Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
Embrapa Agropecuária Oeste Dourados, MS
2011
Milton Parron Padovan Aldalgiza Inês Campolin
Caminhos
práticas rumo à
para mudanças de processos e
Todos os direitos reservados.
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Embrapa Agropecuária Oeste.
© Embrapa 2011 Padovan, Milton Parron
Caminhos para mudanças de processos e práticas rumo à agroecologia / Milton Parron Padovan, Adalgiza Inês Campolin. - Dourados, MS: Embrapa Agropecuária Oeste, 2011.
51 p. : il. color. ; 20 cm. ISBN 978-85-7540-027-2
1.Agroecologia – Cartilha. I. Campolin, Adalgiza Inês. II. Título. CDD (21.ed.) 630.27419
Supervisão editorial: Eliete do Nascimento Ferreira Revisão de texto: Eliete do Nascimento Ferreira Normalização bibliográfica: Eli de Lourdes Vasconcelos Capa (montagem): Eliete do Nascimento Ferreira Ilustração dos personagens: Thiago Soares Padovan
1ª edição
(2011): 1.000 exemplares
Editoração eletrônica: Eliete do Nascimento Ferreira
1ª impressão
Fone: (67) 3416-9700 - Fax: (67) 3416-9721 www.cpao.embrapa.br
E-mail: sac@cpao.embrapa.br
Comitê de Publicações da Unidade
Presidente: Guilherme Lafourcade Asmus Secretário-Executivo: Alexandre Dinnys Roese
Membros: Claudio Lazzarotto, Éder Comunello, Milton Parron Padovan,
Silvia Mara Belloni e Walder Antonio Gomes de Albuquerque Nunes
Milton Parron Padovan
Biólogo, Dr., pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, Caixa Postal 661, 79804-970 Dourados, MS.
Email: padovan@cpao.embrapa.br Aldalgiza Inês Campolin
Pedagoga, M.Sc., pesquisadora da Embrapa Pantanal, Caixa Postal 109, 79320-900 Corumbá, MS.
A agroecologia, enquanto ciência que é, busca, em última análise, estudar modelos de produção agrícola dentro de uma visão holística, onde o agricultor e sua família são sujeitos de todo o processo; portanto, seus conhecimentos são fundamentais para sustentar todo o desenvolvimento dos princípios agroecológicos. Assim, neste modelo de produção busca-se integrar o conhecimento científico ao popular para o desenvolvimento de um modelo de produção que seja realmente sustentável. A produção agrícola em bases agroecológicas leva em consideração as características do ambiente, a biodiversidade local, os recursos existentes, o saber popular e o conhecimento científico. Para que a produção agrícola seja feita em bases agroecológicas muitos estudos ainda são necessários, considerando a demanda por alimentos, fibras e energia da população, especialmente a brasileira, que pelo processo de urbanização por que passa o Brasil, o rural brasileiro é cada dia menor e, assim, menos gente terá que produzir mais para atender as necessidades crescentes da população. Com a cartilha intitulada “Caminhos para as mudanças de processos e práticas rumo à agroecologia”, a Embrapa Agropecuária Oeste, em parceria com a Embrapa Pantanal, coloca à disposição daqueles que se
de produção fundamentados no Sistema Plantio Direto, na rotação de culturas, no manejo integrado de pragas, doenças e plantas daninhas, dentre outras práticas, ao contrário daqueles onde se faz intensa movimentação do solo, não se utiliza a rotação de culturas, utiliza-se de forma indiscriminada inseticidas, fungicidas e herbicidas, não são sustentáveis.Com esta publicação, a Embrapa espera dar mais uma contribuição através da disponibilização de informações que, se adequadamente incorporadas ao sistema produtivo, será possível uma agricultura realmente sustentável.
Fernando Mendes Lamas Chefe-Geral
Introdução
A mudança de manejos de propriedades rurais rumo à Agroecologia apresenta-se como uma alternativa aos modelos tradicionais de exploração agropecuária, que podem causar problemas ambientais irreversíveis, com sérias implicâncias sociais.
Entretanto, o processo é complexo e requer conscientização e formação dos diferentes atores envolvidos (agricultores e técnicos, entre outros), para a mudança de posturas que resultem na adoção de princípios agroecológicos.
