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AMBIENTE E SOCIEDADE NO BRASIL

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Academic year: 2021

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DESAFIOS DA ZONA COSTEIRA

E DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Organizadores:

Rogério Santos da Costa e Rodrigo Rodrigues de Freitas

Prefácio de Paulo Freire Vieira

Coleção Debates Inter

disciplinar es XII ~ AMBIENTE E SOCIED ADE | Or ganizador

es: Rogério Santos da Costa e Rodrigo Rodrigues de F

reitas O R G A N I Z A Ç Ã O A P O I O F I N A N C I A M E N T O 9 786588 775097 > ISBN 978-65-88775-09-7

Foco nas zonas costeiras.

Comunidades, escolas, universidades e ONGs vêm se empenhando para suprir a ausência de um Estado que tem a função constitucional de proteger aquilo que é patrimônio do povo brasileiro: a zona costeira.

Os sete capítulos que compõem este livro apresentam trabalhos inéditos rea-lizados em regiões localizadas próximo da zona costeira, incluindo o litoral pa-ranaense, Florianópolis, Sul de Santa Catarina (Tubarão, Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga e Nova Veneza) e Rio Grande do Sul (Viamão). Adicionalmen-te, um capítulo é dedicado a analisar a abordagem decolonial na extensão uni-versitária brasileira.

Na minha opinião, a representação ‘coevolutiva’ ou ‘simbiótica’ das relações de interdependência envolvendo os sistemas sociais e os sistemas ecológicos (oriun-da dos debates pioneiros sobre a temática do ecodesenvolvimento no follow up da Conferência de Estocolmo) vem sendo eclipsada pela difusão midiática de oximoros: desenvolvimento sustentável e economias verdes tornaram-se as duas guras emblemáticas das dinâmicas em curso de ‘transição ecológica’

.

PAULO VIEIRA FREIRE

AMBIENTE E

SOCIEDADE NO BRASIL

Coleção Debates

Interdisciplinares XII

Organizadores

Rogério Santos da Costa

possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Mestre em Administra-ção (UFSC) e Doutor em Ciência Política (UFRGS). Atua na temática da

Transferência de Tecnologia e seus impactos socioeconômicos e ambientais, bem como nas implicações teórico-empíricas das tec-nologias, políticas públicas, relações inter-nacionais, governança e desenvolvimento na relação histórica entre sociedade e am-biente. Atualmente é Docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da UNISUL e Líder do Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em dinâmicas globais e regionais - GIPART.

Rodrigo Rodrigues de Freitas é Biólogo, mestre

em Geografia e Doutor em Ambiente e Sociedade pela Universidade Esta-dual de Campinas (UNI-CAMP). Desempenha as funções de professor per-manente do Mestrado em

Ciências Ambientais, onde orienta na linha de pesquisa em governança ambiental, e no Curso de Ciências Biológicas da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL). É pes-quisador líder do Grupo de Pesquisa em Conservação de Recursos Naturais de Uso Comum (https://grucunisul.blogspot.com.br).

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AMBIENTE E

SOCIEDADE NO BRASIL

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Organizadores: Rogério Santos da Costa e Rodrigo Rodrigues de Freitas

AMBIENTE E

SOCIEDADE NO BRASIL

DESAFIOS DA ZONA COSTEIRA

E DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

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C O N C E P Ç Ã O G R Á F I C A O R T O G R Á F I C A E M E T O D O L Ó G I C AR E V I S Ã O G R A M AT I C A L , Eduardo Faria/Officio

(officio.com.br)

Ana Paula Aguiar dos Santos

(apasrevisao@gmail.com)

INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES SOBRE A OBRA

Todos os capítulos publicados neste livro foram previamente submetidos à avaliação cega pelos pares. A obra foi financiada com recursos próprios da Editora da UNISUL, e de editais da FAPESC e CAPES.

C O M I T Ê E D I T O R I A L

Ana Lucia Alexandre de Oliveira Zandomeneghi

Doutora, UFMA Ana Regina de Aguiar Dutra Doutora, Unisul Benilson Borinelli Doutor, UEL Hermes Moreira Jr. Doutor, UFGD

Karine de Souza Silva Doutora, UFSC Marcia Regina Ferreira Doutora, UFPR Nilzo Ivo Ladwig Doutor, UNESC/UNISUL Rejane Roecker Doutora, Unisul

Rodrigo Rodrigues de Freitas Doutor, Unisul

Rogério Santos da Costa Doutor, UNISUL Taisa Dias Doutora, UFSC William Antonio Borges Doutor, UEM

A52 Ambiente e sociedade no Brasil : desafios da zona costeira e da educação ambiental / organizadores: Rogério Santos da Costa e Rodrigo Rodrigues de Freitas. - Palhoça : Ed. Unisul, 2020.

141 p. : il. ; 21 cm. – (Debates interdisciplinares ; XII) Inclui bibliografias.

ISBN 978-65-88775-09-7

http://dx.doi.org/10.19177/978-65-88775-09-7

1. Educação ambiental. 2. Meio ambiente. I. Costa, Rogério Santos da, 1965-. II. Freitas, Rodrigo Rodrigues de, 1978-.

CDD 21. ed. – 363.7

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul

S E C R E TÁ R I A E X E C U T I V A Alessandra Turnes Soethe

A V E N I D A P E D R A B R A N C A , 2 5 .

FA Z E N D A U N I V E R S I TÁ R I A P E D R A B R A N C A - 8 8 1 3 7 - 2 7 0 – PA L H O Ç A S C F o n e ( 4 8 ) 3 2 7 9 - 1 0 8 8 – Fa x ( 4 8 ) 3 2 7 9 - 1 1 7 0 - e d i t o r a @ u n i s u l . b r

R E I T O R Mauri Luiz Heerdt

V I C E - R E I T O R

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DESAFIOS DA ZONA COSTEIRA E DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO BRASIL PÓS-PANDEMIA

É com muita satisfação e alegria que apresentamos o Livro Ambiente e so-ciedade no Brasil: desafios da zona costeira e da educação ambiental, parte da “Coleção debates interdisciplinares”, que completa a primeira década de existên-cia. Resultado dos desdobramentos do histórico evento Seminário de Pesquisa Interdisciplinar – SPI, que congregou cinco Grupos Temáticos – GTs, quais sejam: GT 1 – Ambiente, Tecnologia e Sociedade, GT 2 – Território, Estado e Políticas Públicas, GT 3 – Direito, Políticas Públicas e Governança, GT 4 – Poder, desenvol-vimento e interações internacionais e o GT 5 – Processos de internacionalização, inovação e projetos.

Essa década do SPI foi marcante para muitos que criaram o evento em 2009, quando buscamos fortalecer nosso Grupo Interdisciplinar de Pesquisa (GIPART) no relacionamento e formação de redes de pesquisa e divulgação científica. O X SPI coroou esse período e mostrou que a ideia original se con-solida cada vez mais, atraindo outras Universidades do Brasil e do mundo. Pela primeira vez, esta edição do evento foi organizada em colaboração com outra IES, a Universidade de Londrina, através do Grupo de Estudos em política e Gestão Socioambiental – GEA, associado ao Programa de Pós-Graduação em Administração dessa Universidade.

Um aprimoramento fundamental desta décima edição do SPI foi a constru-ção de uma página do evento com sistema de submissão online, possibilitan-do agilidade de divulgação e comunicação. Além disto, através desse sistema foi possível realizar a avaliação cega pelos pares, dando maior confiabilidade e relevância para a empreitada.

Nunca antes o debate interdisciplinar sobre a educação ambiental foi tão necessário na zona costeira. A degradação dos ecossistemas costeiros e dos mo-dos de vida das populações tradicionais associadas vêm avançando em ritmo

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acelerado com o desmonte dos órgãos ambientais, aliado à pandemia gerada pela doença covid-19 (Coronavirus Disease 2019). A iniciativa da sociedade civil para impedir o avanço da destruição e retomar a pró-atividade da agenda so-cioambiental brasileira será crucial em um cenário pós-pandemia. Comunidades, escolas, universidades e ONGs vêm se empenhando para suprir a ausência de um Estado que tem a função constitucional de proteger aquilo que é patrimônio do povo brasileiro: a zona costeira.

