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ESTATUTO DO DESARMAMENTO E PRISÃO PREVENTIVA

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PUBLICAÇÃO OFICIAL DO INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

O DIREITO POR QUEM O FAZ:

ESTATUTO DO DESARMAMENTO E PRISÃO PREVENTIVA

Marco Nahum

HC nº 468.510/6 - Lorena

TACrim/SP

j. em 04/05/2004, v.u.

Os advogados J.N.S. e A.A.S. impetra-ram habeas corpus em favor de C.H.L.S., que estaria sofrendo constrangimento ilegal por parte do MM. juiz de Direito da 1ª Vara Cri-minal de Lorena.

O paciente pleiteia liberdade provisória sob o argumento de que é sargento do Exército e, nesta qualidade, possui residência fixa. Além disso, alega ofensa ao princípio da razoabili-dade da referida lei “que proíbe a concessão de liberdade provisória de crime de menor poten-cial ofensivo...”, e requer a suspensão do pro-cesso até que a ação direta de inconstitucio-nalidade nº 3.112 seja julgada pelo STF.

Foram prestadas informações.

A Procuradoria de Justiça é pela denega-ção da ordem.

É o relatório.

1. Desde já afasta-se a hipótese de

sus-pensão do processo requerida. Como bem afirmado às fls. 144 pelo eminente juiz

Eduardo Pereira, ao ser analisado o pedido

de concessão de liminar, “trata-se de réu preso e a suspensão do andamento do feito traria prejuízo ao paciente”.

Nestes termos, fica afastado o pedido de suspensão do processo.

2. O paciente foi preso em flagrante, e teve

denúncia recebida, por infração ao artigo 16, c/c o artigo 20, ambos da Lei nº 10.826/03 (fls. 175). Requerida sua liberdade provisória, hou-ve o indeferimento por força do estabelecido no artigo 21 da referida Lei nº 10.826/03.

A nova legislação de armas, neste preceito citado, procurou inserir em seu texto o mes-mo tratamento processual estabelecido para os crimes hediondos (artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.072/90), impedindo o direito à liber-dade provisória mesmo quando preenchidos os requisitos previstos em lei.

Ofende o princípio da igualdade. No caso, apenas a título de distinção, o artigo 16 da Lei nº 10.826/03 cuida de crime de perigo, enquanto os delitos definidos como hediondos são crimes de dano material. Ado-tado o princípio da ofensividade, por certo estes últimos trazem ao bem jurídico ofendi-do lesão significativamente maior em relação aos crimes de perigo. Por isso, as penas dos crimes hediondos são bem maiores que as reservadas para os crimes de perigo.

Assim, considerada a tipificação de cada delito, os crimes hediondos e aqueles

defini-03 não podem ter o mesmo tratamento pro-cessual penal no que tange ao cerceamento cautelar do direito de liberdade do agente.

Além da evidente ofensa ao princípio da

igualdade também há ofensa ao princípio da razoabilidade.

No Direito Penal impõe-se, por força cons-titucional, a observação do princípio da igualdade não apenas perante a lei, mas também através da lei, o que implica numa

vinculação do legislador a estabelecer a to-dos os cidadãos um tratamento de igualda-de em sentido material. É profundamente desigual tratar-se crimes de conteúdo mate-rial distinto de maneira igual.

Aqui a proibição do arbítrio. Aqui a proi-bição de tratamento igual para coisas dis-tintas, sem uma justificação razoável, se-gundo critérios de valores estabelecidos pelo contrato social.

É neste sentido que Alberto Silva Franco afirma ocorrer desrespeito ao princípio da igual-dade quando: “...situações fáticas desiguais rece-bem, de modo arbitrário, tratamento igual”(1).

Por outro lado, identificada a desigual-dade de tratamento através da lei imposta pelo legislador, há que se considerar ainda sua implicação e ofensa ao princípio da

se-paração entre os Poderes. Evidente que para

ser garantido o princípio da igualdade for-ma e for-material, impõe-se a imparcialidade e independência do Poder Judiciário em rela-ção aos demais Poderes do Governo.

