• Nenhum resultado encontrado

Memorial acadêmico

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Memorial acadêmico"

Copied!
105
0
0

Texto

(1)

CRISTINA MARIA ROSA

P

ED

A

G

O

G

A

,

P

R

OF

ES

SO

R

A, DO

U

TO

RA

EM

E

DU

CA

Ç

ÃO:

19

9

0 –

2

0

20.

(2)

Texto inicial Currículo Lattes Cristina Maria Rosa

Pedagoga, Mestre, Doutora e Pós-Doutora em Educação, sua obra mais importante é Onde está Meu ABC, de Erico Verissimo? Notas sobre um

livro desaparecido, resultado de pesquisa no Estágio Pós-Doutoral e

publicado em 2013. Docente na Faculdade de Educação desde 1993, atualmente desenvolve a pesquisa Alfabetização Literária de Bebês: acalantos, cantigas, poesia, gibis e narrativas literárias, a partir da qual elaborou o conceito Alfabetização Literária. Coordena o GELL – Grupo de Estudos em Leitura Literária – que promove estudos, pesquisas, visitas guiadas, saraus, cursos de curta duração e de aperfeiçoamento no campo da leitura literária, lidera o Grupo de Pesquisa Escritas, Leitores e História da Leitura (CNPq 11/2009), integra o grupo de pesquisa Hispano-Brasileiro sobre Maus-tratos Emocionais, coordenado pela Drª. Jane Felipe (UFRGS) e Drª. Carmen Galet (Universidad de Estremadura), coordena a SLEV – Sala de Leitura Erico Verissimo – e o Projeto de Extensão Leitura literária na Escola. O foco de seu trabalho é formação de professores na Licenciatura em Pedagogia e Física. Eventualmente, realiza trabalhos na Especialização em Educação e na Especialização em Docência na Educação Infantil (UFRGS/MEC). Desde março de 2018, atua como docente na UNAPI – Universidade Aberta a Pessoas Idosas, um Projeto estratégico da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da UFPel. É autora dos infantis De arqueologias e de avôs (2005); Luíza (2007) e Cobras no

Laranjal (2009), além de e-books como Irmãzinha de Estimação (2014), Listas incríveis, malucas e inventadas de A a Zebra (2014), Quintal ao Lado

(2016) e Íris e a beterraba (2019). Publicou Um alfabeto à parte:

biobibliografia de Pedro Rubens de Freitas Wayne (2009) e organizou as

obras Alfabetização e Cidadania: o inverso do espelho na educação de

jovens e adultos (2002); Jovens e Adultos na Escola: Aprendendo a ler o mundo e a palavra (2005); Leituras: Clássicos e Modernos (2006); Educação Inclusiva: Textos e Glossário (2006); Das Leituras ao Letramento Literário (2009); Escritas, Leitores e História da Leitura (2012) e A Velha, a

Mosca e a Narrativa (2013). Integra a Academia Pelotense de Letras desde 29/08/2014. Desde 01/08/2016 é tutora do Grupo PET/Educação.

Endereço para acessar este CV: ttp://lattes.cnpq.br/9237082032521185 ID Lattes: 9237082032521185

(3)

Memorial Acadêmico

Cristina Maria Rosa

Memorial Acadêmico elaborado por

Cristina Maria Rosa – docente lotada no Departamento de Ensino da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Pelotas como parte dos atributos e condição para obtenção do título de

Professora Titular na Carreira do

Magistério Superior.

Pelotas, Rio Grande do Sul. Fevereiro de 2020.

(4)

“Na maior parte das vezes, lembrar não é reviver, mas refazer, reconstruir, repensar, com imagens e ideias de hoje, as experiências do passado. A memória não é sonho, é trabalho. Se assim é, deve-se duvidar da sobrevivência do passado, "tal como foi", e que se daria no inconsciente de cada sujeito. A lembrança é uma imagem construída pelos materiais que estão, agora, à nossa disposição, no conjunto de representações que povoam nossa consciência atual” (Ecléa Bosi, 1979).

“Sempre me atormentou o fato de que a verdade não se sustenta num só coração, num só espírito. Que ela é de algum modo fragmentada, múltipla, diversa e dispersa pelo mundo. Há em Dostoiévski a ideia de que a humanidade sabe muito mais sobre si mesma do que aquilo que consegue fixar na literatura. Vivemos mais rápido do que antes. O conteúdo rompe a forma. Ele a quebra e a modifica. Tudo extravasa as margens: a música, a pintura e, no documento, a palavra escapa aos limites do documento. Não há fronteiras entre o fato e a ficção, um transborda sobre o outros. Mesmo a testemunha não é imparcial. Ao narrar, o homem cria, luta com o tempo assim como o escultor com o mármore. Ele é um ator e um criador” (Svetlana Aleksiévitch, 2016).

(5)

Sumário

1. Apresentação. 2. Memoriando: a rota e a herança intelectual. 3. Tempo de me tornar a que sou... 4. O ensino, a pesquisa e a extensão.

4.1 O Ensino. 4.2 A Pesquisa. 4.3 A Extensão. 5. Descobertas ou processos de produção de conhecimento.

6. Alfabetização Literária: o fio condutor... 7. Referências: quem li e admiro.

(6)

Apresentação Cristina Maria Rosa

“(...) o passado não é o antecedente do presente, é sua fonte” (Ecléa Bosi, 1979).

Um memorial é mais que um relato de minha vida como docente na Universidade Federal de Pelotas, de 1993 até este início de 2020. Um memorial é, ao mesmo tempo, um olhar para o passado que sempre me parece recente, um presente inapreensível e um futuro inexistente. A maturidade, no entanto, exige que eu olhe para o que já foi e o que virá em igual medida, sabendo que esses dois tempos – o passado e o futuro – não existem. O primeiro inexiste como possibilidade real de intervenção. E o futuro só existe como desejo.

Debruço-me, no entanto, sobre o passado – as memórias que dele preservo – e ouso alinhavar o futuro, incerto e tão instável quanto a verdade, “fragmentada, múltipla, diversa e dispersa pelo mundo” (Svetlana Aleksiévitch, 2016).

Meu passado, aqui recortado e verticalmente marcado por momentos decisivos – o ingresso na Licenciatura em Pedagogia na UFSM (1986), a seleção para Professora

(7)

Auxiliar na Faculdade de Educação da UFPel (1992) e o aprimoramento da formação em diferenciadas relações de saber – Mestrado (1995), Doutorado (1998) e Pós-Doutorado (2010) além dos embates científicos oportunizados especialmente pela pesquisa, extensão e o ensino na graduação, “não foi fruto do acaso ou de oportunidade eventual” (SOARES, 1991). Foi, sim, a sucessão de escolhas calcadas na relevância que a educação – a minha e a dos que de mim dependem – teve e tem em minha trajetória. Repleta de salas de aulas nas quais conheci, desde bem pequena, professores de todos os tipos, minha formação e o exercício da docência foi, com certeza, maior e melhor do que inicialmente prometia. Ao ingressar na UFPel após um concurso disputado em que havia uma só vaga e muitos interessados nela, passei a exercer, diante de meus alunos – a maioria mulheres –, o fascínio que sempre tive pela leitura.

Eu não sabia que elas não liam... Eu lia, e parecia que tudo estava bem.

Nesse exercício constante de ouvir o outro e pedir licença para falar que é a docência, inventei um dos modos de viver as “regras do jogo” na Universidade – instituição social fundada na capacidade intelectual e na qualidade acadêmica e científica de seus membros. Conheci como se organiza e se

(8)

estrutura a autonomia e a autorregulação administrativa e acadêmica de uma das IFES brasileiras e sempre soube, desde o primeiro dia, que queria, sim, aderir aos valores acadêmicos, submeter-me a avaliações, obter progresso científico e intelectual, ou seja, fortalecer a instituição pela minha qualificação.

Nesse momento de avaliação, impossível não olhar para trás. Chave para a compreensão do meu passado e possível futuro, escrever memórias e circunstanciá-las é mais um passo no caminho da deliberação, não do acaso. Do planejamento, não da eventualidade. Dos critérios de escolha, não do espontâneo.