Apesar da apatia do Governo Federal para garantir um mínimo de atenção às constantes violações ao nosso bem comum, não podemos desmerecer a atua-ção de milhares de servidores públicos de carreira dedicados ao cuidado com o meio ambiente e com as pessoas. Em virtude da determinação desses indiví-duos, existem no litoral sul do Brasil iniciativas do Ministério do Meio Ambiente como o Projeto Pedagógico da Zona Costeira, o Projeto GEF Mar e o Plano de Ação Nacional para Conservação dos Ecossistemas Lacustres e Lagunares (PAN Lagoas do Sul). Cabe mencionar também o papel do destaque do Ministério Público na cobrança das ações de cumprimento da legislação ambiental, como o funcionamento das unidades de conservação.

Os sete capítulos que compõem este livro apresentam trabalhos inéditos realizados em regiões localizadas próximo da zona costeira, incluindo o litoral paranaense, Florianópolis, sul de Santa Catarina (Tubarão, Bacia Hidrográfica do rio Urussanga e Nova Veneza) e Rio Grande do Sul (Viamão). Adicionalmente, um capítulo foi dedicado à análise da abordagem decolonial na extensão uni-versitária brasileira.

Ferreira e Blaszczyk abrem a coletânea apresentando a abordagem decolo-nial e discutindo a sua aplicação na extensão universitária brasileira. Para tanto, as autoras analisam as práticas de extensão como resistência cultural expres-sa no Plano Nacional de Educação (2014-2024), o Plano Nacional de Extensão Universitária (2012), o Plano Nacional de Cultura (2010) e a Resolução n° 7 de 18 de dezembro de 2018.

Serafim e De Freitas, por meio da técnica de grupo focal, buscaram com-preender os obstáculos e as expectativas dos professores para utilizar um Parque Natural urbano inaugurado no entorno da sua escola no município de Tubarão, SC. Esse estudo chega a conclusões similares a Fortes e Marques sobre o potencial ainda pouco utilizado de uso das unidades de conservação

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lisaram as percepções de professores da rede pública sobre o Parque Saint Hilaire, localizado em Viamão, RS. Ambas as pesquisas mostram as unidades de conservação como sendo grandes desconhecidas da comunidade escolar e indicam caminhos para essa integração.

Para encerrar a primeira seção, Alves e De Freitas analisam os desafios da gestão ambiental escolar por meio de um estudo de caso em quatro escolas (três públicas e uma particular). Os autores concluem que fatores como o com-prometimento da direção, o acolhimento da proposta pelo corpo docente e o envolvimento de atores sociais de fora das escolas estiveram presentes nas ini-ciativas mais bem avaliadas.

Demczuk e Grechinski abrem a seção sobre Qualidade Ambiental da Zona Costeira discutindo os mutirões de limpeza de praias como ações mitigadoras dos impactos do lixo no mar. As autoras situam a problemática do lixo nos oceanos e apresentam dados de diferentes iniciativas de limpezas de praias, alertando para o fato de que soluções definitivas requerem mudanças na indústria e de-mais setores da sociedade.

Visando apoiar processos de planejamento e gestão territorial integrada, Dias e colaboradores realizaram uma análise temporal (1986-2016) das mudanças na cobertura arbórea/arbustiva e das áreas urbanizadas na Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga. Os autores demonstram que, no período analisado, 1.240 ha de vegetação arbórea/arbustiva foram convertidos em áreas urbanizadas.

Finalizando esta coletânea, Eichler e colaboradores avaliaram a qualidade ambiental das águas da Baía Norte de Florianópolis, SC. No inverno e na prima-vera, os autores encontraram valores extremamente baixos de oxigênio dissol-vido nas águas inferiores da baía. A situação de hipóxia relatada compromete a biodiversidade marinha por desfavorecer a infauna inferior, gerando um predo-mínio de espécies oportunistas.

Como em todas as outras publicações da “Coleção Debates Interdisciplina-res” oriundos do SPI, os trabalhos selecionados aqui são aqueles que melhor representam os anseios em relação à difusão de conhecimento nas áreas dos GTs e na temática geral do evento, não significando um resultado de “melho-res” trabalhos apresentados e publicados nos Anais do SPI. Desta forma, esta publicação só foi possível pela disponibilidade de todos, os selecionados e os

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não, de colaborarem com a difusão do conhecimento nesta obra. A todos que apresentaram trabalho, somos muito agradecidos.

Gostaríamos de estender esses agradecimentos a todos os envolvidos no evento e na publicação. Uma alusão especial aos ouvintes, que são um dos principais objetivos do SPI e que proporcionaram uma ampla variedade de origens tanto de cursos como de instituições, colaborando para a discussão interdisciplinar da temática proposta e dos temas nos Grupos Temáticos. Agra-decemos ainda à Unisul como um todo, sempre nos dando total apoio para a concretização e continuidade desta proposta de evento e Livro, com destaque para os setores de apoio a eventos, o operacional, os gestores e os funcionários da Unidade Trajano, Pedra Branca, Campus Norte e EaD, à nossa querida e cada vez mais qualificada Editora da Unisul, à Reitoria, Pró-Reitorias e às Direções e Gerências de Campus. Na mesma linha somos muito gratos aos coordenadores dos GTs, aos membros do Comitê Científico do evento e do livro, bem como aos coordenadores de mesas dos debates gerais e dos Grupos Temáticos.

Devemos ainda especial agradecimento às palestrantes, que motivaram o debate e o pensar interdisciplinarmente, aos diversos apoiadores do SPI, às insti-tuições CARI-Unisul de Tubarão, AGETEC, às imprescindíveis e sempre presentes CAPES e FAPESC, à parceiria de nosso co-organizador do X SPI, professor doutor Benilson Borinelli, líder do GEA da UEL. Gostaríamos de deixar especiais agrade-cimentos aos demais co-organizadores desta edição do evento, coordenação, professoras e alunas do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da Unisul, às coordenações e professoras dos diversos Cursos de Graduação dos Campi da Unisul, às pesquisadoras e pesquisadores do Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em dinâmicas globais e regionais – GIPART, do Centro de Estudos em Negócios Internacionais – CENI e do Grupo de Pesquisa em Conservação de Recursos Naturais de Uso Comum – GRUC.

Tubarão, setembro de 2020.

Rodrigo Rodrigues de Freitas Rogério Santos da Costa

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POR UMA ABERTURA ECOCÊNTRICA-TRANSDISCIPLINAR DA ECOPEDAGOGIA NO DEBATE SOBRE O ANTROPOCENO

Desde o início dos anos 1970, a intensificação dos impactos destrutivos das ações antrópicas na ecosfera tornou-se o eixo norteador das pesquisas em ecologia humana. Emergiu um novo olhar integrativo sobre o habitat terrestre, pensado como um macrossistema complexo. Ao longo do tempo, a hibridi-zação progressiva de modelos de análise gerados nas mais diversas áreas de especialização científica e filosófica tem favorecido uma percepção mais nítida da vasta teia de inter-relações recursivas envolvendo os níveis bioecológico e sociocultural de organização dos sistemas vivos. Entre outras, as noções de sis-tema socioecológico, complexidade, auto-organização, incerteza, resiliência ecossistêmica, contraprodutividade estrutural e economia ecológica passaram a impulsionar a formação de uma importante subárea de investigações sobre o binômio ecologia & desenvolvimento.

