DIRECÇÃO……….……….120

Capítulo IV – DA ASSEMBLEIA GERAL……….……….……….122

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5

INTRODUÇÃO

O presente trabalho intitulado “Contributo dos Textos de Alexandre Herculano (1837 - 1839) para apoio aos professores na lecionação dos programas da História e

Geografia de Portugal” surge no âmbito do Mestrado do Ensino do 1º e 2º ciclo do

Ensino Básico. No segundo ano deste Mestrado decorre o Estágio II, o qual inclui quatro disciplinas nas quais os alunos estagiam: Português, História e Geografia, Matemática e Ciências da Natureza. No contexto da lecionação das aulas de História e Geografia, sentimos que os manuais eram francamente insuficientes para apoio do estagiário na preparação das aulas. Face à dificuldade sentida, o nosso orientador sugeriu-nos que no Jornal O Panorama (1837-1868) facilmente encontraríamos material em que nos poderíamos apoiar com segurança, quer para complementar a nossa formação, quer para apoiar a preparação das aulas. Os textos revelaram-se de tal forma interessantes, que nos pareceu fundamental fazer o levantamento desses mesmos textos e apresentar uma breve antologia. Esta opção justifica-se no nosso entender por duas razões diversas: a primeira, legitima-se no facto de tais textos não serem do conhecimento geral, nem se encontram acessíveis, a não ser nos arquivos de algumas bibliotecas; por outro lado, e dada a delimitação do âmbito desta investigação (1837-1839), a seleção e recolha dos textos antologizados recaiu sobre o período em que Alexandre Herculano foi o diretor e o redator principal desta publicação. Acresce ainda o facto de tais textos terem sido escritos sob o anonimato exigido pela Direção da

Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Úteis, proprietária do referido jornal: é

nossa convicção que revelar a autoria de tais textos, justificam per se a realização deste trabalho. Um dos propósitos consiste em dar continuidade a um trabalho previamente iniciado por Rodrigues (2008), onde afirma: “não é o fim – estamos certos – de uma obra acabada, mas o ponto de partida para um futuro trabalho que reclama ser continuamente aperfeiçoado e exaustivamente estudado” (2008b:iii), insistindo, assim, na necessidade de continuar a desenterrar fontes esquecidas nos arquivos adormecidos cobertos de pó e expostos ao passar dos tempos.

A exigência de um trabalho desta envergadura carecia de um enquadramento teórico, que ajudasse o leitor a situar os textos, quer no ambiente social e político em que foram escritos, quer nas contingências em que foram dados à estampa. Estamos certos que a primeira parte deste trabalho recria o sitzim liben, ou seja o contexto vital

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que nos permite aprender o alcance da repercussão de tais textos, quer para o público coevo, os destinatários naturais do jornal, quer o impacto que os mesmos escritos podem ter nos nossos dias, mesmo no contexto académico.

Desta forma dividimos a nossa investigação em duas partes distintas: na primeira, damos a conhecer o autor dos textos e fazemos uma abordagem muito sintética da sua obra, com particular destaque para O Panorama. Dentro da multiplicidade temática que esta publicação apresenta, centrámos a nossa atenção nas questões relacionadas com a educação. Ainda dentro da Educação, procurámos dar especial destaque à perspetiva de Alexandre Herculano; na segunda parte, fizemos o levantamento do conjunto de textos, no âmbito da História e Geografia de Portugal, apresentando, dessa forma, a referida antologia.

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Capítulo I – METODOLOGIA

1. Introdução

O presente trabalho tem como objetivo perceber em que medida os textos escritos por Alexandre Herculano no Jornal Literário e Instrutivo “O Panorama “possam constituir como um bom instrumento de ensino da disciplina de História e Geografia de

Portugal do 2º Ciclo.

Neste sentido, a pesquisa representa a possibilidade de verificar como se pode ensinar a história com o apoio dos textos. Partindo dessa premissa nasceu o interesse em registrar, por meio de uma investigação histórica e hermenêutica, as contribuições nessa área.

Metodologicamente, a investigação iniciou com a revisão bibliográfica dos textos, na pesquisa documental foram analisados os programas de história e geografia do 2º ciclo.

A estratégia de se utilizar os textos no ensino da história é um tema de muita relevância para o contexto escolar. Portanto, estamos empenhados na elaboração de estratégias de ensino capazes em ajudar na lecionação.

2. Tema

Contributo dos Textos de Alexandre Herculano (1837 - 1839) para apoio aos professores na lecionação dos programas da História e Geografia de Portugal.

3. Justificação

Tendo constatado ao longo do meu estágio que os textos de apoio dos manuais de História e Geografia do 6º ano de escolaridade, careciam de elementos mais consubstanciais e tendo percebido a mais-valia dos textos escritos por Alexandre Herculano no Jornal Literário e Instrutivo “O Panorama”, considerámos que tais recursos poderiam ser úteis no apoio à lecionação dos programas. Identificar e reunir essa coleção, justificam per se este trabalho.

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Assim, pretendemos apresentar os textos que nos pareceram ser os mais significativos e que poderiam constituir-se num apoio efetivo à lecionação do programa de História e Geografia do 2º Ciclo.

4. Problematização

Em qualquer investigação científica há sempre um problema investigativo. Se entendermos o problema como uma pergunta ou um conjunto organizado de perguntas sobre relações entre variáveis, parece-nos que as perguntas que se seguem constituem um bom ponto de partida para a nossa investigação, a saber:

No sentido de situarmos no tempo quer o Jornal, quer o seu diretor e principal redator, parece-nos importante tentar perceber que ilações se podem apreender entre a

feliz coincidência dos três fatores que em 1837 se cruzaram e convergiram: o aparecimento da Sociedade Propagadora de Conhecimentos úteis, a fundação do órgão jornalístico dessa Sociedade e a escolha acertada de Alexandre Herculano para seu diretor?

Importa também verificar se há textos de Alexandre Herculano, publicados sob a

capa do anonimato, no jornal “O Panorama”, e, havendo, em que medida estes podem contribuir para apoiar os professores na lecionação dos programas de “História e Geografia” do 2º Ciclo?

5. Hipóteses

É plausível que haja textos, publicados no jornal O Panorama, da autoria de Alexandre Herculano e que os mesmos possam constituir um corpus capaz de dar um apoio efetivo na lecionação dos programas de História e Geografia do 2º Ciclo.

6. Objetivos

Elaborar uma Antologia de textos de caráter histórico, com base em excertos da autoria de Alexandre Herculano, veiculados no jornal O Panorama, que ilustrem os

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conteúdos dos programas de História e Geografia de Portugal do 2º Ciclo, tornou-se o objetivo central desta investigação.

O presente trabalho tem, ainda, como objetivo perceber os contornos da cultura portuguesa nos 2º e 3º quarteis do século XIX. Focalizaremos a nossa atenção no estudo das ideias e projetos de O Panorama: daremos particular atenção ao projeto educativo que Alexandre Herculano, enquanto diretor e principal redator deste órgão jornalístico concebeu para regenerar Portugal.

7. Procedimentos

Para realização da presente pesquisa foi necessário proceder ao levantamento, recolha e transcrição de textos (1837-1839) de carácter histórico, publicados no Jornal

O Panorama.

Na posse do corpus integral dos três volumes do mesmo jornal digitalizados em formato eletrónico e algumas das páginas em fotocópia cedidas pela Biblioteca Municipal de Vila Real, através de um pedido a título excecional, junto do Diretor, por se tratar de documentos reservados. A justificação das fotocópias deve-se ao facto de algumas das páginas digitalizadas não serem percetíveis.