Para Magda Soares, que redigiu o seu Memorial em 1981 com o mesmo intuito – prova de concurso para o cargo de professor titular – o gênero memórias “obriga o professor universitário a ultrapassar o que fez, em sua vida acadêmica, para determinar por que fez, para que fez e como fez; ou seja: além da enumeração, que está em seu curriculum vitae, a análise, a crítica, a justificativa” (SOARES, 1990, p. 25).

Serei capaz? Arrisco.

(9)

Foi o livro de Maurice Tardif – Saberes docentes e

formação profissional (2002) – o escolhido para atuar como um

maestro na estrutura das primeiras memórias e na revelação dos saberes que me conformaram e que, ainda hoje, significam. Ao demonstrar que “o saber literário compõe o conjunto de saberes docentes ligados ao trabalho cotidiano em sala de aula, mesmo quando esse trabalho não está diretamente ligado ao ensino de língua e literatura”, Graça Paulino em Saberes literários como saberes docentes (2004), extrapolou as formulações do filósofo e sociólogo canadense e, por isso, escolhi também evidenciar, em minha formação e trabalho desenvolvido, essa herança intelectual potente.

A partir de uma “visita ao passado” com os “materiais que estão, agora, a minha disposição” – Ecléa Bosi em

Memória e Sociedade: lembranças de velhos (1979) –, ousei

elencar os saberes adquiridos, as fontes sociais nas quais os fruí e os modos de integração destes a meu modo de ser professora. Essa a composição de Memoriando, a primeira parte de meu Memorial Acadêmico.

O segundo passo foi observar, com olhos de hoje, o modo como produzi ciência nos primeiros anos de minha vida docente: escrevi dissertação e tese, projetei intervenções e as desenvolvi, orientei estudantes na pesquisa e publiquei. Foi o

(10)

tempo de me tornar a que sou: mais criteriosa e mais sábia, mais humilde e mais capaz. É nesse momento, no Memorial, que realizo uma “seleção de fatos e ideias do passado em função de seus efeitos no presente” (SOARES, 1990, p. 41). A pergunta que busco responder é: Como era a professora que fui e o que dela ainda há hoje, na minha sala de aula?

No terceiro momento da escrita busquei elencar, na estrutura acadêmica, os desafios que, ao ensinar, aprendi a responder, ora pesquisando, ora experenciando. Organizado em três tópicos – o Ensino, a Pesquisa e a Extensão – considerei cada ação a partir da provocação de Magda Soares (1990): O que fiz e por que, para que e como fiz.

Antes do fim, apresento em Descobertas, os processos de produção de três publicações que, não sendo obras do acaso, deram vigor a minha presença como pesquisadora na estrutura da Universidade.

Ao vislumbrar uma confluência, na primeira metade do século XX, de quatro obras (dois impressos e dois manuscritos) para alfabetizar elaborados pelos escritores gaúchos João Simões Lopes Neto (Artinha de Leitura, 1907), Erico Verissimo (Meu ABC, 1936), Pedro Wayne (Histórias da

Teté, 1940) e Mario Quintana (O batalhão das letras, 1948),

(11)

trabalho de pesquisa se estendeu de 2007 a 2011 e resultou em duas publicações: Um Alfabeto à Parte: Biobibliografia de

Pedro Rubens de Freitas Weyne, o “Pedro Wayne” (ROSA,

2010) e Onde está Meu ABC, de Erico Verissimo? Notas sobre

um livro desaparecido (ROSA, 2013).

Além dessas duas grandes conquistas como pesquisadora, tive o privilégio de organizar, em obra publicada pela Editora da UFPel em 2010, os primeiros 20 anos de vida intelectual de Graça Paulino. No impresso, 20 artigos que apresentam o caminho intelectual da professora mineira que culmina com a grafia do verbete Letramento Literário, hoje amplamente utilizado.

Por fim, ouso apresentar um nó. Desses que, ao olhar inicial, parecem bem tramados. A uma aproximação mais atenta, no entanto, pontas prestes a serem desenlaçadas e propícias a novos e mais elaborados nós, são percebidas. Significa dizer que em Alfabetização Literária: o fio condutor, último passo desse Memorial, apresento minha maior contribuição à ciência, fruto da capacidade intelectual desenvolvida nesses anos em busca da qualidade acadêmica e científica. Embora a produção de saberes não seja linear, o conceito por mim cunhado a partir da pesquisa, do estudo, da docência e da experimentação pode, sim, ser apresentada ao

(12)

fim dessa escrita, pois desconfio que, se a tivesse em mãos em 1993, quando ingressei nas salas de aula da Barroso com a Lobo da Costa, a minha e a história dos aproximadamente sete mil estudantes que por mim passaram seria outra.

Seria? Não sei...

Magda Soares escreveu em seu Memorial que “vida nenhuma – quer em seu aspecto pessoal, quer em seu aspecto profissional – desenvolve-se linearmente, seguindo um traçado predeterminado, como se fosse lento e seguro caminhar por vias escolhidas” (1990, p. 27-28). E Valter Hugo Mãe, em seu recente As mais belas coisas do mundo (2019, p. 12) escreveu que “é urgente viver encantado”, pois quem se desilude, “morre por dentro” e “o encanto é a única cura possível para a inevitável tristeza”.

(13)

MEMORIANDO... “Arranca-se o que um dia se plantou, planta-se outra coisa, mas não se lança fora o que se arrancou” (SOARES, 1990, p. 35).

Uma das características de meu texto é a reflexão do impacto que alguns temas foram imprimindo em minha trajetória docente na Universidade Federal de Pelotas, quando, em março de 1993, assumi minha primeira turma de futuros Pedagogos para “ensinar” a alfabetizar crianças e adultos.

A partir daquele momento, reuni as condições que possuía – os saberes adquiridos, as fontes sociais nas quais havia fruído e os modos de integração destes a meu modo de ser professora. Compreendia, à época, que adquirira saberes únicos, pessoais, intransferíveis, pela história de vida e pela socialização primária ocorrida em minha família, repleta de leitores. Pelo ambiente de vida e pela educação no sentido lato a mim oportunizada. De mesmo modo, pela formação e pela socialização ocorridas ainda na pré-escola, escola primária e no ensino médio, pude adquirir as condições de aprovação para o ensino superior, destacando nesse tempo, o aprendizado escolar do apreço pela língua materna e pelos

(14)

idiomas, além de um gostar especial pela Literatura Brasileira, saberes esses provenientes da presença frequente e sem reprovações na escola dos cinco aos 17 anos.

Foi, no entanto, na formação e socialização de modos de ser e pensar a educação ocorridos em uma qualificada instituição de formação de professores – a Licenciatura em Pedagogia ministrada pelo Centro de Educação da Universidade Federal de Santa Maria – que aprendi, política e cientificamente o poder de um professor com seus alunos. Através de saberes provenientes da formação profissional para o magistério, como estudos fundantes e específicos mais estágios e relações com professores pesquisadores, pude compor o acervo de informações e procedimentos concernentes à docência na escola. Considero esse um momento crucial de amadurecimento e de transformação da menina que eu ainda era na mulher que me tornei, por todas as possibilidades que a Licenciatura e o Movimento Estudantil me oportunizaram. Nesse tempo – o final dos anos 80 do Século XX, aprendi a pensar em grupo e individualmente, a propor e defender ideias, a vencer e a perder, a recuar estrategicamente. Aprendi autores e suas teses, métodos e seus resultados. Aprendi a duvidar de minhas crenças, a ter um repertório rico e referenciado, a escrever e ler

(15)

academicamente. Na Licenciatura em Pedagogia aprendi a ser uma professora: igual a muitas que tive no apaixonamento pela profissão e diferente de muitas outras que também tive, ignorantes de si, das escolas e do país em que vivíamos. Em que vivemos.

Mas, aprendi, prioritariamente, o valor de ser referência letrada diante de crianças que ainda não conheciam os livros, os jornais, os impressos que circulam e são valorizados socialmente. Na Biblioteca da UFSM e na CESMA – Cooperativa de Estudantes de Santa Maria – onde mais observei do que comprei livros que amei – pude complementar os dizeres e as descobertas comunicadas em salas de aula no ensino superior. Impossível não mencionar o impacto dos livros no porta-malas do carro de nossa mais inspiradora professora na Pedagogia, Regina Melo Soriano que, impossibilitada de ler tudo o que comprava, nos instava a descobrir as maravilhas do mundo da pesquisa que ela acessava. Foi um encantamento que repeti em minha vida quando eu mesma pude ter acervos a disponibilizar.