Mais recentemente, apoiados numa nova geração de modelos de simulação sistêmica e em imagens de satélite cada vez mais sofisticadas, estamos conse-guindo monitorar – em tempo real – as profundas transformações que estão impactando a fisiologia do Sistema-Terra. O neologismo Antropoceno passou a ser utilizado para caracterizar este novo e inquietante estágio de evolução da civilização termo-industrial, no qual predomina uma cosmologia mecanicista articulada a uma ética antropocêntrica-utilitarista. A concentração de CO2 na atmosfera simplesmente explodiu desde o início dos anos 1950, e as mudanças climáticas somadas a uma longa lista de “efeitos perversos” estão comprometen-do (de forma muitas vezes irreversível) as condições básicas de reprodução comprometen-dos sistemas de suporte da vida no planeta. E com a entrada em cena da temática das “novas pandemias emergentes”, a vulnerabilidade das sociedades contem-porâneas está agora estampada em todas as vitrines.

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A perspectiva de um colapso planetário até o final deste século – caso a crença delusiva nas virtudes de um crescimento ilimitado das economias nacio-nais se mantenha como a via áurea a ser seguida – vem se tornando um tema recorrente de reflexão dentro e fora das academias. Mas não obstante a irrupção das noções de crime de ecocídio e de injustiça ecológica nas iniciativas volta-das à elaboração gradual de um Novo Direito Sistêmico, para muitos ícones da pesquisa socioecológica contemporânea (a exemplo de Denis Meadows, Olivier Godard, Dominique Bourg, Jean-Pierre Dupuy, Clive Hamilton ou mesmo James Lovelock), as modalidades usuais de contestação da ordem industrialista-tecno-crática tornaram-se simplesmente derrisórias, permanecendo muito aquém da complexidade embutida nos grandes dilemas do momento. Dada a extraordi-nária força de inércia dos sistemas socioeconômico-tecnológicos globalizados, grande parte das experimentações sociais promovidas há meio século (e nos cinco continentes) em nome de uma mudança radical de rumos têm se mostra-do superficiais, fragmentadas, descontínuas e muitas vezes contraditórias. Elas não estão conseguindo neutralizar os condicionantes estruturais da crise global. Na minha opinião, a representação “coevolutiva” ou “simbiótica” das relações de interdependência envolvendo os sistemas sociais e os sistemas ecológicos (oriun-da dos debates pioneiros sobre a temática do ecodesenvolvimento no follow up da Conferência de Estocolmo) vem sendo eclipsada pela difusão midiática de oximoros: desenvolvimento sustentável e economias verdes tornaram-se as duas figuras emblemáticas das dinâmicas em curso de “transição ecológica”.

Por outro lado, os intérpretes do ecocentrismo na teoria política do ecolo-gismo continuam concentrando seus esforços na decodificação dos mitos fun-dadores da civilização regida pelo mercado. Para tanto, operam com a imagem de uma realidade em transformação contínua, plena de surpresas e mistérios, na qual os seres humanos se identificam com uma comunidade de seres – uma imensa e complexa teia de eventos inter-relacionados, conectando as espécies vivas e o meio abiótico. Esta abertura ecocêntrica-transdisciplinar do pensamen-to ecológico contemporâneo vem gerando novos modelos de aprendizagem transformadora ecologizada e um novo discurso ético-político de cunho trans-gressivo, inspirador de novas práticas de resistência obstinada à volatização do espírito crítico no debate atual sobre “mudanças climáticas”.

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coletânea, organizada por Rodrigo Rodrigues de Freitas e Rogério Santos da Costa no âmbito da Coleção Debates Interdisciplinares, dois aspectos de indiscutível relevância estratégica na agenda de prioridades de pesquisa socioecológica em nosso País atualmente. Por um lado, a elucidação dos principais obstáculos ins-titucionais à consolidação de um estilo de gestão ao mesmo tempo integrada e compartilhada do nosso patrimônio marinho-costeiro. E por outro, a experi-mentação com novas opções ecopedagógicas que fortalecem um novo tipo de diálogo da academia com a sociedade. Todavia, constato que os estudos de caso não chegam a problematizar explicitamente como um imperativo a necessida-de necessida-de uma transfiguração da nossa autocompreensão como seres humanos na Era do Antropoceno – um corretivo que considero essencial à desconstrução da visão de mundo que se tornou hegemônica na modernidade industrialista. Dito de outra forma, trata-se de tornar mais visível daqui em diante, dentro e fora da comunidade científica, a imagem de uma ecologia integral que, a meu ver, poderia em princípio subsidiar a metamorfose cognitiva e cultural que estamos necessitando, agora em caráter emergencial. Deixo assim registrada minha espe-rança de que esse desafio possa ser levado em conta e valorizado nos próximos Seminários de Pesquisa Interdisciplinar organizados pelo Grupo Interdisciplinar de Pesquisa (GIPART) na UNISUL.

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A sustentação da abordagem decolonial

na Extensão Universitária Brasileira por meio

das diretrizes legais do Estado ...

15

Marcia Regina Ferreira e Amanda Blaszczyk

Estudo do meio em parque urbanos

por escolas públicas do entorno ...

35

Letícia Lopes Serafim e Rodrigo Rodrigues de Freitas

Percepções ambientais de professores da

Rede Pública de Viamão – RS para a Unidade

de Conservação Parque Saint Hilaire ...

53

Diovana Daugs Borges Fortes e Denirio Itamar Lopes Marques

Educação ambiental nas escolas: análise dos fatores

de sucesso em iniciativas no Sul de Santa Catarina ...

65

Emanuelle Cruz Alves e Rodrigo Rodrigues de Freitas

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Paula Grechinski e Silvia Turra Grechinski

Análise temporal do uso e cobertura

arbórea/arbustiva e das áreas urbanizadas

na Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga – SC ...

107

Adriano de Oliveira Dias, Danrlei De Conto, Nilzo Ivo Ladwig, Vanessa Dagostim Manenti e Thaise Sutil

Evaluation of seasonal anoxia in Florianopolis Bay

through environmental indicators ...

123

Patrícia Pinheiro Beck Eichler, Audrey Amorim Corrêa, Camilla Gomes da Silva, Diego Xavier, Rogério Santos da Costa, Guido de Gregório Grimaldi e Roberto Barcellos

Organizadores e autores...

136

Índice remissivo ...

140

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O R G A N I Z A D O R E S : R O G É R I O S A N T O S D A C O S T A E R O D R I G O R O D R I G U E S D E F R E I T A S

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A SUSTENTAÇÃO DA ABORDAGEM DECOLONIAL NA EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA BRASILEIRA POR MEIO

DAS DIRETRIZES LEGAIS DO ESTADO

Marcia Regina Ferreira1

Amanda Blaszczyk2

http://dx.doi.org/10.19177/978-65-88775-09-7.15-33

1 INTRODUÇÃO

Ao estudar a extensão universitária na América Latina como resistência cultural e como atividade real de construção de conhecimento por meio de uma ecologia de saberes3, surgem questionamentos acerca de como os planos, diretrizes e leis

incentivam novas abordagens de extensão e quanto eles, de fato, se relacionam com os conceitos de decolonialidade e pesquisa-ação. Passa a existir nesse mo-mento a necessidade de se pensar sobre uma nova abordagem para a extensão com um olhar epistemológico decolonial e participativo, o qual vai ao encontro do pensar sobre a universidade brasileira e como as universidades se relacionam com as comunidades de seu entorno. Enfim, urge pensar partindo de nós mesmos e como as mudanças nos documentos oficiais podem colaborar para uma melhor e mais ampliada forma de interação entre universidade e comunidade.