Posto isto, tínhamos um grande desafio pela frente que era transcrever os textos selecionados e atualizar a ortografia. Partimos dos textos digitalizados e socorremo-nos de OCR (leitor ótico de caracteres), cuja mais-valia só se revelou em parte, em virtude quer das condições péssimas do texto, quer do facto de estarmos perante uma ortografia do século XIX, que baralhava o dicionário.

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Capítulo II - ALEXANDRE HERCULANO: O HOMEM E A

OBRA

1. Alexandre Herculano – O Homem

Alexandre Herculano de Carvalho Araújo nasceu no dia 28 do mês de Março do ano de 1810 em Lisboa e faleceu em Vale de Lobos no dia 13 de Setembro de 1877. Era filho de Teodoro Cândido de Araújo, um modesto funcionário administrativo, descendente de comerciantes e de pedreiros, mais tarde mestres-de-obras. A sua preparação para matricular-se posteriormente na universidade foi feita no colégio dos Oratorianos; porém, com a morte do pai, foi obrigado a ingressar num curso mais utilitário e rápido tendo em vista um emprego no funcionalismo: a aula de Comércio e o curso de Diplomática.

A sua formação cultural realizou-se na época incerta que sucede às Invasões, pois tinha somente 10 anos de idade quando se deu a Revolução de 1820. Como as fronteiras portuguesas estavam abertas às influências exteriores, durante a adolescência Herculano pôde iniciar-se em escritores como Chateaubriand, Schiller e outros.

Precocemente manifestadas, as suas tendências literárias colocaram-no em contacto com Castilho (que era duas mãos mais velho), com representantes da geração de Bocage, abrindo-lhe entrada nos salões da marquesa de Alorna, figura destacável e solene no movimento pré-romântico em Portugal (Cruz, 1969).

Corria o ano de 1831 quando Herculano fez um compromisso com a revolta do 4 da Infantaria, conseguindo escapar à matança dos insurretos que a liquidou, o que o obrigou a refugiar-se em Inglaterra. A sua situação como emigrado é a de um soldado desconhecido, quando Garrett já se tornara uma personalidade; contudo, e em antítese a este, parece ter trazido de Inglaterra recordações amargas. Pelo contrário, França, foi um país que lhe abriu novos horizontes, permitindo-lhe frequentar a biblioteca de Rennes, pensando-se, deste modo, que data desta época a sua iniciação em Thierry, Victor Hugo, Giuzot e Lamennais, cujas influências iriam futuramente marcar as suas obras. (Ibidem). Mais tarde regressou a Portugal como soldado da expedição de D. Pedro, tomando parte em ações militares e diversos confrontos. Mas já nesse tempo colaborava em trabalhos de reforma cultural relacionados com a revolução. Com fundos retirados das

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bibliotecas monásticas ou miguelistas (incluindo a de um irmão de Garrett), organizou a biblioteca pública do Porto. Em 1835, no Repositório Literário do Porto, tentou a primeira teorização portuguesa do Romantismo, que estava inserida em preocupações dominantes de reforma pedagógica.

Segundo Coelho (1983), a Revolução de Setembro de 1836 trouxe Herculano para a notoriedade. Assim, como forma de protesto demitiu-se do seu lugar de bibliotecário em Lisboa e publicou um folheto - A Voz do Profeta – contra os novos governantes. Este começo de nomeada literária tem continuação no trabalho desenvolvido em O

Panorama, jornal cuja direção assumiu em 1837. Neste semanário enciclopédico

ilustrado e direcionado para um largo público, Herculano surge com narrativas históricas e alguns estudos eruditas.

Nesta época o seu modo de vida é o jornalismo, acumulando a direção de O

Panorama com a redação de O Diário do Governo. Em 1839 liberta-se desta situação, e

obtém o lugar de diretor das bibliotecas reais das Necessidades e da Ajuda, cargo que estava dependente do rei consorte, D. Fernando.

Quanto às ideologias políticas, Herculano alinhava no partido conservador, embora na ala esquerda. Foi deputado à legislatura de 1840, onde apresentou um plano de ensino popular, desinteressando-se, quase que de imediato, da vida parlamentar. Aderiu à moderada Constituição de 1838, desaprovou o golpe de Estado de Costa Cabral e remeteu-se à atividade literária e científica.

A parte mais considerável da sua obra literária é realizada durante o período do cabralismo. Faz sair em O Panorama algumas obras, cartas e apontamentos bem como outros escritos que reunirá nas Lendas e Narrativas e nos Opúsculos. Em 1846 surge o primeiro volume da História de Portugal, no ano da Maria da Fonte, de que Herculano, então identificado com o Paço, parece bem alheado, como salientam alguns autores, entre eles Saraiva e Lopes (2000). Em 1847 surge o segundo volume da obra supra referenciada, e o terceiro aparece três anos decorridos, ou seja, em 1850.

Este ano fica marcado pela polémica da batalha de Ourique; Herculano é atacado na imprensa e por diversos pregadores e dá a sua resposta através de Eu e o Clero, carta redigida ao Patriarca de Lisboa, cartas ao redator de A Nação, interrompendo a História

de Portugal para se dedicar a uma obra relacionada com a política e de intolerância

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Neste meio tempo dá-se o golpe de Estado da Regeneração, e Herculano acompanhando a corte e o rei consorte D. Fernando, abandona a neutralidade política que procurara manter até então, e colabora na formação do novo governo preparando projetos de reforma social. Contudo, os seus amigos são obrigados a deixar o governo, e ele entra em oposição ao ministério, cuja principal figura era Rodrigo Fonseca Magalhães, seguido por Fontes Pereira de Melo.

Em 1853 funda os jornais O País e O Português, onde desenvolve uma grande atividade polémica contra o mencionado ministério; nesse mesmo ano concorre às eleições municipais de Belém como membro da oposição, vindo a ser eleito presidente da Câmara; porém, em 1855 como presidente, entra em conflito com o ministro do Reino.

Cortez (1992), salienta que, tudo isto reunido contribuiu para prejudicar o bom andamento da História de Portugal, uma vez que o quarto e último volume só saiu no ano de 1853. Tanto nesse ano como no seguinte, a título de trabalho, Herculano realizou uma viagem na província recebendo provas de prestígio nacional e de apreço; no entanto, de novo entrou em antagonismo com o clero, que se opunha à transferência para a Torre do Tombo de diversos documentos importantes, que corriam o risco de se perderem ou extraviarem

Segundo o mesmo autor, Herculano é um dos fundadores do Partido Progressista Histórico, que em 1856 concorre pela primeira vez às eleições, desenvolvendo um forte ataque à Concordata de 1857 com a Santa Sé, que restringia determinados direitos dos portugueses, entre eles os direitos do padroado português na Índia. Mais tarde, este combate é realizado através das palavras e da escrita, animando diversos comícios. Herculano chegou a propor a introdução do casamento civil ao lado do casamento religioso, originando uma forte polémica em que ele participou ativamente, com os artigos depois reunidos no volume Estudos sobre o Casamento Civil, em 1865. Sem largar a posição de bibliotecário real, passa largas temporadas numa quinta adquirida em Vale de Lobos. Em 1866 casou com uma senhora por quem se apaixonou na juventude, dedicando-se intensamente à agricultura, atividade do seu agrado e que muito o fascinava devido ao contacto com a natureza.