Na Pedagogia, ainda, observei e aprendi a utilização das “ferramentas” de alguns dos professores: como compunham e apresentavam os programas das disciplinas, como selecionavam e utilizavam livros didáticos, como

(16)

registravam suas docências, os alunos que por eles passaram e seus procedimentos metodológicos. Com eles aprendi a fazer meu diário de classe, um caderno que me acompanha desde sempre e é renovado a cada semestre, revelando a professora que estou sendo.

Na Universidade, como docente, me defrontei com a tríade “ensino, pesquisa e extensão”, e a levei a sério. Pela prática do trabalho e pela socialização profissional, ou seja, por experimentos do ofício nas diferentes disciplinas tanto na Graduação como na Pós-graduação, em projetos nas escolas em que tive a oportunidade de estar e nos resultados de investigações que promovi ou me integrei, além da experiência dos pares, estruturei o grupo de saberes que se tornou a minha experiência na profissão. Colegas pesquisadores, docentes na mesma área, professoras na escola, bebês, crianças, jovens e longevos – todos eles inseridos em minhas salas de aula, projetos e programas – fizeram de mim a professora que consegui ser: uma professora leitora.

Nas formações posteriores, Mestrado e Doutorado, adquiri a desenvoltura com o trabalho acadêmico – pesquisar e relatar, descobrir e revelar, me apaixonar e publicar. Desse tempo, são oriundos os livros acadêmicos que publiquei e pelos quais não sinto nenhum demérito. Representam um

(17)

tempo, precioso, de investimento da sociedade em um educador público.

No pós-doutorado, conheci Graça Paulino e a minha vida acadêmica nunca mais foi a mesma. Foi Graça quem me educou a considerar que “o saber literário compõe o conjunto de saberes docentes ligados ao trabalho cotidiano em sala de aula, mesmo quando esse trabalho não está diretamente ligado ao ensino de língua e literatura”. Ao ler seu mais importante texto – Saberes Literários como saberes docentes – publicado no número 59, volume 10 da revista Presença Pedagógica em setembro/outubro de 2004, consolidei o mais potente argumento para minha existência intelectual. Nele, Graça afirma que o pensamento de Tardif sobre saberes docentes se mostra “especialmente instigante por ultrapassar limites tecnologistas próprios de outros pensadores da década de 90”, e valoriza o pressuposto do pesquisador de que “o saber dos professores é um saber deles e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com sua experiência de vida e com a sua história profissional”. Mais. Organiza sua argumentação a partir do desejo de “não cair na tentação de separar o saber literário de outros”. Defendendo sua especificidade, parte de dois quadros em que Tardif propõe “um modelo tipológico para identificar e classificar os saberes

(18)

dos professores” e “uma comparação entre o trabalho industrial e o trabalho docente no que diz respeito aos objetivos, ao objeto e ao produto”, ambos inseridos no livro Saberes

docentes e formação profissional, publicado no Brasil em 2002.

O argumento central de Graça Paulino, é que “se entendemos a formação de professores de modo mais amplo, em sua produção histórica e social que envolve, além de competências cognitivas stricto sensu, também sensibilidade, emoções, ligações afetivas, interações, transformações pessoais, temos de pensar na possibilidade de que um desses saberes seja de natureza literária”. É isso. Não há controvérsias! Nesse momento teórico consolido o meu saber e, munida desse novo poder, passo a reparar arestas que eu mesma ainda produzia.

O saber literário é um saber. E, como tal, reverbera nas relações na sala de aula, seja ela de que dimensão for. E, se ensino Literatura, o meu saber literário é, ao mesmo tempo, uma competência científica e um componente de meu saber docente, me identifica, é parte de minha experiência de vida e integra minha história profissional.

O que se constata ao ler Tardif, como bem Graça reitera, é que “não adianta querer buscar coerência teórica ou unidade lógica nesse sincretismo de natureza biográfica”, pois há uma variedade de “fontes sociais de aquisição dos saberes

(19)

docentes”. Essa variedade é produzida pela história e família de cada um, escolas frequentadas e saberes acessados que, junto com a “formação profissional propriamente dita”, revelam-se “no momento em que cada um atua em sala de aula”. Como “espaços educativos de várias naturezas”, totalizam “nossa vida cultural” e comprometem integralmente o “que fazemos como professores”.

Eu acredito nisso. E assim me produzi.

Lendo e escrevendo, escrevendo e lendo. Amo ler e ensino a amar a literatura. Essa a minha essência docente.

Ela está garantida, também, nas palavras de Tzvetan Todorov (2010), para quem a principal função de um professor é iniciar os seus “nessa parte tão essencial de nossa existência que é o contato com a grande literatura”.

Mais.

Para ele, a escola deveria “ensinar os alunos a amar a Literatura”.

(20)

Tempo de me tornar a que sou

Como produzi ciência nos primeiros anos de minha vida docente? Quais os efeitos que observo no presente de fatos e ideias do passado? Como era a professora que fui e o que dela ainda há hoje, na minha sala de aula?

Ao observar, com olhos de hoje, o modo como produzi ciência nos primeiros anos de minha vida docente percebi que pouco tempo para reflexão havia em minha ânsia por prestar um excelente serviço público. Demandas como projetos de extensão eram muito caros à instituição e, logo que cheguei, já havia estudantes aguardando e uma sociedade que ainda não tinha proposta mais qualificada e persistente para os que ainda não sabiam ler. Assim, alfabetizar adultos na periferia da cidade e em projetos no Rio Grande do Sul e no Brasil tomou parte considerável de meu tempo. Aproveitando essa demanda institucional e social, vinculei meu Mestrado1 e Doutorado2 a

entender os princípios teóricos e metodológicos do tema,

1 Defendida em 1996, a dissertação Novas Competências para um outro

século: um estudo crítico da Conscientização na Educação de Adultos

(CE/UFSM, 1995-1997), teve como orientadora Drª. Valeska Fortes de Oliveira.

2 Defendida em 2004, a tese O elogio da Escola: de mulher para mulher, uma escola imaginada (PPG/FACED/UFRGS) teve como orientadora a Drª.

(21)

revisitei a obra de Paulo Freire e convidei seu maior estudioso – Balduíno Andreola3 – para avaliar meus escritos. Desse

investimento resultaram, além dos trabalhos necessários como a Dissertação e a Tese, projetos e livros4.

Projetos: 1993 a 2010

A docência na Pedagogia foi meu principal projeto. Assim, disciplinas como Alfabetização, Metodologia da Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos foram minha prioridade. Além do Ensino, nesse tempo, desenvolvi programas de alfabetização para jovens e adultos na cidade5,

representei a UFPel no Programa Alfabetização Solidária6 e

integrei o Projeto Alfabetiza Rio Grande7.

3 Teólogo e filósofo, Balduíno foi diretor da FACED/UFRGS entre os anos

de 1989 e 1992. Atuou linha de pesquisa Educação Popular e Movimentos Sociais no PPGEDU, em que orientou diversas dissertações e teses diretamente relacionadas ao tema da educação popular e da Pedagogia de Paulo Freire.

4As obras Alfabetização e Cidadania: o inverso do espelho na educação de

jovens e adultos (2002); Jovens e Adultos na Escola: Aprendendo a ler o mundo e a palavra (2005) e Mulheres em conto: fragmentos partilhados ao sul (2005) são alguns dos resultados desse tempo.

5 Alfabetização e Cidadania (1993-2007) foi desencadeado na periferia

urbana pelotense (com adultos analfabetos na Vila Princesa, com mães e mulheres de presidiários na COHAB Tablada e com adolescentes e adultos na Escola Lélia Olmos). Também com servidores analfabetos da UFPel, no Campus Capão Leão e no CAVG.