Essas questões foram aparecendo no desenvolvimento do projeto de pes-quisa “Educação e Vida Sustentável: Um diagnóstico da Extensão universitária na UFPR”, o qual estudou a extensão universitária como instrumento de mu-dança e emancipação na relação entre sociedade e comunidade no que tange à construção do conhecimento em uma expectativa do desenvolvimento de uma extensão universitária participativa. Essa pesquisa desenvolveu um estudo sobre a Universidade Federal do Paraná (UFPR), em especial, na Pró-Reitoria de

1 Professora Associada da Universidade Federal do Paraná – marciareginaufpr@hotmail.com

2 Graduada em Gestão Pública na Universidade Federal do Paraná – amanda.blaszczyk@gmail.com

3 BOAVENTURA, Sousa. S. A universidade no século XXI: para uma reforma democrática e emancipatória da universi-dade. São Paulo: Cortez, 2004

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O R G A N I Z A D O R E S : R O G É R I O S A N T O S D A C O S T A E R O D R I G O R O D R I G U E S D E F R E I T A S

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Extensão e Cultura (PROEC) em relação aos projetos e programas executados pela comunidade acadêmica, analisando como se desenvolvia a extensão na UFPR. Naquele estudo, iniciou-se a análise sobre o Plano Nacional de Educação (PNE)4, o Plano Nacional de Extensão Universitária (PNEU)5 e a Resolução nº 7 de

20186, que regimenta o disposto na Meta 12.7 do Plano Nacional de Educação.

Dentro desse contexto, o presente artigo tem como objetivo refletir acerca da abordagem decolonial na extensão universitária brasileira por meio da con-tribuição das novas diretrizes legais do Estado brasileiro. Para tanto, busca-se no primeiro momento compreender a formulação histórica da extensão, através da contextualização da abordagem assistencialista até a busca da dialogicidade universidade e comunidade; o conceito de indissociabilidade; o surgimento da abordagem participativa, somando a compreensão da institucionalização da extensão por meio do desenvolvimento histórico do Plano Nacional de Educa-ção (PNE 2014-2024), Plano Nacional de Extensão Universitária (PNEU 2012) e Plano Nacional de Cultura (PNC 2010).

Em seguida, busca-se trabalhar a compreensão de como surge o conceito de decolonialidade e pesquisa-ação. Por fim, em um terceiro e último momen-to, analisar quais as perspectivas dentro do Plano Nacional de Educação, Plano Nacional de Extensão Universitária, o Plano Nacional de Cultura, considerando a Resolução n° 7 de 18 de dezembro de 2018, que contribui para a prática de uma extensão cada vez mais decolonial, dialógica e participativa.

2 FORMULAÇÃO HISTÓRICA DA EXTENSÃO

Em um primeiro momento, a extensão no Brasil surge com moldes assisten-cialistas e tem suas primeiras aparições na Universidade Livre de São Paulo, entre 1911 e 1917, no entanto, nesse período, a concepção de extensão era apresentar à sociedade as soluções para os compromissos sociais.

A partir da década de 1960, a extensão passa a se comportar como um di-fusor de conhecimento, pois nesse momento estariam incluídos ao Programa

4 BRASIL. Plano Nacional de Educação – PNE. Ministério da Educação. Brasília, DF: INEP, 2001.

5 BRASIL. Plano Nacional de Extensão Universitária – PNEU. Fórum de pró-reitores de extensão das universidades

públicas brasileiras. 2012

6 BRASIL. Ministério da Educação. RESOLUÇÃO CNE/CES Nº 7, de 18 de dezembro de 2018. Diário Oficial da União, nº 243, de 19 de dezembro de 2018. Seção 1. p. 49 e 50.

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Nacional de Extensão Universitária, projetos como o Projeto Rondon (1967), o qual se trata de um projeto de integração social que envolve a participação voluntária de estudantes universitários na busca de soluções que contribuam para o desenvolvimento sustentável de determinados grupos sociais, projeto esse que é desenvolvido até os dias de hoje.

Essas mudanças ocorridas nas últimas décadas no Brasil têm buscado avançar para uma mudança na prática de extensão universitária. Dentro desse contexto, busca-se romper tanto com a concepção assistencialista de extensão, como com a concepção mercantilista. Essas concepções assistencialista e mercantilista já desenvolvidas na universidade, como abordada pelos autores Ferreira, Silva e Zanatta7, limitam-se a dois aspectos fundamentais: ou (i) giram em torno de

su-prir necessidades sociais emergentes, de programas e atividades que atendem a carentes e desempregados, e assistência técnica e serviços assistenciais, ou (ii) pautam-se em uma extensão que apenas oferece consultorias ou prestação de serviços a empresas e entidades que são objeto de contrato em função de critérios de mercado. Ambas as concepções apresentam escassez de projetos sociais transformadores e trazem à tona o imperativo de a universidade refletir sobre sua função e finalidade, buscando criar respostas institucionais em relação ao espaço da extensão que vem sendo construído nas universidades brasileiras7.

No entanto, até esse momento a extensão não é muito bem entendida como um espaço no qual a universidade atende à sociedade e recebe da so-ciedade, realizando uma troca por meio dos saberes locais de um determinado território de forma horizontal. Nesse período, a universidade ainda se comporta como detentora dos conhecimentos científicos construídos de forma isola-da em que não se valoriza a realiisola-dade local e seus saberes para desenvolver soluções aos problemas de forma pertinente. Segundo Thiollent8, ainda

pre-valece a relação vertical, na qual a extensão apenas oferece consultorias ou prestação de serviços a empresas e entidades que são objeto de contrato em função de critérios de mercado.

7 FERREIRA, R, M.; SILVA, F.; ZANATTA, R. A. Da dialogicidade entre universidade e comunidade: um estudo de caso da extensão universitária a partir do exercício da democracia dialógica na pesquisa-ação. Caderno gestão social, v.3, n.1, p.53-68, jan./jun. 2012.

8 THIOLLENT, M. Extensão universitária e metodologia participativa. II Seminário de Metodologia de Projetos de Extensão. Rio de janeiro: COPPE/ URRJ, 1998.

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O R G A N I Z A D O R E S : R O G É R I O S A N T O S D A C O S T A E R O D R I G O R O D R I G U E S D E F R E I T A S

18

Contudo, a criação da comissão mista CRUTAC/MEC9 consolida através do

Pla-no de Trabalho de Extensão Universitária um Pla-novo conceito de extensão Pla-no qual a define como uma ação institucional voltada para o atendimento das organiza-ções e populaorganiza-ções com um sentido de retroalimentação e trocas do ambiente acadêmico. Apesar dessa possibilidade de interação com as comunidades, essa nova abordagem só se desenvolve e é posta em prática longe da relação vertical universidade/comunidade após a criação do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Brasileiras (FORPROEX)10 e com a indissociabilidade

entre ensino, pesquisa e extensão abordada na Constituição brasileira. Para além disso, é nesse terceiro momento que acontece a institucionaliza-ção da extensão universitária que sustenta uma possível prática de abordagem participativa, por meio do Plano Nacional de Extensão Universitária (PNEU), pois este tem como alguns dos seus objetivos considerar as atividades voltadas para o desenvolvimento, produção e preservação cultural e artística como relevan-tes para a afirmação do caráter nacional; estimular a educação ambiental e o desenvolvimento sustentável; e priorizar práticas voltadas para o atendimento de necessidades sociais. Somando a isso, o PNEU delimita diretrizes e aspectos como o de transformação e impacto social; impacto na transformação do es-tudante; aplicação do princípio de indissociabilidade; interdisciplinaridade e interprofissionalidade; e uma interação dialógica.

3 DECOLONIALIDADE

Os estudos pós-coloniais explicitam que os erros da modernidade vitoriosa nunca foram efeitos perversos, imprevistos, indesejáveis, produtos precoces da incompletude do projeto moderno, mas seus elementos intrínsecos. Combatem assim, na diversidade das correntes e abordagens, qualquer crença

fundamen-talista na universalidade totalitária.11

9 O Centro Rural Universitário de Treinamento e Ação Comunitária denominado CRUTAC na década de setenta tinha como objetivo a segurança e o desenvolvimento nacional.

10 PAULA, ,J. A. A Extensão universitária: história, conceito e propostas. Interfaces - Revista de Extensão, v. 1, n. 1, p. 5-23, jul./nov. 2013.