No Brasil, há grande carência de materiais técnico-pedagógicos com linguagem simples, boa profundidade nas abordagens, para dar suporte ao desenvolvimento de trabalhos, principalmente junto a agricultores familiares, escolas e universidades.
Assim, planejou-se esta cartilha sob a forma de “diálogo de saberes”, ou seja, a partir de conhecimentos técnico-científicos aliados aos tradicionais, que passam de geração a geração, onde ambos se complementam.
Optou-se em compartilhar as mensagens contidas no texto através de cinco personagens fictícios (suas entidades e municípios também são fictícios), dialogando entre si, para melhor entendimento do leitor. São eles:
Caminhos
Agricultor ligado à Associação de Produtores Orgânicos do
Assentamento Barra Mansa, em Forte, ES.
Pesquisadora iniciante em Agroecologia, ligada à ONG “Viver com Saúde”, em Campo Grande, MG. Estudante de Agronomia na Universidade do Vale Verde, em São Pedro, PA. Técnico em Agropecuária, egresso da Escola Família Agrícola em Campo Limpo, MS.
ligada à Cooperativa das Mulheres Trabalhadoras Rurais da Comunidade do Córrego Fundo, em Brasília, DF. Marilda Tiago Marlon Flora Virgílio
O que se busca com a mudança para a agroecologia?
Quando se fala da adoção de princípios da agroecologia em propriedades rurais, busca-se uma mudança no sistema de manejo, por meio da implementação de práticas que proporcionem melhorias nos processos produtivos, na qualidade de vida e do meio ambiente. Isso pode ser conquistado através da diversificação de cultivos e de criações de animais, da rotação e consorciação de culturas, do oferecimento contínuo de materiais orgânicos ao solo, da manutenção do solo coberto o ano todo e do redesenho da paisagem, dentre outras práticas.
Ah, quer dizer que a agroecologia incentiva algumas mudanças no comportamento das pessoas... Mas, o que é preciso para essa mudança?
Isso mesmo, Marilda. Não basta apenas "deixar de usar insumos químicos (adubos químicos e agrotóxicos, por exemplo) e começar o uso de produtos naturais, orgânicos"... Iniciar um processo de
mudança significa repensar, a cada dia, a forma de trabalhar a agricultura e a propriedade como um todo, além da
convivência com o próximo e o meio ambiente.
...Pensando bem... trata-se de sensibilização sobre a forma de praticar a agricultura e manejar a propriedade... Uma das primeiras mudanças ocorre "na cabeça" das pessoas, ao se conscientizarem de que é preciso desenvolver e incorporar outros processos na produção agropecuária que evitem a degradação dos recursos naturais, principalmente a flora, a fauna, o solo e os recursos hídricos, e que contribuam para a manutenção das famílias no campo, produzindo e investindo na qualidade de vida. A agroecologia também busca o aumento da produção de alimentos seguros para as pessoas.
Para aprendermos ou reaprendermos alguma coisa é preciso um certo tempo... passo a passo... pois essa mudança ocorre aos poucos em nossa cabeça.
Esses passos seriam...
...começar a compreender que a solução para cada problema
existente no solo, pragas, doenças ou outros encontrados no dia a dia da propriedade não está numa garrafa, galão ou saco, à
disposição em lojas de produtos agropecuários... ...A solução pode estar na frente dos agricultores... na
propriedade... A compreensão e o uso dos conhecimentos que a natureza nos fornece ajuda muito para mudar os processos. A forma de lidar com o solo, as plantas, os animais...enfim...são as "alternativas locais" para solucionar problemas do dia a dia de cada propriedade. Esse é um bom caminho para conquistar autonomia, ou seja, "andar com as próprias pernas".
...A FORÇA DE VONTADE PARA MUDAR É FUNDAMENTAL...
A partir daí, a disposição, o grande desejo de construir uma nova forma de produzir
alimentos e de se organizar é a chave para as mudanças na propriedade e na forma de lidar com o semelhante e os recursos naturais.
Então é muito importante: ... pensar, planejar, buscar novos conhecimentos, trocar ideias e ensinar outras pessoas. Essas ações fundamentais
devem ser praticadas no dia a dia dos agricultores que buscam a agroecologia...
