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Passaporte para inclusão escolar

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Academic year: 2021

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Comunicação Alternativa: passaporte para a

inclusão escolar

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Leila Regina d´Oliveira de Paula Nunes

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, Cátia Crivelenti de Figueiredo

Walter

3

e Carolina Rizzotto Schirmer

4

Abstract

The number of students with cerebral palsy and autism included in regular schools is growing each day. Teachers need to be, continuously, trained to employ Alternative Communication resources with these students, who present severe difficulties in oral communication. The studies conducted in regular and special schools by the Language and Alternative Communication Research Group from the Graduate Program in Education of UERJ will be briefly described. Various Alternative Communication resources will be presented. A description of how these resources facilitate the students’ linguistic, communicative, and social abilities will follow. Finally, issues related both to the development of research in schools and the conception of communicative accessibility will be discussed.

Resumo

A presença de alunos com paralisia cerebral e com autismo é crescente no cotidiano das escolas regulares. Professores frequentemente necessitam de formação no emprego de recursos de comunicação alternativa junto a esse alunado que exibe graves dificuldades de comunicação oral. Serão descritos os estudos do Grupo de Pesquisa Linguagem e Comunicação Alternativa do Programa de Pós–Graduação em Educação da UERJ conduzidos em escolas regulares e especiais. Serão apresentados e comentados recursos de Comunicação Alternativa elaborados com o propósito de favorecer as habilidades linguísticas, comunicativas e sociais desses alunos em suas interações em sala de aula. Finalmente, serão discutidas questões relativas à pesquisa em sala de aula e à concepção de acessibilidade comunicativa.

1 Capitulo do livro organizado por Cicilia Maia , Tecnologias Assistivas: Experiências e Desafios, 2013, UERN

2Ph.D. em Educação Especial. Professora titular da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ, leilareginanunes@terra.com.br

2Dra. em Educação Especial. Professora adjunta da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ. catiawalter@gmail.com

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2 A Comunicação Alternativa

A inclusão escolar e social de pessoas com deficiência tem sido amplamente discutida na literatura especializada na Educação e na Saúde, nos últimos anos (Manzini, Deliberato, 2004; Pelosi, 2008; Schirmer, Nunes, Walter, Delgado, 2008; Pelosi e Nunes (2009), Nunes e Schirmer, 2011). A complexidade que permeia a questão da inclusão escolar teve maior expressividade em nosso país a partir da Lei de Diretrizes e Bases - LDBEN 9394/96. A despeito do anunciado comprometimento do arcabouçolegal e das ações governamentais com a inclusão, é notório que muitas delas não tem garantido a qualidade do ensino nas escolas, a formação qualificada de professores, assim como o acesso efetivo a serviços e recursos da Tecnologia Assistiva (TA) e mais especificamente da Comunicação Alternativa para alunos com deficiência, notadamente, aqueles com dificuldades acentuadas de comunicação [Schirmer, 2012].

A Comunicação Alternativa é uma das áreas da Tecnologia Assistiva (TA) que atende pessoas sem fala ou escrita funcional ou em defasagem entre sua necessidade comunicativa e sua habilidade em falar e/ou escrever. Mais especificamente, Comunicação Alternativa envolve o emprego de gestos manuais, posturas corporais, expressões faciais, uso de miniaturas, de símbolos gráficos (como fotografias, gravuras, desenhos e linguagem alfabética), de voz digitalizada ou sintetizada por meio dos quais pessoas sem fala articulada, devido a fatores psicológicos, neurológicos, emocionais, físicos e/ou cognitivos, podem efetuar a comunicação face a face [Nunes, 2003; Soto, von Tetzchner, 2003].