11 MIGLIEVICH-RIBEIRO, A. M. Por uma razão decolonial: desafios ético-político-epistemológicos à cosmovisão moderna.

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É com base nessa visão, apresentada pelo autor12, que se aborda o

con-ceito de decolonialidade, o qual surge como a principal ideia de se pensar paralelamente ao conteúdo produzido através de uma globalização hege-mônica. Quando pensamos no processo de colonização, os países Sul13 não

foram colonizados apenas territorialmente, mas ao mesmo tempo na cultura de pensar. Essa globalização hegemônica retira a autonomia dos países Sul sobre o seu próprio olhar para si.

O que se segue é um sistema de natureza capitalista que subalterniza tudo, com articulações biológicas e históricas, na natureza e na sociedade, particular àqueles que representam seus modelos e práticas locais em uma natureza oposta culturalmente estabelecida em uma continuidade de separações entre o mundo natural, humano e “sobrenatural”. A abordagem decolonial trata da valorização dos conhecimentos locais, para com seus próprios habitantes; a ideia de que o conhecimento deve ser produzido através de um olhar local; e o ato de bus-car fontes empíricas e metodológicas, no próprio território, na realidade local14.

Para uma melhor compreensão dessa abordagem decolonial, apresenta-se um conjunto de autores denominado por Arturo Escobar15 como grupo de

pes-quisadores da perspectiva teórica que envolve o pensar e entender a Moderni-dade/Colonialidade/Decolonialidade (MCD). O autor apresenta o pensamento decolonial, no entendimento do MCD, como um marco interpretativo mais visível que surgiu nos anos 2000. Relaciona os seguintes pesquisadores como integran-tes do MCD: Aníbal Quijano, Walter Mignolo, Enrique Dussel16, Catherine Walsh17 12 Ibidem.

13 Ao empregar o conceito de Sul e Norte, o qual é usado como alternativa para substituir os conceitos de países subdesenvolvidos e desenvolvidos no mundo, uma vez que a classificação de subdesenvolvido é aplicada pelo olhar eurocêntrico, trabalhamos com o fato de que há sim diferenças entre os países que participam dessas nomenclaturas, no entanto abandonamos a afirmação eurocêntrica de que o conhecimento e desenvolvimento, seja ele econômico, social e científico, é apenas legítimo e correto quando praticado da mesma maneira que é posto no Norte. Tal prática feriu, em um contexto histórico, e fere até hoje os saberes locais do Sul, uma vez que são engolidos pelas condições que a globalização neoliberal eurocêntrica nos submete.

14 ESCOBAR, A. Mundos y conocimientos de otro modo. El programa de investigación de modernid/coloniedad latino-a-mericana. Tabula Rasa, n.1, p.55-86, eneiro/diciembre 2003.

15 ESCOBAR, A. Sentipensar con la tierra. Nuevas lecturas sobre desarrollo, territorio y diferencia. Medellín: Ediciones UNAULA, 2014.

16 DUSSEL, E. Transmodernidade e interculturalidade: interpretação a partir da filosofia da libertação. Soc. Estado, Brasília, v. 31, n. 1, p. 51-73, abr. 2016.

17 WALSH, C. Interculturalidad, conocimentos y decolonialidade. Revista Signo y pensamento, Bogotá-Colombia, v. XXIV, n.46, mayo-juno 2005.

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e Edgardo Lander, os quais introduziram um conjunto de categorias também conhecidas como: colonialidade do poder, colonialidade do saber, colonialidade do ser, descolonização epistêmica e sistema-mundo-colonial. Todos esses pro-cessos de categorias, de análise e construção de conhecimento buscam refletir sobre a forte orientação cultural e epistêmica ocorridas nos sujeitos que rece-beram o processo de colonização na América do Sul.

Uma das principais proposições epistemológicas do grupo MCD é o ques-tionamento da geopolítica do conhecimento, entendida como a estratégia mo-dular da modernidade onde a colonialidade é considerada como constitutiva da modernidade, e não derivada dela18. Ou seja, a colonialidade e

modernida-de são as duas faces da mesma moeda. Não se separa a colonialidamodernida-de da mo-dernidade e da racionalidade construída. Graças a ela, a Europa pôde produzir as ciências humanas com um modelo único, universal e objetivo na produção de conhecimentos, além de deserdar todas as epistemologias da periferia do ocidente. Quijano na década de 1990 já dizia que esse paradigma europeu de conhecimento racional não foi apenas elaborado no contexto deles, mas tam-bém como uma estrutura de poder que implicou a dominação colonial europeia sobre o resto do mundo, em especial a América do Sul19. Há uma relação entre

modernidade, colonização, racionalidade, capitalismo e colonialidade, segundo esses pesquisadores do MCD, que permeiam o território, o gênero e a etnia/raça. Nesse sentido, a obra de Freire, quando analisada nesse contexto de deco-lonidade, apresenta dois conceitos, sendo 1) a colonização cognitiva, que se baseia em uma relação entre o opressor e o oprimido estruturada por crença na autoridade, na estrutura imutável e na miséria como fatalidade20. Tal relação

ocasiona medo e repulsa por parte do oprimido, causando uma experiência existencial dos oprimidos de uma irresistível atração pelo opressor, e isso é de extrema importância para que se relacione como o conhecimento eurocêntrico se estrutura, salientando as características dos oprimidos para Freire, as quais são: (a) a dualidade existencial, por causa de uma introjeção do opressor; e

18 MIGNOLO, W. Histórias Globais/projetos Locais. Colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.

19 QUIJANO, A. Colonialidade Y Modernidade/racionalidade. Peru Indig., v. 29, n.13, p. 11-20, 1992.

20 PENNA, C. Paulo Freire no pensamento decolonial: um olhar pedagógico sobre a teoria pós-colonial latino-americana.

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(b) o fatalismo alongado; e sendo 2) a colonização do ser, que é existente por causa do primeiro, uma vez que ocorre a internalização e naturalização das categorias do eurocentrismo.

Esses conceitos também são apresentados na pedagogia decolonial, os quais buscam achar soluções para romper a colonização cognitiva do ser, que se concentram na superação do eurocentrismo, por meio do questionamento de temas e aspectos da realidade, superando a visão fatalista do mundo, visando produzir conhecimento menos colonizado e excludente e à procura da valori-zação do pensamento fronteiriço, onde a realidade do educando é respeitada e investigada, pressupondo a superação da hierarquia entre os centros produtores e receptores de conhecimento. Visa também à superação da assimetria entre in-vestigadores e investigados. Uma última característica convergente entre a obra de Freire e de Mignolo, um dos pesquisadores decoloniais da América Latina, é a forma como ambos apontam a importância de prestar atenção ao tipo de saber que atende aos oprimidos.

Vale ressaltar que no Brasil a extensão no sentido de comunicação teve com Paulo Freire um avanço, em especial a extensão universitária na Universidade de Recife, através do Serviço de Extensão Universitária, dirigido por esse pedagogo. Nessa época, manifestou-se com clareza a efetiva integração da universidade, da extensão universitária, às grandes questões nacionais, ampliando o que já vinha sendo feito pelos estudantes com a luta pela Reforma Universitária. De fato, é com Paulo Freire que a universidade descobre e desenvolve instrumentos que a aproximam dos setores populares21 e inicia um diálogo com as comunidades,

o qual, no entanto, já na década de 1960, é silenciado com o golpe militar. Essa relação do eurocentrismo para com os países Sul implica a dificuldade de desenvolver uma política social do conhecimento e um reconhecimento do local em que se vive. A política social do conhecimento22 relaciona-se com a

abordagem decolonial de uma maneira simples. Para que seja desenvolvida a decolonialidade, é necessário que a sociedade esteja organizada de uma ma-neira mínima para que ela possa demonstrar suas necessidades, da mama-neira que lhe for cabível.

21 PAULA, op. cit.

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Aí reponta a nova face da pobreza: mais comprometedora que a carência material é a pobreza política, ou seja, a dificuldade extrema de organizar o próprio des-tino com autonomia mínima. O mal maior não será a fome - tecnologicamente fácil de debelar, mas a ignorância, ou seja, a condição de massa de manobra ou

a incapacidade de gerar as próprias oportunidades23.

