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Análise de um indicador de vulnerabilidade socioambiental da Região Metropolitana de Campinas no contexto das mudanças climáticas *

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Análise de um indicador de vulnerabilidade socioambiental da

Região Metropolitana de Campinas no contexto das mudanças climáticas

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Humberto Prates da Fonseca Alves

Resumo:

O objetivo geral do presente trabalho é operacionalizar empiricamente o conceito de vulnerabilidade socioambiental, através da construção de indicadores socioambientais, com integração de dados socioeconômicos e demográficos do Censo 2010 do IBGE e de dados que representem áreas de risco ambiental, para identificação e análise de situações de vulnerabilidade socioambiental em escala intraurbana no conjunto de 19 municípios que constituem a Região Metropolitana de Campinas. Para isso, foi construído um índice de vulnerabilidade socioambiental, tendo o setor censitário como unidade de análise, através da combinação entre um indicador de renda domiciliar per capita e um indicador de exposição ao risco ambiental, de modo a operacionalizar as duas dimensões da vulnerabilidade: suscetibilidade e exposição ao risco ambiental. Os resultados mostram que as áreas (setores censitários) com alta vulnerabilidade socioambiental possuem condições socioeconômicas muito piores do que aquelas com baixa vulnerabilidade socioambiental, e que também são significativamente piores do que as áreas que também compartilham da dimensão pobreza, mas não possuem exposição ao risco ambiental de enchentes. Assim, os resultados revelam a existência de intensa concentração e sobreposição espacial de situações de suscetibilidade/pobreza e de exposição a risco ambiental em determinadas áreas da região. Deste modo, no bojo da agenda de pesquisa do GT População, Espaço e Ambiente da Abep, o presente trabalho pretende contribuir com o desenvolvimento de metodologias de integração de dados sociodemográficos e ambientais, através do uso de métodos de geoprocessamento e análise espacial de cartografias digitais, para análise de situações de vulnerabilidade socioambiental às mudanças climáticas, em áreas urbanas e metropolitanas do Brasil.

Palavras-chave: vulnerabilidade socioambiental; indicadores socioambientais; mudanças climáticas; Região Metropolitana de Campinas.

*

Trabalho apresentado no XIX Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em São Pedro/SP – Brasil, de 24 a 28 de novembro de 2014.

Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Campus Guarulhos, Guarulhos, São Paulo, Brasil.

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Análise de um indicador de vulnerabilidade socioambiental da

Região Metropolitana de Campinas no contexto das mudanças climáticas

1. Introdução

O objetivo geral do presente trabalho é operacionalizar empiricamente o conceito de

vulnerabilidade socioambiental, através da construção de indicadores socioambientais, com

integração de dados socioeconômicos e demográficos do Censo 2010 do IBGE e de dados que representem áreas de risco ambiental, para identificação e análise de situações de vulnerabilidade socioambiental em escala intraurbana no conjunto de 19 municípios que constituem a Região Metropolitana de Campinas (Mapa 1).

Mapa 1:

Localização dos 19 municípios que constituem a Região Metropolitana de Campinas

Fonte: IBGE, Malha digital dos municípios brasileiros, 2010.

Vamos operacionalizar o conceito de vulnerabilidade socioambiental, utilizando uma definição que a descreve como a coexistência, cumulatividade ou sobreposição espacial de situações de pobreza e privação social e de situações de exposição a risco ambiental (ALVES, 2006). Para isso, vamos construir e analisar um índice de vulnerabilidade socioambiental,

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através da operacionalização de duas dimensões da vulnerabilidade – suscetibilidade e exposição ao risco ambiental –, combinando um indicador de renda domiciliar per capita com um indicador de exposição ao risco ambiental, tendo o setor censitário do Censo 2010 do IBGE como unidade de análise.

Deste modo, os resultados do trabalho possibilitarão a construção de uma análise atualizada sobre a Região Metropolitana de Campinas em escala intramunicipal e intraurbana, e poderão fornecer subsídios para o planejamento de políticas públicas de mitigação e adaptação a situações de vulnerabilidade social e ambiental na região, no contexto das mudanças climáticas.

Portanto, no bojo da agenda de pesquisa do GT População, Espaço e Ambiente da Abep, o presente trabalho pretende contribuir com o desenvolvimento de metodologias de integração de dados sociodemográficos e ambientais, através do uso de métodos de geoprocessamento e análise espacial de cartografias digitais, para análise de situações de vulnerabilidade socioambiental às mudanças climáticas, em áreas urbanas e metropolitanas do Brasil.

2. Expansão urbana e vulnerabilidade socioambiental na Região Metropolitana de Campinas no contexto das mudanças climáticas: uma breve revisão da literatura

A segunda metade do século XX marcou a aceleração do processo de urbanização no Brasil. Entre as consequências deste processo, pode-se destacar: a formação de regiões metropolitanas; a verticalização e adensamento das áreas já urbanizadas; e a expansão urbana para áreas periféricas (REIS; TANAKA, 2007). Uma parte significativa da literatura sobre a questão urbana no Brasil mostra que esta expansão urbana para as áreas periféricas está relacionada à procura por habitação em áreas com baixo preço da terra, o que provoca um aumento das ocupações precárias como favelas e loteamentos irregulares, em áreas sem infraestrutura e expostas a risco e degradação ambiental. Assim, esta dinâmica de urbanização nas regiões periféricas, através da ocupação ilegal e predatória de terra urbana, faz com que grande parte das áreas urbanas de risco e proteção ambiental, tais como as margens dos cursos d’água, estejam ameaçadas pelas ocupações precárias de uso habitacional de baixa renda, por absoluta falta de alternativas habitacionais, seja via mercado privado, seja via políticas públicas sociais (BONDUKI; ROLNIK, 1982; SMOLKA, 1993; MARICATO, 1996; 2003).