6 O Programa Alfabetização Solidária ocorreu no governo de Fernando

Henrique Cardoso (1997-2002). É considerado ensaio de relação público-privado na área das políticas sociais. Para sua execução foram convocadas as IFES brasileiras, públicas e privadas. Proposto pelo Gabinete da

(22)

Além desses projetos em que equipes estiveram sob minha responsabilidade, coordenei com intelectuais da UFPel o Projeto Rondon Amazônia (2006), o Projeto Rondon Rio Grande do Sul (2006/2007), a Área de Concentração "Alfabetização e Letramento" no Curso de Especialização em Educação da FaE/UFPel (2004 a 2010) e o Curso de Especialização em Educação da Faculdade de Educação em 2012. Foram momentos de intenso trabalho, aprendizagens profundas e vigorosas dúvidas. A maior delas: seria inútil todo o trabalho de alfabetização em um país que não apresentava projeto de letramento para os seus? Nesses tempos, Cristovam Buarque (1993) e o seu O que é Apartação: o

apartheid social no Brasil, ainda galvanizava minha atenção. Publicações: 1993 a 2010

Esse foi o tempo em que as publicações refletiam meu trabalho: projetos de extensão que se tornaram artigos ou livros, estudos do Mestrado e Doutorado amplamente Antropóloga Ruth Cardoso, teve como objetivo contribuir para reduzir os índices de analfabetismo e ampliar a oferta pública de educação de jovens e adultos no Brasil.

7 O Projeto Alfabetiza Rio Grande foi lançado pela Secretaria Estadual da

Educação do Governo do RS em 2003, através de assinatura do protocolo de intenções entre o Estado, Ministério da Educação, UNESCO e FAMURS, pois, à época, o Rio Grande do Sul tinha 6,65% de analfabetos absolutos, totalizando 501.261 pessoas com 15 anos ou mais.

(23)

aproveitados em publicações científicas e literárias e o trabalho de orientação na Especialização em Educação organizado em uma revista anual, a Alfabetização e Letramento. Todos referenciados no meu Curriculum Vitae, os títulos dos livros estão aqui listados.

O primeiro – A voz a e letra dos excluídos: histórias de

vida de adultos em processo de alfabetização – publicado pela

editora da UFPel (1999) é o único que não tenho nenhum exemplar, o que lamento profundamente. Depois dele publiquei:

Escola Lélia Olmos: Projeto Educação e Cidadania,

em 2000;

Alfabetização e Cidadania: o inverso do espelho na educação de jovens e adultos, em 2002;

Mulheres em conto: fragmentos partilhados ao sul, em

2005, como resultado literário de meus estudos no Doutorado;

Jovens e Adultos na escola: aprendendo a ler o mundo

e a palavra.

Em 2006, integrando a equipe da UFPel que desenvolveu em Pacaraima, Roraima, mais uma edição do Projeto Rondon, organizei, junto com estudantes, duas obras para a formação de professores. Financiadas pela UFPel e

(24)

enviadas aos professores da cidade para que integrassem a formação e suas bibliotecas, foram:

Leituras: clássicos e modernos da literatura universal;

Educação Inclusiva: Textos e Glossário.

Reunir e publicizar os trabalhos de investigação realizados na Especialização foi o mote para criar e editar, com colegas da FaE/UFPel, especialmente a Drª Eliane Teresinha Peres, a Revista Alfabetização e Letramento. Em quatro edições – 2006, 2007, 2008 e 2009 – foi resultado de um trabalho intenso e muito proveitoso e que revelou autores e orientadores de todos os portes.

Em 2009, depois de intensa pesquisa, publiquei Um

alfabeto à parte: biobibliografia de Pedro Rubens de Freitas Weyne, o Pedro Wayne. Nele, um manuscrito inédito do poeta

e romancista que ficara guardado com os herdeiros por muitos anos deu luz à parte significativa da história da alfabetização no Rio Grande do Sul. E, depois dele, eu estava pronta para o ingresso no Pós-Doutorado, Mas isso é outra história.

Para descrever a professora que sou, essa que fui foi necessária. Excessos? Exageros? Eu não pensava assim, naquele tempo.

(25)

Guinada em minha vida acadêmica, conhecer a UFMG como estudante de pós-doutorado foi o ápice de minha formação docente. E como pesquisadora e extensionista, também. Mas como escritora de minhas palavras, mais ainda.

Com certeza, a organização da obra Das Leituras ao Letramento literário foi o trabalho mais marcante de toda a minha trajetória. Como cheguei a ele?

A partir de 2010, com as relações que me foram oportunizadas no Pós-Doutorado, ampliei as ações do Grupo de Estudos Escritas, Leitores e História da Leitura8. Um dos

produtos, além de resultados publicizados em eventos e artigos, foi a produção de uma obra com intelectuais que investigam a mesma área no país: integrada por 12 intelectuais brasileiros, Escritas, Leitores e História da Leitura foi pulicado em 2012.

8 Grupo de pesquisa criado em 2009, tem como objetivo primordial

investigar processos de leitura, manuscritos e impressos raros, a história da leitura, da escrita e de usuários dessas práticas culturais. Sob sua guarda há, atualmente, sete projetos em andamento: Há “livros para bebês” no

acervo da Sala de Leitura Erico Verissimo? (2018), As relações entre Leitura, Escrita e Letramento na Formação de Professores Alfabetizadores

(2019), A literatura infantil enquanto ferramenta interdisciplinar de ensino no

contexto da revolução científica (2018), Perfil leitor do estudante de pedagogia FaE/UFPel: 2017-2020, Um olhar sobre a literatura indígena

(2019), Caminho das pedras: Quilombolas na biblioteca escolar (2019) e

(26)

Em 2015, um convite importante foi aceito por mim: integrar, como parecerista, no período de abril a agosto, o processo de Avaliação e Seleção de obras de Literatura, com vistas à composição de acervos destinados às bibliotecas de escolas públicas do país, coordenado pelo Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE), da Faculdade de Educação da UFMG, no contexto do Programa Nacional

Biblioteca da Escola (PNBE 2015), executado pelo Fundo

Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), em parceria com a Secretaria de Educação Básica (SEB) do Ministério da Educação (MEC). Os exemplares, recebidos e lidos, avaliados e criticados, compõem a biblioteca da SLEV, um presente do projeto que não tem similares em minha vida.

Coordenar o GELL – Grupo de Estudos em Leitura Literária desde 11/2010 – e a Sala de Leitura Erico Verissimo desde 17/12/2015, são importantes momentos em minha trajetória que revivo todos os dias, ao disponibilizar acervos e repertórios para pesquisas, visitas guiadas, estudos e intervenções.

Em 2019, dois prêmios por esses trabalhos foram recebidos: um no SUPLPET UFPel9 (maio de 2019) e outro no

9 Com o título “Extensão PET Educação: constância e inovação” é que o

(27)

CIC (SIIEPE UFPEL, outubro de 2019), pela estudante Jéssica Corrêa Ribeiro que inventariou a presença de livros “para meninas” na sala de leitura Erico Verissimo, a fim de delinear um acervo literário cujo foco é o feminismo e violência contra a mulher.

Estudante de pós-graduação ao mesmo tempo em que era docente na Licenciatura, escrevi dissertação e tese, projetei intervenções, orientei estudantes na pesquisa e publiquei. Foi o tempo de me tornar a que sou: mais criteriosa e mais sábia, mais humilde e mais capaz. Embora uma “seleção de fatos e ideias do passado”, sempre limitada pela memória frágil e atribuição de sentido, ouso imaginar que sim, esses foram os mais importantes momentos vividos.

04/05 de 2019. Elaborado pelos estudantes de Pedagogia Angélica Karsburg; Fernanda Vieira Dos Santos e Valdoir Simões Campello, o trabalho foi apresentado pela estudante Ieda Maria Kurtz De Azevedo. Como foco, o trabalho de extensão desenvolvido pelo PET Educação nos últimos três anos.

(28)

O Ensino, a Pesquisa e a Extensão. No terceiro momento desse Memorial elenco demandas que, ao ensinar, aprendi a responder, ora pesquisando, ora experenciando. Organizado em três tópicos – o Ensino, a Pesquisa e a Extensão – considerei cada ação a partir da provocação de Magda Soares (1990): O que fiz e por que, para que e como fiz.

Ensinar sempre foi uma atividade primordial. Desde sempre. Lembro-me das origens dessa escolha profissional e as encontro na infância, quando me divertia pulando o muro de casa e cuidando de crianças pequenas que, no “jardim”, aos cinco anos, precisavam aprender a se portar e desenhar, colorir, recortar, cantar e brincar em grupo. Eu, com oito anos, era a professora deles, sob o olhar condescendente e até despreocupado da professora Ingrid, a titular. Em suas saídas para um cafezinho, eu reinava: uma professora plena, falante e apaixonada.

