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PINTURAS DE íNDIOS NO BRASIL CE

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Academic year: 2018

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PINTURAS DE íNDIOS NO BRASIL CENTRAL:

ALTO SUCURIÚ, SERRANÓPOLlS

E CAIAPÔNIA

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MARCUS VINíCIUS BEBER*

RESUMO

O Centro-Oeste representa hoje uma das grandes fronteiras da arqueologia brasileira. Sua posição geográfica e suas condições ambientais favoreceram um florescimento de culturas na pré-história que a arqueologia tem buscado resgatar. Nessa busca, o Instituto Anchietano de Pesquisas empreendeu dois grandes programas: o Programa Arqueológico de Goiás e o Programa Arqueológico do Mato Grosso do Sul. Neste trabalho, buscamos apresentar uma comparação entre as áreas estudadas, especialmente Alto Sucuriú, Serranópolis e Caiapônia.

1 - INTRODUÇÃO

Ao longo dos últimos trinta anos, o Instituto Anchietano de Pesquisas

vem trabalhando nos estados do Centro-Oeste brasileiro, especialmente

Goiás e Mato Grosso do Sul, onde vem desenvolvendo dois grandes

Programas Arqueológicos: o Programa Arqueológico de Goiás e o Programa

Arqueológico do Mato Grosso do Sul. Em ambos os casos houve a

subdivisão em vários projetos, como forma de obter uma amostragem

significativa das áreas em questão.

Neste trabalho apresentamos os dados básicos quanto à arte rupestre

dessas áreas, procurando uma comparação dos motivos encontrados nas

três áreas pesquisadas pelo Instituto Anchietano de Pesquisas ao longo dos

últimos trinta anos.

São enfocadas as seguintes áreas: Alto Sucuriú, no Mato Grosso do

Sul; Serranópolis e Caiapônia, no estado de Goiás.

Para nós, arte rupestre

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é todo testemunho gráfico, deixado por populações

passadas, utilizando como suporte a rocha, sejam paredes de abrigos,

blocos de rocha ou lajedos horizontais.

Apesar das discussões que a utilização desse termo tem levantado na

bibliografia, sua utilização está suficientemente consolidada na comunidade

Científica, e nesse sentido concordamos com Silva (1992, p. 57):

-

s * Instituto Anchietano de Pesquisas / UNISINOS. Caixa Postal 275, CEP 93001-970-ão Leop.oldo, RS, Brasil- Email: beber@pub.unisinos.tche.br

(2)

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o

t e r m o , p o r s i s ó , n ã o é e x p lic a t iv o .

Não temos muitas condições atualmente de responder a boa parte

dessas questões, mas procuramos fornecer elementos que nos ajudem a

encontrá-Ias, para que se possa, então, compreender melhor esse

fenômeno que é a arte rupestre do Planalto Central Brasileiro.

2 - ALTO SUCURIÚ

o

Projeto Alto Sucuriú foi o primeiro dos quatro projetos previstos para

o Programa Arqueológico do Mato Grosso do Sul. Está localizado entre

51° 30' e 53° 22' de longitude oeste e 18° e 19° de latitude sul.

Foram encontrados quatro sítios com arte rupestre: o MS-PA-01; o

MS-PA-02 - também conhecido como "Casa de Pedra"; o MS-PA-03 e por

último o MS-PA-04.

As pinturas estão concentradas preferencialmente em dois dos quatro

sítios, o MS-PA-02, com pouco-menos de 35% das figuras, e o MS-PA-04,

com cerca de 60% das figuras. Nos outros sítios encontra-se o restante das

figuras.

Os grafismos predominantes são as figuras fechadas tanto de base

retangular como elipsóide - 18,61 % e 19,17%, respectivamente; juntas,

chegam a quase 40% das pinturas da área. Se contarmos ainda os tipos

próximos, que são figuras formadas pela combinação de elipses, ou mesmo

outros geométricos fechados, que não formam exatamente elipses ou

retângulos, e contabilizarmos ainda as figuras dos tipos 8 e 9, que devem ter

sido figuras fechadas, quer retângulos ou elipses, mas que foram alteradas

pelas intempéries, o percentual alcança 52,78% das figuras.

As figuras abertas, representadas pelas retas, curvas e pontos, que

se combinam de diferentes formas, representam juntas 26,21 %.