Segundo alguns autores, entre eles destacando-se Teófilo Braga (1892), durante os seus últimos anos, Herculano encontrou-se rodeado de extraordinário prestígio, de um

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verdadeiro poder espiritual nacional, para o qual muito contribuiu a sua forte atitude, o seu caráter combativo, a sua solene postura e ter colocado à margem os cambalachos políticos e financeiros da Regeneração. Do mesmo modo, recusou todas as distinções honoríficas que lhe foram oferecidas, de tal modo, que o seu falecimento deu lugar a grandes manifestações de luto em todo o país.

1.1. Herculano - O Romancista

Alexandre Herculano formou-se dentro do Romancismo. É ele que representa o movimento romântico de maneira mais persistente e espetacular, de modo diferente de Almeida Garrett e de outros mais.

Foi o introdutor do novo género de romance consagrado por Walter Scott, o romance histórico. E foi com o romance histórico que começou, podemos dizer, a novelística portuguesa moderna, uma vez que o romance de cavalaria e outros géneros parecidos de romance perderam-se inteiramente. Embora proclamando-se patriótico e restaurador do passado, o romantismo português vai entroncar na novela e noutros domínios, em modelos estrangeiros, especialmente em Walter Scott, quanto ao pitoresco medievo do trajo, ambientes interiores e exteriores; e em Vítor Hugo, pela junção entre a ambientação evocativa e a caracterologia melodramática, que são os principais obreiros e mestres do romance histórico (Saraiva & Lopes, 2000).

Ao longo dos seus romances e narrativas de cariz histórico, Herculano expressou múltiplas tendências e interesses que as Poesias, as obras polémicas e as históricas apenas mostram parcialmente. Tal como foi concebido por Vítor Hugo, o romance histórico não possuía limites definidos; era uma mistura onde afluía a prosa poética, a erudição, o comentário filosófico, social e político e a descrição pitoresca, tudo a pretexto de narração (Ibidem). Herculano evoca lutas e intrigas de um momento que o tempo calou, deixando antever a vaidade e o dedo da Providência a conduzir o desfile processional da civilização. Do mesmo modo, os seus romances apresentam características de origem religiosa, com o sacrilégio a ocupar um lugar de destaque em todos eles; o gosto pela reconstituição ao pormenor dos trajes, das arquiteturas, dos interiores, das cerimónias e das festas, está presente na sua obra; o culto do cavaleiresco, que parece incoerente num homem que se auto intitulava burguês e

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concebia a História de Portugal como a ascensão da classe média, culto este que se revelava no contraste com os vilãos, grotescos e tartamudos, a defesa da honra pela espada, enchem páginas e páginas da sua escrita (Braga, 1892).

Herculano deixou assinalado na novelística, passando por alto vários aspetos, o seu grande interesse pelos estudos históricos e toda uma conceção de história.

A Semana Santa, O Alcaide de Santarém, O Alcaide do Castelo de Faria, Eurico,

O Monge de Cister, A Dama Pé de Cabra e tantos outros, retratam bem o grande

romancista e historiador que existia dentro de si. Nas crónicas de Fernão Lopes buscou elementos para o Alfageme e O Arco de Sant’Ana. Com O Bobo assistimos a intrigas no seio da aristocracia portucalense, evocando o mundo dos trovadores e dos guerreiros, tema preferencial do Romantismo; por outro lado, O Monge e a Abóbada, dão-nos uma perspetiva mais abrangente e mais real da vida social.

Herculano procurava manter as posições em relação aos nobres, o papel decisivo desempenhado pelo direito romano na centralização monárquica, como refere Carneiro (2003). Na composição das novelas, as cenas dramáticas de interior sucedem-se, dominadas pelos diálogos e pelas minuciosas descrições do ambiente, com pormenores do mobiliário, das cenas ao ar livre, etc…

Na prosa de Herculano é notória uma intenção poética, especialmente em Eurico, como salienta Teófilo Braga (1880), “onde observamos um poema em prosa, devido ao vocabulário, do fôlego versicular do ritmo e pelo sentido grandioso da própria imaginação”. Assim, é neste ritmo combinado com o nobre vocabulário e com a dinâmica dos contrastes, que ainda hoje persiste um dos encantos da sua leitura.

1.2. Herculano e a Poesia Romântica

Desde o início que a poesia de Herculano está inserida em pleno ambiente romântico; o mesmo costumava dizer que fora poeta até aos vinte e cinco anos. A sua escrita tende para problemas sentimentais ou morais, como as paisagens, as atitudes emotivas, as meditações filosóficas com abundância de reflexões pertinentes. Escreve sobre a morte, sobre Deus, sobre a liberdade, sobre o contraste entre a transitoriedade do homem e a eternidade que a transcende. Estas meditações têm por pano de fundo paisagens (com o sentimento da infinidade e da solidão), o oceano e o mosteiro

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abandonado da Arrábida, a tempestade, a noite, o sol poente e outros semelhantes, que deixam transparecer o que lhe vai na alma, os seus mais profundos sentimentos. Ao mesmo tempo, atribui à poesia uma função doutrinária, política, com temas que versam sobre tal, como poderemos ver em O Mosteiro Deserto, A Semana Santa, A Cruz

Mutilada e outras mais.

Em Herculano predomina a estrofe livre em verso branco, conforme a tradição arcádica, bem como a quadra, especialmente em redondilha. Deste modo, podemos considerar como romântica a diversidade métricas dos seus extensos poemas. (Batista, 1977).

Importa referir que foi através de O Panorama que o romantismo entrou em Portugal. É natural que o pendor romântico que o marcou, tal como a muitos dos seus colaboradores, apareça estampado nas páginas de O Panorama, de tal forma que possamos encontrar, disseminado no seu conteúdo, uma abundância significativa de elementos românticos, que nos permite classificá-lo, sem qualquer objeção, não apenas como um jornal romântico, mas como o primeiro e principal jornal do romantismo português, cuja vigência hegemónica se fez em quase perfeita coincidência cronológica com a vida editorial do jornal.1

1.3. Herculano – O Historiador

Para melhor podermos compreender a obra de Alexandre Herculano, deveremos relacioná-la com as condições do ambiente, mais propriamente com os problemas políticos e sociais causados pela instauração do Liberalismo em Portugal, como salienta Carvalho (2001).

1

O romantismo, enquanto movimento autónomo literário, surge no nosso País por volta de 1834 e inicia a sua dissolução sob a segunda regeneração, à roda de 1860, ou seja, entre o definitivo triunfo da burguesia sobre as instituições monárquico-feudais e o triunfo da fação burguesa-liberal sobre o radicalismo da pequena burguesia ou das camadas populares mais esclarecidas. Cf. FERREIRA, Alberto (1971). Perspectivas do romantismo português (4ª edição). Lisboa – Porto: Litexa Editora, s/d, p. 32.

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A História de Portugal, escrita por si, foi concebida como exaltação do movimento concelhio, percursor de uma classe média rural e fabril que tinha como finalidade afirmar-se depois de uma vitória liberal contra o capitalismo, viu no municipalismo a aplicação local da poupança. Este projeto foi realizado em poucos anos, tendo servido o absolutismo para rasoirar certas desigualdades da democracia municipal e para a expansão dos séculos XV, XVI e XVII, embora Herculano tenha caído em alguns erros de transcrição por desconhecimento, bem como de algumas datas conjeturais precisamente pelos mesmos motivos, como revelam alguns autores, destacando-se, entre eles, Saraiva & Lopes (2000).

Esta obra pretende ser a história das instituições, escrita de acordo com uma visão laica de alguns factos políticos, permitindo que atualmente consigamos sentir alguns limites: uma informação pouco suficiente no que diz respeito às estruturas tecnológicas e económicas, originando a que as lutas sociais não apareçam mediante uma perspetiva absolutamente política e jurídica.