De uma maneira geral, as metrópoles brasileiras são constituídas por uma cidade sede, que concentra as atividades comerciais e de serviços, e pelo processo de formação de periferias urbanas, com funções industriais e residenciais e predomínio de populações de

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baixa renda. Algumas das principais características dessas metrópoles são: a periferização das cidades grandes e médias; a conurbação entre municípios limítrofes; o surgimento de cidades-dormitórios; e a segregação espacial e favelização da população de baixa renda. No período de urbanização mais acelerada dos anos 1960 e 1970, foram criadas inicialmente nove regiões metropolitanas: Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. A partir da Constituição Federal de 1988, a atribuição de criar e institucionalizar regiões metropolitanas passou a ser competência dos Estados. Essa disposição resultou, até o ano de 2000, na criação de 20 novas regiões metropolitanas em todo país. Neste contexto, foi criada a Região Metropolitana de Campinas, através da Lei Complementar n° 870, de 19 de junho de 2000, formada por um conjunto de 19 municípios, que são: Americana, Artur Nogueira, Campinas, Cosmópolis, Engenheiro Coelho, Holambra, Hortolândia, Indaituba, Itatiba, Jaguariúna, Monte Mor, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa Bárbara d’Oeste, Santo Antônio de Posse, Sumaré, Valinhos e Vinhedo (DAVANZO; NEGREIROS, 2006).

O processo de formação e expansão da Região Metropolitana de Campinas é semelhante ao de outras metrópoles do país, com altas taxas de crescimento populacional e expansão urbana para áreas periféricas. Além disso, a urbanização da região também envolveu tanto a verticalização e o surgimento de condomínios fechados horizontais mais voltados para as classes de renda média e alta, como a dispersão da população de baixa renda para bairros periféricos sem infraestrutura urbana e para as favelas. Os principais eixos de expansão urbana acompanham as rodovias mais importantes da região, principalmente as rodovias Anhanguera e Bandeirantes. Isso implica na produção de espaços descontínuos, mas que progressivamente vão configurando um grande aglomerado urbano e intensificando fenômenos como a conurbação, migração intrametropolitana, mobilidade pendular etc. Em particular, no vetor de expansão urbana que abrange a região sudoeste do município de Campinas e os municípios de Sumaré, Hortolândia e Monte Mor, a urbanização é caracterizada pelo forte predomínio de assentamentos precários como favelas e loteamentos irregulares (CUNHA et al., 2006; CUNHA; JIMENEZ, 2006; CAIADO; PIRES, 2006).

Nesse sentido, o expressivo crescimento demográfico e a expansão horizontal das áreas periféricas da Região Metropolitana de Campinas têm contribuído para o aumento da heterogeneidade das periferias e para o aumento da pobreza, vulnerabilidade e desigualdade social e ambiental. De fato, o nível dos problemas sociais e ambientais de determinadas áreas é impressionante, superpondo, em termos espaciais (e sociais), os piores indicadores socioeconômicos com riscos de enchentes e deslizamentos de terra, um ambiente

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intensamente poluído e serviços públicos extremamente ineficientes. Assim, em alguns espaços da periferia, verifica-se intensa concentração de indicadores negativos, que sugerem a presença de “pontos críticos” de vulnerabilidade social (e ambiental), revelando a existência de uma espécie de periferia da periferia (TORRES; ALVES; OLIVEIRA, 2007; TORRES; MARQUES, 2001).

Assim, esses grandes processos de transformação por que têm passado as áreas periféricas da Metrópole de Campinas têm explicitado um crescente entrelaçamento e sobreposição entre problemas sociais e ambientais. Esta sobreposição ou cumulatividade de riscos e problemas socioeconômicos e ambientais representa um desafio para as políticas públicas que, na maioria das vezes, são compartimentalizadas segundo áreas de intervenção setorial. Portanto, o grande número de situações de sobreposição de péssimas condições sociais e sanitárias a riscos e conflitos ambientais torna necessárias abordagens que contemplem as relações e interações entre as dimensões sociais e ambientais da urbanização (ALVES; TORRES, 2006).

Nesse sentido, um conceito que pode ser usado para analisar essas questões é o de

vulnerabilidade socioambiental, que pode ser definido como a coexistência, cumulatividade

ou sobreposição espacial de situações de pobreza/privação social e de situações de exposição a risco e/ou degradação ambiental (ALVES, 2006; 2009).

O termo vulnerabilidade social tem sido utilizado com frequência por grupos acadêmicos e entidades governamentais da América Latina. Parte da visibilidade dos estudos sobre vulnerabilidade social se deve a certa insatisfação com os enfoques tradicionais sobre pobreza e com seus métodos de mensuração, baseados exclusivamente no nível de renda monetária e em medidas fixas, como a linha de pobreza (KAZTMAN et al., 1999).

Outra linha de análise sobre vulnerabilidade tem origem nos estudos sobre desastres naturais (natural hazards) e avaliação de risco (risk assessment). Nesta perspectiva, a vulnerabilidade pode ser vista como a interação entre o risco existente em um determinado lugar (hazard of place) e as características e o grau de exposição da população lá residente (CUTTER, 1994; 1996). A vulnerabilidade também tem se tornado, nos últimos anos, um conceito central para as comunidades científicas de mudanças ambientais globais (IPCC, IGBP, IHDP) e uma categoria analítica importante para instituições internacionais, como algumas agências das Nações Unidas (PNUD, PNUMA, FAO) e o Banco Mundial (KASPERSON; KASPERSON, 2001; ALVES, 2006) 1.

