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A relação entre a Gaudium et spes e a Evangelii gaudium: um estudo na perspectiva da conversão pastoral

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Academic year: 2021

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A relação entre a Gaudium et spes e a Evangelii gaudium:

um estudo na perspectiva da conversão pastoral

Raquel Maria de Paola Colletto1

Resumo

Este artigo volta-se ao atual contexto vivencial da Igreja, que sente grande dificuldade de transmitir a fé às novas gerações. Nos documentos do Concílio Vaticano II, encontra-se subjacente a necessidade de uma evangelização que conduza a um renovado empenho missionário. Esse processo está presente em toda trajetória pós-conciliar até os dias de hoje. O Papa Francisco, na exortação apostólica Evangelii Gaudium, convida todos os cristãos para uma nova etapa evangelizadora marcada pela alegria emanada da Boa-Nova de Jesus Cristo. Nesse sentido, se faz urgente imprimir à Igreja uma verdadeira conversão pastoral, a fim de tornar a experiência eclesial mais autêntica em prol da missão evangelizadora. Analisa-se como a relação de um documento de ontem (Gaudium et

Spes) com um documento de hoje (Evangelii Gaudium) pode orientar a transmissão da fé cristã no mundo

contemporâneo. Sugerem-se caminhos para a Igreja continuar transmitindo com alegria o Evangelho na perspectiva do Concílio Vaticano II.

Palavras-chave: Conversão pastoral. Evangelii Gaudium. Gaudium et Spes.

1 INTRODUÇÃO

A Igreja, em nossos dias, experimenta grande dificuldade em transmitir a fé às novas gerações. Não se trata de um problema novo, visto que já era sentido entre os participantes do Concílio Vaticano II. Nesse sentido, o Sínodo de 2012 teve por tema A nova evangelização

para a transmissão da fé cristã.

A abordagem do estudo é feita através de três etapas. A primeira etapa estuda a constituição pastoral Gaudium et Spes, a segunda aborda a exortação apostólica Evangelii

Gaudium, mantendo dentro do possível, as mesmas propostas de análise aplicadas à Gaudium et Spes. Na terceira, analisa-se, através dos documentos, como a Igreja de ontem relacionada a

de hoje enfrenta os desafios da nova evangelização no concernente à conversão pastoral, ensejando caminhos que deve percorrer para continuar a transmitir com alegria o Evangelho na perspectiva do Concílio Vaticano II. Conclui-se com algumas propostas à Igreja diante dos atuais cenários, para chegar ao homem contemporâneo.

2 A CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES

Numa visão panorâmica, a Gaudium et Spes é um documento original,porque, entre outras características, é o primeiro documento no qual o Magistério se debruça sobre os

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aspectos diretamente pastorais da vida cristã. O método de proceder do documento é novo, apoiando-se numa descrição humana do mundo de hoje.

Diante do cenário do mundo atual, cabe à Igreja tomar consciência da dimensão da evolução e do impacto que promovem na coletividade. Trata-se da Igreja – que perscruta os sinais dos tempos – que se interessa pelo homem mais do que o próprio homem e que existe unicamente para sua salvação. Sua fenomenologia está voltada a uma Antropologia que é inspirada por uma visão do homem em Jesus Cristo, o homem novo.

A Teologia anterior à Gaudium et Spes era dualista, a constituição abandonou essa postura para afirmar que Deus e o mundo são obras de Deus. O Concílio inicia uma teologia pastoral, que não é simples aplicação do dogma à prática; ao contrário, vê o âmbito pastoral como constitutivo da própria Teologia, como ponto de partida e de chegada.2

A Igreja passa de uma perspectiva estática e metafísica para uma mais histórica e dinâmica (GS 5). Ocorre, assim, uma predisposição à valorização das realidades do mundo, o mundo é visto como lugar da Revelação, da presença e ação de Deus. E nesse lugar está a comunidade crente, a Igreja, vivendo sua fidelidade a Deus na construção do seu Reino.