1.4. Herculano - O Doutrinário e Polemista

O trabalho de Herculano como historiador é um dos aspetos da sua participação nos problemas que predominavam no seu tempo. Deste modo, tanto a História de Portugal como a Origem e Estabelecimento da Inquisição são obras bastante polémicas. Ao lado destas obras, ocupam lugar também importante os artigos de polémica circunstancial, muitos dos quais reunidos nos Opúsculos. Muito deste material teve origem numa atividade jornalística intensa, uma vez que foi colaborador e dirigiu alguns periódicos de relevo. Porém, nem todos os seus artigos foram assinados e muitos estão ainda por identificar, como refere Nunes (1989).

Podemos distinguir duas épocas na atividade do escritor como jornalista e polemista: na primeira predominam os temas políticos, pedagógicos e literários relacionados com a adaptação ao nosso país de novas instituições; no segundo, predominam os temas relacionados com a crise social europeia subsequente à revolução de 1848, com as novas condições sociais portuguesas desenvolvidas a seguir à Regeneração e com a adaptação da hierarquia religiosa à nova estabilidade da alta burguesia.

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Sem qualquer dúvida, podemos afirmar que Herculano foi, na sua polémica obra, um digno e justo representante da teoria social, económica e política do liberalismo, embora se encontrasse em luta com algumas instituições resultantes da instauração do novo regime. As suas melhores qualidades literárias ressaltam nos seus artigos e obras polémicas, que o consagram como o nosso maior polemista romântico. A sua grande emotividade, o gosto pelo sarcasmo, a ênfase que confere à sua escrita, o vocabulário solene, fizeram de Herculano o homem que hoje recordamos e de quem falamos com admiração.

2. O Contributo de Herculano na Educação

Não vamos apresentar, de modo algum, um resumo de todo o pensamento pedagógico de Alexandre Herculano, mas apenas alguns dados que consideramos pertinentes, como é o caso de alguns relatos assumidos pelo mesmo, aquando das suas intervenções políticas.

Seguindo a linha de raciocínio de Rodrigues (2008), há a salientar que a primeira destas intervenções acontece a propósito da reforma do ensino de Passos Manuel, onde somos surpreendidos nas páginas da revista O Panorama com uma crítica de cariz radical e ao mesmo tempo primando pelo negativismo, na qual Herculano refere não ter havido ainda em Portugal uma única providência governativa a bem da verdadeira instrução. Em textos identificados como sendo seus, embora publicados anonimamente, Herculano continua escrevendo que “(…) Nada; absolutamente nada. (…) o povo nada tem melhorado com o gozo da liberdade; porque esta, para produzir fruto, carece de bons costumes, e os bons costumes só nascem da instrução geralmente derramada” (Pan 1838: 315).

Segundo a opinião de Rodrigues (2008), esta atitude, este expressar de opinião de Herculano, deverá ser entendida dentro de dois pressupostos que não somente a situam como também a justificam. Por um lado, as palavras de Herculano têm como pano de fundo as suas opiniões e posições político-partidárias, uma vez que era um conservador embora situado no lado esquerdo do partido; mas por outro lado, Herculano era também, segundo Gomes, um “defensor da reforma da Instrução levada a efeito por Rodrigo da Fonseca” (s/d: 501). Deste modo e assim perspetivado, os dois pressupostos

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direcionam as palavras de Alexandre Herculano contra o setembrismo, visando, de modo direto, a reforma de Passos Manuel, sem, contudo, referenciar explicitamente a pessoa em questão.

Em 1840, continuando os seus ideais conservadores e comungando na ala esquerda do partido cartista, foi eleito deputado para integrar uma Comissão de Instrução Pública, cuja principal finalidade era trabalhar num projeto de estudos de reorganização do ensino primário, oportunidade que fornecia a Herculano a possibilidade de pôr em prática os seus sonhos, uma vez que acreditava que a instrução deveria ser para todos os homens, que depois tirariam dela o melhor proveito.

Nesta linha de pensamento, Herculano deu forma de projeto de reforma do ensino (Rodrigues, 2008) às suas ideias soltas, propondo um plano de ensino popular que, segundo Gomes (s/d), seria capaz de resolver problemas de projeção nacional. Desta maneira, concebe o ensino geral em, dois níveis:

1- O ensino geral elementar deveria abranger: leitura de manuscritos e impressos, escrita, princípios de aritmética até à regra de três inclusive e o catecismo religioso;

2- O ensino geral superior deveria abranger: gramática portuguesa e exercícios de leitura e escrita corretos (servindo de texto para a leitura e temas o Novo Testamento), elementos de história e geografia da pátria, bem como a aritmética completa, os elementos de geometria e suas aplicações, especialmente o desenho linear e as noções principais de agrimensura. Também no ensino geral estavam incluídos os rudimentos de física e mecânica, os princípios de química aplicados às artes, os elementos de botânica aplicados à agricultura e ideias generalizadas sobre higiene popular.

Para Herculano, o primeiro grau de ensino era o principal uma vez que dizia respeito ao homem como cidadão, enquanto que o segundo dotava o indivíduo de uma formação para poder ascender culturalmente durante a qual as suas vocações seriam reveladas.

Já no que respeitava ao ensino dito superior, Herculano era seletivo, defendendo, acima de tudo, que o dinheiro não era nem um meio nem um caminho para poder ingressar-se na universidade e que deveriam criar-se mecanismos para criar restrições ao dito ensino, através de provas irrefutáveis e severas.

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No entanto, depressa acabou o sonho de Herculano, pois foi excluído da Comissão de Instrução Pública e, deste modo, resolveu publicar as suas reflexões pedagógicas no jornal O Constitucional, em finais de 1841.

Herculano não aprovou o golpe de Estado de Costa Cabral e desligou-se da vida política, uma vez que reconheceu não ter vocação para tal. E foi após tal, o período em que esqueceu a política, que realizou a maioria da sua obra literária (Rodrigues, 2008).

Este aspeto será posteriormente desenvolvido no capítulo IV, ponto 3, onde abordaremos os pressupostos teóricos sobre as questões pedagógicas desenvolvidas no jornal “O Panorama”.

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Capítulo III - O JORNAL “O PANORAMA” E O SEU

TEMPO

1. Breve Contextualização Histórica da Época em que “O Panorama” foi publicado

1.1. Desenvolvimento Político

A Revolução liberal teve lugar na cidade do Porto, no dia 24 de Agosto de 1920, representando, a nível simbólico, a revolta de algumas camadas sociais, muito em particular da burguesia, contra o Antigo Regime e as práticas abusivas que durante o mesmo vigoravam.

Quando D. João VI regressou a Portugal oriundo do Brasil, deixou em terras de Vera Cruz o seu filho primogénito D. Pedro na função de regente. Porém, este foi aclamado como Imperador no dia 7 de Setembro do mesmo ano, data em que o Brasil proclamou a sua independência.

Contra a sua própria vontade, no dia 1 de Outubro do ano em questão, D. João VI jurou a Constituição. Mas devido às grandes modificações que a Revolução empreendeu e consequente Constituição, o clima tornou-se muito tenso, uma vez que os defensores do regime anterior começaram a ver os seus poderes serem abolidos. Este clima de tensão e instabilidade foi aproveitado por D. Miguel que encabeçou a luta anto-liberal, que veio a originar uma sangrenta guerra civil no país, como salienta Saraiva (1999).

A censura é restabelecida no dia 6 de Março de 1824 bem como a lei que estabelecia a liberdade da imprensa.

No entanto, D. Miguel não ficou contente com a atitude moderada de seu pai, e organizou uma revolta que aconteceu em Abril, tornando-se conhecida como “Abrilada”. Mas foi obrigado a fugir do país e prevaleceu a corrente moderada que se manteve no poder.