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Porém, não se pode deixar de destacar as diferenças de abordagem entre os estudos sobre vulnerabilidade social e aqueles a respeito da chamada vulnerabilidade ambiental. Na literatura mais sociológica sobre o tema

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É importante destacar que o conceito de vulnerabilidade não trata simplesmente da exposição aos riscos e perturbações, mas também da capacidade das pessoas de lidar com estes riscos e de se adaptar às novas circunstâncias. Nisto reside a importância e a inseparabilidade das dimensões social e ambiental da vulnerabilidade (PANTELIC et al., 2005). Assim, numa perspectiva das Ciências Sociais, a vulnerabilidade pode ser pensada em termos de três aspectos (ou dimensões): grau de exposição ao risco, susceptibilidade ao risco e capacidade de adaptação (ou resiliência) diante da materialização do risco. Nesta perspectiva, as pessoas ou grupos sociais mais vulneráveis seriam aqueles mais expostos a situações de risco ou stress, mais sensíveis a estas situações e com menor capacidade de se recuperar (MOSER, 1998; DE SHERBININ et al., 2007).

No contexto das mudanças climáticas, neste início de século XXI e nas próximas décadas, com cenários de maior frequência e intensidade de eventos extremos como tempestades, furacões, enchentes e secas, as situações de vulnerabilidade socioambiental tendem a crescer significativamente em cidades e áreas metropolitanas, principalmente nos países pobres e em desenvolvimento. Com o lançamento dos relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) em 2007, a questão das mudanças climáticas entrou definitivamente nas agendas da comunidade científica, dos governos e da sociedade civil em quase todos os países do mundo. Contudo, nem todos os aspectos das mudanças climáticas têm sido percebidos com a mesma atenção. Assim, por um lado, a consciência da necessidade de ações para redução das emissões de gases estufa já está relativamente consolidada entre os governos, comunidade científica e sociedade civil, ainda que haja um vasto conjunto de dificuldades, incertezas e conflitos econômicos e políticos para efetiva implementação destas ações. Mas, por outro lado, a premente necessidade de redução da vulnerabilidade às mudanças climáticas ainda é pouco percebida pelos governantes e mesmo pela sociedade civil. Em parte, isto decorre do fato de que a maior parte da presente e futura vulnerabilidade às mudanças climáticas irá se dar nos países pobres e em desenvolvimento, e principalmente nas populações de baixa renda (IPCC, 2007; HUQ et al., 2007).

Para as áreas urbanas, o principal aumento do risco que irá advir das mudanças climáticas será o aumento no número e intensidade de eventos extremos, tais como

(MOSER, 1998; KAZTMAN et al., 1999), a vulnerabilidade social é analisada em relação a indivíduos, famílias ou grupos sociais. Já na geografia e nos estudos sobre riscos e desastres naturais (CUTTER, 1994; 1996), a vulnerabilidade ambiental tem sido discutida em termos territoriais (regiões, ecossistemas). Portanto, esta disparidade entre as duas tradições de estudos sobre vulnerabilidade, em termos de escala e de tipo de objeto de análise, deve ser considerada na construção do conceito de vulnerabilidade socioambiental, o qual pretende integrar as duas dimensões – a social e a ambiental (ALVES, 2006).

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tempestades, secas, ciclones e furacões. As consequências das mudanças climáticas para as áreas urbanas dependerão de diversos fatores, incluindo a vulnerabilidade e a resiliência das populações. Os impactos das mudanças ambientais globais, particularmente os riscos relacionados ao clima, afetam desproporcionalmente as populações pobres e vulneráveis, moradores de favelas e de invasões nas encostas, margens de cursos d’água, áreas mal drenadas ou baixadas litorâneas. Portanto, as situações de vulnerabilidade às mudanças climáticas, principalmente devido ao aumento da intensidade e frequência dos eventos climáticos extremos, poderão se tornar muito graves, especialmente para os grupos populacionais de baixa renda (UNFPA, 2007).

Na Metrópole de São Paulo, modelos de projeção da expansão urbana para as próximas décadas revelam um significativo aumento das situações de risco e vulnerabilidade a enchentes, inundações e escorregamentos de terra no contexto das mudanças climáticas. Tais cenários baseiam-se na hipótese de aumento dos assentamentos precários em áreas de risco ambiental, tais como beiras de rios e córregos e terrenos de alta declividade nas periferias da região. As consequências do aumento de eventos extremos, como enchentes e deslizamentos, deverão atingir o conjunto da população metropolitana. Porém, tais situações devem afetar com mais intensidade e gravidade as populações residentes em locais de maior exposição a riscos ambientais de inundações e escorregamentos, como é o caso de grande parte das favelas da região. Assim, situações de vulnerabilidade, desigualdade e injustiça ambiental (e climática) estarão cada vez mais presentes na Metrópole de São Paulo nos próximos anos e décadas. Cabe destacar que, mesmo numa dimensão bem menor do que a Metrópole paulistana, essas situações também atingirão de maneira crescente a população da Região Metropolitana de Campinas, principalmente aquela residente em áreas periféricas, áreas de risco e assentamentos precários como favelas e loteamentos irregulares (NOBRE; YOUNG, 2011; MILANEZ; FONSECA, 2011).

Tendo em vista as considerações acima, cabe destacar a importância de se desenvolver indicadores, metodologias e análises, que permitam mensurar e quantificar os diferentes graus de vulnerabilidade às mudanças climáticas nas áreas urbanas e metropolitanas, através da identificação e caracterização das áreas de maior risco a desastres naturais e dos grupos populacionais mais vulneráveis, complementando a informação qualitativa proveniente dos órgãos de defesa civil (BRAGA et al., 2006).