Os tipos naturalistas são poucos, e juntos não ultrapassam 15% do

total. Ocorrem fundamentalmente pisadas de mamíferos, pisadas de aves,

com 5,14% e 5,83% respectivamente. As figuras antropomorfas ocorrem

vinte e duas vezes, ou 3,06% do total das pinturas. São figuras chapadas,

em vermelho; em alguns casos, ocorrem por cima das figuràs geométricas,

indicando terem sido pintadas posteriormente. Algumas medem até cerca de

60cm de comprimento e 46cm de largura. Existem figuras maiores, mas são

poucas.

108 BIBlOS, Rio Grande, 9: 107-116, 1997.

As sobreposições

repre-sentam cerca de 16% das

pinturas, encontradas

predomi-nantemente no sítio MS-PA-04.

As figuras que estão por cima

são na maioria em vermelho e

bordô; já os grafismos que estão

por baixo são nas cores amarelo

ou laranja. As figuras bicolores

aparecem predominantemente

por baixo das outras nos

momentos de sobreposição.

Quanto à distribuição

espacial, parecem ocupar os

espaços claros e acessíveis dos

sítios. Não existem casos de

figuras em áreas de difícil

acesso ou escuras. Estão

distribuídas uniformemente nos

sítios, em abrigos que possuem indícios de ocupação.

As gravações estão

restritas ao sítio MS-PA-02,

onde o arenito mais friável

permite a sua realização.

O Alto Sucuriú, portanto,

apresenta um conjunto de

pinturas que não mostram

cenas. O que predomina são as

pinturas geométricas, de base

tanto elipsóide como retangular.

Em menor quantidade ocorrem

figuras biomorfas, mas ainda

assim completamente estáticas.

A coloração é vermelha

ou bordô, com algumas figuras

bicromáticas de vermelho e

A coloração é fundamentalmente o vermelho e o bordô, em mais de

82% dos casos, obtida a partir do óxido do ferro aplicado em suspensão em

gordura animal ou água. O amarelo, em várias tonalidades, é pouco

freqüente e ocorre quase sempre em combinações bicolores com o

vermelho ou bordô.

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FIGURA 1 - Alto Sucuriú - Mato Grosso do Sul

(3)

amarelo. As figuras biomorfas são claramente posteriores e fornecem um

estrato mais recente sobre as geométricas.

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3 - SERRANÓPOLlS

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FIGURA 3 - Serranópolis - Goiás.

SISLOS, R i oGrande, 9: 107-116, 1997.

110

o

Projeto Paranaíba está inserido no Programa Arqueológico de

Goiás, elaborado a partir de um convênio firmado em 1973 entre o Instituto

Anchietano de Pesquisas, a Universidade do Vale do Rio dos Sinos e o

Instituto Goiano de Pré-História e Arqueologia.

O objetivo básico do Programa está em "amostrar a arqueologia do

estado, insistindo principalmente em elementos cronológicos, distribucionais

e ecológicos" (Schmitz et aI., 1989, p. 16).

Parte dos dados foram publicados em vários trabalhos, especialmente

o de Schmitz, Barbosa, Jacobus e Ribeiro (1989), que reúne a

documentação dos sítios e o trabalho neles realizado .

Na Área Arqueológica de Serranópolis ocorre um total de 1159 signos,

distribuídos em 14 dos 26 abrigos estudados.

As pinturas estão divididas em duas grandes categorias

-geométricas e naturalistas.

Os geométricos são figuras compostas por linhas retas e curvas,

figuras compostas por pontos, retângulos, triângulos, losangos e elipses,

que juntos totalizam 633 figuras, ou 54,62%. Percebe-se a predominância

das elipses, com mais de 20%, seguidas pelas linhas que se encontram em

ângulos retos, retângulos, linhas isoladas e os pontos. Em termos de

preenchimento, são preferencialmente preenchidas por linhas, e

secundariamente cheias e ponteadas, isso quando as figuras são fechadas.

As figuras naturalistas, por sua vez, apresentam um total de 239

figuras, ou 20,62% do total. Os tipos que ocorrem são os quadrúpedes,

anfíbios, figuras ovais com patas, lacertídeos, peixes, aves, pisadas de

aves, figuras estilizadas de animais, figuras humanas e pisadas

antropomorfas. Percebe-se a predominância dos lacertídeos, seguida pelos

anfibios, aves, figuras e pisadas antropomorfas, com mais de 5%, e os

demais com menos que isso.

As figuras naturalistas são cheias na maior parte dos casos, mas

também apresentam preenchimentos como linhas, pontos ou a combinação

de ambos, porém em menor quantidade.