O Grupo de Pesquisa Linguagem e Comunicação da Pessoa com Deficiência

O Grupo de Pesquisa Linguagem e Comunicação Alternativa do Programa de Pós

-Graduação em Educação (ProPEd) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro vem se dedicando sistematicamente desde 1995 ao ensino e à pesquisa sobre a linguagem e a comunicação de pessoas com deficiência, em especial, aquelas com paralisia cerebral,

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3 autismo, deficiência intelectual severa, deficiência múltipla e surdocegueira. Foram desenvolvidos 13 projetos de pesquisa financiados pelo CNPq, FAPERJ, UERJ e CAPES, orientadas 20 dissertações de mestrado e 6 teses de doutorado, 16 monografias de conclusão de curso, além de uma tese de pós-doutorado, totalizando mais de 200 produções. As atividades de pesquisa, ensino e extensão do Grupo de Pesquisa são, em sua maioria, desenvolvidas no Laboratório de Tecnologia Assistiva/Comunicação Alternativa (LATECA), situado nas dependências do ProPEd. Em 2009, o LATECA foi remodelado e reequipado com os mais modernos instrumentos de Tecnologia Assistiva, contando com financiamento da FAPERJ5. Em 2009, foi criada uma homepage do LATECA – www.lateca-uerj.net/ contendo informes sobre os membros constituintes do Grupo e suas publicações, os eventos nacionais e internacionais e diversos links .

Os estudos conduzidos pelo Grupo de Pesquisa ao longo desses 17 anos foram agrupados em oito eixos temáticos, a saber: a) características dos instrumentos e dos recursos de comunicação alternativa e de seus usuários, b) ensino do uso da comunicação alternativa através do ensino naturalístico e da interação responsiva , c) desenvolvimento da leitura, escrita e consciência fonológica em alunos não oralizados, d) interação de usuários de comunicação alternativa com seus interlocutores, e) emprego da comunicação alternativa junto à família, f) programas de formação de recursos humanos para introduzir a comunicação alternativa nas escolas do ensino fundamental e de educação de jovens e adultos, g) desenvolvimento de habilidades sociais em usuários de comunicação alternativa, h) estudo transcultural sobre desenvolvimento da linguagem em usuários de comunicação alternativa.

A Comunicação Alternativa nas escolas

Na condução das investigações sobre programas de formação de professores, os membros do Grupo de Pesquisa estabeleceram parceria colaborativa com graduandos de Pedagogia, professores e estagiários para introduzir a Comunicação Alternativa nas escolas regulares e especiais do ensino fundamental e de educação de jovens e adultos.

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4 A seguir, serão apresentados alguns exemplos desses recursos acompanhados de uma breve descrição das situações nas quais foram empregados e dos alunos beneficiados.

Nos projetos Dando a voz através de imagens: comunicação alternativa para indivíduos com deficiência [Nunes, 2007]6 e Promovendo a inclusão comunicativa de

alunos não oralizados com paralisia cerebral e deficiência múltipla [Nunes, 2007] 7 os

principais objetivos foram introduzir e avaliar os efeitos da inclusão dos recursos de Comunicação Alternativa em duas salas de aula de uma escola especial e de uma escola regular, e, no programa de Educação de Jovens e Adultos do município do Rio de Janeiro, analisar o processo comunicativo de alunos com deficiência severa de comunicação oral com seus interlocutores na escola e em casa. A equipe de pesquisa foi bem sucedida em ensinar às professoras a elaborar e a empregar tais recursos de baixa e alta tecnologia em uma diversidade de situações. Os dados coletados apontaram para uma mudança sensível nas habilidades comunicativas e sociais dos alunos em sala de aula e maior sensibilidade das professoras às questões de comunicação nesse contexto.

6 FAPERJ proc . 26/110235/2007 7

CNPq proc. 473360/2007.1

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5 A figura 1 revela a satisfação de Teresa8, uma aluna com paralisia cerebral, utilizando o computador pela primeira vez, por meio de acionador plugado ao mouse, que lhe permitia jogar de forma autônoma.

Com o financiamento recebido da FAPERJ e do CNPq, uma sala de aula na escola especial foi equipada com computador, monitor, teclado com colmeia, acionadores e softwares como o Intellytools, e o Boardmaker with Speaking Dinamically Pro destinados à impressão de imagens, adaptação de atividades pedagógicas e programação de pranchas dinâmicas. O software “Escrevendo com Símbolos” foi igualmente empregado para facilitar a elaboração de textos com imagens e adaptações de atividades de leitura. Com a impressora jato de tinta e a plastificadora, também disponibilizadas pelo projeto, as professoras imprimiam as atividades e pranchas de comunicação na própria sala de aula e plastificavam os pictogramas usados pelos alunos. Além dos equipamentos, os membros do grupo de pesquisa forneciam orientação em sala de aula para as professoras.