...Deve-se entender que não existe receita pronta para sistemas ecológicos. Cada propriedade possui suas particularidades, ou seja, cada caso é um caso.
Qualquer mudança em nossa vida é sempre difícil, pois traz
insegurança...incertezas. Normalmente fazemos aquilo que estamos
acostumados e assim nos sentimos seguros. A grande saída é a troca de “saberes”, conhecer agricultores que alcançaram o sucesso na mudança para a agroecologia.
Agroecologia é pensar não só no agora, mas pensar que “o futuro depende do que fizemos no passado e o que estamos fazendo no presente”.
Então, agroecologia significa... ...mudança quanto aos valores da terra, do meio ambiente, da família e das pessoas da comunidade... ...E a queda na produtividade durante
a mudança... é uma verdade ou um mito?
Depoimentos de técnicos e experiências de agricultores mostram que "se o agricultor usa monoculturas, altas quantidades de agroquímicos (adubos químicos e agrotóxicos), alcançando elevadas produtividades, devido, principalmente, a esses insumos, certamente a produtividade por cultura poderá cair durante a fase inicial da mudança do sistema ao utilizar princípios agroecológicos", até que o sistema se recupere e alcance um equilíbrio.
Vamos pensar sobre o que fazer nessa situação...
A experiência dos
agricultores e resultados de pesquisa mostram
que, nessa situação, a mudança deve ser lenta, onde o agricultor faz apenas
algumas modificações no manejo por safra...no máximo três grandes mudanças. Por exemplo: plantar adubo verde para produção de bastante palhada, diversificar os cultivos e substituir "parte" dos adubos químicos e agrotóxicos por produtos naturais.
Ouvi dizer que há outras situações em que ocorre aumento de produtividade durante a mudança. É verdade?
Temos consciência de que atualmente há grande quantidade de agricultores descapitalizados e que, por isso, não usam adubos químicos e agrotóxicos.
Nesse caso, se já houver certa diversificação de cultivos e criações, e o solo não estiver muito degradado (pobre), poderá haver aumento de produtividade na maioria das culturas.
Qual seria o motivo principal? Vamos pensar juntos - por exemplo: ao começar a "tratar bem o solo" através da formação de palhada em cobertura, usar
biofertilizantes, defensivos naturais no manejo de insetos indesejáveis (pragas) e doenças nas lavouras e criações, "o sistema receberá benefícios” que não tinha, respondendo com melhores produções...
VAMOS CONTINUAR NA PRÁTICA DA MUDANÇA? O processo que discutiremos a seguir refere-se à busca de mudança da propriedade aos poucos e não pretende ser uma receita, mas apenas chamar a atenção sobre a necessidade de alguns pontos principais que não podem ser esquecidos.
Então é fundamental fazer um replanejamento da propriedade para que a mudança seja bem sucedida...
Isso mesmo! Para planejar as mudanças, é importante discutirmos um roteiro de
possibilidades a serem trabalhadas rumo à Agroecologia...
Assim, um passo a ser dado é o levantamento da situação atual da propriedade... que é o passo inicial para a mudança organizada rumo à agroecologia...corresponde à construção do alicerce de uma casa para durar a vida toda...
Eis algumas dicas para o levantamento:
? Situação atual do solo.
? O que vem sendo feito para manutenção e melhoria do solo. ? Cultivos e criações existentes para subsistência da família. ? Cultivos e criações existentes para a venda (geração de renda). ? Situação geral quanto à diversificação de cultivos.
?Situação quanto ao uso de adubos químicos (quais, como..., a
quanto tempo).
?Situação quanto ao uso de agrotóxicos (quais? - herbicidas,
inseticidas, fungicidas, carrapaticidas, outros...).
? Situação da mata ciliar, reserva legal.
?Mão-de-obra disponível (quantas pessoas trabalham e o tempo
que dedicam).
?Como e onde comercializa os produtos da propriedade
(intermediários, atacadistas, super mercados, feiras).
?Forma de venda dos produtos (sem beneficiamento ou já
beneficiado, com valor agregado).
? Renda anual média alcançada.
?Classificar as fontes de renda (da melhor até a pior). ? Infraestrutura da propriedade (casa, galpões, outras).