No caso presente, inserindo no sistema jurídico um vínculo potestativo (os crimes previstos nos arts. 16, 17 e 18 são insuscetíveis de liberdade provisória) os Poderes Legislati-vo e ExecutiLegislati-vo afastaram o vínculo

limita-tivo do sistema (a prisão cautelar só é possível

quando presentes os requisitos da prisão pre-ventiva), e cercearam a atividade jurisdicio-nal a medida que impedem o Poder Judi-ciário de manifestação plena sobre o direito de liberdade da pessoa(2).

Por certo, a exclusão da possibilidade de manifestação do Poder Judiciário ofende a plenitude do Estado Democrático de Direi-to Direi-tornando inválida sua legitimidade.

A liberdade do homem é direito funda-mental. Em contraposição, para limitá-la, o Estado, por meio do Poder Judiciário, deve fundamentar o ato coercitivo que apenas pode ser aplicado nos limites da lei. Esta deixa evi-dente que o direito fundamental à liberdade do cidadão brasileiro apenas pode ser restrin-gido quando presentes os pressupostos da prisão preventiva (artigos 312 e 316 do CPP). Esta análise não pode ser subtraída do

cípio da separação e equilíbrio dos Poderes, além de se negar, ao cidadão brasileiro, o aces-so concreto à um julgamento justo e inde-pendente, o que ofende o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal(3).

Nem se diga que o artigo 5º, inciso LXVI, da Carta Magna, permite que a lei regule a prisão provisória, a significar que o legislador ordinário pode permitir ou não. Este prisma de discussão está relacionado com os crimes hediondos e não serve para a hipótese presen-te. Insiste-se, no caso não se trata de crime hediondo. Para casos de crimes comuns, quan-do a Constituição restringe benefícios o faz de maneira expressa (art. 5º, XLIII), como ocor-re com os crimes hediondos inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia.

Portanto, o referido artigo 21 da Lei nº 10.826/03 ao ofender a independência dos Poderes e vedar ao cidadão o acesso ao Judi-ciário para garantia de sua liberdade indivi-dual, mostra-se desvinculado dos princípios maiores inseridos em nossa Constituição, e que são vinculantes a todo o sistema jurídico e ao Estado Democrático de Direito.

Portanto, a análise deste writ será orienta-da segundo critérios materialmente constitu-cionais, isto é, será observada a possibilidade ou não da limitação do direito de liberdade do paciente segundo as hipóteses previstas no artigo 312 do Código de Processo Penal.

3. Segundo a denúncia, no dia 26 de

de-zembro de 2003, por volta das 11h, na Rua (...), em Lorena, o paciente possuía e manti-nha sob sua guarda arma de fogo de uso restrito, consistente em uma pistola marca “Taurus”, calibre 9” (laudo de fls. 184/185), com numeração raspada, municiada, sem autorização e em desacordo com determina-ção legal e regulamentar.

Pelo que se constata dos autos, policial militar entrou na residência do paciente a fim de verificar a procedência de denúncia anônima a respeito da posse de arma ilícita. No momento o paciente admitiu ser o pro-prietário e que a havia adquirido pelo valor de R$ 600,00. A arma estava desmuniciada, porém “alimentada” (fls. 178).

O paciente alegou ao condutor do fla-grante que gosta de arma de fogo e achou que poderia regularizá-la (fls. 179). Também consta que mantinha guardado um revólver calibre 38”, devidamente registrado. O poli-cial militar ainda declarou que o paciente, no momento da prisão foi gentil e não ofere-ceu resistência (fls. 179).

Portanto, não se vislumbra na hipótese os requisitos da prisão preventiva a fim de que

Marco Nahum

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Marco Nahum

A “ordem pública” existe quando a

per-manência do réu em liberdade, concretamen-te demonstrada, pode dar motivos a novos crimes ou cause repercussão danosa e preju-dicial ao meio social. A “conveniência da ins-trução criminal” ocorre quando a permanên-cia do acusado em liberdade causa danos con-cretos à instrução procedimental. A “garantia da aplicação da lei penal” existe quando há suficientes evidências de que o réu irá fugir.

Nenhuma destas hipóteses se mostram presentes para demonstrar o periculum in mo-ra justificador da limitação do direito funda-mental de liberdade.