Aulas para crianças pequenas, depois de adulta e na UFPel, só na Extensão. Mas delas, a fonte para as aulas na graduação. Por isso, nunca me afastei da escola e das salas de aula da Educação Infantil e do Ensino Fundamental. Tive, nesse tempo todo, a conivência e a excelente recepção de

(29)

professoras que, nas escolas, estavam ávidas por acertar. Eu, novamente, experenciei.

E percebi que se tivesse me dedicado à docência nos anos iniciais, teria sido tão feliz na profissão quanto. Amo as infâncias que se apresentam a mim, escrevo literariamente sobre elas, revelo seus dilemas e percebo a responsabilidade dos docentes com a avidez que a maior parte das crianças que estão na escola tem pelo saber. Dessas relações guardo o melhor: hoje, produzo livros digitais com crianças na escola. Ao ler um texto escrito por mim para elas, atualizo meu discurso com essa geração. Ao observar como desenham e como opinam, faço uma pós-graduação extraoficial e apreendo modos de ser e estar no mundo. Parte de minhas produções advém dessas relações. A mais recente, Iris e a Beterraba –

disponível em

https://1drv.ms/b/s!AnLx_C_tdWpwg1iHRKOaU3rJpl4G – é um livro digital que integrou os lançamentos na Feira do Livro de Pelotas em 2019. No salão nobre da Biblioteca Pública Pelotense, as crianças, seus pais e avós, mais professores e dirigentes do Colégio Municipal Pelotense oportunizaram a mim uma tarde de avaliação do trabalho realizado.

Destaco ainda, fruto desse investimento na infância, na leitura e na escolha criteriosa de livros para leitura por adultos

(30)

(professores, pais, avós, irmãos e cuidadores), a composição de uma lista de livros. Elaborada como um impresso informal e ao mesmo tempo como uma lista online, De A a Z o que gosto

de ler (ROSA, 2013) tem sido disponibilizado no endereço

http://crisalfabetoaparte.blogspot.com/2013/09/de-a-z-o-que-gosto-de-ler.htmls, sempre que atuo com futuros professores, docentes em cursos de aperfeiçoamento e mesmo pais e mães em busca de uma sugestão de livros de literatura para crianças. Desse modo, socializo as raridades que garimpei em anos de estudo na área e que foram selecionados entre o que há de melhor em bibliotecas, livrarias, sebos e catálogos das editoras.

(31)

4.1 O ensino As aulas na graduação foram o meu maior investimento. Pedagoga, trouxe comigo, desde o tempo da Licenciatura cursada na UFSM, o desejo de ser uma professora aos moldes dos meus melhores mestres, que não foram poucos. Concursada em 1992 e assumindo a tarefa de responder pela área na Faculdade de Educação da UFPel – lecionar os temas vinculados à disciplina de Alfabetização na Licenciatura em Pedagogia –, pude experimentar o estudo das linhas teóricas que, historicamente responderam pelo tema no Brasil e explorar métodos e processos que se transformaram em cartilhas e livros didáticos nos aproximadamente 140 anos dessa história.

Destaco, desse tempo, o investimento em compor um acervo de livros didáticos, cartilhas e manuais que foram utilizados para alfabetizar no Brasil, além de abecedários que, sem vínculo com a escola, circularam pelo país, com o intuito de auxiliar pais e familiares na tarefa de inserir crianças no mundo da leitura e da escrita. Esse banco de dados está integrado a minha biblioteca, foi utilizado em sala de aula sempre que o tema era recompor a história de impressos para alfabetizar e nele se destaca a presença de originais como a

(32)

cartilha “¿Quieres leer?” (José Henriques Figueira, 1924)10 e o

abecedário O batalhão das letras (Mário Quintana, 1948)11. A

produção de trabalhos analíticos sobre o tema, junto com estudantes e a partir desse grupo de obras, originou um arquivo que, ao final do semestre, sempre era compartilhado. Como exemplo, Estudos de Cartilhas, Manuais e Livros

didáticos: 1872-2012 (ROSA, 2013), disponível no endereço

https://1drv.ms/b/s!AnLx_C_tdWpwgxNops3GlvLZ0xfK.

10 Em 2008, publiquei um pequeno estudo (disponível em http://crisalfabetoaparte.blogspot.com/2008/12/queres-ler-na-histria-da-cultura.html) sobre esse livro. Nele, escrevo: Originalmente escrita pelo professor uruguaio José Henriques Figueira sob o título “¿Quieres Leer?” e considerado parte do sucesso obtido pelo ensino na capital do Uruguai, foi adaptado pelas professoras Olga Acauan e Branca Diva Pereira de Souza em 1935, no RS. Foi anunciado como um “Livro de Leitura e escripta corrente” fundado “na sciencia mental e no estudo da criança e composta de accordo com os princípios de espontaneidade, de autonomia e correlação natural das matérias (associação synergica) e dos methodos intuitivo e analytico-synthetico phonico de palavras e frases fundamentaes”.

11 Um Abecedário é um gênero literário inserido na literatura para crianças.

Alguns grandes escritores que hoje respeitamos, como Cecília Meireles, Erico Verissimo e Mário Quintana os escreveram em um tempo em que os livros para crianças eram raros, sem ilustrações e sem infância. O Batalhão

das Letras, de Mário Quintana não é raro. Nem mesmo desaparecido. Há

nas livrarias, já recebeu tratamento editorial de mais de uma empresa, ilustradores como Eva Furnari e Rosinha. Seus versos já apoiaram as professoras em processos de alfabetização e é um dos livros para crianças mais conhecidos de Mário Quintana, mesmo fora do Rio Grande do Sul. No entanto, o exemplar original, de 1948 é muito raro. Mais sobre o tema em:

http://crisalfabetoaparte.blogspot.com/2014/01/1948-o-batalhao-das-letras-de-quintana.html

(33)

Destaco ainda, algumas investidas em compor, com os alunos, Abecedários como possiblidades de invenção de um método próprio para alfabetizar, também na Disciplina por mim ministrada por alguns anos, a optativa Metodologia da Alfabetização. Entre estes, recomendo Nosso Abecedário

(ROSA, 2012), editado pela EDGUFPel

(ISBN:978-85-7192-861-9. E De palavra em palavra (ROSA, 2014), disponível no endereço: https://1drv.ms/b/s!AnLx_C_tdWpwgUrKUwvotD-1Q41q, como exemplo do que pode ser feito para além das clássicas cartilhas e manuais.

Uma disciplina que venho ofertando, de modo optativo aos estudantes da Licenciatura em Pedagogia, tem sido de muito apreço pessoal e frequentada até por filhos de estudantes. É a Literatura Infantil que, neste último semestre (2019/2) foi integrada por dois públicos: estudantes da Pedagogia e da UNAPI. Como produto final, a publicação online de um livro – Escrevo o que inventei: sobre meninos,

papelão e cães... – uma coletânea escrita a partir de uma

provocação acadêmica e literária. Certo dia, contei um “causo” a meus alunos. Uma história que eu presenciara em parte e da qual ouvira muitos desfechos, posteriormente. Foi mais ou menos assim:

(34)

“Há muitos anos, no centro da cidade de Pelotas, havia um grupo de meninos que circulavam durante o dia pedindo esmolas. À noite, nas imediações do Café Aquários, eles se agrupavam e dormiam em cima de papelões descartados pelas lojas, junto com cães de estimação. Um dia, sem saber como, a cidade se viu livre da presença de todos eles”.

Para torná-los partícipes do enigma, perguntei: O que teria acontecido? E escrevi, no quadro, algumas frases. Convidei-os, então, a dar continuidade literária à narrativa. As frases, no quadro, eram:

“Era uma vez, meninos, papelões e cães... Era uma vez, em Pelotas, meninos, papelões e cães. Era uma vez, em Pelotas, próximo ao

Café Aquários, meninos, papelões e cães...

Em uma quinta-feira, bem cedinho, não havia mais meninos, papelões nem cães...”

Organizada por mim junto com a estudante Cinara Tonello Postringer, contou com a colaboração da Alessandra Steilmann e da Pedagoga Ieda Maria Kurtz de Azevedo e estará disponível online, em breve.