A equipe formada pelos pesquisadores, mestrandos e doutorandos, com formação nas áreas de Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional, Psicologia e Pedagogia,

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Todos os nomes são fictícios.

Figura 2. Claudia, professora de sala especial utilizando pranchas de CAA e recebendo orientação dos profissionais envolvidos no projeto.

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6 demonstrava para as professoras como planejar e empregar os recursos nas atividades lúdicas e pedagógicas em sala de aula. A disposição dos alunos em sala de aula, sentados em semicírculo, a disponibilização de pranchas e cadernos de comunicação, o incentivo para a conversa dos alunos com os colegas e a maior agilidade na troca de turnos da professora com cada aluno favoreceu, sobremaneira, a participação efetiva e a expressão de pensamentos e sentimentos por todos.

Na Figura 3, Samira, jovem com paralisia cerebral, expressa o desejo de que seu colega empurre sua cadeira de rodas na hora do lanche.

O levantamento do vocabulário funcional dos alunos permitiu a elaboração de pranchas personalizadas por meio das quais eles desempenhavam tarefas pedagógicas e estabeleciam diálogos com a professora, com as assistentes de pesquisa e com eles próprios. Essa situação somente foi possível com o auxílio da Comunicação Alternativa.

A formação dos participantes do projeto Acessibilidade comunicativa para alunos com deficiência: formação inicial de professores (Nunes, 2008)9, desenvolvido por Schirmer (2012), como sua tese de doutorado, foi fundamentada na Metodologia Problematizadora [Berbel, 1998; 1999]. Os objetivos gerais da formação foram: iniciar a preparação dos graduandos para interagir com alunos sem fala articulada e/ou fala funcional; desenvolver habilidades de coletar dados, estruturar um estudo de caso e

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FAPERJ proc. 26/111794/2008

Figura 3. Mensagem elaborada com imagens por Samira e dirigida a um colega de turma em escola especial

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7 elaborar um plano de intervenção especializada. A formação objetivou, também,

estimular parcerias entre o aluno da graduação, o aluno com deficiência, a família, os profissionais da escola e da Saúde na construção do planejamento e na resolução dos problemas. Os dados mostraram que houve modificações positivas nas atitudes e nas condutas dos graduandos ao interagir com os alunos especiais.

Abaixo seguem alguns exemplos de recursos elaborados pelos graduandos de Pedagogia.

A figura 4 mostra os alunos de graduação elaborando e utilizando recursos de Comunicação Alternativa e material pedagógico adaptado junto a alunos especiais no LATECA.

A seguir, apresentaremos alguns exemplos de recursos elaborados pelos alunos de Pedagogia.

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8 Na figura 5, as graduandas Aline e Jane conversam com Isabel, uma criança com paralisia cerebral, usando prancha de Comunicação Alternativa. No inicio do trabalho, eles vivenciaram a situação angustiante de interagir com uma aluna que apresentava grave comprometimento motor e sem comunicação sistemática, pois Isabel não tinha sequer as respostas de “sim” e “não” estabelecidas. Apesar de seus impedimentos, os graduandos identificaram em Isabel a habilidade de olhar para o que lhe interessava e pensaram que o estabelecimento de uma resposta afirmativa poderia ser um bom início para o estabelecimento de uma comunicação eficiente. Após o início do uso da prancha com “sim” e “não” perceberam que a aluna possuía uma boa compreensão da linguagem oral, e que poderiam ampliar o vocabulário da prancha introduzindo fotos e símbolos pictográficos. Elaboraram, então, uma prancha, utilizando a técnica da subdivisão, a qual permite que muitos símbolos e fotografias estejam à disposição do usuário ao mesmo tempo, mas apenas um número limitado deles seja apresentado por vez. Por exemplo, na prancha principal há um símbolo para sentimentos. Quando esse símbolo é indicado, uma página ou prancha com símbolos relativos a sentimentos é exibida.