Embora se reconheça que este delito causa preocupação à sociedade, não se pode presu-mir que, apenas pelo tipo penal elencado na

denúncia, a garantia da ordem pública, a conveniência da instrução criminal e a apli-cação da lei penal estejam ameaçadas.

Portanto, nos casos dos autos, a prisão cau-telar não tem sua necessidade demonstrada de forma concreta, o que faz prevalecer o di-reito de liberdade do paciente.

Pelo exposto, concedo a ordem, expedin-do alvará de soltura clausulaexpedin-do.

Notas

(1) Crimes Hediondos. 4ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 56.

(2) Esclarecendo que os vínculos limitativos (ou imperativos negativos) impedem uma discri-cionariedade ampla dos órgãos normativos inferiores, Luigi Ferrajoli afirma que o

Esta-do absoluto ou autoritário caracteriza-se pela inserção de imperativos potestativos. In:

De-recho y Razón. Teoria del Garantismo Penal,

Madrid: Editorial Trota, 1995, pp. 362-369. (3) J.J. Gomes Canotilho afirma que o princípio

da garantia da via judiciária “é imposição

di-rectamente dirigida ao legislador no sentido de dar operatividade prática à defesa de direitos...; A defesa de direitos através de tribunais representa também uma ‘decisão fundamental organizatória’ (D. Lorenz), pois o controle judicial constitui

uma espécie de ‘contrapeso’ clássico em relação ao exercício dos Poderes Executivo e Legislativo”. In: Direito Constitucional, Coimbra: Editora

Almedina, p. 386.

Marco Nahum

Juiz relator

ESTATUTO...

JURISPRUDÊNCIA COMENTADA:

QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO E CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL:

UM CASO DE ABUSO DAS PRESUNÇÕES

Gabriel Bertin de Almeida

Crime de sonegação fiscal. Quebra de sigilo bancário. Presunção de veraci-dade das conclusões da receita federal

“Acontece que a negativa do réu, desa-companhada de outras provas, não tem o condão de afastar sua responsabilidade cri-minal, que deriva da necessidade de prestar suas declarações ao Fisco no prazo legal, bem como de justificar os casos omissos.

E a defesa não trouxe qualquer prova justificadora de sua tese, pelo que deve pre-valecer o que ficou apurado no Procedi-mento Administrativo. (...)

De acordo com o contexto probatório, não há que falar em meras presunções. Ao revés, trata-se de provas documentais pro-duzidas por servidores públicos no desem-penho de seu mister, dotados de fé-pública, atributo por Excelência do ato administra-tivo, do que resulta a presunção de legitimi-dade e de veracilegitimi-dade desses atos, presunção relativa, claro está, que vale, por isso mes-mo, até prova em contrário, que, no caso, caberia ao réu produzir” (Ação Penal nº 2002.70.01.000231-4, da Vara Criminal Federal de Londrina/PR, fls. 109 e verso.) 1. Introdução

Temos visto nos últimos anos um grande aumento da repressão aos chamados crimes de colarinho branco, praticados pela camada mais abastada da sociedade, que inclui polí-ticos, empresários, profissionais liberais etc. A atitude é em boa parte louvável, pois amplia o foco da persecução criminal para além da cri-minalidade decorrente das desigualdades so-ciais mais evidentes, como é o caso da peque-na crimipeque-nalidade patrimonial, mais frágil frente ao aparato policial.

No entanto, apesar do caráter democráti-co de tal fato (justiça criminal distribuída a ricos e pobres), temos visto uma quantidade

preocupante de abusos cometidos pelo órgão acusador, algumas vezes, infelizmente, aco-lhidos pelo Judiciário, que acaba por dene-gar aos acusados direitos constitucionais dos mais básicos. Tal fato tem também tornado mais presente a discussão sobre a possibili-dade ou não do Ministério Público condu-zir investigação criminal, já que a Consti-tuição Federal em nenhum momento atri-bui-lhe expressamente essa tarefa. Não é esse, porém, o tema que se pretende discu-tir no presente artigo.