? Infraestrutura regional (cooperativas de beneficiamento, grandes
indústrias, inexistência de infraestrutura...).
?Participação em organizações de agricultores (ativo ou só fica à
espera...).
...Vamos colocar no papel, como no exemplo abaixo...
...começar de uma forma bem simples...isso facilita o controle e as correções quando não funciona direito...
Situação atual da propriedade
exemplos
-Situação
desejada O que se pode fazer Período das mudanças
Solo pobre,
desgastado Solo vivo, fértil... Plantio de adubos verdesAproveitamento das palhadas e estercos
Manutenção do solo coberto o ano todo
Diversificação de cultivos
Início imediato Práticas contínuas
Monocultura
de milho Diversificação de culturas e criações
Plantar milho, feijão, hortaliças e adubo verde
Iniciar a criação de vacas de leite Acrescentar o cultivo de soja, bananeira e mandioca...
1ª safra 2º semestre 3º semestre Uso de
herbicidas Não usar herbicida Cultivo de adubos verdes queformam bastante palhada Duas safrasManter a prática Córrego sem
mata ciliar Córrego com mata ciliar Isolar a área próximo ao córrego Coletar sementes da região e produzir mudas Plantar as mudas Imediato 2º semestre Início do 2º ano Continuação ... ... ...
Estou entendendo que há alguns pilares que sustentam a Agroecologia, tais como:
? Família consciente de que a
agroecologia é uma grande saída para a sustentabilidade da Agricultura Familiar...QUERER FAZER...
? Tratamento permanente do SOLO como
um ORGANISMO VIVO...
? Investimento na DIVERSIDADE
BIOLÓGICA...várias espécies de plantas e animais...
? ORGANIZAÇÃO dos agricultores como
a base de sustentação e conquistas...
Aqui já começamos aquelas mudanças que discutimos lá no início dessa conversa...
É importante estarmos conscientes de que fazer a mudança por acreditar que a agroecologia trará
qualidade de vida, por ser uma maneira de "trabalhar a agricultura de forma
limpa", é uma ótima opção, mas poderá encontrar
portas fechadas para a venda dos produtos.
Ao planejar a mudança, é importante que o agricultor esteja agrupado a outros (organizado), e que se informe sobre as normas básicas para a certificação como produtos orgânicos.
A certificação da
propriedade de acordo com a "Lei dos Orgânicos"
garantirá ao agricultor que seus produtos recebam "selo
orgânico".
Vale lembrar que essa lei prevê a utilização de várias práticas e cuidados para que os processos de
produção sejam harmônicos
com o meio ambiente, não haja exploração de mão-de-obra e os produtos não tenham nenhum resíduo químico. Este selo garante a qualidade do produto (credibilidade) para consumidores que não conhecem o agricultor, às vezes até de outras regiões do País ou mesmo do exterior, aumentando as possibilidades de conquistar um mercado especial, que vem crescendo rapidamente.
...é importante ficar atento... há muitos casos por todo o Brasil de agricultores que fazem apenas
algumas pequenas mudanças em suas
propriedades para tentar buscar esse mercado especial dos produtos orgânicos (apenas trocaram insumos químicos por orgânicos) - seus
sistemas de produção encontram-se
biologicamente fracos
(desequilibrados), ou seja, com solos
pobres, baixa diversidade vegetal e animal, facilitando o aparecimento de pragas e doenças.
Estes agricultores ficam "altamente dependentes de defensivos
naturais preparados ou comprados", porém até poderão
receber o "selo orgânico", mas quando encontram as primeiras dificuldades de mercado ou mesmo na produção saem da
Importante... ... quando o agricultor trabalha a mudança
com consciência, por entender que a
Agroecologia é o melhor caminho, a maioria das normas para a certificação são atendidas.
... a troca de experiências com outros
agricultores, aliada ao acompanhamento de
um técnico experiente, garante maior segurança aos agricultores nesse processo de mudança rumo à Agroecologia.
...é importante pensarmos o que pode ser feito daí em diante...
Devemos estar atentos que na mudança de uma propriedade é impossível começar a fazer tudo de uma só vez... a maioria dos que tentam dessa forma se perdem no meio do caminho...ou precisam ter muito dinheiro para essa tarefa...