2.1 A RECEPÇÃO DA GAUDIUM ET SPES

Terminado o concílio, começou a luta por sua interpretação, em busca da síntese que ele não conseguiu fazer. A Gaudium et Spes inaugurou um caminho a ser percorrido e uma postura inédita com relação ao mundo, isto é, uma verdadeira transposição da totalidade da existência cristã em categorias teológicas novas.

Seguindo as linhas-mestras da Cristologia, presentes no Concílio Vaticano II, a teologia latino-americana aproximará a ideia de salvação do movimento de libertação das populações dominadas e fundamentará sua ação em favor dessa libertação dos pobres segundo a prática de Jesus e sua pregação voltada ao Reino. Nesse sentido, a opção dos pobres já está implícita no concílio, sobretudo na Gaudium et Spes e destacada nas Conferências Gerais do Episcopado Latino-Americano em: Medellín (1968), Puebla (1979), Santo Domingo (1992) e Aparecida (2007). Essa última, convocou todos os batizados à conversão, para se tornarem discípulos-missionários de Cristo, num grande esforço de evangelização e de promoção humana integral. Destaca-se que o documento de Aparecida indica a necessidade de ver os pobres como “sujeitos de sua própria libertação” (DA 21).

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3 EXORTAÇÃO APOSTÓLICA EVANGELII GAUDIUM

No dia 24 de novembro de 2013, o Papa Francisco promulgou a exortação apostólica

Evangelii Gaudium, sobre a nova evangelização. Tratava-se da devolução à comunidade

eclesial das reflexões feitas no final de 2012, no Sínodo dos Bispos, convocado e realizado ainda sob o pontificado do Papa Bento XVI. Nesse sínodo, alguns assuntos receberam nova acentuação, dentre eles, a conversão pastoral segundo o espírito de Aparecida e o papel a ser desempenhado pelos teólogos na nova evangelização.

O texto ora em comento compreende cinco capítulos e uma introdução.Na parte introdutória, o Papa denuncia a tendência de isolamento que a sociedade atual proporciona ao homem. Ela convida os católicos a uma renovada experiência de encontro com Cristo. O capítulo 1, intitulado : A transformação missionária da Igreja, entra em “cheio” no tema conversão pastoral, que no fundo, é a busca da Igreja para viver a fidelidade à própria vocação.No capítulo 2, foi abordado o tema crise do compromisso comunitário. Nele, o Papa denuncia a idolatria do capital que tende a subverter a ordem natural das coisas, se colocando no centro em vez de estar a serviço da pessoa humana e da justiça entre os povos.O capítulo 3, intitula-se O anúncio do Evangelho volta-se à Igreja que se apresenta como totalidade dos Batizados, e todos são chamados, a partir de seu carisma, a evangelizar tendo no querigma seu alicerce. No capítulo 4, A dimensão social da evangelização, mergulha fundo na questão social, afirmando que: “cada cristão e cada comunidade são chamados a ser instrumentos de Deus ao serviço da libertação e promoção dos pobres” (EG 187). O capítulo 5, aborda a espiritualidade dos evangelizadores.

No que tange à sua forma, destaca-se que a Evangelii Gaudium está embebida em um ponto extremamente relevante da sua ‘substância’ comunicativa: a tensão entre encontro, diálogo e anúncio. Segundo o Papa Francisco, “em qualquer forma de evangelização, o primado é sempre de Deus” (EG 12). E Deus é sempre o outro, que nos surpreende, que se manifesta pela “liberdade incontrolável da Palavra” (EG 22). O anúncio do Evangelho se faz no encontro com os diversos outros. Daí a necessidade de uma Igreja “em saída”, que vá ao encontro dos “outros” porque “ninguém se salva sozinho” (EG 113).

Num estilo evangelizador, a Evangelii Gaudium mostra como o anúncio consiste na partilha de uma alegria e na indicação de um horizonte (EG 14; 11). Francisco optou pelo método de Jesus que falava em parábolas e dava sinais do Reino. O grande cerne de inspiração papal apresentada constantemente na exortação é que a Igreja faça a experiência do “Ide, pois, fazer discípulos...” (Mt 28, 19-20). Urge que nos mantenhamos em “estado

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permanente de missão”(EG 25). A Igreja peregrina, como instituição humana e terrena, “necessita permanentemente de reforma”(EG 26), caso contrário cairá numa “espécie de introversão eclesial” (EG 27).