Quanto à coloração, predomina o vermelho com 68,62% das figuras

naturalistas, seguida pelas figuras em marrom, com 22,59%. As pinturas

bicromáticas representam 5,02%. Os grafismos em amarelo contribuem com

2,09% e o branco com 1,26%. Em 0,42% das figuras não há indicação da

Coloração.

As figuras estão distribuídas em 14 dos 26 abrigos estudados, e

concentradas preferencialmente em quatro deles: no GO-JA-01 com 8,63%,

GO-JA-03 com 52,8%, GO-JA-13 com 19,33% e GO-JA-14 com 8,71% .

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Já os petroglifos estão concentrados preferencialmente nos sítios

GO-XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

1 3 , GO-JA-14 e. GO-JA-15, e associados às qualidades do arenito

otucatu, que é bem mais friável, facilitando a realização das gravações.

BIBlOS, R i oGrande, 9: 107-116, 1997.

(4)

Os motivos são formados por linhas retas e curvas que se justapõem

cruzam e/ou se encontram; figuras que lembram pisadas de aves; forma~

elípticas; formas triangulares; círculos ou depressões circulares; pisadas de

felinos; figuras que lembram pés humanos; figuras fechadas sem simetria'

figuras fechadas de tendências quadráticas; ocorrem ainda figuras qU~

lembram escudos, lagartos, estrelas, cruzes, outras formas.

Um elemento que chama bastante a atenção em Serranópolis é a

distribuição das pinturas e petroglifos. As variáveis que definem a seleção

dos locais a serem pintados ou gravados são diferentes, em função do

substrato, ora mais friável, onde são feitas as gravuras, ora mais solidificado, onde são feitas as pinturas.

Dos 14 sítios com arte rupestre, apenas oito apresentam ambas as

manifestações; entretanto, nunca há um equilíbrio: ou predominam pinturas

ou predominam petroglifos.

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4 - CAIAPÔNIA

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FIGURA 3 - Caiapõnia - Goiás.

112 BIBlOS. Rio Grande. 9: 107-116. 1997.

A área arqueológica de Caiapônía está situada entre 16°30' e 16°40'

de latitude sul e 51°40 e 51°20' de longitude oeste, no município de

caiapônia, GO. Foi pesquisada do ponto de vista arqueológico, por ocasião

do Projeto Caiapônia, parte do Programa Arqueológico de Goiás, levado a

termo pelo Instituto Anchietano de Pesquisas, UNISINOS e UCG.

O relatório final dessa etapa foi publicado em 1986, onde pode ser

encontrada toda a documentação, bem como a reprodução dos painéis,

croquis dos sítios, vistas dos blocos e toda a documentação adicional

produzida.

Na região de Caiapônia foram encontrados 42 sítios, a maioria deles

(33) cobertos por pinturas; apenas três possuem gravações.

Os sítios estão concentrados em duas áreas: o Córrego do Ouro, com

27 sítios, dos quais 14 apresentam pinturas e apenas dois deles petroglifos;

as Torres do Rio Bonito, com 14 sítios, 11 deles com pinturas e um com

petroglifos.

Na área do Rio Bonito, foram registradas 2450 figuras. Destas, 73,7%

são geométricas, 11% zoomorfas, 4% antropomorfas, 0,3% fitomorfas e

11% indefinidas. São pintadas preferencialmente em vermelho (80,5%),

alaranjado (14,5%), umas poucas em amarelo (1,5%), preto (0,5%) e

algumas policromáticas (3%).

Na área do Córrego do Ouro, foram registradas 1088 figuras, das

quais 73,3% são geométricas, 9,8% zoomorfas, 5,6% antropomorfas e

11,1% não-definidas.

Nas figuras geométricas ocorrem retas independentes ou que se

cruzam e encontram em diferentes ângulos; curvas que também podem se

cruzar ou encontrar de diferentes formas; pontos que se combinam ora em

linhas, ora formando nuvens ou mesmo figuras; carimbos; triângulos com ou

sem preenchimento interno; retângulos, losangos, círculos, além de outras

formas não-identificadas.

As figuras são formadas por traços ou pontos e raramente chapadas.

Entre as naturalistas, ocorrem peixes, répteis, aves, mamíferos,

antropomorfos e fitomorfos, além de mãos.

Os antropomorfos formam cenas e podem vir isolados, associados ou

justapostos a outras figuras zoomórficas e/ou geométricas.