Com a morte de D. João VI em Março de 1826 e com a morte do rei, ficou o problema da sucessão para resolver. Dos dois possíveis sucessores, um, D. Pedro, era o representante do constitucionalismo e a marca da continuidade; o outro, D. Miguel, era o representante da ortodoxia do absolutismo. Como a regência nomeada antes da morte

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do rei declarou D. Pedro como rei legítimo de Portugal e como este já era Imperador do Brasil, na impossibilidade de exercer os dois cargos e de governar os dois reinos, este resolveu que seria a sua filha Maria da Glória, então com sete anos, a governar Portugal, devendo, para tal, ser jurada uma nova constituição, a Carta Constitucional, tendo D. Miguel de casar com D. Maria.

No entanto, os miguelistas queriam D. Miguel como rei, os liberais não queriam a Carta Constitucional e os moderados tinham medo de uma iminente contra revolução (Ibidem). Em 1826 D. Miguel regressou a Portugal, jurou fidelidade a D. Maria e a D. Pedro bem como à Carta Constitucional. Em 1828 dissolveu as cortes, convocando-as novamente no mesmo ano em Julho, mas à maneira antiga, por ordens e nelas foi proclamado legítimo rei de Portugal.

Como consequência, a grande maioria dos liberais foi exilada; contudo, organizaram a resistência.

Nos Açores formou-se um governo de regência em nome de D. Maria II, comandado por seu pai, D. Pedro IV, saindo de Ponta Delgada e em direção ao continente em Julho de 1833 acompanhado de 7500 homens, todos dedicados à causa em questão; após desembarcarem em Mindelo estabeleceram-se no Porto. Importa lembrar que neste batalhão militou ativamente Alexandre Herculano. Resistiram com bravura aos 80 000 miguelistas que os cercaram mais ou menos durante um ano, travando várias batalhas sangrentas. Lentamente os liberais avançaram, de tal modo, que no dia 24 de Julho de 1833 D. Pedro IV entrou em Lisboa perante a pouca resistência dos miguelistas, atitude esta decisiva para determinar o caminho final da guerra. O que não impediu que as lutas continuassem até à assinatura da convenção de Évora-Monte em 29 de Maio de 1834 o consequente exilio de D. Miguel.

1.2. A Passagem da Esperança à Desilusão com o Segundo Liberalismo

Corria o ano de 1834 e o regime implantado representava uma rutura com a conjetura do quadro histórico de 1820 e, ao mesmo tempo, dava início a uma segunda fase do liberalismo, como que representando um marco a separar o Portugal Antigo do Portugal Novo. Para trás, ficavam as lembranças de um Portugal alterado por crises políticas, por desilusões, pela guerra civil, e pela frente renascia um novo país,

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fervilhante de novas emoções e esperanças, tal como dava a conhecer um jornal da época, quando referia “A época de terror e luta que atravessámos deixou em nós profundas impressões (…). Cumpre promover a difusão da instrução pública (…) e pouco a pouco ir reparando as ruínas causadas pelos anos do império da ignorância e da inquietude” Repositório Literário, (1834).

Os portugueses esperavam, portanto, melhores dias, onde se pudesse combater o marasmo em que Portugal se encontrava mergulhado; contudo, acabando a guerra civil e contrariamente ao que muitos pensavam, não acabaram os problemas. Foi demasiada euforia, pois tal não significou que finalmente chegaria a estabilidade.

Oliveira Marques (1977: 94), salientou que “o fim da guerra civil não significou estabilidade para o País”. Assim, viviam-se tempos de precariedade, de incertezas a todos os níveis. Entretanto, a princesa foi proclamada rainha, uma vez que D. Pedro faleceu, nesse mesmo ano.

Os tempos eram difíceis. De um lado encontravam-se os defensores das Constituição de 1822 (vintistas), do outro, os defensores da Carta Constitucional (cartistas); e o país não suportava mais demoras, mais esperas.

Deste modo, não foi admiração o que aconteceu no dia 11 de Setembro de 1836, eclodiu em Lisboa uma revolução que ficou a ser conhecida como setembrismo, que colocou os vintistas contra os cartistas. Neste seguimento, a Carta Constitucional foi abolida e a Constituição de 1822 restaurada provisoriamente, até aparecer uma nova Constituição resultante do compromisso entre ambas, como bem refere Rocha (1984).

Poderemos destacar deste mesmo período dois aspetos que nos merecem particular atenção: no que concerne à cultura, foram criados liceus, a Escola Politécnica de Lisboa, a Academia de Belas Artes do Porto e de Lisboa e a escola médico-cirúrgica do Porto; na perspetiva política, anotamos que a Constituição de 1836 vigorou até 1842, data do golpe de estado levado a cabo por Costa Cabral, e altura em que a Carta foi novamente proclamada pela rainha como sendo a constituição política do país.

Todas as medidas tomadas atingiram Portugal na sua totalidade e o descontentamento das pessoas originou o movimento Maria da Fonte precisamente contra o Cabralismo; porém, a revolta e o descontentamento eram tão sérios que o governo não teve mão no controlo político do país e foi necessária a intervenção estrangeira que culminou por fomentar a assinatura da Convenção de Gramido. Costa

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Cabral foi afastado e em seguimento a toda esta agitação seguiu-se um período de calma, de apatia, de estagnação e marasmo, onde nada digno de registo se passou.

Tudo isto não impediu que Costa Cabral regressasse novamente ao poder em 1849 governando até meados de 1851 (Rodrigues 2008).

1.3. A Regeneração

Costa Cabral foi afastado de vez por Saldanha em 1851, que encabeçava a revolta dos Regeneradores. A sua vontade era aproximar mais Portugal da Europa, de modo a facultar um possível desenvolvimento do país, até então tão envolvido em quezílias e tão estagnado.

A partir de 1851, um período de maior calmaria instalou-se no país, acabando as guerras civis, entrando-se numa era de desenvolvimento e recuperação, com a dita Regeneração. Foi um período que durou até ao advento da República, regendo-se pela Carta Constitucional com os respetivos atos adicionais tão necessários para a atividade económica, e um vasto programa político de Fontes de Pereira de Melo. Acima de tudo privilegiou-se o entendimento dos partidos, regeneradores e progressistas, de modo a existir paz que tão precisa era após a guerra civil.

Desde as reformas do Marquês de Pombal, os primeiros passos do ensino no regime constitucional, destacam-se a Reforma de Rodrigo da Fonseca (1835), o contributo da reforma de Passos Manuel (1836) e, ainda, as reformas ocorridas na Regeneração entre outras iniciativas, muitos outros passos foram dados para fazer entrar Portugal no carril do desenvolvimento que a Europa já conhecia.

2. “O Panorama” entendido como jornal instrutivo

O despertar do constitucionalismo no nosso país, desencadeou uma grande alteração política e social. Herculano, p. 33, refere que “A época de 1833 foi a única época revolucionária por que tem passado Portugal neste século…(…)…porque só então foi substituída a vida interina da sociedade por uma nova existência”.

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Surgiram novas instituições relacionadas com a difusão da cultura, renovando-se o espírito de cooperação e associação. Assim, estas instituições possuíam uma pessoa ligada à modalidade jornalística, detentora de conhecimentos que podiam estar relacionados com o plano jurídico, científico, literários, médico ou industrial; por sua vez, a informação era transmitida através de periódicos, que tinham uma determinada tiragem, maior ou menor, consoante o gosto do público. Por outro lado, era também necessário incentivar o gosto pelas letras e por outros assuntos de modo a fomentar o amor pelo trabalho e pela cultura.