Portanto, no contexto de uma agenda brasileira de estudos sobre vulnerabilidade e mudança climática, é fundamental que haja um esforço para o desenvolvimento de metodologias e indicadores para a identificação, caracterização e análise de situações de

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vulnerabilidade socioambiental às mudanças climáticas nas áreas urbanas e metropolitanas do país. Neste sentido, o presente trabalho pretende ser uma contribuição inicial a este esforço. 3. Metodologia

Como foi dito, o objetivo geral do presente trabalho é operacionalizar empiricamente o conceito de vulnerabilidade socioambiental, através da construção e análise de indicadores socioambientais em escala intraurbana (setores censitários), com integração de dados socioeconômicos e demográficos do Censo 2010 do IBGE e de dados ambientais, provenientes de bases cartográficas do meio físico tais como rede hidrográfica, que representem áreas de risco ambiental. A seguir, descrevemos os principais procedimentos metodológicos, utilizados para operacionalizar este conceito, o qual será utilizado na análise empírica que faremos.

Inicialmente, construímos um indicador de exposição ao risco ambiental, tendo o setor censitário como unidade de análise e representando a porcentagem da área do setor sobreposta a áreas de risco ambiental. Estamos considerando como de risco ambiental as áreas às margens de até 50 metros de cursos d´água, sujeitas a enchentes e/ou de doenças de veiculação hídrica 23.

Para construção do indicador de exposição ao risco ambiental, fizemos primeiramente a sobreposição espacial da cartografia das áreas de risco ambiental (margens de até 50 metros de cursos d´água) à malha digital dos setores censitários do Censo 2010 do IBGE dos 19 municípios que constituem a Região Metropolitana de Campinas, através de um Sistema de Informação Geográfica, em projeção UTM e Datum WGS84. Em seguida, calculamos o tamanho e a porcentagem da área de cada setor sobreposta às áreas de risco ambiental (margens de 50 metros de cursos d´água), resultando na seguinte variável quantitativa contínua: porcentagem do território do setor censitário composto de áreas de risco ambiental (sujeitas a enchentes e/ou de doenças de veiculação hídrica). Finalmente, convertemos esta variável contínua numa variável categórica ordinal com duas categorias (dois grupos), usando o seguinte critério: 1) alta exposição ao risco ambiental, para setores com mais de 50% do seu território composto de áreas de risco ambiental; e 2) baixa exposição ao risco ambiental, para setores com menos de 50% do seu território composto de áreas de risco ambiental4 (Mapa 2).

2

A cartografia da rede hidrográfica do Estado de São Paulo foi obtida junto ao DAEE – Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo.

3

Para construção do indicador de exposição ao risco ambiental, utilizamos o software TerraView - Política Social, que foi desenvolvido pelo INPE, através de parceria com o CEM.

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Cabe ressaltar que estamos adotando critérios bastante rígidos para a construção do indicador de exposição ao risco ambiental, ao considerarmos como critério de alto risco mais da metade da área do setor censitário

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Mapa 2:

Sobreposição espacial da cartografia da rede hidrográfica (áreas de risco ambiental) à malha dos setores censitários do Censo 2010 dos 19 municípios da Região Metropolitana de Campinas

(detalhe do município de Campinas)5

Fonte: DAEE, Cartografia da rede hidrográfica do Estado de São Paulo. IBGE, Malha digital dos setores censitários do Censo 2010.

Posteriormente, operacionalizamos o conceito de vulnerabilidade socioambiental, através de um índice de vulnerabilidade socioambiental, construído através da combinação entre um indicador de renda domiciliar per capita e o referido indicador de exposição ao risco ambiental, também tendo o setor censitário como unidade de análise.

Para operacionalizar o conceito de vulnerabilidade socioambiental, partimos de uma definição de Chambers (1989)6, que considera que a vulnerabilidade possui dois lados (ou duas dimensões): 1) exposição ao risco e 2) suscetibilidade ao risco7. Também utilizamos uma

sobreposta a áreas de risco ambiental. Portanto, consideramos que ele é um indicador bastante exigente para representar a exposição ao risco ambiental.

5 Para possibilitar a visualização da sobreposição espacial da cartografia da rede hidrográfica à malha digital dos

setores censitários, foi aplicado um “zoom” em um trecho do município de Campinas.

6

Esta definição é uma versão mais simples do que outras definições de vulnerabilidade (MOSER, 1998; DE SHERBININ et al., 2007), que consideram três elementos constituintes da vulnerabilidade: exposição, suscetibilidade e capacidade de adaptação. Porém, para operacionalizar a dimensão ‘capacidade de adaptação’ seria necessário realizar análises dinâmicas, o que foge do escopo metodológico deste trabalho.

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Para operacionalizar o conceito de vulnerabilidade socioambiental, estamos considerando exposição e suscetibilidade ao risco ambiental.

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definição operacional de vulnerabilidade socioambiental, que a descreve como a coexistência, cumulatividade ou sobreposição espacial de situações de pobreza e privação social e de situações de exposição a risco ambiental (ALVES, 2006).

Estas definições são complementares e foram operacionalizadas através da construção e análise de um ‘índice de vulnerabilidade socioambiental’, que combina as duas dimensões: suscetibilidade e exposição ao risco ambiental. A dimensão ‘exposição ao risco ambiental’ foi operacionalizada através do indicador já descrito acima. Já para operacionalizar a dimensão ‘suscetibilidade’ utilizamos um indicador de renda domiciliar per capita, obtido nos resultados do Universo do Censo 2010, e convertido numa variável categórica ordinal com duas categorias, de maneira a classificar os setores censitários em dois grupos: 1) alta pobreza/suscetibilidade, para setores com renda domiciliar média per capita abaixo de 1 salário mínimo; e 2) baixa pobreza/suscetibilidade, para setores com renda domiciliar média per capita acima de 1 salário mínimo89.

Combinando as duas dimensões – suscetibilidade/pobreza e exposição ao risco ambiental –, geramos o ‘índice de vulnerabilidade socioambiental’, que é uma variável categórica ordinal com quatro categorias/grupos, descritos no Quadro 1.