Um aspecto importante da formação dos graduandos era que, no início do trabalho, eles apresentavam dificuldade em identificar as respostas dos alunos especiais. Com frequência os graduandos solicitavam que os alunos se expressassem, fazendo perguntas fechadas ou abertas, sem, contudo, esperar a resposta. Às vezes até respondiam por eles. Com o andamento do trabalho, os graduandos passaram a oferecer aos alunos mais oportunidades de manifestar opinião e fazer escolhas, apresentando modelos e pistas,

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9 fazendo varredura das opções de respostas gráficas e aguardando a expressão dos alunos especiais. Estes passaram a interagir com mais frequência com os graduandos, buscando-os para fazer solicitações, responder a perguntas e mediar relações com outro colega, professor ou familiar. Observou-se, igualmente, o crescimento no vocabulário contido nas pranchas de comunicação.

.

Na figura 6 vemos Túlio, 29 anos, com a graduanda Marina preparando o mural para apresentar à sua turma o jornal adaptado por ele com símbolos Picture

Communication System (PCS)10 e Rebus11. Quando os graduandos começaram a

acompanhá-lo, observaram que ele nunca estava inserido nas atividades pedagógicas, parecendo alheio à sala de aula. Segundo os alunos de Pedagogia, Túlio não apresentava retardo em seu desenvolvimento cognitivo e demonstra grande conhecimento e interesse cultural relacionado às artes, à música, à história e ao futebol. Possuía dificuldade em manter contato visual com quem se relacionava e sua fala era caracterizada pela repetição

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O Sistema PCS, criado nos Estados Unidos em 1981, é provavelmente o sistema mais utilizado no mundo atualmente. Ele envolve 3000 figuras altamente icônicas desenhadas de forma estilizada acompanhadas de vocábulo escrito, destinado a indivíduos cujas habilidades intelectuais não permitem o emprego de sistema abstrato e complexo. Além dos pictogramas, palavras funcionais como artigos e preposições são representadas na ortografia tradicional sem qualquer desenho [Nunes, 2003].

11 Sistema Rebus, criado em 1969 nos Estados Unidos, foi usado inicialmente para auxiliar a aprendizagem da leitura em alunos com problemas específicos de aprendizagem e, posteriormente, seu uso foi estendido para ser um meio de comunicação. Ele é composto por 950 sinais gráficos, dos quais a maioria são pictogramas e alguns são ideogramas. Os rébus simples representam uma palavra ou parte de uma palavra através de um pictograma. Os mais complexos combinam tais pictogramas com letras, números, notas musicais etc [Nunes, 2003].

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10 da fala do interlocutor ou de suas próprias palavras. O jovem, bastante interessado em rádio, televisão e jornais, acompanha-os diária e assiduamente. A partir desta constatação, os graduandos propuseram atividades de produção escrita com esse jovem, através do gênero textual jornalístico. Segundo a professora de sala de aula, em oportunidades anteriores, Túlio recusava-se a escrever. Segundo os graduandos, no dia em que seria feita a produção do jornal, o aluno mostrava ansiedade, mas ao mesmo tempo sabia o que desejava escrever, utilizando o computador com rapidez e facilidade. No início, necessitava de constante auxílio oral dos graduandos para, por exemplo, diferenciar letras maiúsculas e minúsculas, além do uso do teclado para a formatação do texto. Porém, ao longo do processo, o rapaz demonstrou aprender com facilidade. Um fator importante elencado por eles foi o resgate de sua autoestima através da valorização de seu potencial e da oportunidade de compartilhar sua produção com colegas, professores e familiares.

O Projeto Tecnologia Assistiva para a inclusão comunicativa de alunos com

deficiência: formação continuada de professores [Nunes, 2010]12 visou a

implementação e a avaliação de um programa de formação continuada de professores regulares e especiais que trabalhavam em sala de recursos multifuncional em escolas regulares e em um centro especializado.. Mais especificamente, esses professores foram ensinados a planejar, implementar e avaliar atividades pedagógicas e materiais didáticos adaptados para atender alunos do ensino fundamental que apresentassem severos comprometimentos em sua comunicação oral, como os alunos com paralisia cerebral, autismo e deficiência múltipla. Araujo (2012) e Netto (2012) redigiram suas dissertações de mestrado sob nossa orientação abordando este tema. Serão descritas,

abaixo, algumas atividades elaboradas e utilizadas em classe regular.