Na EAD/Pedagogia/UFPel, tive a oportunidade de integrar, a convite da Coordenação, a equipe de professores e

(35)

ofertar, nas formações específicas, a disciplina Leitura Literária

na Escola, entre 02/04 e 03/06/15. Os objetivos eram conhecer

o universo literário infantil disponível e selecionar obras adequadas a crianças entre zero a 11 anos, preponderantemente, além de empreender estudos que possibilitassem a compreensão de conceitos básicos da área como leitura, leitura literária, obra literária, gêneros literários, literatura para a infância e suas relações na escola. Além desses, intencionei apresentar possibilidades de trabalho pedagógico aos estudantes a fim de que se tornassem mediadores do processo de gostar de ler e de atribuir sentido ao lido. A intenção pedagógica foi orientada pela leitura, diálogo e pesquisa de autores e obras brasileiras especialmente adequadas à infância. O foco, a formação do professor leitor literário. Desse tempo, lembro-me de ter organizado, com as estudantes, um Abecedário (disponível em

https://1drv.ms/b/s!AnLx_C_tdWpwg101Fi7fd4w3mqOC), como

orientação do que e como fazer na escola.

A docência na Pós-Graduação – em diferentes especializações e, eventualmente no Mestrado e Doutorado, oportunizaram relações mais leves e instigantes com o saber, uma vez que a ampla maioria dos estudantes é experimentada e tem perguntas mais focadas em resultados. Uma de minhas

(36)

oportunidades ocorreu na FaE/UFPel, quando integrei o grupo de professores que criou, em 2004, uma revista institucional, a Alfabetização e Letramento. Impressa anualmente como resultado de artigos por nós orientados, foi um excelente momento de tornar público para um maior número de pessoas, o que e como fazíamos ciência nos anos 2004-2009.

Atualmente, atuo na Especialização em Educação em uma disciplina que agrega a Literatura Infantil, Artes Visuais e Música. O foco é a Educação para o sensível representado por acesso ao conhecimento dos princípios teóricos e metodológicos acerca da Arte e da Cultura. O tema central – explorado através de tópicos interligados e metodologias integradoras como Oficinas de Criação Coletiva, Arteterapia e Sarau Literário –, possibilitou que eu explorasse o conhecimento da linguagem literária através de gêneros, títulos e autores representativos da Cultura Escrita e Imagética Brasileira. O foco foi desenvolver as habilidades de ouvir, ler e reinventar narrativas literárias para a infância. Nessas últimas duas edições propus e os estudantes aceitaram produzir escritas literárias que originaram duas obras digitais: Contos de

Infância (2017), que está impresso e também disponível em

(37)

Coisas de Infância (2019), disponível em: https://1drv.ms/b/s!AnLx_C_tdWpwg1BXEnd03f7MJ_76).

Destaco, nesse quesito, a participação em duas edições do Curso de Especialização em Docência na Educação Infantil da FACED/UFRGS/MEC (2012-2014 e 2014-2016). Neles, desenvolvi a disciplina Linguagem, Oralidade e Cultura escrita, cuja súmula e conteúdo programático previam o estudo de concepções de linguagem, relação entre pensamento e linguagem e entre linguagem e interações, além de compreensão das relações entre oralidade e cultura escrita e um cuidado especial com a Literatura na Educação Infantil, incluindo o livro infantil em creches e pré-escolas. Fruto desse trabalho, além dos textos finais defendidos por orientandas12, a

organização de dois livros digitais: um com escritas literárias dos estudantes – Em busca de estrelas, disponível em

https://1drv.ms/b/s!AnLx_C_tdWpwgybUW6WVW54zfOsx e o

Abecedário ABC, disponível em

https://1drv.ms/b/s!AnLx_C_tdWpwgl_ySI_hDzVHZLCW, ambos em 2015. Essas duas participações apresentaram para mim um trabalho em equipe que até então, não havia

12 Os artigos finais defendidos em maio de 2016 foram: Um repertório criterioso: a escolha de livros a partir do olhar do professor mediador, de Andréa Reckziegel e Leitura literária e aquisição da linguagem oral: os

(38)

partilhado e foi uma volta à Universidade na qual me doutorei, o que é sempre significativo.

Aulas Especiais

A primeira rica oportunidade de desenvolver uma aula especial ocorreu nas dependências do arquivo de literatura infantil do CENEC na Biblioteca da FaE/UFMG, no dia 04/11/2010, das 19 às 21 horas. Ao abordar o tema “Literatura para Crianças: livros e critérios de escolha” para estudantes do Curso de Pedagogia da FaE/UFMG, matriculadas na Disciplina

Leitura Literária na Escola, ministrada pela Drª. Graça Paulino,

pude comprovar, para mim, que um acervo poderoso e à disposição do professor faz uma imensa diferença na qualidade de seu trabalho.

No Programa de Pós-Graduação em Educação da FACED/UFRGS, a convite da Doutora Jane Felipe e do GERGE – Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero criado 1990 que se dedica a atividades de investigação, ensino e extensão sobre temas como gênero, sexualidade, raça/cor, etnia, classe, religião, nacionalidade, geração, em articulação com a Educação – tive a oportunidade de dialogar, em 10 de outubro de 2014, sobre maus-tratos emocionais e violência “benévola”, o que originou um dos meus mais interessantes artigos, entregue aos alunos

(39)

previamente. O argumento central que desenvolvi em

Maus-tratos emocionais e violência “benévola”: o que a literatura tem a nos dizer sobre o tema? (ROSA, 2017), disponível em

http://crisalfabetoaparte.blogspot.com/2017/07/maus-tratos-emocionais-e-violencia.html, é que a violência contra mulheres e meninas também está presente nas narrativas literárias como um modo de educar, dirigir, formatar, configurar os comportamentos de gênero, especialmente nos contos clássicos como Chapeuzinho Vermelho, Pele de asno, Barba

azul, Cinderela, A Bela e a fera, Branca de neve, Rapunzel, João e Maria, O patinho feio, A pequena vendedora de fósforos

e A princesa e a ervilha. E a morte, consequentemente. Quem a apresenta aos pequenos, às meninas, às mocinhas, são mães, pais, madrastas, madrinhas, irmãs, vizinhas. Estudando o tema descobri que Diana e Mário Corso (Fadas no Divã, 2006) avaliaram o impacto que parte significativa dos contos clássicos produziu e produz em nossa psique, em nossa constituição como sujeitos.

O que se pode depreender é que há nas narrativas, intensa presença de atitudes que hoje denominamos maus-tratos emocionais como abandono e desmando de adultos sobre os infantes, ameaça de violência sexual, desterro e violência de pai, marido ou monstro e, em algumas das

(40)

narrativas, a presença de “violência benévola”, representada pela competição entre mulheres e localizada na “moral”, implícita ou explícita, ofertada pelo desfecho. Nas entrelinhas, no epílogo ou posterior ao fim da narrativa, o leitor compreende que “só uma princesa merece o amor de alguém”, “a curiosidade mata”, “é perigoso ser bela”, “mulheres „fáceis‟ é que são abordadas por lobos” e para casar é necessário um rol de virtudes: ser bela, ter paciência, humildade, delicadeza. Os maus-tratos também podem ser observados quando há punições exemplares aos “desvios de caráter” que tornaram esses contos educativos, moralizantes, exemplares. Neles, assim como nas fábulas, inveja, soberba, ganância, gula, apetite sexual são desaconselhados em desfechos mal sucedidos às personagens femininas.

Além dessas, a mais recente oportunidade foi ofertar literatura para um público que cresce no país, em especial no RS, os longevos. A convite da UNATI – Universidade Aberta a Terceira Idade (UFPel, 2018) e UNAPI – Universidade Aberta a Pessoas Idosas (UFPel, 2019 e 2020), como um programa livre, criei ementa e temas a serem estudados. No primeiro semestre de 2018, a disciplina ofertada foi Literatura: Contos e Poemas em língua portuguesa. Propunha o estudo de duas expressões literárias – o conto e a poesia – através de um

(41)

grupo de autores, entre eles, o português José Saramago, o moçambicano Mia Couto e os brasileiros Mário Quintana e Manoel de Barros. Ao desenvolver o gosto pela leitura literária através da apreciação de produtos de autores em língua portuguesa, a intenção foi historicizar, conceituar e diferenciar os dois gêneros literários e desenvolver, entre os estudantes, a capacidade de se ser um mediador de leitura.