3.1 A RECEPÇÃO DA EVANGELII GAUDIUM

O desempenho do Papa mostra uma revitalização eclesial, dando sinais à Igreja de sua necessidade de enxergar e atuar na concretude do ser humano contemporâneo. Com seu testemunho e pregação foi preparando todos os crentes a se desinstalarem, indicando o caminho da conversão pastoral. Em discurso proferido pelo Papa Francisco num encontro com o Comitê de Coordenação do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), abordou os inúmeros desafios do missionarismo discipular, limitando-se a assinalar dois: renovação interna da Igreja e diálogo com o mundo atual. Afirmou que essa renovação envolve atitudes: “A conversão pastoral diz respeito, principalmente, às atitudes e a uma reforma de vida”.3

No Brasil, a expressão da atividade missionária está presente nos documentos da CNBB:

Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora (2011-2015), aprovado na 49ª Assembléia dos

Bispos e no documento Comunidade de Comunidades: uma nova paróquia. A conversão

pastoral da paróquia (2014), gerado na 52ª Conferência Nacional dos Bispos. Esse último

documento volta-se à atual paróquia necessitada de conversão pastoral, que é muito mais que um planejamento técnico, é a exigência de mudança de mentalidade. O caminho latino-americano de multiplicação de pequenas comunidades na grande paróquia, tem resultado interessante para renovar a vida cristã de muitos paroquianos.4

4 A ALEGRIA DE TRANSMITIR A FÉ NO MUNDO

CONTEMPORÂNEO

A origem de todo o projeto da nova evangelização encontra-se no Concílio Vaticano II, e na sua vontade de responder às transformações e lacerações que o mundo conhecia naquele período. A Igreja desde o pós-concílio procura se capacitar em viver de modo renovado a própria experiência comunitária de fé e de anúncio, num contexto de novas situações culturais que despontam nestes últimos decênios. Comparando os desafios enfrentados pela Igreja

ontem e hoje, tenta-se evidenciar se há similitude, ou não entre a Gaudium et Spes e a Evangelii Gaudium, ressaltando a atualidade social nos dois documentos estudados.

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FRANCISCO. Palavras do Papa Francisco no Brasil, p.135.

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se caminhos nos quais a ação eclesial deve anunciar com alegria o Evangelho, na perspectiva do Concílio Vaticano II.

No caminho de uma constante conversão, o Concílio olhou o mundo para responder às “alegrias e esperanças, às tristezas e angústias do ser humano de hoje” (GS 1). Quem se abre ao outro e quem olha para o outro, se abre à conversão. Esta é a atitude que o Papa Francisco tanto propõe à Igreja da atualidade para avançar no caminho da conversão pastoral e missionária (EG 2).

No caminho que leva aos excluídos, A Igreja dos pobres, sonho do Papa João XXIII (GS1) e que a Evangelii Gaudium afirma: “Somos chamados a descobrir Cristo neles” (EG 198).

No caminho da igualdade na adversidade, a Igreja é uma resposta eficaz à urgência de um mundo inclusivo, onde caibam todos. Assuntos que merecem tomadas de decisão com base nos direitos humanos da Igreja, como a posição da mulher na Igreja eram realidades que há 50 anos apenas se deixavam vislumbrar, daí sua ausência na Gaudium et Spes. Hoje, se tornam urgentes, não podem ser tratados com superficialidade (EG 103).

No caminho da questão ecológica, na década de 60 (século XX), também não era assunto tão preocupante quanto em nossos dias, razão de não vir à tona no concílio. Mas no documento do Papa Francisco passa a ser considerado imprescindível a reflexão sobre a responsabilidade da Igreja no meio ambiente (EG 56).