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A figura 7 mostra a professora Cláudia, da sala de recurso, junto com Duda, aluna incluída, em uma atividade destinada a sistematizar códigos para respostas utilizando cartões de sim e não. Dessa forma, a aluna poderia responder às perguntas fechadas elaboradas pela professora da sala de aula regular durante atividades acadêmicas, como está ilustrada com o mapa adaptado das regiões do Brasil. A professora expôs um mapa do Brasil de tamanho grande diante da turma para que todos pudessem acompanhar as explicações. Duda deveria montar o mapa de acordo com a legenda das regiões brasileiras, apresentada pela professora e algumas colegas da turma se ofereceram para ajudá-la. Assim, instruída pela professora, uma colega lhe apresentava e nomeava duas figuras de regiões do país e Duda era solicitada a olhar para a figura correta. Após a resposta, a colega apontava sucessivamente (varredura) para as várias regiões no mapa vasado e Duda indicava o local correto para colar a figura da região nomeada. Na segunda atividade, os alunos deveriam pintar o mapa utilizando como referência a legenda existente abaixo do exercício. Para que Duda realizasse a atividade, a colega mediadora apresentava as alternativas das cores e através da varredura, a resposta correta era fornecida. Duda, que em geral se mantinha pouco atenta e distante das colegas, se manteve concentrada, interagindo com interesse junto às mediadoras e à professora.

Figura 7. Duda, aluna incluída na sala regular, e a professora Cláudia utilizando cartões de comunicação alternativa. Ao lado, mapa adaptado.

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A figura 8 retrata uma atividade de narrativa e construção de texto a partir de uma fotografia significativa escolhida previamente pelos alunos. Foi realizado o levantamento do vocabulário pela professora de turma comum e a professora da sala de recurso confeccionou o material adaptado. A prancha continha cartões de cartolina plastificada com os pictogramas impressos, uma base de apoio feita de papel cartão plastificada com velcro autoadesivo onde os cartões eram ordenados. Isabel identificava os que estavam de acordo com a história e os colocava em ordem cronológica. Essa atividade permitiu que a aluna sem fala articulada pudesse realizar a mesma atividade de elaboração de textos que seus colegas de turma.

Na Figura 9 é possível observar o Painel Galeria dos Nomes, contendo o nome e/ou fotografias das crianças com autismo e profissionais, que estariam presentes no centro de ensino especializado naquele dia. O painel tinha o objetivo de auxiliar os alunos a

Figura 8. Cartões pictográficos referentes à atividade de narrativa trabalhada pela professora em sala de aula regular com Isabel, aluna incluída.

Figura 9. Atividades acadêmicas utilizando pictogramas e imagens em painéis de atividades e de comunicação.

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13 prever quem estaria no ambiente. Os cartões com pictogramas, construídos por Márcia Netto, após discussão e planejamento com os profissionais desse centro, favoreceram a comunicação e a autorregulação da aluna Mirtes.

As fotos da figura 10 mostram uma adaptação pedagógica formalizada, realizada durante uma experiência de bidocência (dois professores de ensino especializado). Uma das professoras dinamiza a atividade de leitura e interpretação do livro de história “Vida Marinha”, enquanto a outra usa cartões pictográficos como apoio na realização da atividade com a aluna Maria.

O projeto intitulado Quero conversar com você: Comunicação Alternativa para

alunos com autismo no contexto escolar [Walter, 2011]13 teve como objetivo promover

a aplicação e a avaliação de um programa de comunicação alternativa, baseado no sistema PECS-Adaptado [Walter, 2000]14, proposto para alunos com autismo incluídos no ensino regular no município do Rio de Janeiro. O projeto foi realizado em duas etapas, sendo a primeira destinada a capacitar 35 professores da rede regular de ensino do município do Rio de Janeiro que atuam em salas de recursos ou salas de Atendimento Educacional Especializado (AEE). Após a capacitação dos professores, foi possível verificar, pelos relatos dos mesmos, que havia necessidade de se utilizar o

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14 PECS-Adaptado é um sistema de comunicação alternativa que promove a comunicação alternativa por intercâmbio de figuras destinado a pessoas com autismo. Este sistema consiste numa adaptação do PECS [Picture Exchange Communication System – Bondy e Frost, 1994] ao contexto brasileiro e possui flexibilidade para os diferentes contextos: escolar, familiar e especializado.