O melhor caminho, de acordo com a vivência de muitos agricultores e técnicos experientes, seria a identificação dos "pontos-chaves" a serem atacados, ou seja, os problemas mais sérios do sistema atual (antes da mudança) e buscar soluções que resolvam estes e outros problemas de uma só vez.
Exemplo de "ponto-chave" ou grande problema: o solo está desgastado, com pouca matéria orgânica, ficando a maior parte do ano descoberto... Uma boa solução seria o plantio de adubos verdes rústicos, que possuam raízes agressivas e produzam bastante palhada. Os principais benefícios gerados por essa “solução” serão: proteção do solo
contra erosão; manutenção do solo mais fresco; fornecimento de alimento para a maioria das espécies de organismos do solo (bichinhos nossos amigos e das plantas); permanência da umidade do solo durante maior tempo; o solo fica mais “fofo”; melhora a circulação de ar dentro do solo; é uma importante fonte de nitrogênio às plantas cultivadas, quando os adubos verdes são leguminosas; ajuda na diminuição da germinação das plantas espontâneas (inços) e recupera nutrientes que estariam sendo perdidos para camadas mais profundas do solo (ciclagem de nutrientes).
...É muito importante na mudança...
...sempre que identificar um grande problema no levantamento da situação atual da propriedade, deve-se pensar e planejar
soluções.
Os problemas mais importantes nem sempre são de caráter biológico, como "falta de
biodiversidade", físicos ou
químicos (solos
degradados, por exemplo).
Muitas vezes, os maiores problemas referem-se à falta de
conhecimento de práticas ecológicas pelos agricultores
(acha interessante, mas não sabe como fazer), falta de
controle na administração e isolamento das demais pessoas da comunidade e dentro da própria família.
...Vimos uma solução que melhora muitas coisas ao mesmo tempo... assim o agricultor ganha tempo na mudança em sua propriedade... o que vocês acham?
Agora que já conhecemos a situação atual da propriedade, vamos avançar mais. É hora de planejar! Para fazer o planejamento da propriedade e de outros processos «fora da porteira» e da forma de agir...a curto, médio e longo prazo...é importante responder a seguinte questão: onde quero chegar, como e
quando vou agir para chegar na situação desejada (ideal).
Quando o agricultor utiliza adubos químicos e agrotóxicos, é necessária a substituição destes por produtos orgânicos ou até químicos pouco
prejudiciais ao meio ambiente (cama de aviários, fosfatos de rochas, extrato de nim, por exemplo, entre outros), até que o sistema melhore e possa
retirar completamente alguns destes produtos
"temporariamente aceitos", mas que não são as
melhores alternativas para o manejo ecológico num sistema equilibrado.
É importante lembrar que na mudança de propriedades convencionais para adoção de práticas e processos ecológicos, se o agricultor não estiver consciente das vantagens e trabalhar apenas a troca de
insumos químicos (adubos químicos e
agrotóxicos) pelos orgânicos, certamente
desistirá da "mudança" nas primeiras dificuldades.
...a gente sempre deve ter em mente... a partir do início da mudança, a busca do equilíbrio do solo e do ambiente como um todo é
Percebo que a reativação da vida do solo é um processo importantíssimo!
A reativação da vida do solo pode ser obtida através do oferecimento contínuo de materiais orgânicos ao solo (uso da adubação verde, aproveitamento de estercos diversos, aproveitamentos de palhadas existentes na propriedade e resíduos de beneficiamento de produtos agrícolas) e manutenção do solo coberto o ano todo, através de cobertura viva (plantas) e cobertura morta (palhada)...
Isso é importante porque...
...a boa cobertura do solo, através de palhadas
diversas, apresenta efeito altamente positivo... ...em poucos meses a
fauna e os microrganismos do solo aumentam em quantidade e diversidade, resultando em grandes melhorias no solo.
É possível ver essas
melhorias na aparência do solo e também através
do desenvolvimento das culturas plantadas e no rendimento.