Era preciso combater a ignorância que se havia instalado entre as pessoas durante esses anos atribulados, abrir as portas para o progresso, para novos horizontes, e permitir que Portugal alcançasse outros patamares que até então não fora capaz.

E que caminho melhor que a instrução para tal?

A Instrução entendida como uma realidade social quase natural, que em última análise constitui a nossa vida e se difunde na nossa consciência. E, do mesmo modo, uma realidade que define as sociedades ditas atuais, e que se tem como condição de progresso material e espiritual do homem e da sociedade, sem hipótese de tal ser discutido. Instrução, portanto, entendida como uma trajetória de um direito pleno de promessas.

Neste seguimento, a instrução era como uma espécie de cruzada contra o atraso de um povo que até então tinha estado conformado com o que lhe fora destinado. Combater a ignorância era a meta desejada, colocar o país ao lado de outros desenvolvidos para que lhe fosso restituído o brilho que perdera. E para tal, todos os esforços eram necessários. Foi, pois, neste contexto, que surgiu O Panorama, onde era possível expandir os conhecimentos úteis através de uma publicação semanal que chegasse até onde preciso fosse para cumprir os seus objetivos.

Com Herculano e O Panorama, surgiu, assim, o primeiro jornal de cariz romântico, o primeiro e principal jornal do romantismo português.

O Panorama foi, por excelência, o educador de toda a classe média, com uma

consciência romântica bem explícita nas páginas da Introdução do III volume, referindo que provocou “…certa afeição pelas coisas que o passado tinha boas (…) trabalhou para que renascesse o sentimento da antiga energia e glória nacional, (…) tem procurado

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incorporar os desejos e esperanças do futuro com as saudades das tradições do belo e grandioso…" (Pan 1844: 1).

Assim, o culto pelo passado bem como a divulgação de imagens da Idade Média, fizeram com que a História de Portugal renascesse nas páginas do jornal (Rodrigues, 2008). Nele encontramos também uma grande diversidade de trechos poéticos e históricos, com relevo no que possuíam de mais sugestivo e exaltando-se figuras lendárias (Mello 1971).

2.1 Os Colaboradores e o Anonimato

Desde que foi fundado a 6 de Maio de 1837, o jornal impunha aos seus colaboradores o anonimato literário, e, portanto, não permite identificar com certeza absoluta quais os artigos oriundos da pena de Herculano, na sua totalidade. Na época, este tinha dois colaboradores, identificados como Jorge de Brito e Rodrigo Felner. Inocêncio Silva referiu a falta de informação relativamente a este devido a esta lacuna, salientando que “ainda outros que ficaram para nós desconhecidos” (Dicionário Bibliográfico, Tomo XXI: 519), isto é, dando a conhecer que outros colaboradores teriam havido, desconhecendo-se assim a sua identificação rigorosa e precisa. Contudo, Augusto Xavier da Silva confirma a presença destes dois colaboradores e reforça, dizendo que outros haveria, além destes dois “a direção literária foi confiada a Herculano, que convidou para o auxiliar nesta cruzada Francisco Romano Meira e Rodrigo José Gomes Felner, entrando pouco depois para a redação da folha os sócios Viana Pedra e Jorge César Figaniére” (Dicionário Jornalístico Portuguez, tomo III: 1284).

Também Teófilo Braga contribuiu para a identificação dos colaboradores de O

Panorama, citando uma circular de 1839, onde menciona os gloriosos dias que o jornal

conheceu, logo após a saída de Herculano e à data da referida circular; ”nem obsta o deixar de ser o principal redator o Sr. Herculano, porque além de continuar a ministrar-nos os seus interessantes artigos, algumas pessoas zelosas da instrução pública ministrar-nos têm presenteado com fruto dos seus estudos” (Braga 1880: 290), contudo sabe-se que ainda foram bastantes aqueles que colaboraram no jornal, reconhecendo-se ser bastante fastidioso fazer o levantamento de todos.

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27 2.2 Temas Predominantes

Ao fim de um ano de publicação, a matriz do jornal foi alterada devido a determinadas necessidades, em especial porque os responsáveis entenderam ser necessário adaptar a mesma à realidade do nosso país, afastando-se assim da matriz original, herdada do Penny Magazin, o que vinha acontecendo até então. Para que tal sucedesse com êxito, foi necessário estudar a psicologia dos leitores portugueses, evoluindo, assim, para uma nova matriz que se manteve invariável ao longo de todo O

Panorama.

Deste modo, o jornal passou a conter duas partes distintas, de acordo com as exigências de Herculano:

Uma, mais séria, era composta por artigos mais longos, circunspectos, respeitantes à história, biologia, arqueologia, música, higiene, filosofia, agricultura, tecnologia, economia, belas artes, história natural e à literatura, propriamente dita;

Outra, a segunda, dizia respeito a artigos de menos relevância, mais leves, menos extensos, artigos ditos recreativos, cujas temáticas variavam entre a literatura de viagem, lendas populares, etnologia, economia doméstica e um leque de outros diversos assuntos.

Foi, portanto, este, o formato que predominou no jornal desde o segundo ano de existência até ao final da publicação.

(Mello 1971), realizou uma pormenorizada análise dos temas tratados no jornal, salientando a divulgação histórico-geográfica (história de países, cidades, ruínas, monumentos).

No que concerne aos quadros da História de Portugal, os mesmos fizeram reviver a Idade Média, realçando as grandes figuras nacionais bem como os monumentos que legaram aos vindouros, as batalhas travados e que fizeram alargar as fronteiras portuguesas, as instituições civis e religiosas, e, do mesmo modo, as superstições e lendas que foram passando de pais para filhos ao longo dos anos (Rodrigues 2008).

Ao longo do jornal encontramos uma valiosa coleção de dados etnográficos sobre usos, costumes, modas, casamentos, festas e ritmos fúnebres, entre outros, de diversos países.

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Da mesma maneira, salientamos temas sobre higiene e saúde pública, inerentes ao campo da educação, importantes como medidas preventivas contra determinadas doenças.

Temas sobre a religião e a moral apareceram de modo bastante significativo, também relacionados com a educação, uma vez que privilegiavam os valores da amizade, da modéstia, condenando a avareza, o egoísmo e as paixões da carne.

As artes e a ciência também foram contempladas, com um vasto leque de artigos alusivos às referidas temáticas; por sua vez a tecnologia não ficou esquecida, referindo-se diversos artigos respeitantes aos domínios domésticos, equipamentos industriais e agrários e instrumentos de navegação e ótica.

Várias notícias sobre inventos e suas aplicações surgiram, evidenciando-se as vantagens dos seus usos. Destes inventos, uns eram nacionais, embora fossem mais raros; outros estrangeiros, mais abundante. De qualquer forma todos contribuíam para o desenvolvimento do país. Entre os inventos nacionais podemos referir as armas de fogo, objetos esculpidos em mármore e jaspe artificiais, mas, especialmente, a invenção da faixa hidráulica e o diedrogomómetro, resultado de muito trabalho e das faculdades dos portugueses para inventar (Rodrigues 2008).

No campo da economia agrária, os ensinamentos foram diversos, desde a silvicultura, agricultura e horticultura, passando por experiências de produções novas, de conhecimentos sobre enxertias, estrumes, colheitas e secagem de novas plantas, regas, podas e mesmo de receitas de cariz fitopatológico.

No domínio da História Natural, notamos uma dada preocupação em difundir belos exemplares, tanto de animais como de plantas. Verifica-se uma preocupação em divulgar o que de utilitário ofereciam no campo da medicina e da indústria, muito para além da simples preocupação em adornar as páginas do jornal.