Muitos outros desafios encontram-se presente tanto ontem como hoje: o caminho de

formação dos leigos (GS 43; EG 102); o caminho que leva ao ecumenismo e ao diálogo inter-religioso (GS 92; EG 181); o caminho do diálogo e da valorização nas diversas tradições culturais (GS 91-92; EG 68-75); o caminho dos novos contextos, (GS 22; EG 55); o caminho que leva ao desenvolvimento científico (GS 36; EG 242); o caminho da paz (GS 78; EG

238-241).

No caminho de seguimento a Jesus, pode parecer um contrassenso propor o caminho de Jesus, quando todos os itens anteriores já o fizeram, mas o que se está propondo é a recuperação do encanto e da alegria que há em anunciar o Evangelho, o ardor e a audácia do mandato missionário, a profecia dos primeiros seguidores, tornando as estruturas humanas impregnadas do Reino de Deus.5

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CONCLUSÃO

Pode-se dizer, que o Papa Francisco retomou os fios da constituição Gaudium et Spes (1965) do Vaticano II em sua exortação Evangelii Gaudium (2013). Tanto o Papa João XXIII quanto o atual papa, seguindo o caminho do concílio, creem na possibilidade de haver “conversão eclesial” e na necessidade de uma “reforma perene” da Igreja (EG 26).

Nesse sentido, elencam-se algumas propostas a serem aplicadas ao processo que a Igreja desenvolve através da nova evangelização, voltada aos nossos contemporâneos. Primeiramente, aprender a ouvi-los mais, a escuta propicia conhecer seus problemas, sua linguagem, seus anseios, suas alegrias e seus sofrimentos. O diálogo fluiria melhor, a Igreja teria menos visibilidade em suas figuras hierárquicas e se faria presente na vida e na ação de seus membros. Na renovação das paróquias, uma rede de comunidades menores pode propiciar um clima de maior partilha e comunhão, semelhante às primeiras comunidades. A Igreja deveria enfatizar a formação de uma consciência social. É sabido que o que alimenta a credibilidade da Igreja, é sua preocupação e atividade em favor dos pobres, dos últimos da sociedade, à semelhança de Jesus Cristo. A Igreja precisa também se apresentar como uma

educadora da liberdade e como espaço cristão para o exercício cristão da mesma.

Trata-se de uma Igreja que testemunha e experimenta sua fé em Cristo. Uma fé onde o relacional é decisivo, onde a caridade fraterna constitui sua verdade e seu núcleo (cf. 1 Jo 4,7). Uma Igreja para a qual, a atual sociedade não significa apenas desafio, mas também

oportunidade de se submeter a um exame crítico, seja em suas estruturas, seja na pastoral

tradicional. Ademais, as comunidades cristãs, através de seus testemunhos pessoal e

comunitário devem espelhar unicamente a caridade.Para tanto, a maior de todas as exigências

é a verdadeira conversão de cada um. Oxalá, se possa corresponder ao que o Espírito Santo espera de cada um de nós! Que Ele venha “renovar, sacudir, impelir a Igreja numa decidida saída de si mesma a fim de evangelizar todos os povos” (EG 261).

REFERÊNCIAS

BRUSTOLIN, Leomar Antônio. La conversión pastoral de La parroquia. La renovación parroquial en América Latina. Rivista Lateranum, Roma: Lateran University Press, n. LXXX, p. 9-26, jan. 2014. CARO, Olga Consuelo Vélez. A 50 anos do Vaticano II: luzes e desafios. Revista Eclesiástica

Brasileira, Petrópolis: Vozes, n. 283, p.619-627, jul. 2011.

CODINA, Victor. O Vaticano II: um concílio em processo de recepção. Perspectiva Teológica, Belo Horizonte, n. 37, p. 89-104, 2005.

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CONCÍLIO VATICANO II. Constituição pastoral Gaudium et Spes. In: KLOPPENBURG, Boaventura; VIER, Frederico. Compêndio do Vaticano II: constituições, decretos, declarações. Petrópolis: Vozes, 2000.

FRANCISCO. Palavras do Papa Francisco no Brasil. São Paulo: Paulinas, 2013.

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