Esse conceito diz respeito à pobreza política dos sujeitos na sociedade. O autor alega também que o sistema produtivo, ou seja, o sistema capitalista faz com que o sujeito dentro da mais-valia seja interessante em meios de contra-tação, deva produzir mais e melhor, com isso não há a preocupação em dispo-nibilizar para a sociedade uma educação que proporcione senso crítico, o qual seria de extrema importância para que a pobreza política não seja um problema tão grande.

No que tange ao conhecimento local, é importante pensar a sociedade em uma territorialidade, ou seja, que ela seja entendida como parte de um sítio sim-bólico de pertencimento, onde existe a busca da compreensão para entender a complexidade da sociedade em suas diversidades culturais. Durante a análise dessa pesquisa, adicionamos muitos conceitos sobre a valorização dos saberes locais para uma extensão universitária participativa, no entanto, é de igual im-portância entender o que são esses locais e de que maneira se formam, além de procurar entender como os sujeitos se comportam nesses espaços.

A obra denominada Globalização e Diversidade Cultural24 apresenta o

pensa-mento de Zoaul, o qual consiste na elaboração de uma teoria do local, e para isso ele utiliza o conceito dos sítios simbólicos de pertencimento, que são espaços imateriais, cujas características atribuídas fornecem ao sujeito identificação em meio aos grupos sociais. A crítica do autor diz respeito a como a globalização e o pensamento econômico racional, que por sua vez são vistos como uma econo-mia agressiva, sugerem uma sociedade hegemônica que não possui diferenças culturais e ou econômicas.

Tal perspectiva representa um grande desafio e amplia a possibilidade no que diz respeito à construção de novos paradigmas e conhecimentos nos pro-cessos de pesquisa, ensino e extensão. A ideia de que nenhum conhecimento social pode ser totalmente separado dos valores e das crenças que animam os

23 Ibidem.

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fatos e gestos dos atores de um dado lugar questiona os moldes clássicos de racionalidade, o que implica qualquer projeto de desenvolvimento, pois não incorpora a dimensão antropológica dos agentes.

Ante os reflexos da produção científica e tecnológica na América Latina, em especial no Brasil, buscou-se inicialmente resgatar os ensinamentos de Álvaro Vieira Pinto25 quanto à perspectiva epistemológica da ciência e da tecnologia

para construção de conceitos voltados ao pensamento decolonial, movimento importante para o desenvolvimento dos países subdesenvolvidos26.

O pensamento epistemológico decolonial parte do afastamento, libertação e emancipação dos países historicamente colonizados e oprimidos27, pois

verifica--se que a relação antagônica do colonizado e do colonizador impossibilita a cons-tituição de uma identidade plena daquele, devendo esta relação ser superada. Importante mencionar o conceito de Colonialidade do Poder, desenvolvido por Aníbal Quijano e amplamente utilizado pelo grupo latino-americano Modernida-de/Colonialidade, para entender de forma aprofundada o movimento decolonial. O conceito indica que a dominação no âmbito político e econômico pelos colonizadores não se extinguiu com a destruição do sistema colonial, ao con-trário, mantém-se presente através da cultura colonial e pelas estruturas do sis-tema-mundo capitalista moderno/colonial, desta forma, os países periféricos, por uma condição global, permanecem em uma situação colonial em razão de a estrutura mundial estabelecer uma hierarquização étnico-racial28.

A Colonialidade do Poder foi estendida a um nível mais complexo de estru-turação, englobando não só o poder colonial da economia e da política, mas também o controle da autoridade, dos recursos naturais, da subjetividade, do conhecimento, do gênero e da sexualidade dos países periféricos pelos países centrais, envolvendo assim uma colonização na dimensão do poder, do saber e do ser, como dito anteriormente.

A modernidade pauta-se na posição eurocêntrica de superioridade, ou seja, o processo civilizador advém dos países europeus colonizadores, sendo

25 PINTO, Álvaro Vieira. Ciência e Existência: Problemas Filosóficos da Pesquisa Científica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1969.

26 PINTO, Álvaro Vieira. O Conceito de Tecnologia. v. I. Rio de Janeiro: Contraponto, 2005.

27 BALLESTRIN, L. América Latina o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, Brasília, n.11, p. 89-117, maio-ago. 2013.

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permitida a violência diante da resistência dos povos colonizados a esse pro-cesso, estabelecendo, portanto, e adjetivando os países colonizadores/centrais como modernos e os países colonizados/periféricos como atrasados, aqui nas três vertentes: poder, saber e ser. Esse estigma fundamenta bem a colonialida-de do conhecimento, ou seja, o conhecimento colonialida-desenvolvido na mocolonialida-dernidacolonialida-de eurocêntrica assume posição hierárquica superior ao conhecimento periférico, principalmente no campo de ciência e tecnologia.

Outro elemento estudado pelo grupo Modernidade/Colonialidade é o “giro decolonial”, termo destinado ao “movimento de resistência teórico e prático, político e epistemológico”29, pois é nele que consta o pensamento crítico da

es-trutura moderna eurocêntrica, sendo um diagnóstico e prognóstico envolvendo as dimensões do ser, do saber e poder colonial.

A decolonialidade, portanto, é um pensamento filosófico que visa afastar o ranço cultural do fazer ciência e tecnologia através dos países centrais e busca desmistificar o dogma imposto e construído de que o pensamento eurocêntrico seja o verdadeiro, único e absoluto, apontando para várias epistemes.

Não obstante, Álvaro Vieira Pinto30, ao anteceder o grupo

Modernidade/Co-lonialidade, já demonstrava em suas obras uma preocupação genuína com o fortalecimento dos saberes locais como componente essencial ao desenvolvi-mento dos países subdesenvolvidos. O autor defende a importância de o cien-tista possuir consciência sobre a realidade na qual está inserido.

Para que o país que precise libertar-se política, econômica e culturalmente das peias do atraso e da servidão, a apropriação da ciência, a possibilidade de fazê-la não apenas por si mas para si, é condição vital para a superação da etapa da cultura reflexa, vegetativa, emprestada, imitativa, e a entrada em nova fase histórica que se caracterizará exatamente pela capacidade, adquirida pelo homem, de tirar de si as ideias de que necessita para se compreender a si próprio tal como é e para

explo-rar o mundo que lhe pertence, em benefício fundamentalmente de si mesmo31.

A ciência para Álvaro Vieira Pinto, em seu contexto de pensamento, é o instru-mento adequado para libertação do homem e de sua realidade nacional e em razão disto constrói conhecimentos epistemológicos acerca da ciência e da tecnologia.

29 ESCOBAR, 2014, op.cit., p.105. 30 PINTO, 2005, op. cit. 31 PINTO, 2005, op. cit., p.4.

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Relaciona a historicidade nacional e a cultura, pois essa se constitui “uma manifestação histórica do processo de hominização e por isso se desenvolve concomitantemente com este último, até os graus superiores, em que o ca-ráter de ‘humano’ se apresenta como um conteúdo de valor ético”32, ou seja, a

cultura se desenvolve através da relação histórica do homem com o meio em que vive, pois a consciência do homem da manipulação do meio em que vive e o surgimento da ideação projetada, são pontos cruciais no processo de ho-minização do animal.

Entende cultura como produto uma vez que o homem o fabrica e, igualmen-te, um bem de consumo em razão da sua absorção por ele. A cultura, segundo o autor, é como produto do processo produtivo, a noção decisiva é a sua dupla natureza de bem de consumo, enquanto resultado, simultaneamente materia-lizado em coisas e artefatos e subjetivado em ideias gerais, da ação produtiva eficaz do homem na natureza.

Para o autor, atualmente a cultura, por ser um processo de acúmulo de expe-riências pelo homem, se traduz no compêndio imensurado de conhecimentos científicos, criações artísticas, operações técnicas, fabricação de objetos e outras produções da mente humana, desta forma, extrai-se que a ciência integra a cultura.