Figura 10. Os professores do centro de ensino especializado utilizando a Comunicação Alternativa e recursos visuais em atividades conjuntas.

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14 PECS-Adaptado com os alunos que não apresentam fala funcional e que o professor do AEE deveria ficar responsável pela coordenação e aplicação do programa nas escolas regulares. Na segunda etapa do projeto foi possível aplicar o programa de comunicação alternativa em quatro alunos com autismo, sendo dois em sala de aula regular e outros dois em salas de AEE.

As imagens, a seguir, revelam que os alunos aprenderam a se comunicar pelo intercâmbio de figuras, solicitando itens de interesse para as professoras durante atividades preparadas em sala de aula e na sala de recurso.

Na figura 11, a professora Joana, com a mão estendida, aguarda a entrega da figura com a imagem de “jogo” pelo aluno Hugo, expressando seu desejo de obter uma peça do seu jogo favorito. Esta etapa do programa de comunicação alternativa corresponde à Fase 1 do PECS-Adaptado e estava sendo realizada em sala de aula regular, onde futuramente, o aluno deverá solicitar seus itens desejados à professora regente da turma e aos colegas.

Figura 11. Joana, professora do AEE ensinando a Fase 1 do PECS-Adaptado a Hugo, aluno com autismo, incluído em sala regular.

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15 Na figura 12, o aluno Hugo solicita um biscoito à Tania, uma estagiária do ensino regular, no refeitório junto a outros alunos, quando a professora do AEE não estava presente. Este evento atesta a generalização do uso dos cartões por Hugo em novos contextos e com outros interlocutores.

O programa de Comunicação Alternativa também foi aplicado pelas professoras de AEE em salas de recursos multifuncionais, onde o aluno foi ensinado a pedir seus itens de interesse à professora durante as atividades específicas, como revela a figura 13.

Figura 12. Hugo solicita um biscoito por meio do PECS-Adaptado a estagiaria da escola regular.

Figura 13. José, aluno com autismo, aprendendo a fase 1 do PECS-Adaptado em sala de AEE

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16 O uso dos recursos de comunicação alternativa no contexto regular de ensino possibilitou, em diversas situações e contextos, condições de comunicação mais eficaz e maior clareza na compreensão dos alunos, por meio da troca de figuras pelos itens desejados.

Discussão

A pesquisa em sala de aula

Conduzir pesquisas em escolas tem se constituído em grande desafio para o professor/pesquisador universitário. Nos estudos acima descritos, os esforços para introduzir inovações tecnológicas como os recursos de Comunicação Alternativa, de baixa, média ou de alta tecnologia, sempre envolveram confrontos entre pesquisadores e docentes de sala de aula. Costuma-se dizer, de forma apressada, que tais embates refletem a velha dicotomia teoria versus prática. Contudo, Zeichner (1998) nos ensina que tal fato reflete o dissenso entre as teorias implícitas do professor e as teorias mais ou menos explicitas do pesquisador. É, com efeito, um embate entre ideias, concepções. As teorias cristalizadas implicitamente são, de fato, um grande nó para práticas inovadoras no campo educacional. Uma grande dificuldade é a couraça com a qual se revestem professores e pesquisadores. O professor é aquele que tem que dominar o conhecimento do processo, do aluno, sendo desnecessário aprender algo mais. A receptividade à ideia de mudança precisa fazer parte das crenças daqueles que se envolvem em uma investigação. Zeichner (1998) alerta para preconceitos muito difundidos de que o corpo docente das escolas é pouco receptivo e não quer pensar e agir segundo novas alternativas; e de que alguns professores, como também, alguns acadêmicos, não estão interessados no desafio de mudar seus modos usuais de agir no mundo.

Ao abordar essa separação entre teoria e prática docente, é preciso, sob uma perspectiva dialética, compreender que

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...as elaborações teóricas são processadas em função de “tensionar” a prática e, por sua vez, é na prática que essas elaborações são checadas. Segundo o princípio epistemológico da práxis, nesse processo de confronto, as elaborações teóricas são questionadas também pela prática, dinamizam-se no sentido de exigir novas elaborações, não para se aproximar da prática, buscando sua função, mas para buscar novas formas de “tensionar” a ação num processo histórico permanente [Gamboa, 2003, p. 127].