No segundo semestre, ofereci Literatura II – Leitura e Escrita Literária, entre setembro e dezembro de 2018. Como monitoras, as estudantes de Pedagogia Cláudia Sousa e Fernanda Santos e a colaboração da Pedagoga Ieda Maria Kurtz de Azevedo. Teve como foco o estudo de um acervo que integra, como fonte criativa, um projeto de escrita literária para adultos que frequentarão a disciplina Literatura II na UNATI. Trata-se de literatura produzida para pensar, apreciar e se aventurar a escrever textos de diferentes gêneros. A base teórica para o desenvolvimento da proposição foram três obras de autores que se dedicam a formar novos escritores: Luis Augusto Fischer, Graça Paulino, Jane Tutikian e Pedro Gonzaga. Dessa resultou um livro digital, disponibilizado a todos via redes sociais no endereço

(42)

O primeiro semestre de 2019 foi o tempo de ofertar Literatura: Contos Clássicos e 100 Melhores Brasileiros, entre 03/04/2019 e 13/07/2019. O objetivo foi ampliar o estudo de uma das expressões literárias mais populares: o conto. A obra escolhida pelo grupo em dezembro de 2018 foi “Os cem melhores contos brasileiros do século XX”, de Ítalo Moriconi. Ao desenvolver o gosto pela leitura literária através da apreciação de produtos de autores em língua portuguesa, a intenção é historicizar, conceituar e aprender a apreciar a qualidade do gênero literário e desenvolver, entre os estudantes, a capacidade de ser um mediador literário.

E, no segundo semestre de 2019, a escolha foi por criar um grupo mais plural de alunos, mesclando estudantes de Pedagogia com os 60+. Assim, ofertei Tópicos de Literatura: do século XVIII ao XXI a 50 pessoas, 20 estudantes de graduação e 30 longevos. Como conteúdo e base, o conhecimento de estudos literários realizados por ABRAMOVICH (2002), Machado, (2012), PAULINO (2010) e ROSA (2015).

Como chave para o conhecimento, a leitura e o estudo dos clássicos da literatura infantil representados por C. Perrault, J e W. Grimm e H. Andersen, clássicos brasileiros (Lobato, Lopes Neto, Meireles, Verissimo e Quintana) e autores modernos, preponderantemente brasileiros. O

(43)

Glossário CEALE, disponível em http://www.ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/glossarioceale/, foi adotado como fonte importante de verbetes na área.

(44)

4.2 A Pesquisa

“Não há e nunca houve uma verdadeira arte que valesse o mesmo para todos no mundo, em todas as épocas, porque as pessoas têm expectativas, preferências e repertórios diferentes. Além do mais, há as diferenças de critérios de valor que dependem fundamentalmente de cada época histórica” (PAULINO, 2010, p. 129).

Recém Doutora, em 2004, elaborei, junto com duas colegas13, Projeto de Pesquisa submetido ao Edital Humanas

2004 do CNPq - Conselho Nacional de Pesquisa. Intitulado

Aquisição da escrita e letramento: a linguagem nas relações de pertencimento à escola, teve origem na proximidade de

interesses e trajetórias de investigação de três mulheres pesquisadoras, bem como nas necessidades suscitadas pelo envolvimento destas com o Ensino e a Pesquisa nos Programas de Pós-Graduação em Educação mantidos pela Faculdade de Educação. O projeto buscava instituir e delimitar um campo de investigação em educação possibilitando a emergência de múltiplos estudos, pesquisas e pesquisadores

13 A proposta continha a mim como Coordenadora Técnica Científica e as

colegas Ana Ruth Moresco Miranda e Gilsenira de Alcino Rangel como proponentes e, ao aprová-la, conseguimos equipar nossa sala de trabalho.

(45)

que tinham como objetivo de análise a reflexão de diferentes enfoques teóricos e metodológicos acerca da aquisição da linguagem oral e escrita. Propunha, ao mesmo tempo, um alargamento em torno da compreensão da aquisição de saberes no campo da linguagem, uma vez que pretendia registrar os procedimentos de aquisição da linguagem oral e/ou escrita com diferenciadas fontes como crianças no ensino fundamental, crianças portadoras de necessidades educativas especiais e jovens e adultos em processo de alfabetização, prioritariamente organizados pela escola. Foi o primeiro projeto financiado que deu fôlego institucional a nossas – minha e da Ana Ruth e Gilsenira – pesquisas pessoais.

Um dos resultados alcançados foi o impulso à elaboração, dentro do Programa de Pós-Graduação, tanto na Especialização como no Mestrado, de monografias e dissertações sobre o tema. Outro, a publicação, na Revista da Linha de Pesquisa “Alfabetização e Letramento”, de artigos a partir das pesquisas.

Os sentidos do ler e escrever na sociedade e na escola, iniciada também em 2004, foi uma das primeiras

investigações desenvolvidas em consonância com os estudantes que eu observava em sala de aula. Teve como objetivo central conhecer, descrever e analisar o processo de

(46)

aquisição de conceitos sobre a leitura e a escrita em um grupo de acadêmicos. Financiada pelo CNPQ (480865/2004-3), a investigação partiu da hipótese central de que o curso superior oferecia a oportunidade de reconhecimento da leitura e da escrita como objetos conceituais primordiais à docência nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental. Orientada por estudos que indicam que a leitura e a escrita prévia e a desencadeada nos cursos de formação tem parte considerável de influência na atuação docente (KRAMER, 1998), a investigação partiu da hipótese de que o Curso de Pedagogia oferecia elementos para que os estudantes transformem seus conceitos durante a formação. A escolha metodológica aliava informações disponibilizadas pelos dados quantitativos aos resultados qualitativos e busquei descobrir se liam e quais livros liam, quais produções escritas realizavam (cartas, diários, resenhas, resumos, entre outros), quais os objetos culturais que manipulavam (livros, revistas, jornais, manuais, entre outros) e como os conceituavam. A coleta de dados deu-se através da adaptação de um questionário (PERES, 1999) e da construção de instrumentos daí derivados. A categorização dos dados consistiu em agrupar respostas por proximidade conceitual em percentuais de incidência. De caráter longitudinal, a pesquisa acompanhou os quatro anos de estudo do grupo, realizando,

(47)

ao menos, duas coletas anuais. Como resultado mais flagrante, descobrimos que a leitura era, majoritariamente, sinônimo de decifrar e adquirir conhecimento e a escrita, codificação e expressão de ideias.

Em continuidade a essa ideia – mapear o que pensavam e como agiam as estudantes de Pedagogia –, em 2005 dei início a outra investigação. Intitulada As relações

entre leitura, escrita e letramento na formação do professor,

tinha como objetivo averiguar qual o impacto do curso superior nas práticas de letramento de um grupo com origens, idades e diversas experiências na escola. Iniciada em março de 2005 e concluída em 2010, foi financiada com bolsa de IC pela FAPERGS em 2008 e buscava referenciais teóricos e metodológicos para tratar e compreender as práticas culturais acessadas no curso superior que servissem de referência para a atuação docente. Tendo participado de pesquisas em grupo, essa foi a primeira a ser coordenada integralmente por mim e, até hoje, é um tema que me interessa. Por vários outros momentos em minha trajetória profissional pude redimensionar esse tema e, atualmente, ainda investigo o assunto na Licenciatura em Pedagogia.

Por que e para que fiz? Busquei sempre compreender essa fragilidade apresentada em sala de aula: o insistente não

(48)

vínculo com práticas letradas, especialmente a leitura e a leitura literária. E fiz para capacitar-me a intervir, na sala de aula e em outros locais, com os agentes desse insistente fenômeno: os que não leem. Desejava e ainda desejo impactar, encantar, despertar as estudantes para um princípio que me move: a leitura é condição de exercício de nossa profissão e é o que nos diferencia dos demais profissionais “formados” pelas universidades.