Nesse sentido da ciência, tecnologia e vida em sociedade, discute-se ainda a ne-cessidade de fazer ciência comprometida por meio da compreensão da vida social e de sua dinâmica33. Os países do Sul precisam de uma ciência própria para

rom-per o colonialismo intelectual, desenvolver a surom-peração do eurocentrismo e gerar o enriquecimento do saber sistêmico e endógeno com base no contexto tropical, pois a prática colonialista deteriora a cultura do país. Esses pesquisadores do Sul consideram que a desigualdade advém diretamente da alienação da cultura atra-vés da divisão do trabalho, estrutura adotada na contemporaneidade, e destacam que, apesar de entenderem o crescimento das sociedades e a necessidade dessa divisão, a elitização da cultura e, logicamente, da ciência gera a concentração do domínio da ciência e impede o desenvolvimento de um país como um todo. Ou seja, eles reivindicam uma justiça cognitiva nos países que foram um dia colônia.

32 Ibidem, p.123.

33 FALS BORDA, O.; MORA-OSEJO, L.E. A superação do Eurocentrismo. Enriquecimento do saber sistêmico e endógeno sobre o nosso contexto tropical. In: BOAVENTURA, Sousa S. Conhecimento prudente para uma vida decente: Um discurso sobre as ciências. São Paulo: Cortez, 2003.

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4 VALORIZAÇÃO DA ABORDAGEM DECOLONIAL DENTRO DAS DIRETRIZES

Para análise, considera-se que a educação, seja ela do nível fundamental ou superior, está submetida a seguir as diretrizes legais. Dessa forma, é necessário entender o desenvolvimento de duas diretrizes em especial, sendo elas: Plano Nacional de Ensino 2014-2024 (PNE); e o Plano Nacional de Cultura (PNC).

Para fins de uma melhor compreensão do que há dentro dessas diretrizes, o Plano Nacional de Educação (PNE) entra em vigor através da Lei n° 13.005, de junho de 2014, e institui o PNE de 2014-2024. A própria história de toda a fomentação e tentativas de instauração do plano já demonstra ideias que buscam uma edu-cação de caráter multidisciplinar, interdisciplinar, participativo e decolonial, uma vez que, quando analisado o PNE 2014, foi possível identificar por meio de uma análise sobre as metas e estratégias dispostas no documento quais têm como consequência dar finalidade à formação de um sistema de educação capaz de produzir conhecimento local, seja no sentido de capacidade de produção cien-tífica do ensino superior, seja na capacitação dos profissionais da área em geral.

Mesmo usando como base os expressos nos incisos do artigo 214 da Consti-tuição, que são: erradicação do analfabetismo; universalização do atendimento escolar; melhoria da qualidade do ensino; formação para o trabalho; promoção humanística, científica e tecnológica do país; e o estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto in-terno bruto, o PNE de 2014-2024, quando estipula suas metas, vai para além do que está estabelecido na constituição.

A meta número 13 tem como tema “Qualidade da educação superior/Titu-lação do corpo docente”, que busca desenvolver o nível da qualidade do ensi-no superior e ampliar a proporção de mestre e doutores. Logo em seguida, na meta número 20, encontramos o objetivo que se faz de grande importância, o qual trata de: ampliar o investimento público em educação pública de forma a atingir no mínimo o patamar de sete por cento do produto interno bruto (PIB).

Durante a análise da estratégia 27 presente na meta 2, “Universalizar o ensino fundamental de nove anos para toda a população de seis a quatorze anos”, per-cebemos que há logo de início uma certa responsabilidade em entender que a instituição escolar deve estar aberta e dispor das condições sociais. E destaca-se

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que “Deve disciplinar, no âmbito dos sistemas de ensino, a organização flexível do trabalho pedagógico, incluindo adequação do calendário escolar de acordo com a realidade local, a identidade cultural e as condições climáticas da região” 3

Dando continuidade, na meta 12, que busca a elevação da taxa bruta de matrícula na educação superior, desenvolvem-se para a concretização dessa meta estratégias como a otimização da capacidade instalada da estrutura física e de recursos humanos das instituições públicas de educação superior: uma expansão da rede federal de educação superior, da rede federal de educação profissional; disponibilização dos cursos noturnos; ampliação das políticas de in-clusão e de assistência estudantil; asseguração de, no mínimo, dez por cento do total de créditos curriculares exigidos para a graduação em programas e projetos de extensão universitária; e a fomentação de estudos e pesquisas que analisem a necessidade de articulação entre formação, currículo, pesquisa e mundo do trabalho, considerando as necessidades econômicas, sociais e culturais do país.

Contudo, a fim de solidificar essa meta, o Ministério da Educação (MEC) em 18 de dezembro de 2018 instituiu por meio da Resolução n° 7 novas diretrizes para extensão universitária brasileira. Logo de início, presente no artigo 3°, é apresentado o conceito de extensão como ferramenta indispensável e totalmen-te atrelada ao ensino e pesquisa, além de reconhecer a função transformadora que as extensões detêm, uma vez que esta é o canal de comunicação entre a comunidade acadêmica e a sociedade a qual a instituição pertence. Uma ex-tensão não revela apenas resultados para um dos agentes, mas sim um efeito para todos os presentes.

Art. 3º A Extensão na Educação Superior Brasileira é a atividade que se integra à matriz curricular e à organização da pesquisa, constituindo-se em processo in-terdisciplinar, político educacional, cultural, científico, tecnológico, que promove a interação transformadora entre as instituições de ensino superior e os outros setores da sociedade, por meio da produção e da aplicação do conhecimento,

em articulação permanente com o ensino e a pesquisa. 32

Para além disso, essa resolução vai ao encontro dos conceitos basilares da abordagem decolonial nos artigos 5° e 6°, os quais estruturam a concepção e a prática das Diretrizes da Extensão na Educação, compostas juntos por 11 inci-sos. Esses serão organizados em quadros relacionando os conceitos importantes que carregam quanto à abordagem decolonial e a abordagens emancipatórias.

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Embora o trabalho de Álvaro Vieira Pinto, como dito anteriormente, não utilize o conceito decolonialidade, o autor lutava pela construção de uma educação de caráter nacional, na qual se manifestasse a consciência crítica nos brasileiros.

Quadro 1 – Art 5° Resolução n° 7 de 18 de dezembro de 2018 Art 5° Resolução n° 7 de 18 de dezembro de 2018 Inciso Conceito Autores

I Interação dialógica Paulo Freire, Boaventura (2003, 2004)

Ferreira, Silva e Zanatta (2012)

II Formação cidadã pela vivência

de seus conhecimentos Escobar (2004, 2014)

III Interculturalidade Walsh (2005)

IV Interdisciplinariedade Alvaro Pinto (1969, 2005)

Fonte: Elaborado pelas autoras, 2019.

Quadro 2 – Art 6° Resolução N° 7 de 18 de dezembro de 2018 Art 6° Resolução N° 7 de 18 de dezembro de 2018 Inciso Conceito Autores

I Formação cidadã crítica do estudante Dussel

II Interculturalidade Walsh (2005)

III Compromisso social da universidade BoaventuraArt (2003,2004)

IV Reflexão ética da dimensão social do ensino

e pesquisa Alvaro Pinto (1969, 2005)

V Contribuição da universidade no

enfrenta-mento das questões sociais da sociedade brasileira

Alvaro Pinto (1969, 2005)

VI Apoio a princípios éticos que expressem o

compromisso social das instituições de ensi-no superior

Boaventura (2003, 2004)

VII Construção de conhecimentos voltados

para o desenvolvimento social, equitativo, sustentável

Pedro Demo (2000), Zaoual (2003)

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Considera-se que o PNE 2014-2024 juntamente com a Resolução n° 7 trazem à luz a importância em se pensar a extensão com uma abordagem decolonial e de pesquisa-ação, onde a proposta e a prática da extensão universitária sejam uma ação realmente dialógica com o grupo que receberá a atividade de extensão. Os conceitos de colonialidade, pesquisa-ação, política social do conhecimento e até mesmo a construção de cidadania não são colocados nesses textos legais de maneira direta, mas se extraem essas concepções dentro das diretrizes. Essa observação mostra como esses elementos estão se tornando cada vez mais pró-ximos da realidade ao serem praticados quando uma extensão é exercida pela universidade buscando essas diretrizes formuladas.