Apesar das limitações metodológicas apontadas, consideramos que este índice de vulnerabilidade socioambiental é um indicador bastante exigente, que representa bem as duas dimensões da vulnerabilidade socioambiental, e traz avanços metodológicos em relação a trabalhos anteriores em que operacionalizamos o conceito de vulnerabilidade socioambiental (ALVES, 2006; 2009; ALVES et al., 2010; 2011). Também gostaríamos de ressaltar que, ao construirmos este índice de vulnerabilidade socioambiental, através de métodos de geoprocessamento e análise espacial, estamos incorporando o espaço como uma dimensão analítica fundamental do nosso estudo, e não apenas considerando o espaço como mera representação dos dados censitários e ambientais.

8 Em 2010, o valor do salário mínimo era de 510 reais.

9

Vamos utilizar a noção de pobreza como proxy de suscetibilidade, usando a renda domiciliar média per capita do setor censitário como indicador. Ainda que o uso da renda para medir suscetibilidade, pobreza ou vulnerabilidade social possua uma série de limitações conceituais e analíticas, ela ainda é o indicador mais utilizado. Neste trabalho, o uso da renda per capita como proxy de suscetibilidade/pobreza também se deve a restrições metodológicas, devido à renda ser praticamente a única variável socioeconômica disponível nos resultados do Universo do Censo 2010, já que estamos utilizando o setor censitário como unidade de análise.

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Quadro 1

Construção do índice de vulnerabilidade socioambiental, através da combinação das dimensões suscetibilidade/pobreza e exposição ao risco ambiental

Dimensões Índice de Vulnerabilidade Socioambiental Exposição ao risco ambiental Suscetibilidade/ Pobreza ALTA Acima de 50% de áreas de risco ambiental ALTA pobreza/suscetibilidade: renda domiciliar per capita abaixo

de 1 salário mínimo ALTA (Grupo 4) BAIXA Abaixo de 50% de áreas de risco ambiental ALTA pobreza/suscetibilidade: renda domiciliar per capita abaixo

de 1 salário mínimo

MODERADA (com alta pobreza)

(Grupo 3) ALTA

Acima de 50% de áreas de

risco ambiental

BAIXA pobreza/suscetibilidade: renda domiciliar per capita acima

de 1 salário mínimo

MODERADA (com alto risco)

(Grupo 2) BAIXA

Abaixo de 50% de áreas de

risco ambiental

BAIXA pobreza/suscetibilidade: renda domiciliar per capita acima

de 1 salário mínimo

BAIXA (Grupo 1)

Fonte: IBGE, Censo 2010. DAEE, Cartografias da rede hidrográfica do Estado de São Paulo.

4. Operacionalização do conceito de vulnerabilidade socioambiental através da análise do índice de vulnerabilidade socioambiental

A seguir, vamos operacionalizar o conceito de vulnerabilidade socioambiental, através do índice de vulnerabilidade socioambiental, que combina as duas referidas dimensões – suscetibilidade/pobreza e exposição ao risco ambiental –, gerando quatro grupos, descritos no Quadro 1 (ver Metodologia) e representados no Mapa 3.

Classificando os setores censitários nos quatro grupos de vulnerabilidade socioambiental, obtivemos os seguintes volumes populacionais apresentados a seguir. Nas áreas (setores censitários) com baixa vulnerabilidade socioambiental (Grupo 1) residem 2,1 milhões de pessoas, que correspondem a 76,9% da população no ano 2010 dos 19 municípios que constituem a Região Metropolitana de Campinas. Já nas áreas de moderada vulnerabilidade socioambiental [com alto risco] (Grupo 2) vivem 24,9 mil pessoas (meros 0,9% da população metropolitana). Nas áreas de moderada vulnerabilidade socioambiental [com alta pobreza] (Grupo 3) residem 551 mil pessoas (20% da população metropolitana). Por fim, nas áreas de alta vulnerabilidade socioambiental (Grupo 4) vivem 51 mil de pessoas, que correspondem a apenas 1,9% da população da Metrópole de Campinas.

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Mapa 3

Classificação dos setores censitários dos 19 municípios da Região Metropolitana de Campinas nos quatro grupos de vulnerabilidade socioambiental

(detalhe do município de Campinas)10

Fonte: DAEE, Cartografia da rede hidrográfica do Estado de São Paulo. IBGE, Malha digital dos setores censitários do Censo 2010.

Estes números revelam que 77% da população da Região Metropolitana de Campinas residem em áreas com baixa pobreza e baixa exposição ao risco ambiental (Grupo 1), e 20% da população vivem em áreas com alta pobreza e baixa exposição ao risco ambiental de enchentes (Grupo 3). Portanto, apenas cerca de 3% da população metropolitana residem em áreas de risco ambiental de enchentes, seja em áreas com baixa pobreza e alto risco (Grupo 2) ou em áreas com alta pobreza e alto risco (Grupo 4) (Tabela 1)11.

A seguir, fazemos uma análise comparativa dos indicadores socioeconômicos e demográficos dos resultados do Universo do Censo 2010, entre os quatro grupos de vulnerabilidade socioambiental, para observar as expressivas diferenças entre eles, e assim identificar e caracterizar as diferentes combinações de situações de pobreza/suscetibilidade e

10 Para possibilitar a visualização da classificação dos setores censitários nos quatro grupos de vulnerabilidade

socioambiental, foi aplicado um “zoom” em um trecho do município de Campinas.

11 Ainda que estes números sejam pouco expressivos em termos relativos, em valores absolutos eles representam

76 mil pessoas residindo em áreas de risco ambiental de enchentes, sendo que 51 mil pessoas vivem em situação de alta vulnerabilidade socioambiental (Grupo 4).