O que releva notar aqui é que na apuração dos crimes em questão (usualmente o pecula-to, a corrupção ativa e passiva, os da Lei de Licitações, a lavagem de dinheiro, entre mui-tos outros), há um usual efeito colateral que pode implicar, como tem implicado, um dos abusos referidos. O efeito colateral menciona-do é o freqüente impulso damenciona-do pelo Ministério Público à Receita Federal, com o objetivo de buscar uma “punição total” dos acusados, em uma verdadeira Cruzada. O raciocínio é sim-ples: se houve desvio de dinheiro público ou obtido ilicitamente, presume-se que há renda não declarada; se há renda não declarada, há sonegação de imposto. Dessa forma, apuram-se as declarações de renda dos envolvidos, com o fim de promover futura execução fiscal, via Procuradoria da Fazenda, e nova ação penal, via Ministério Público Federal, agora por causa da sonegação.

O abuso intolerável decorrente do efeito colateral é o excesso de presunções utilizadas para chegar-se à punição pretendida na ação penal por sonegação. Muito freqüentemente, há quebra de sigilo bancário dos acusados, que têm suas contas devassadas. Na análise dessas contas pela Receita, apuram-se os valores que por elas passaram. Se são superiores à renda declara-da, presume-se que houve sonegação. O proble-ma é, portanto, a possibilidade ou não dessa presunção e sua extensão à esfera Penal. Vejamos.

2. O abuso das presunções 2. em matéria penal tributária

Como se sabe, o Direito Penal Brasileiro não permite a responsabilização objetiva, de-rivada somente do nexo de causalidade entre a ação e o resultado. É necessário, nos crimes de sonegação, que se demonstre a integral res-ponsabilidade do acusado, isto é, que a ação criminosa tenha sido de fato praticada e que seja dolosa (não há tipo culposo). Por isso, a movimentação da conta corrente de uma pes-soa não pode revelar, automaticamente e por presunção, sua renda. Não é incomum que outros valores, além de rendimentos próprios, sejam movimentados em contas pessoais. No entanto, vem surgindo o entendimento de que essa presunção é possível, pois bastaria ao acusado provar o contrário, informando qual a procedência do valor que entende não cons-tituir renda tributável. Essa pretensão de in-versão do ônus da prova, porém, é tão intole-rável quanto a tentativa de responsabilização objetiva. Aliás, nesse caso, ambas estão inti-mamente relacionadas, pois a ausência de produção de prova pelo acusado implicaria, segundo o referido entendimento, o dolo do crime de sonegação!

A decisão judicial transcrita em parte na abertura deste comentário, bem ilustra o en-tendimento mencionado, o qual tem apoio de parte da doutrina sobre o tema.

“O ônus da prova de fato negativo, porém, envolve técnica diversa, pois, se a administra-ção afirma, por exemplo, a omissão de infor-mações por parte do agente, com a finalidade de reduzir ou suprimir tributo, nos moldes do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, cabe ao contribu-inte demonstrar que prestou as declarações, o que não exime a acusação, mediante a autori-dade administrativa, comprovar (ainda que por indícios) que requisitou tais informações na for-ma da lei, e que o contribuinte possuía os ele-mentos exigidos pela fiscalização, posto a posse

Gabriel Bertin de Almeida

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QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO E CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL: UM CASO DE ABUSO DAS PRESUNÇÕES

das informações requisitadas ser pressuposto da conduta criminosa.

No campo do ônus da prova, os efeitos das presunções são mais evidentes, pois o ato adminis-trativo, devido às presunções relativas de veraci-dade do conteúdo e legaliveraci-dade de forma, inverte o ônus da prova do fato objeto do mesmo, cabendo ao sujeito passivo da obrigação tributária com-provar o contrário do contido em tal ato.