Ao se pensar em todas essas estratégias sendo postas em prática, não há dúvida com relação à ampliação da capacidade de se coproduzir conhecimento acadêmico nas universidades brasileiras. Tal capacidade incitaria também a pro-dução de conhecimento decolonial. Neste sentido, considera-se que as metas do PNE 2014-2024 têm potencialidade para que o conhecimento se torne cada vez mais decolonial, uma vez que é incentivado a ser produzido no Brasil, pois que nessa resolução propõe: Interação dialógica na universidade entre a comu-nidade, elementos já praticados em algumas universidades34, apontando para

necessidade de uma extensão universitária participativa, onde a dialogicidade entre universidade e comunidade fosse o ponto de partida. Além disso, tal re-solução destaca a dimensão social do ensino e a interculturalidade, elementos coerentes aos que desejam um desenvolvimento social no país.

Somando a isso, no Plano Nacional de Cultura, o qual está disposto através da Lei nº 12.343, de 2 de dezembro de 2010, pode-se perceber que este des-taca em suas metas e estratégias de maneira clara e objetiva sua preocupação em promover a cultura de modo que esta promova e enriqueça a cultura local.

Trata de uma política que engloba o fortalecimento de pesquisas no âmbito acadêmico, valorização dos saberes locais, promoção e enriquecimento econô-mico sustentável da cultura brasileira, tudo isso contribuindo fortemente para o processo de decolonialidade.

34 FERREIRA, R, M.; SILVA, F.; ZANATTA, R. Da dialogicidade entre universidade e comunidade: um estudo de caso da extensão universitária a partir do exercício da democracia dialógica na pesquisa-ação. Caderno gestão social, v.3, n.1, p.53-68, jan./jun. 2012.

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Nos objetivos VII, IX e X, o PNC busca estimular a sustentabilidade socioam-biental; desenvolver a economia da cultura, o mercado interno, o consumo cultural e a exportação de bens, serviços e conteúdos culturais; reconhecer os saberes, conhecimentos e expressões tradicionais e o direito de seus detentores.

O PNC busca por meio de estratégias desenvolver mais pesquisas na área cultural, o que de certa forma sustenta o PNE 2014, adiciona estratégia de ampliar e regulamentar as contrapartidas socioculturais, de desconcentração regional, de acesso, de apoio à produção independente e de pesquisa para o incentivo a projetos com recursos oriundos da renúncia fiscal.

Além de promover a defesa de direitos associados ao patrimônio cultural, em especial os direitos de imagem e de propriedade intelectual coletiva de po-pulações detentoras de saberes tradicionais, envolvem-se nessa ação: garantir aos povos e comunidades tradicionais direitos sobre o uso comercial sustentá-vel de seus conhecimentos e expressões culturais; estimular sua participação na elaboração de instrumentos legais que assegurem a repartição equitativa dos benefícios resultantes desse mercado; e estabelecer mecanismos de proteção aos conhecimentos tradicionais e expressões culturais, reconhecendo a impor-tância desses saberes no valor agregado aos produtos, serviços e expressões da cultura brasileira.

Das estratégias ligadas à extensão, ensino e pesquisa, podem-se destacar as metas 1.10.10; 2.7.9; 2.7.13; e 3.4.1, que buscam o incentivo nas pesquisas e elaborações de materiais didáticos e a difusão referente à conteúdos multicultu-rais, éticos e de educação patrimonial, e também buscam incentivar programas de extensão que facilitem o diálogo entre os centros de estudos, comunidades artísticas e movimentos culturais, e a formação de linhas de pesquisa, experi-mentações estéticas e reflexão sobre o impacto socioeconômico e cultural das inovações tecnológicas e da economia global sobre as atividades produtivas da cultura e seu valor simbólico. Além disso, criar bolsas, programas e editais específicos que diversifiquem as ações de fomento às artes, estimulando sua presença nos espaços cotidianos de experiência cultural dos diferentes grupos da população e a promoção de novos artistas.

A importância da decolonialidade se aplica para os três eixos, igualmente, pois quando a universidade fortalece a extensão e a pesquisa com uma abordagem

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decolonial, resulta em um arcabouço para um desenvolvimento de uma abor-dagem decolonial no ensino, a qual está mais enraizada com nossa realidade.

No entanto, embora existam as resoluções e planos nacionais que sustentem esses elementos da abordagem decolonial, não há como fazer com que os pro-fissionais de educação busquem já em sua atuação profissional a aplicação de um ensino-pesquisa-extensão com esses elementos, ou seja, é uma mudança cultural essa nova epistemologia e metodologia acerca da extensão universitária brasileira. Ações de geração de conhecimento considerando o conhecimento local (pautada em uma ecologia de saberes) envolve também um ambiente institucional adequado para isso, na medida em que se não há um ambiente institucional para que essa produção e ação universitária ocorra, o processo será ainda mais lento ou inexistente. Enfim, as leis são importantes, mas as institui-ções também importam.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao entendermos como conhecimentos as diversas epistemes, inicia-se a libertação do espelho eurocêntrico e fica evidente que não há no mundo uma única forma de conhecimento. Essa abordagem compreende alternativa além da integração de valores, métodos e zonas fronteiriças, mostra-se como um trabalho plural, desenvolve sínteses amplas, busca reunir, mas não unifica, de-senvolve o exercício da humildade, sugere uma epistemologia da “alteridade” e, por isso, tem relação tão próxima com a abordagem decolonial (pluriverso).

O método, que pode ser a ampliação da extensão, poderá ser o caminho, percurso epistemológico/metodológico escolhido para a construção desses co-nhecimentos tão necessários na universidade brasileira. Nesse ponto, este ensaio evidencia que a abordagem ou a opção decolonial na construção do conheci-mento oportuniza o entendiconheci-mento histórico e geopolítico (variável conforme o local e em perspectiva), que o método se constrói ao conhecer a realidade a ser estudada e que não há um conhecimento universal e nem métodos universais, o que há é uma pesquisa envolvida. Nesse ponto, as mudanças na extensão nas universidades brasileiras poderão desenvolver a criação de saberes em uma perspectiva da política social do conhecimento, colocando-o em evidência no

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processo de construção de saberes e aprendizagens, os quais poderão envolver uma opção ontológica, epistemológica, metodológica e ético-política.

Assim, acredita-se que tanto o PNE, como o de Cultura e a Resolução n° 7 fomentam novas práticas na universidade brasileira, oportunizando ampliar a forma de construção do conhecimento até agora desenvolvida, e sustentam os elementos da abordagem decolonial. Muitos serão os desafios, no entanto, a formação cidadã do estudante brasileiro perpassa pelo próprio ato de pensar acerca de si mesmo, na dialogicidade entre universidade e comunidade e, tam-bém, na ecologia de saberes e na construção de conhecimentos pertinentes para uma vida decente. Por fim, conclui-se que a abordagem decolonial está ligada de maneira intrínseca a uma valorização dos saberes locais, que por sua vez podem ser correlacionados a uma política social do conhecimento. Por esse motivo, o papel da universidade em disseminar e promover uma nova prática na extensão universitária participativa aplicando as novas diretrizes legais é tão importante, mas será um processo gradual, pois há na ação docente uma cultura colonizadora/colonização cognitiva instituída, e alterá-la para essa abordagem decolonial exigirá mais que leis e resoluções. No entanto, esses documentos apresentados apontam para um avanço na compreensão dos saberes locais, uma possibilidade do rompimento do espelho eurocêntrico e o desenvolvimento de uma política social do conhecimento no Brasil.

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