Respeitante ao reino mineral, há a referenciar determinados catálogos de diversos minerais e dos lugares onde podiam ser encontrados dentro do país. Estamos a falar de cobalto, cobre, enxofre, chumbo, carvão mineral, ardósia, gesso, estanho, tufa, mármores e outros. Contudo, muitas destas pedras, malgrado abundassem no nosso país, não foram devidamente exploradas e foram enviadas para o estrangeiro, aproveitando outros o que devia ter sido aproveitado por nós.

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Os temas relacionados com economia, foram abordados no jornal mediante duas perspetivas: a economia doméstica, confundida por vezes com questões de educação, e a economia política, respeitante a investimentos públicos, bancos, financiamentos, impostos e ao fomento económico na sua generalidade.

2.3 A Sociedade Oitocentista e a Influência do Jornal “O Panorama”

Através do jornal, a Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Úteis procurou sempre promover a instrução, muito especialmente sobre os conhecimentos úteis procurando promover, desta maneira, o desenvolvimento do povo português.

Depois do lançamento do primeiro número do jornal O Panorama, sem pretender substituir-se ao poder legislativo, Filipe Ferreira de Araújo e Castro, interpretando o poder dos Estatutos, reafirmou a vocação vinculada ao jornal, referindo “… cumpre promover, quanto é possível, o melhoramento da educação doméstica …” (Pan 1844: 2).Nestas linhas estão, pois, bem patentes, os principais ideais presentes em O

Panorama.

Da mesma maneira, o jornal adquiriu relevo entre os mesmos da época, devido ao seu carisma de divulgador social, tendo um papel especial na instrução e formação contínua das pessoas.

Dentro das limitações existentes O Panorama funcionava como uma biblioteca acessível a todos as classes, acomodada a todos os interesses e gostos, estimulando assim o gosto pela leitura e instrução. O êxito foi tal que Herculano transmitiu aos seus leitores, ao rejubilar-se com os resultados das primeiras semanas de publicação de “O

Panorama, que logo ao 5º número se tirava a 5000 exemplares, caso único em a história

das publicações periódicas em Portugal” (Pan 1837:53).

Através dele a informação chegou às aldeias, vilas e cidades, foi um guia para o mundo do conhecimento. Segundo Rodrigues (2008:91), “Foi, numa palavra, um educador privilegiado, de uma geração privilegiada pelas oportunidades de mudança e pelas esperanças de progresso, o educador de uma geração que transportou consigo a Geração de 70”.

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Capítulo IV - A EDUCAÇÃO NO JORNAL “O

PANORAMA”

Tanto quanto os homens são, o devem à educação. (Pan 1844)

1. A Educação do Homem todo e de todo o homem

Acordando com os Estatutos da Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Úteis, Alexandre Herculano não foi somente o principal colaborador e fundador do jornal O Panorama. Mais do que isso, foi como o pai de um jornal cujo principal objetivo visava instruir todo um povo até então mergulhado no marasmo devido a problemas vários. E embora este ideal fosse partilhado pelos colaboradores, foi, sem dúvida, Herculano, que através da sua escrita, deu a conhecer os inúmeros ensinamentos tão importantes para o desenvolvimento intelectual que era necessário.

Assim dos nove artigos que se presume serem de sua autoria, publicados ao longo de três anos, podemos retirar as seguintes ideias:

• a educação visa o desenvolvimento integral do homem, isto é, o desenvolvimento e consequente cultivo das faculdades do indivíduo;

• a educação pode ser dividida em educação física, educação intelectual e educação moral, sendo que ,deste modo, as três vertentes complementam-se; • é da educação de infância que se parte para a regeneração de um país, e é desde

a mais tenra idade que se deve apostar na educação. (Rodrigues 2008).

Respeitante ao papel que a mulher desempenhava na educação, este era, sem qualquer dúvida, muito importante, uma vez que, entre outros, o papel de amamentar era fundamental, quase como que um dever considerado sagrado; assim sendo, e como os homens não seriam nunca capazes de tão nobre missão, o papel de educadora de infância estava direcionado para as mulheres.

Segundo Xavier de Quadros (1841: 87), “A educação aperfeiçoou a sociedade, não só porque dá hábitos e costumes de regularidade, mas também porque substitui esses maus costumes pelos bons”

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Locke, citado pelo Panorama (1986: 65), refere mui sabiamente, que “as diferenças que se encontram nos costumes e nas atitudes dos homens devem-se à sua educação mais do que a qualquer outra coisa”.

Nós, podemos salientar que, o facto de um ser humano receber a mesma educação que qualquer outro, não vai significar igualá-los entre si. A educação não é um meio omnipresente para a supressão das desigualdades. Na melhor das hipóteses, é apenas um dos possíveis meios para percorrer o caminho para a igualdade. E as desigualdades, outrora como hoje, originam sérias consequências, para além de causarem diferenças sobre as oportunidades que se possam ter. Receber ou não educação, ontem como hoje, é condição para a participação na sociedade, desde que, para desempenhar o exercício de muitas atividades e a ocupação de postos de trabalho, se exige não só preparação prévia, bem como ferramentas e habilidades para adquiri-la.

Por isso, a insistência de Herculano na educação era legítima, uma vez que a pessoa inculta ou com carências e deficiências significativas, fica excluída ao não poder participar plenamente na sociedade.

“Um povo instruído há-de conhecer mais depressa do que o ignorante, que o seu interesse consiste na paz e na ordem pública; a instrução há-de lhe fazer conhecer mais…” (Pan 1841: 88). Como refere este autor anónimo, a educação é indispensável para o desenvolvimento de um povo, para uma participação plena em todas as atividades da sociedade em que se está inserido. Com a educação é possível conhecerem-se os deveres e fazerem-se cumprir.

Pela educação, o homem deverá ser:

• Disciplinador: Disciplinar é tentar impedir que a animalidade se estenda à humanidade, tanto no homem individual como no homem social;

• cultivado. A cultura compreende a educação e o ensino. Proporciona a habilidade, que é a posse de uma faculdade pela qual se alcançam todos os fins propostos;

• é preciso que o homem seja também prudente. Que se adapte à sociedade humana. Tal corresponde a uma espécie de ensino a que se chama civilidade; • deve atender à moralização. O homem deve não somente ser hábil para todos os

fins, mas também ter um critério que apenas o capacite a escolher os bons. (Kant 1991).

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Neste seguimento, podemos afirmar que a cultura não é a existência do que se costuma chamar bens culturais, mas sim a nossa presença diante deles, a nossa possibilidade de ser alguém perante a herança cultura, e, sobretudo, a nossa possibilidade de fazer com ela.

E dia a dia, a complexidade de educar os filhos, era e é, cada vez maior. As dificuldades crescem e há necessidade de recorrer à sociedade a que pertencemos no sentido de esta prestar a sua ajuda.

Também ao longo das suas inúmeras páginas, O Panorama prestou a sua homenagem aos mestres, que se dedicavam a ensinar, admirando a sua vocação e o sentido de responsabilidade com que o faziam, malgrado as parcas condições que possuíam e a que se sujeitavam, pois os salários eram exíguos e não davam para quase nada. E várias vezes O Panorama tentou devolver aos mestres a dignidade a que tinham direito, e os seus colaboradores lutavam contra a indiferença de quem governava perante situação tal, buscando a todo o custo um novo rumo para quem tanto se esforçava em prol de uma população que tinha todo o direito à instrução (Rodrigues 2008).