A conseqüência indiciária da presunção de veracidade do conteúdo do ato administrativo atinge o processo penal, neste produzindo efeitos, de modo que, se a notificação fiscal por si só não é suficiente para a prova da materialidade deli-tuosa (assim como qualquer outro meio de pro-va), não há como negar a substancialidade da aptidão de tal meio de prova para os efeitos a que se propõe, principalmente quando o ato adminis-trativo não é desconstituído mediante anulação administrativa ou judicial.”(1)

O primeiro ponto a ser levantado diz respei-to ao onus probandi. Diz o artigo 156 do CPP que o ônus da prova cabe a quem alega. Trata-se do famoso adágio onus probandi incumbit ei qui asserit. A acusação deve provar, assim, a existência do fato e a autoria, incluindo o ele-mento subjetivo, doloso ou culposo(2). Há,

ainda, entendimento doutrinário no sentido de que o acusado deve provar determinados fatos que eventualmente alegar, especialmen-te nos casos de excludenespecialmen-te de antijuridicidade, culpabilidade ou de extinção de punibilidade. No entanto, deve-se notar que, no tema em discussão, o que se pretende seja provado pelo acusado é, além do dolo, a inexistência de renda tributável, que é a negação de circuns-tância elementar do tipo penal do crime de sonegação, isto é, algo bem diferente de causas excludentes de antijuridicidade, extintivas de punibilidade... Portanto, não há possibilidade de que haja inversão do ônus nesse caso. Mes-mo que se admitisse que o dolo na hipótese é presumido, porque os atos que praticamos conscientemente são voluntários, ainda assim deve restar provado pela acusação que a renda pretensamente tributável é do acusado, por elementos mais concretos que a simples passa-gem de valores por suas contas bancárias.

Em segundo lugar, é importante notar que a apuração e responsabilização em um ilícito fiscal é bem diferente da que ocorre em um ilícito penal tributário. Quando alguém pre-tensamente deixa de pagar tributos, duas são as conseqüências possíveis: uma na área tri-butária, em que se aplicam multas e encar-gos, cobrando-se judicialmente o tributo de-vido e acessórios; outra na área penal, em que se persegue o acusado através de ação penal, pretendendo-se a imposição de pena. No pri-meiro caso, aplica-se o artigo 136 do Código Tributário Nacional:

“Art. 136. Salvo disposição de lei em contrá-rio, a responsabilidade por infrações da legisla-ção tributária independe da intenlegisla-ção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato.”

Essa responsabilização objetiva, ligada à in-versão do ônus de prova, no que se refere ao tema ora em análise, equipara de maneira

me-cânica movimentação bancária e renda tributá-vel, tomando ainda, essa mesma responsabiliza-ção, outras formas, por mais absurdas que pos-sam parecer: é muito comum a Fiscalização pre-sumir, por exemplo, no caso de contas conjun-tas de marido e mulher, que os valores que por lá passaram pertençam metade a cada um!

Enfim, somente na atribuição de respon-sabilidade tributária despreza-se a intenção do agente. Por isso, a responsabilidade vem a ser muitas vezes objetiva. Basta, assim, verifi-car-se, como temos visto acontecer, os saldos em conta no início e no final do mês, junta-mente com os rendimentos declarados e, ha-vendo saídas em valores mais elevados que os ganhos, presumir-se a sonegação (no âmbito meramente fiscal, vá lá, mas no máximo uma presunção relativa):

“O principal traço desse tipo de sanção (me-ramente tributária) está em que a penalidade pode ser aplicada independentemente de ficar comprovada a culpabilidade do sujeito passi-vo, bastando, para isso, que a lei tributária as-sim determine. Em outras palavras o pressupos-to da aplicação da penalidade é a contrarieda-de ao que estatui a legislação tributária, sem se perquirir acerca da ocorrência de qualquer das formas de culpabilidade, presentes do Direito Penal Comum.”(3)

O argumento sobre a fé pública dos agentes do Fisco, freqüentemente utilizado, demons-tra perfeitamente a confusão entre a possibili-dade de utilização da presunção na esfera fiscal e a contraposta impossibilidade na esfera criminal. Nesta, a palavra do auditor fiscal, para efeito de condenação, não se presume verdadeira até prova em contrário! Se fosse assim, estariam subvertidos todos os princípios da prova no processo penal, exigindo-se dos acusados que provassem a inocência ao invés de exigir-se do acusador prova robusta do fato, da autoria e da culpabilidade. Aquela presun-ção, prevista no artigo 136 do Código Tributá-rio Nacional, tem sido, portanto, equivocada-mente utilizada na esfera penal.