As figuras zoomorfas, por sua vez, permitem, em alguns casos, a

diferenCiação em nível de classe, percebendo-se mamíferos, répteis, aves e

peixes. Os mamíferos estão representados em perfil com todas as

extremidades visíveis, sugerindo movimento. Percebem-se representações

de macacos, as mais numerosas, veados, antas e felinos. Os répteis são

representados pequenos, chapados, podendo ser lagartos e tartarugas. As

aves são variadas. na forma, mas geralmente são representadas chapadas,

com pernas formadas por traços, bicos abertos em perfil lateral, sugerindo

(5)

movimento. Ocorrem normalmente agrupadas mas podem estar isoladas

Os peixes são bastante comuns, representados com o corpo alongado

chapado, com as nadadeiras caudais evidenciàdas; ocorrem sozinhos,

em

duplas ou cardumes.

As figuras fitomorfas, por sua vez, são poucas, lembrando tubérculos

palmeiras e outros vegetais não-identificados. '

Quanto ao tamanho das figuras, está entre 5 e 50cm na maior

medida, predominando as figuras entre 10 e 20cm, podendo ocorrer figuras

extremas de até 150x80cm.

XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

Re s u m in d o , p o d e m o s d iz e r q u e n a p in t u r a d e C a ia p ô n ia t e m o s u r n a

a r t e in g ê n u a , d e r e p r e s e n t a ç ã o , q u e u s a s u g e s t ã o em v e z d e

d e t a lh a m e n t o

ONMLKJIHGFEDCBA

e n ã o c o n h e c e t é c n ic a s s o f is t ic a d a s n a e x e c u ç ã o . A s

m e n s a g e n s le g í v e is s ã o e x t r e m a m e n t e s im p le s : c a ç a , f a m í lia , d a n ç a ,

b r in c a d e ir a , lu t a s h u m a n a s ; a n im a is is o la d o s o u a s s o c ia d o s

o c a s io n a lm e n t e o u em a g r u p a m e n t o s t ip t c o s , c o m o c ir a n d a s d e

m a c a c o s , a v e s c a m in h a n d o u m a s a t r á s d a s o u t r a s , f ê m e a s c o m

f ilh o t e s , c a r d u m e s d e p e ix e s ; a lg u m a s p la n t a s ; r it u a l, c o m o p e s s o a s

e s t e n d e n d o os b r a ç o s s o b r e m e n o r e s , p r o c is s ã o d e a n im a is ( o u

m a s c a r a d o s ) em a t it u d e s e s t r a n h a s . Os n u m e r o s o s s in a is

g e o m é t r ic o s o u liv r e s , p e r t e n c e n t e s ao s e u m u n d o s im b ó lic o e

p r o v a v e lm e n t e p o r t a d o r e s d e m e n s a g e n s c o m p r e e n s í v e is p a r a e le s ,

c e r t a m e n t e t ê m c o m o f u n ç ã o b á s ic a a d e c o r a ç ã o d o a m b ie n t e , q u e d e

e s t r a n h o se t o r n a r ia d o m é s t ic o , c o m o as m e n s a g e n s le g í v e is

c e r t a m e n t e m a r c a r ia m ap a s s a g e m d o g r u p o p e lo lo c a l (Schmitz et ai,

1986, p. 300).

Pelos dados disponíveis, podemos ver que a arte rupestre do Brasil

Central apresenta uma tendência de geometrização do litoral para o interior.

Ao compararmos as diferentes tradições rupestres, separados os três

grandes motivos - antropomorfos, zoomorfos e geométricos, notamos que:

*

no Alto Sucuriú temos 1,36% das figuras antropomorfas, 7,33%

zoomorfas e 87,57% geométricas;

*

em Serranópolis temos 1,71 % de antropomorfas, 25,37% zoomorfas

e 73,14% geométricas;

*

em Caiapônia temos 4% antropomorfas, 11 % zoomorfas, 73,7%

geométricas, além de 0,3% fitomorfas e 11 % indefinidas;

Percebe-se, assim, um aumento nas representações antropomórficas

e zoomórficas em Serranópolis e Caiapônia, ao contrário do Alto Sucuriú,

bem como as figuras com representações cênicas em Caiapônia são mais

abundantes.

Mesmo se considerarmos apenas as geométricas, notamos algumas

114 BIBLOS. Rio Grande. 9: 107-116. 199

7

diferenças, pois no Alto Sucuriú são basicamente retas, curvas, elipses e

retângulos; já nas outras áreas ocorrem, além destas, quadrados, losangos,

triânguloS, e também variações, que são encontradas nas figuras

naturalistas.