A ideia que se tinha de um mestre, era a de alguém com responsabilidades acrescidas e que se encontrava relacionado com o desenvolvimento integral da criança.

Como assinala Aries (1986), desde o século XVIII até aos nossos dias, as atitudes de quem ensina relativamente às crianças mesclam-se em doses variáveis segundo o momento histórico e de acordo com o tipo de sociedade, a ternura e severidade face às mesmas crianças, um jogo complicado entre a pedagogia, o amor e a moral, entre a necessidade de orientá-las e a tendência para respeitar a sua natureza boa entre o trato mimado e a imposição. Era com toda esta responsabilidade que os mestres tinham de lidar, mantendo-se sempre ativos e disponíveis mesmo perante condições que não podiam ser consideradas razoáveis, quanto mais boas, para a prática do ensino.

Há também a assinalar o facto de nem todos poderem ser professores, nem todos terem o perfil que se deseja constatar num professor. Para ensinar há que ter vocação, gostar do que se faz, ter a paciência, a delicadeza e o trato que a profissão exige; para não falarmos dos conhecimentos que é obrigatório possuir.

Assim, nas suas páginas, O Panorama faz referência a uma subtil diferença entre os conceitos de vocação e de profissão, referindo que o mestre não pode ser um

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profissional sem vocação. Há que a possuir. O ensinar não pode ser entendido somente como um modo de ganhar a vida. Tem de amar-se o que se faz para melhor o poder transmitir. A educação tem de ser entendida como uma aposta no progresso do homem, um projeto otimista que deve ser extensível a todos, visto que se apoia nos valores da racionalidade e da democracia, que eleva a condição humana. Como refere Locke (1986: 66), “… devemos deduzir que se atribuirá especial cuidado à formação do espírito das crianças e dar-lhes aquela preparação inicial que influenciará o resto da sua vida”.

Deste modo, reiteramos a ideia de que, de facto, nem todos podem ser professores, nem todos têm vocação para serem mestres, e não pode, de modo algum, fazer-se do ensino apenas um meio de ganhar a vida. A missão de que estão imbuídos é soberana, e, por isso mesmo, a escolha reveste-se de grande dificuldade.

O mestre deve possuir um leque de qualidades morais e intelectuais, a par com conhecimentos suficientes sobre diversos assuntos; além disto, deve ser-lhe ministrado um bom estágio, ao longo de vários meses, para poder desenvolver uma boa prática pedagógica e saber transmitir todos os conhecimentos e valores de que dispõe. Foi sempre uma crença de senso comum, reiteradamente confirmada pela investigação, de que o professor é o elemento central de uma cadeia de fatores e condições que fundamentam a qualidade da educação. Sem mestres ou professores não há educação. Têm de ser dotados de qualidades especiais, cultos e dotados de sensibilidade e de bom senso pedagógico, adequadamente selecionados, profissionalmente motivados e em constante aperfeiçoamento. E os mestres de então não usufruíam de um clima propício para tal e lutavam contra inúmeras dificuldades, o que não seria, de todo, motivante. Por tal, referimos que nem todos podiam ser mestres, nem todos podiam ser bons professores.

Herculano referia que, para se obter o grau de mestre, existia rigor nos exames, o que estava em desacordo com os salários que iriam auferir. Assim, como poderia existir motivação, se o dinheiro quase os obrigava a mendigar? Como exigir tudo de um mestre, se quase nada lhes era dado em troca? Tempos difíceis esses!

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35 2. Propostas de Reorganizar o Ensino

2.1 Proposta de Araújo e Castro

A proposta de Araújo e Castro referia que a educação só poderia operar a regeneração de uma sociedade se ela própria fosse nacional, ou seja, radicasse num sistema de educação pública que fosse conveniente. E embora insistisse sempre que a educação deveria ser nacional, não fechou as portas às escolas de cariz particular, dando aos pais a possibilidade de escolherem o que queriam para os seus filhos.

Era medida urgente levar os pais a entender que a escola obrigatória tinha vantagens reais tanto para os filhos como para eles mesmos, e compreenderem que “ao direito que aos pais se mantém de dirigirem a educação dos seus filhos, corresponde o dever de o fazerem em conformidade com as leis que regulam o plano…”; do mesmo modo, os interesses dos alunos deveriam ser tidos em consideração. Se os pais não cumprissem com esses deveres, então também não teriam direito de intervir (Pan 1844: 115).

Com a instrução, os educandos teriam um modo de sustentar-se num futuro próximo, uma vez que a educação dotava-os de conhecimentos necessários para poderem construir um futuro. De qualquer modo, a educação sendo obrigatória, conferiria um sentido educativo e social às suas vidas.

A obrigatoriedade da educação, no decurso das primeiras etapas do desenvolvimento humano, reflete uma espécie de contrato ou de pacto, entre a escola e a família e entre esta e o Estado.

As mudanças sociais que estão por detrás do ensino obrigatório fizeram das escolas espaços semelhantes aos espaços familiares para o cuidado da infância e da juventude. A escolaridade, hoje como no passado, é considerada como um indicador da qualidade de vida. Como realidade social, a sua existência, ou carência, gera consequências para as pessoas e confere uma dinâmica própria às relações sociais. É uma espécie de qualidade acrescentada que, uma vez adquirida, condiciona todo o futuro. Tem um valor que provoca reações em cadeia em espetos diferentes da realidade e entre gerações distintas: as famílias que foram educadas terão filhos com mais educação e, por sua vez, estes disporão de mais facilidades, graças ao facto da educação ser uma espécie de capital que se multiplica por si mesmo. A educação dos pais condicionará aquela que os

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mesmos escolherão para os seus filhos. Daí o facto de Herculano mencionar com insistência na sua escrita a necessidade de haver educação e de esta dotar-se de caráter obrigatório.

Do mesmo modo, também a proposta de Araújo e Castro versava sobre o facto de a educação não poder estar distanciada da indústria, como o mesmo refere “ o governo não deve descansar na eventualidade das empresas particulares, (…), e por isso o governo deve sustentar escolas de diversas ciências, artes, e ofícios ao nível dos progressos do século” (Pan 1844: 115). Interpretando tal, entendemos que o governo deveria promover a educação obrigatória, pois quanta mais instrução os educandos tivessem, quantos mais conhecimentos adquirissem, mais facilmente estariam aptos para ingressar nas fábricas e competir com outros países promovendo o desenvolvimento do país.

2.2 Proposta de Silvestre Pinheiro Ferreira

Referente à proposta apresentada por Silvestre Pinheiro Ferreira, sabemos que, entre todas as que foram apresentados, é a mais completa. Era defensor de um verdadeiro sistema nacional de educação, salientando que “só mediante um sistema arrazoado da educação nacional, é que se pode esperar pôr um termo à deplorável anarquia” (Pan 1844: 79).

S. P. Ferreira mostra como são compostas as diversas profissões e, refere que, todas podem ser apresentadas mediante três classes de pessoas: uns, com uma enorme habilidade, muito dotados; outros, que não sendo génios, conseguem, contudo, realizar o trabalho que lhes é destinado; por últimos, aqueles que são considerados inaptos, que não conseguem realizar seja o que for. Esta realidade revela-se negativa, uma vez que são estes últimos que se encontram em maior número. Mas são estes os que as pessoas preferem, uma vez que praticam preços mais baratos. Assim, os bons, ficam mais desfavorecidos em prol dos que não têm habilidade para nada e apresentam obras más.

Este tipo de situação gera descontentamento, uma vez que são estas pessoas as causadoras da desmoralização das famílias devido ao seu comportamento, não conseguindo, deste modo, transmitir os valores necessários aos filhos. Por outro lado,

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