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de situações de exposição a risco ambiental no conjunto de municípios que constituem a Região Metropolitana de Campinas (Tabela 1).

Tabela 1

Indicadores socioeconômicos e demográficos por categoria de vulnerabilidade socioambiental. Conjunto de 19 municípios da Região Metropolitana de Campinas, 2010

Indicadores socioeconômicos e demográficos ALTA Vulnerabilidade Socioambiental ( Grupo 4 ) MODERADA

(com alta pobreza)

Vulnerabilidade Socioambiental

( Grupo 3 )

MODERADA

(com alto risco)

Vulnerabilidade Socioambiental ( Grupo 2 ) BAIXA Vulnerabilidade Socioambiental ( Grupo 1 ) População residente 51.232 551.119 24.892 2.120.142

Número de domicílios partic. perm. 13.827 154.458 8.329 682.377

Distribuição da população total (%) 1,86 19,99 0,90 76,90

Distribuição do total de domicílios (%) 1,61 17,96 0,97 79,35

Domicílios com coleta de lixo (%) 98,97 99,44 99,90 99,83

Domic. com rede geral de água (%) 98,40 97,25 99,75 97,62

Domic. com rede geral de esgoto (%) 49,06 68,64 92,17 91,10

Domicílios sem iluminação pública (%)* 13,82 3,00 0,86 1,01

Domicílios em rua s/ pavimentação (%)* 24,98 10,71 3,58 1,98

Domicílios c/ esgoto a céu aberto (%)* 13,04 5,87 2,74 0,98

Domicílios c/ lixo nos logradouros (%)* 16,61 3,83 3,71 1,62

Pessoas de cor branca (%) 42,19 47,38 71,95 72,61

Pessoas de cor preta ou parda (%) 57,31 50,87 27,06 26,03

Domicílios com renda per capita de até

¼ salário mínimo (%) 6,61 5,24 1,14 1,01

Domicílios com renda per capita de até

½ salário mínimo (%) 28,12 23,35 6,85 6,71

Renda per capita média (reais) 383 422 1.109 1.103

Renda per capita média (sal. min.) 0,75 0,83 2,17 2,16

População em aglomerados subnormais 44.121 108.898 1.057 7.025

População aglomerados subnormais (%) 86,12 19,76 4,25 0,33

* Não considera os domicílios em aglomerados subnormais.

Fonte: IBGE, Resultados do Universo do Censo 2010 e Malha digital dos setores censitários do Censo 2010. DAEE, Cartografia da rede hidrográfica do Estado de São Paulo.

Inicialmente, comparamos as condições de saneamento básico dos quatro grupos. Como se pode observar na Tabela 1, a coleta de lixo está quase universalizada na Metrópole de Campinas, com os quatro grupos apresentando percentuais próximos de 100% dos seus domicílios com lixo coletado. Já o abastecimento de água mostra que apesar dos níveis de cobertura também estarem próximos da universalidade na metrópole, os dois grupos de alta exposição ao risco ambiental (Grupos 2 e 4) possuem respectivamente 99,8% e 98,4% dos seus domicílios com acesso à rede geral de água, enquanto nos dois grupos de baixa

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exposição (Grupos 1 e 3) o acesso à rede de água não chega a 98% dos domicílios. Assim, curiosamente, constatamos que a falta de acesso à rede de abastecimento de água em algumas poucas áreas da região não pode ser explicada nem pela exposição ao risco ambiental nem pela pobreza, com possivelmente outras razões para estes números (Tabela 1).

Com relação à cobertura de esgoto, as diferenças entre os quatro grupos são consideráveis, e mostram uma forte relação com o grau de vulnerabilidade socioambiental de cada grupo. Assim, enquanto nas áreas com baixa vulnerabilidade socioambiental 91,1% dos domicílios estão ligados à rede geral de esgoto, no grupo de alta vulnerabilidade socioambiental este percentual é de apenas 49,1%, o que revela uma ausência de cobertura da rede de esgoto para mais da metade dos moradores deste último grupo. No Grupo 3 (baixo risco ambiental e alta pobreza), a porcentagem de moradores em domicílios ligados à rede geral de esgoto também é relativamente baixa (68,6%), mas é bem maior do que o grupo de alta vulnerabilidade socioambiental, o que mostra que se a ausência de esgotamento sanitário está relacionada à pobreza, este déficit sanitário é intensificado quando associado à residência em áreas com exposição ao risco ambiental de enchentes. Já o Grupo 2 (alto risco ambiental e baixa pobreza) possui 92,2% dos seus domicílios ligados à rede geral de esgoto.

Se analisarmos as características de entorno dos domicílios, também observaremos importantes diferenças entre os quatro grupos, particularmente do grupo de alta vulnerabilidade socioambiental em relação aos demais. Como mostra a tabela 1, nas quatro variáveis referentes ao entorno dos domicílios (falta de iluminação pública, ruas sem pavimentação, esgoto a céu aberto e lixo nos logradouros), o grupo 4 apresenta percentuais significativamente piores do que os outros grupos, com destaque para ruas sem pavimentação (25% dos domicílios) e presença de lixo nos logradouros (16,6% dos domicílios)12.

No que concerne à cor da pele, a proporção pessoas de cor preta ou parda é significativamente mais alta nos dois grupos de alta pobreza (Grupos 3 e 4), chegando a mais de 57% no conjunto de setores censitários com alta vulnerabilidade socioambiental. Nos grupos de baixa pobreza, esta proporção é bem mais baixa, com apenas 26% no grupo de baixa vulnerabilidade socioambiental.