Considerando que a ocupação do Brasil Central deve ter começado

por volta dos dez ou doze mil anos antes do presente, correspondendo ao

final do pleistoceno e início do holoceno, associada às condições ambientais

do holoceno com um clima de sem i-aridez se desfazendo, os abrigos devem

ter sido procurados como refúgio e fonte de matéria-prima.

As pinturas rupestres desse momento, especialmente no Alto Sucuriú

e Serranópolis, compreendem figuras geométricas, chapadas, e em alguns

casos ocorre a bicromia. Essas figuras correspondem aos motivos do

primeiro estrato definido no Alto Sucuriú, que está caracterizado por figuras

bicolores em vermelho e amarelo, preponderantemente geométricas.

A cultura material encontrada nas escavações é composta

especialmente por artefatos fabricados sobre o arenito silicificado

encontrado nos abrigos, como raspadores, machados, facas, associados à

tradição lítica Itaparica.

A ocupação seria de pequenos bandos caçadores-coletores, que

ocupariam os sítios como abrigos e fonte de matérias-primas. Possivelmente

Serranópolis tenha visto uma ocupação mais intensa, devido à maior

quantidade de abrigos e maior variabilidade nos motivos representados, o

que poderia indicar uma maior quantidade de pessoas executando a pintura.

Caiapônia, por sua vez, não parece ter visto uma ocupação mais

significativa nesse período.

O segundo momento de ocupação da área parece estar situado entre

os sete e oito mil anos antes do presente, entre o início do holoceno e a

entrada do "Ótimo Climático". As pinturas apresentam uma modificação no

seu conteúdo, tanto em termos de cor como de forma. No Alto Sucuriú,

sobre as figuras geométricas bicolores do momento anterior. estão

sobrepostas figuras chapadas geométricas e biomorfas de cor vermelha a

bordô, o que indica uma execução posterior.

No Alto Sucuriú as pinturas desse momento são quantitativa mente

predominantes, do mesmo modo que em Serranópolis. A cultura material

assOciada a esse momento indica uma produção de lascas irregulares e

pouco retocadas conhecida como Tradição Serranópolis* , que seria de

grupos de caçadores generalizados que estariam vivendo da caça e da

coleta, tendo nos abrigos um ponto de referência.

O terceiro momento estaria associado, então, às ocupações

s . *É importante frisar que a definição de Tradição Serranópolis apresentada por Chmltz et aI. (1986: p. 327) éuma denominação tentativa que merece melhor caracterização.

BIBLas. Rio Grande. 9: 107-116. 1997

(6)

posteriores aos seis mil anos antes do presente, quando há um aumento na

umidade, e a necessidade agora é por abrigos grandes e ventilados, corno

ocorre nos de Serranópolis e Caiapônia. A arte rupestre agora apresenta

uma nova realidade, proliferando figuras biomorfas com motivos do

cotidiano, como cenas de caça, lutas, danças e brincadeiras, caminhando

para uma "naturalização", já que há uma diminuição da incidência de figuras

geométricas, ocorrendo, a exemplo de Caiapônia e Serranópolis, um

aumento nas figuras naturalistas, e em Caiapônia a profusão de figuras

naturalistas, dançando, pulando, brincando, o que parece ser urna

penetração de elementos de tradições como a Planalto, Agreste e talvez

Nordeste.

Evidentemente que as conclusões apresentadas aqui sobre esse

"movimento de geometrização" da arte rupestre são uma primeira reflexão

sobre o assunto, mas parece claro que existem elementos que se difundem

na arte rupestre brasileira. Em termos de Brasil Central, devemos levar em

consideração ainda que temos uma grande tradição lítica, a Tradição

Itaparica, com uma dispersão territorial de mais de 2000 quilômetros, que

nos coloca questões ainda difíceis de serem respondidas, mas que nos

fazem pensar nos mecanismos que devem ter articulado essas populações.

Nesse sentido, parece lógico pensar que a geometrização que se

percebe nas pinturas rupestres refletem, de alguma forma, esses

mecanismos, sem contudo possibilitar que sejam percebidos claramente, até

porque as pesquisas ainda estão buscando a localização dos sítios e

identificação do que é a primeira expressão cultural autenticamente

brasileira.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

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ONMLKJIHGFEDCBA

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VERONEZE, Ellen. A O c u p a ç ã o d o P la n a lt o C e n t r a l B r a s ile ir o . 'O N o r d e s t e d o M a t o G r o s s o d o S u l. São Leopoldo, Instituto Anchietano de Pesquisas/UNISINOS, 1994.

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