Planejamento de uso das áreas da propriedade
No planejamento de uso das
áreas, é fundamental o respeito a cada tipo de solo,
plantando, por exemplo, culturas de ciclo curto, como: milho, feijão, mandioca, soja, entre outras, em áreas mais
planas. Em áreas um pouco declivosas (caídas ou
dobradas, como muitos dizem...) pode-se plantar café, bananeira e outras fruteiras, além de sistemas agroflorestais. Em áreas muito
caídas, se for realizar algum
plantio, aproveitar para reflorestar com árvores nativas da região.
biodiversidade...
Diversificação dos cultivos e
criações na propriedade é uma
estratégia importantíssima, pois ajuda a garantir a "segurança alimentar" às famílias, geração de renda e recuperação da biodiversidade.
Melhoria da paisagem, em geral, consegue-se através do
plantio de árvores, arbustos, flores, entre outras plantas, tanto para fins de produção quanto para aumentar a
biodiversidade na propriedade
rural.
A recuperação de matas ciliares e de outras áreas de
preservação permanente, como nos morros, por exemplo,
além de áreas de reserva legal, é fundamental na melhoria da
A implantação de
quebra-ventos (também chamados
de cercas-vivas ou cordões vegetados), é fundamental na melhoria da
biodiversidade, formação de
um "clima agradável" para as plantas cultivadas e animais criados, além de ajudarem a diminuir e até evitar pragas, doenças e plantas invasoras (inços). É importante implantar os
quebra-ventos logo no início da mudança rumo à
agroecologia (conversão), pois dependendo
da planta utilizada, demora para se formar e fazer os efeitos desejados.
aproveitamento dos benefícios do mato
(plantas daninhas...inços) é importante na
melhoria “rápida” da biodiversidade,
favorecendo o equilíbrio biológico do sistema, além de sua ótima função na
conservação e melhoria da qualidade do solo.
Importante: manter o mato roçado, para não sementear e amadurecer as sementes, pois aumentará o “inço” na área.
É importantíssimo a utilização de variedades de milho, feijão, soja, mandioca, entre outras culturas, adaptadas à região, pois são mais resistentes (pode-se até selecionar e produzir a semente na comunidade, seguindo as recomendações técnicas), além de raças de
animais “rústicos”.
Os agricultores ganharão independência aos poucos (com sementes e raças próprias de animais), além de poderem obter boas produtividades, pois a genética dessas sementes e dos animais, estará adaptada (acostumada) às condições ambientais da região onde a propriedade se localiza.
Integração entre a produção vegetal e a criação de animais... eis mais uma prática muito interessante...
É o aproveitamento de alguns subprodutos da produção vegetal para melhorar a produção animal. Exemplo: as folhas velhas de hortaliças aumentam as doenças se ficarem na horta, mas são excelentes para alimentar as vacas, carneiros, entre outros animais. Por outro lado, os animais fornecem estercos
que são excelentes para a melhoria dos solos...UMA ATIVIDADE AJUDA A OUTRA.
Rotação de Culturas... outra prática que traz muitas vantagens aos agricultores e ao meio ambiente...
A rotação é uma técnica que o agricultor alterna o plantio de culturas, isto é, planta em lugares diferentes no sítio a cada ano, não repetindo o plantio de determinada cultura na mesma área durante um período mínimo de, pelo menos, dois anos. Essa técnica permite a diversificação de culturas ao longo do tempo, resultando em vários benefícios.
de culturas...
A rotação de culturas participa na manutenção e melhoria da quantidade de matéria orgânica do solo, pois cada plantio produz “palhada diferente”, o que favorece a formação de mais matéria orgânica no solo.
Ajuda na prática do “cultivo mínimo”, pois o cultivo diferente a cada safra na mesma área, favorece a formação de palhada sobre o solo.
Com o aumento da matéria orgânica do solo, melhora a sua fertilidade química (evita perdas de nutrientes, mantendo aonde as plantas mais precisam) e as condições físicas do solo (contribui para que o solo fique mais fofo, tenha melhor circulação de ar, segure mais água para as plantas, facilitando o desenvolvimento das raízes).
Fornece alimento diferente a cada safra aos organismos do solo, beneficiando maior número de espécies (ajuda no aumento da biodiversidade do solo).
...Mais vantagens da rotação de culturas... Participa no controle de plantas espontâneas (plantas daninhas), pois a cada cultura diferente que é plantada, “dificulta” o desenvolvimento de muitos tipos de mato, que acabam desaparecendo da área.