As diferenças nos indicadores de renda também são bastante expressivas entre os quatro grupos de vulnerabilidade socioambiental. A concentração de domicílios com renda per capita abaixo da linha da pobreza (abaixo de um quarto salário mínimo, inclusive os sem

12 É importante destacar que estas variáveis referentes ao entorno dos domicílios não são medidas para os

domicílios em aglomerados subnormais. Como a grande maioria dos domicílios do grupo 4 estão em aglomerados subnormais, as características de entorno dos domicílios desse grupo certamente são muito mais degradadas do que esses números parciais revelam.

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renda)13 nas áreas de alta vulnerabilidade socioambiental (6,6%) é um pouco maior do que naquelas áreas que também compartilham a dimensão pobreza, mas não estão expostas ao risco ambiental (que são as áreas do Grupo 3, com 5,2%). Já nas áreas de baixa pobreza (Grupos 1 e 2), as porcentagens de domicílios com renda per capita abaixo da linha da pobreza são muito menores, com 1% nas áreas do Grupo 1 (baixo risco ambiental) e 1,1% nas do Grupo 2 (alto risco ambiental).

Se considerarmos o percentual de domicílios com renda per capita abaixo de meio salário mínimo, as diferenças entre os quatro grupos são ainda maiores, com nada menos do que 28,1% dos domicílios nesta situação nas áreas de alta vulnerabilidade socioambiental, contrastando com apenas 6,7% nas áreas de baixa vulnerabilidade socioambiental, o que mais uma vez revela a forte sobreposição de exposição ao risco ambiental e pobreza nos setores do Grupo 414.

Estas diferenças se refletem numa significativa variação da renda domiciliar média per capita entre os grupos de vulnerabilidade socioambiental. Enquanto nas áreas de baixa vulnerabilidade socioambiental, a renda domiciliar per capita média chega a 1.103 reais (2,2 salários mínimos em 2010), nas áreas de alta vulnerabilidade socioambiental a renda domiciliar média per capita é de apenas 383 reais (0,75 salários mínimos)15 (Tabela 1).

A concentração de população residente em aglomerados subnormais (áreas de favela segundo definição IBGE) é uma variável que expressa muito bem a associação entre pobreza e falta de infraestrutura urbana, e que também possui uma forte vinculação com exposição ao risco ambiental (TASCHNER, 2000). Assim, nas áreas de alta vulnerabilidade socioambiental, nada menos do que 86% da população vive em favelas, o que revela que a esmagadora maioria dos setores censitários classificados neste Grupo 4 (com alta exposição ao risco e alta pobreza) compõem aglomerados subnormais. Já nas áreas que também partilham da dimensão pobreza, mas que não estão expostas ao risco ambiental (classificadas no Grupo 3), o percentual de população residente em aglomerados subnormais é muito mais baixo (19,8%).

Esta expressiva diferença na porcentagem de população favelada entre os dois grupos de alta pobreza (grupos 3 e 4) mostra que a presença de favelas não está associada apenas à

13 Esta linha de pobreza tem sido comumente adotada como referência no Brasil. Ver Rocha (2003). 14

Nos grupos intermediários, os percentuais de domicílios com renda per capita abaixo de ½ salário mínimo) são de 6,9% nas áreas do Grupo 2 (alto risco ambiental e baixa pobreza) e 23,4% nas áreas do Grupo 3 (baixo risco ambiental e alta pobreza).

15 Nos grupos intermediários, a renda domiciliar per capita média é de 1.109 reais (2,2 salários mínimos) nas

áreas do Grupo 2 (alto risco ambiental e baixa pobreza) e de 422 reais (0,8 salários mínimos) nas áreas do Grupo 3 (baixo risco ambiental e alta pobreza). Como foi dito, em 2010, o valor do salário mínimo era de 510 reais.

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pobreza, mas sim à coincidência espacial entre pobreza e exposição a risco ambiental, o que revela a fortíssima concentração e sobreposição de problemas e riscos sociais e ambientais em determinadas áreas, como os setores censitários classificados como de alta vulnerabilidade socioambiental (Tabela 1).

Por fim, nas áreas de baixa pobreza (Grupos 1 e 2), as porcentagens de população residente em aglomerados subnormais são muito baixas, com meros 0,3% nas áreas do Grupo 1 (baixo risco ambiental) e 4,3% nas áreas do Grupo 2 (alto risco ambiental).

Em resumo, os resultados mostram que as áreas (setores censitários) com alta vulnerabilidade socioambiental possuem condições socioeconômicas muito piores do que aquelas com baixa vulnerabilidade socioambiental, e que também são significativamente piores do que as áreas do grupo 3, que também compartilham da dimensão pobreza mas não possuem exposição ao risco ambiental de enchentes.

Entre as variáveis que mais diferenciam as áreas de alta vulnerabilidade socioambiental em relação aos outros três grupos, destacam-se a cobertura de esgoto, as características de entorno dos domicílios e principalmente a população residente em aglomerados subnormais. Nesse sentido, cabe destacar que alguns indicadores socioeconômicos possuem forte relação com a vulnerabilidade socioambiental, tais como população residente em favelas, acesso à rede esgoto e algumas características de entorno dos domicílios (iluminação pública, pavimentação nas ruas, lixo nos logradouros e esgoto a céu aberto). Além disso, nas áreas de alta vulnerabilidade socioambiental (alta exposição ao risco e alta pobreza) praticamente todos os indicadores socioeconômicos são piores do que nas áreas do Grupo 3, as quais também possuem alta pobreza mas não estão expostas ao risco ambiental16.