Conduzir pesquisa numa sala de aula demanda a construção de uma cumplicidade entre pesquisadores e professores. Nesse sentido, considera-se que o planejamento de momentos de troca, de estudo e de reflexão conjunta sejam essenciais para que as partes envolvidas se percebam como sujeitos de uma pesquisa colaborativa de fato [Nunes e Danelon, 2008].

A Comunicação Alternativa na escola

A introdução da Comunicação Alternativa em sala de aula ou em qualquer outro ambiente da pessoa sem fala articulada, como aquelas com paralisia cerebral, autismo e deficiência intelectual severa levam-nos a refletir sobre em que consiste de fato a comunicação humana. Se concebermos a comunicação como um processo contínuo no qual interlocutores mutuamente corregulam seus comportamentos, isto é, alteram suas ações em função das ações atuais e antecipadas do outro, possibilitando a criação conjunta de sentido [Fogel, 1993], é essencial destacar a presença do outro. Em última análise, nos comunicamos para afetar o pensamento, o sentimento do nosso interlocutor e deste modo negociarmos o sentido de nosso ato comunicativo. Assim, para que a pessoa desprovida de fala se comunique, não basta a disponibilização de recursos de Comunicação Alternativa, como pranchas e cadernos de comunicação, comunicadores portáteis, computadores e softwares especiais. Tão ou mais importante do que isso é a presença do interlocutor interessado e preparado para acolher e responder às mensagens da pessoa não falante e que respeite e utilize ele próprio essas modalidades alternativas de comunicação.

Nesses tempos em que o termo acessibilidade encontra-se presente nos discursos da Educação, da Reabilitação e da Tecnologia de Informação, é preciso destacar o significado da expressão acessibilidade comunicativa. Para von Tetzchner e Grove (2003) esta expressão significa que

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18 there are people who understand the alternative communication form, who can scaffold it in the acquisition period, and who are able and willing to communicate in a manner that gives the

individual maximal communicative autonomy ( p.27)15

Assim, são fundamentais o conhecimento, a aceitação e o incentivo ao emprego de formas alternativas de comunicação, inclusive pelos próprios interlocutores e potenciais interlocutores, membros dos grupos sociais dos quais o individuo sem fala faz parte. Os contextos inclusivos, segundo Soto e von Tetzchner (2003), favorecem,

sobremaneira, a interação entre alunos usuários de Comunicação Alternativa e seus pares falantes. Por esta razão é que nas salas de aula, sejam de escolas regulares ou mesmo especiais, devem estar disponibilizados esses recursos de Comunicação Alternativa para que todos, professores e alunos, oralizados ou não, possam se comunicar efetivamente.

A disponibilidade do professor para favorecer a comunicação em sala de aula, envolve, contudo, mais do que o desejo de acolher as mensagens dos alunos e tornar acessíveis os recursos de Comunicação Alternativa. Na escola, torna-se essencial o planejamento das atividades e dos materiais pedagógicos adaptados e das pranchas de comunicação. Para implementar com sucesso programas instrucionais junto a alunos especiais sem fala, o professor precisa ter clareza do plano pedagógico e preparar seu plano de aula elaborando previamente todos os materiais e recursos necessários para um bom ensino a cada dia.

Para concluir, fazemos nossas as palavras de Pelosi (2006): A escola tem muitos papeis, mas o principal deles é ensinar. A escola não pode se tornar, apenas, espaço de convivência social ou espaço para fazer amizades. A escola tem de ensinar a todos e não apenas acolhê-los ( p. 131)

Referências

15 Há pessoas que entendem as formas alternativas de comunicação, que oferecem suporte para elas no período de aquisição (de linguagem da criança) e que se mostram capazes e desejosos de comunicar de uma maneira que dá ao individuo a máxima autonomia comunicativa .

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19 Araújo, C. A G. (2012). O ensino colaborativo favorecendo a inclusão de alunos com deficiência física e transtorno global do desenvolvimento nas escolas municipais do Rio de Janeiro. Dissertação de mestrado defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro.

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Referências

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