Contribui para a diminuição de insetos pragas e doenças nas lavouras, pois a cada “troca de cultura”, acaba o “alimento preferido” de alguns grupos de insetos e de microrganismos causadores de doenças, diminuindo a quantidade dessa “bicharada” que estaria aumentando a cada safra se continuasse com a mesma cultura naquele local.
Consorciação de culturas... eis outra prática importante...
O consórcio de culturas corresponde ao plantio de dois ou mais tipos de plantas ao mesmo tempo, na mesma área, onde cada uma tenha raízes bem diferentes da outra (exemplos: milho, arroz e feijão; milho, feijão e abóbora; café, feijão e amendoim).
É uma prática milenar, bastante utilizada por agricultores que não mecanizam seus cultivos através de trator. Traz vários benefícios aos sistemas ecológicos e às famílias envolvidas.
Nesse sistema poderá haver competição entre as culturas por água, nutrientes e até pelo sol, que diminuirá um pouco a produtividade final de cada uma, mas a produção por área será muito maior do que se plantar cada uma das culturas em
Vamos pensar sobre algumas vantagens da consorçiação de
culturas...
Com a consorciação de culturas, melhora o aproveitamento da energia do sol, pois várias culturas plantadas juntas quase não deixam “espaços vazios”, fazendo com que o “tapete verde” das culturas captem maiores quantidades de raios do sol, possibilitando com que todas cresçam com mais vigor.
Melhora o aproveitamento da água e nutrientes. Ao utilizar culturas que possuem tamanhos e tipos de raízes diferentes, cada uma vai explorar melhor uma determinada área do solo, o que diminuirá as perdas de nutrientes e água para as camadas mais profundas do solo.
Melhora o uso das áreas de produção, pois ao aumentar o aproveitamento da água das chuvas, dos nutrientes existentes no solo e dos raios do sol, normalmente resultará em maior produção por área, necessitando de menos terra para produzir e atender às necessidades de subsistência e de renda da família.
Além disso, a consorciação de
culturas contribui para a conservação do solo de duas formas. Como o solo normalmente fica coberto
rapidamente pelo “tapete verde”
formado pelas culturas consorciadas, protege-o dprotege-o impactprotege-o diretprotege-o das gotas de água das chuvas, do vento e da própria radiação do sol, que possui raios infravermelhos prejudiciais. A outra forma refere-se ao uso de menores áreas cultivadas para atender às necessidades de produção das famílias, “sobrando” mais áreas para as reservas, reflorestamentos, entre outras.
... Veja outras vantagens da consorçiação de culturas
Melhora o controle de plantas espontâneas (plantas daninhas), uma vez que o "tapete verde" formado pelas plantas consorciadas (culturas) "abafa o mato", sobrando poucas espécies que conseguem se desenvolver no meio das culturas.
Diminui proporcionalmente a mão-de-obra com capinas, pois o trabalho passa a ser somente de "catação" do mato que
resistir ao abafamento. Além disso, a necessidade de menores áreas de cultivo, resultará em menos trabalho para controlar o mato nas lavouras.
Diminui a ocorrência de pragas e doenças nas lavouras, pois cada bichinho (insetos, microrganismos ou outros) tem sua preferência alimentar e a maioria busca seu alimento através do cheiro. Quando tem várias plantas no mesmo local, cada uma libera um cheiro diferente, "confundindo a bicharada", que terá maior dificuldade para encontrar seu alimento, resultando em diminuição na população desses "bichinhos" destruidores das plantas cultivadas. Muitas vezes as plantas mais altas também funcionam como barreira física àqueles insetos que voam mais baixo, dificultando encontrar seu alimento, bem como o seu parceiro para reprodução.
consorciação de culturas é importantíssimo o uso frequente de espécies leguminosas de
adubos verdes.
Uma das vantagens é a grande capacidade que esse grupo de plantas possui de se juntar (associar) a uns bichinhos muito pequenos (alguns tipos de bactérias) que retiram (fixam) nitrogênio do ar, repassam para a planta e quando esta morre e se decompõe, boa parte desse nitrogênio fica na matéria orgânica do
solo, alimentando outras plantas.