Portanto, estes resultados mostram que a exposição ao risco ambiental possui uma grande associação com a pobreza, gerando situações de alta vulnerabilidade socioambiental. Uma das principais explicações para isso é a forte presença de aglomerados subnormais (favelas) nas áreas de risco ambiental, que geralmente correspondem a áreas não edificantes, isto é, consideradas impróprias, pelas legislações urbanística e ambiental, para ocupação urbana, seja porque oferecem risco ambiental, seja porque são áreas de preservação permanente. Neste caso, na maioria das vezes, são áreas (públicas ou privadas) invadidas, em geral por assentamentos precários, que se configuram como áreas de favela. Outra possível

16 Criam-se assim situações em que justamente os grupos sociais com maiores níveis de pobreza e privação

social (e portanto com menor capacidade de reação às situações de risco) vão residir nas áreas com maior exposição ao risco ambiental, configurando-se situações de alta vulnerabilidade socioambiental (ALVES, 2006).

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explicação para esta elevada concentração de problemas e riscos sociais e ambientais, nas áreas de alta vulnerabilidade socioambiental, está ligada ao fato de que estas, muitas vezes, são as únicas localidades acessíveis à população de mais baixa renda, pois são muito desvalorizadas no mercado de terras por serem pouco propícias à ocupação, devido às características de risco e falta de infraestrutura urbana (ALVES, 2006; 2009).

5. Considerações Finais

Neste artigo, procuramos operacionalizar empiricamente o conceito de vulnerabilidade socioambiental, através da construção de um índice de vulnerabilidade socioambiental, com integração de dados do Censo 2010 do IBGE e de dados de áreas de risco ambiental, para análise de situações de vulnerabilidade socioambiental em escala intraurbana no conjunto de 19 municípios que constituem a Região Metropolitana de Campinas.

Os resultados revelam que a associação entre pobreza e exposição ao risco ambiental gera situações de alta vulnerabilidade socioambiental, com forte concentração e sobreposição espacial de situações de suscetibilidade/pobreza e de situações de exposição a risco ambiental em determinadas áreas da Metrópole. Assim, a classificação dos setores censitários da Região Metropolitana de Campinas, com base no índice de vulnerabilidade socioambiental, mostrou que as áreas de alta vulnerabilidade socioambiental possuem condições socioeconômicas significativamente piores do que aquelas com baixa vulnerabilidade socioambiental, e mesmo em relação às duas situações intermediárias de moderada vulnerabilidade socioambiental, com destaque para as diferenças em relação à cobertura de esgoto, às características de entorno dos domicílios e à população residente em aglomerados subnormais (favelas). Além disso, esses resultados mostram que mais de 50 mil pessoas vivem nessas áreas de alta vulnerabilidade socioambiental (com alta pobreza e alta exposição ao risco ambiental), o que são resultados relativamente expressivos e preocupantes, tendo em vista os cenários de aumento da intensidade e frequência de eventos extremos nos próximos anos e décadas, no contexto das mudanças climáticas.

Assim, através da construção de indicadores socioambientais, por meio da utilização de metodologias de geoprocessamento e análise espacial, foi possível identificar e caracterizar (em termos quantitativos e espaciais) situações de vulnerabilidade socioambiental nos 19 municípios que constituem a Região Metropolitana de Campinas. Com isso, o presente trabalho traz uma importante contribuição metodológica, ao realizar a integração de fontes censitárias de dados sociodemográficos com cartografias ambientais (áreas de risco), para

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análise da vulnerabilidade socioambiental em escala intraurbana. Cabe ressaltar que estas metodologias e indicadores, que apresentamos neste estudo, podem ser replicados para outras áreas urbanas e metropolitanas do Brasil, uma vez que utilizam a malha digital de setores censitários do Censo 201017. Deste modo, o presente trabalho pretende contribuir e dialogar com estudos que utilizem os resultados do Censo 2010, para identificar e analisar fenômenos e processos de concentração e sobreposição espacial de situações de pobreza e de problemas e riscos sociais e ambientais em escala intraurbana, nos municípios e regiões metropolitanas brasileiros.

Por fim, os resultados do presente trabalho podem fornecer subsídios relevantes para o planejamento de políticas públicas na Região Metropolitana de Campinas, no contexto das mudanças climáticas, ao identificar e caracterizar as áreas críticas, com alta vulnerabilidade social e ambiental, as quais poderiam ser alvo de políticas focalizadas, obtendo-se resultados bastante significativos na redução da vulnerabilidade, tendo em vista que o número de famílias residentes nas áreas de maior vulnerabilidade socioambiental não é tão grande. Nesse sentido, a política habitacional e, principalmente, políticas de urbanização de favelas poderiam ter grande eficácia na redução das situações de alta vulnerabilidade socioambiental na Metrópole de Campinas, uma vez que a maioria das áreas nesta situação é de favelas. Além disso, seria muito importante que as diversas políticas públicas que lidam com as situações de vulnerabilidade socioambiental (políticas de habitação, saneamento e meio ambiente) fossem formuladas (e implementadas) conjuntamente e de maneira integrada, levando em conta a distribuição desigual destas situações no espaço urbano e metropolitano (ALVES, 2006).

6. Referências Bibliográficas

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17 Porém, uma das limitações para o desenvolvimento destas metodologias é a dificuldade de se obter dados de

certos fenômenos e atributos ambientais em escala intraurbana e local, tais como áreas de risco, planícies de inundação, encostas de alta declividade, áreas contaminadas, áreas de preservação permanente, etc. Esta restrição dificulta (ou até impede) a integração de dados sociodemográficos e ambientais em escala intraurbana, o que limita a capacidade analítica de muitos estudos, em particular os estudos empíricos para identificação e caracterização de situações de vulnerabilidade socioambiental em áreas urbanas e metropolitanas. Assim, o preenchimento desta lacuna deveria ser um objetivo importante a ser perseguido por órgãos públicos, como o IBGE, através da produção e disseminação em formato digital de cartas topográficas em escalas espaciais detalhadas (acima de 1:25.000) (ALVES, 2009).

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