Marco de minha “virada” como intelectual foi a aceitação, por Maria das Graças Rodrigues Paulino – a Graça Paulino – de orientação no Estágio Pós-Doutoral em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Foi com Graça que aprendi ou aprimorei as mais preciosas lições para o exercício docente na Universidade. Quais foram? Saber ler e escrever academicamente, cunhar a própria história científica, responder socialmente pelo conhecimento adquirido representando o meu lugar e o saber que só nele existe, conhecer o mundo real e intervir nele com os saberes produzidos, relacionar-se com os alunos e professores mais os pares a partir de saberes próprios e, mais importante que todos, que “o saber literário compõe o conjunto de saberes docentes ligados ao trabalho cotidiano em sala de

(49)

aula, mesmo quando esse trabalho não está diretamente ligado ao ensino de língua e literatura” (PAULINO, 2004).

Ao ser avaliada por ela, após a realização do estágio Pós-Doutoral, recebi palavras de confirmação de suas orientações e, animada por esse reconhecimento, pude ser novamente a jovem professora que ao ingressar na UFPel em 2013, buscava ser. Talvez, almejasse ser mais e melhor que os que me antecederam, meus professores todos. As palavras de Graça, na escrita que enviou ao PPGE/FaE/UFMG foram:

“Acompanhei, de agosto de 2010 a julho de 2011, o Estágio Pós-Doutoral da Professora da Universidade Federal de Pelotas, Cristina Maria Rosa, com Mestrado e Doutorado em Educação. Seu Projeto de Pesquisa tinha como objeto a análise de aspectos pedagógicos e culturais de quatro cartilhas escritas na primeira metade do século XX por quatro escritores gaúchos: Pedro Wayne (Histórias da Teté), João Simões Lopes Neto (Artinha da Leitura), Mário Quintana (O batalhão das Letras) e Erico Verissimo (Meu ABC). Os dois primeiros nunca chegaram a publicar essas obras ligadas à alfabetização. E, se o livro de Mário Quintana é até hoje prestigiado, o de Erico Verissimo não só nunca é citado em sua bibliografia como nunca deu origem a um estudo especializado, tendo desaparecido dos acervos a ponto de serem encontrados apenas dois exemplares em bibliotecas abertas ao público ou a pesquisadores. Esse fato deu origem à curiosidade intelectual de Cristina Maria Rosa, que se propôs

(50)

entender razões que teriam levado três ficcionistas e um poeta a se dedicarem à escrita de obras de alfabetização e o possível impacto cultural que essa atitude teria, especialmente no Rio Grande do Sul. A escolha da FaE/UFMG para realizar tal pesquisa se deveu não só ao acervo de trabalhos sobre alfabetização do Ceale como também à existência de uma forte Linha de Pesquisa sobre Educação e Linguagem na Pós-Graduação. O pedido de supervisão foi a mim dirigido pela formação literária e interesse pelo ensino de literatura que meu currículo evidenciou para ela. Combinamos, então, que ela ficaria em Belo Horizonte, com imersão nas atividades da FaE, durante o segundo semestre de 2010, voltando a Pelotas em 2011 para escrever um livro sobre o foco de sua pesquisa. O período de imersão nas atividades da FaE é avaliado por mim como muito bem sucedido. Frequentou as reuniões do GPELL, participou das discussões do Grupo, acompanhou a disciplina “Leitura Literária na Escola”, oferecida por mim, integrou atividades do Projeto Tertúlia Literária, frequentou as sessões do “Ceale Debate”, participou de estudos do GEPCE. Além disso, ampliou seus conhecimentos do que ocorria na UFMG, participando da Jornada Jacques Derrida na FALE e de eventos na FAFICH. Estendeu seus horizontes culturais à vida acadêmica e ao patrimônio histórico de arte mineira, com viagens a Ouro Preto, São João Del-Rei, Sabará, Congonhas do Campo. Assistiu a espetáculos da Filarmônica, do Grupo Corpo, do Grupo Galpão. Suas atividades acabaram por incluir a organização de um livro com artigos meus, publicados desde os anos 70 e espalhados muitas vezes por revistas que deixaram de circular. Cristina Maria Rosa conseguiu juntá-los num livro,

(51)

Das leituras ao letramento literário, publicado pela FaE/UFMG e pela UFPEL em 2010. A importância dessa tarefa se revela maior quando pensamos no excesso de trabalho acadêmico que hoje nos toma todo o tempo, obrigando-nos, às vezes, a deixar para trás o que foi escrito e publicado em outra fase da vida. Em março de 2011, Cristina Maria Rosa voltou a Belo Horizonte para participar da Banca de Mestrado de Ludmila Corrêa Bastos, orientada pela Profª. Carmem Lúcia Eiterer. Nessa ocasião, tivemos oportunidade de discutir o encaminhamento que ela estava dando à sua pesquisa, através de entrevistas realizadas com Maria da Glória Bordini, Regina Zilberman, Vera Teixeira Aguiar e Flávio Loureiro Chaves, estudiosos das obras dos autores pesquisados. Revelou-se, então, a quase ausência de atenção ao Meu ABC de Erico Verissimo, o que nos fez acreditar que o livro dela deveria centrar-se nessa cartilha, fazendo menção mais rápida aos outros três autores. O livro de Cristina Maria Rosa já está em execução, com lançamento previsto para outubro nas atividades do “Jogo do Livro”, das quais ela participará com apresentação de trabalho. No final de julho deste ano, recebi pessoalmente o Relatório Final do Pós-Doutorado, que julgo um texto vivo, de leitura agradável, com caráter cultural mais amplo que um frio relatório acadêmico de atividades. Trata-se de uma iniciativa de interferência capaz de recriar um gênero textual, ligando-o à vida do pesquisador como um todo, sem prender-se a formalismos estabelecidos pelo costume e pelo culto à previsibilidade. Considero todo o processo experimentado e trabalhado por Cristina Maria Rosa durante seu Estágio Pós-Doutoral muito bem sucedido, o que honra não só a mim e a meus

(52)

colegas da Linha, como à nossa instituição acadêmica, capaz de atrair pesquisadores ativos, sagazes e criativos. Belo Horizonte, 22 de agosto de 2011. Profª. Maria das Graças Rodrigues Paulino.

Recorto do texto de Graça, para indicar o que nele me impulsionou a consolidar e prosperar em meus projetos de escrita – livre e compromissada, ao mesmo tempo – um parágrafo a respeito de meu relatório final, cujo texto minha orientadora julgou como “um texto vivo, de leitura agradável, com caráter cultural mais amplo que um frio relatório acadêmico de atividades”. E essa “iniciativa” entendeu como “de interferência capaz de recriar um gênero textual, ligando-o à vida do pesquisador como um todo, sem prender-se a formalismos estabelecidos pelo costume e pelo culto à previsibilidade”. Autorizada por essa autoridade no campo de estudos da linguagem, passei a acreditar que havia atingido um tempo de ser a que eu me preparara a vida toda para ser.

Tive, nesse mesmo tempo, que avaliar o trabalho lá desenvolvido e a orientação recebida. Sobre o trabalho, escrevi:

Querida Graça. Decidi avaliar teu trabalho em formato de carta, uma prática letrada do século passado. Por quê? Pela relação que estabelecemos – afetuosa – e por ser tu a única realmente a quem desejo dizer estas palavras. Sei – obviamente – que estas não se

Referências

Documentos relacionados

O desenvolvimento desta pesquisa está alicerçado ao método Dialético Crítico fundamentado no Materialismo Histórico, que segundo Triviños (1987)permite que se aproxime de

Os pesquisadores José Roberto Costa e Regina Maria Pavanello investigam as possibilidades de se estabelecer um processo de desenvolvimento profissional com um grupo de

Como já destacado anteriormente, o campus Viamão (campus da última fase de expansão da instituição), possui o mesmo número de grupos de pesquisa que alguns dos campi

2 - OBJETIVOS O objetivo geral deste trabalho é avaliar o tratamento biológico anaeróbio de substrato sintético contendo feno!, sob condições mesofilicas, em um Reator

Se o examinando montar a figura corretamente dentro do limite de tempo, não aplicar a segunda tentativa, passar para a primeira tentativa do item 6. Se o examinando montar a

Este trabalho buscou, através de pesquisa de campo, estudar o efeito de diferentes alternativas de adubações de cobertura, quanto ao tipo de adubo e época de

No entanto, maiores lucros com publicidade e um crescimento no uso da plataforma em smartphones e tablets não serão suficientes para o mercado se a maior rede social do mundo

O enfermeiro, como integrante da equipe multidisciplinar em saúde, possui respaldo ético legal e técnico cientifico para atuar junto ao paciente portador de feridas, da avaliação