...E a questão da mão-de-obra nas propriedades... vamos pensar sobre esse
assunto...
É importante ter a clareza da “mão-de-obra
disponível” para planejar melhor as
atividades de mudança na propriedade, para não ter surpresas desagradáveis de prever tarefas e não conseguir cumprir.
...Um dos princípios da agroecologia é a preparação artesanal de produtos na propriedade (defensivos naturais e biofertilizantes)... Eis uma boa saída... investir no aprendizado
sobre a "preparação
caseira" de biofertilizantes
e outros produtos naturais, à base de plantas, por exemplo, para o controle de pragas e doenças.
Estes produtos são aliados importantes para enfrentar os problemas que surgem, principalmente durante a conversão de um
lidar com essa situação...
O tempo de mudança é um fator importante. Se uma determinada mudança programada no sistema não foi cumprida, há necessidade de correções, senão aumentam as dificuldades no novo manejo como um todo...fica difícil controlar os problemas que surgem...como pragas, por exemplo.
É fundamental que os agricultores estejam conscientes de que a mudança rumo à Agroecologia de uma propriedade isolada é possível, mas é muito mais difícil... o agricultor fica “lutando” o tempo inteiro com pragas e doenças que “vem de fora”, além de “receber sem desejar” grandes quantidades de venenos carregados pelo vento, vindos de outras propriedades.
É importante estar consciente... Se a propriedade estiver muito degradada (solos compactados, ácidos, pobre em nutrientes, desestruturados) e baixa diversidade de plantas (sejam elas cultivadas para produção ou não), o tempo de mudança será muito maior e mais trabalhoso para equilibrar o sistema.
...Veja que interessante! ...mais uma grande vantagem da união... O ideal é que os vizinhos estejam unidos em busca da Agroecologia onde a somatória da mudança de cada
propriedade resulte num reordenamento regional da paisagem,
o que certamente resultará em maior equilíbrio biológico a todos e menos pragas e doenças nos cultivos e criações em cada propriedade.
É importante refletir...
Dedicar atenção especial à agregação de valor aos produtos, ou seja, beneficiar os produtos na propriedade ou na comunidade. Isso aumenta as possibilidades de trabalho no meio rural, o que podemos chamar de “inclusão social”. Ainda mantém a maior porcentagem do valor total de cada produto com a família e, c o n s e q u e n t e m e n t e , m a i o r rentabilidade.
...Comercialização da produção...
... se preparar para evitar surpresas desagradáveis.
Importante “conhecer as possibilidades de comercialização dos produtos orgânicos”, desde o início do planejamento da propriedade, pois ainda não há canais tradicionais de comércio que o consumidor em geral esteja acostumado a comprar.
A partir do diálogo de saberes realizado entre os “diferentes atores”, ficou claro que essa mudança é possível e viável, mas deve ser aos poucos.
Inicialmente, faz-se necessário um processo de conscientização, evoluindo para a capacitação e a adoção de práticas e processos agroecológicos, fazendo uma "transição" passo a passo, até a inserção total na agroecologia.
Como se trata de propriedades rurais, é importante ter a consciência que os "sistemas de produção de base agroecológica" nunca estão totalmente prontos. Quando se alcança um bom nível de equilíbrio, encerra-se a fase mais crítica. No entanto, inicia-se a fase de manutenção e ajustes menores, não menos importantes, que duram para sempre, tendo a natureza a grande referência que sempre deu certo.
Literatura Recomendada
ALTIERI, M. A. Agroecologia: as bases científicas para a agricultura alternativa. Guaíba: Agropecuária, 2002. 592 p.
AQUINO, A. M. de; ASSIS, R. L. de (Ed.). Agroecologia: princípios e técnicas para uma agricultura sustentável. Brasília, DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2005. 517 p.
FEIDEN, A.; ALMEIDA, D. L. de; VITOI, V.; ASSIS, R. L. Processo de conversão de sistemas de produção convencionais para sistemas de produção orgânicos. Cadernos de Ciência e Tecnologia, Brasília, DF, v. 19, n. 2, p. 179-204, 2002.
GLIESSMAN, S. R. Agroecologia: processos ecológicos em agricultura sustentável. Porto Alegre: UFRGS, 2000. 653 p.
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