No Direito Penal, essa responsabilização objetiva não tem lugar. Não basta a aplicação dos conceitos do Direito Tributário, sobretu-do os de renda e proventos de qualquer natu-reza, que, como se sabe, abusa de presunções, e o de responsabilidade pelo pagamento do tributo, absolutamente incompatível com a responsabilização penal:

“Ante algum sinal de omissão de informar, deve notificar o contribuinte e exigir-lhe o for-necimento de dados. Aliás, legalmente ao con-tribuinte é lícito recusar-se a fornecer dados, em vista do princípio constitucional de que nin-guém é obrigado a se auto-acusar (CF, art. 5º, LXIII, que não se aplica só ao preso, literal-mente, senão também ao que se vê processar). Se assim proceder, é claro, o contribuinte não evitará a priori a incidência das penas do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90 (pois fica sujeito à produção de provas pela acusação), mas tam-pouco de sua simples omissão promanará a ca-racterização da fatispécie penal.”(4)

“Não raro, o legislador tributário utiliza-se das figuras da presunção ou da ficção para

cons-truir a hipótese de incidência de determinado tributo ou contribuição.

O importante é deixar consignado que as presunções legais, se por um lado podem servir como hipóteses de incidência tributária, por outro, não produzem as mesmas conseqüências na esfera penal, em que o processo é orientado na busca da verdade real e, por isso, é necessária a demonstração inequívoca dos fatos, para de-terminar a culpabilidade dos agentes e lhes per-mitir a mais ampla defesa.”(5)

3. Conclusão

A presunção de que movimentação ban-cária é renda, não pode, por si só, ensejar ação penal. Com o devido respeito às opiniões em contrário, essa lição é elementar no Direito Penal. Quando muito, pode ensejar cobrança do tributo pretensamente devido. Enfim, se o Fisco pode presumir algo e agir em razão des-sa presunção, o que, data venia, já soa abusi-vo, o Ministério Público Federal, para denun-ciar e pretender condenação, jamais pode fa-zer o mesmo. Deve ultrapassar a precariedade da presunção e, através da prova, cumprindo o ônus que tem, transformar aquela presun-ção em verdade real, em fato apurado, em seus aspectos objetivos e subjetivos. As posi-ções em sentido contrário representam niti-damente as idéias dos chamados movimentos de Law and Order, que priorizam o endureci-mento penal com funções meramente simbó-licas, em detrimento de garantias constitucio-nais, das mais elementares, conquistadas em séculos de lutas históricas.

Deve-se notar, por fim, que o Ministério Pú-blico, quando atua com o apoio da Receita Federal, deve utilizar mecanismos adequados (que, aliás, freqüentemente são eficientes) para pretender condenação por sonegação fiscal, como, por exemplo, a análise da evolução pa-trimonial do acusado, quando incompatível com a renda declarada, ou através dos meios de cruzamento de informações (o chamado “pente fino”). A quebra de sigilo é instrumento valioso quando utilizada em conjunto com esses outros meios. Abusar das presunções, po-rém, é algo incompatível com nosso Direito Penal e Processual Penal, pois seria ignorar os princí-pios da responsabilidade subjetiva, do ônus da prova e do devido processo legal (penal).

NOTAS

(1) EISELE, Andreas. Crimes Contra a Ordem Tributária. São Paulo: Dialética, 1998, pp. 214/215).

(2) TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Pro-cesso Penal, v. 3, 15ª ed., São Paulo: Saraiva, 1994, p. 215. MIRABETE, Julio F. Processo Penal, 3ª ed., São Paulo: Atlas, 1994, p. 254.

(3) ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Direito Pe-nal Tributário. 2ª ed., São Paulo: Atlas, 1997, p. 35). (4) SILVA, Juary C. Elementos de Direito Penal

Tributá-rio. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 189.

(5) ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Opus citatum, p. 84.

Gabriel Bertin de Almeida

Advogado, professor de Processo Penal e de Filosofia do Direito na Faculdade Paranaense e mestrando em Filosofia pela USP

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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Jurisprudência compilada por

Helena Regina Lobo da Costa

e Mariângela Lopes Neistein A opinião do julgador

sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada

“Fixada a pena em seu mínimo legal, infe-rior a 8 (oito) anos, não sendo caso de reinci-dência, e reconhecidos, tanto pela sentença como pelo acórdão do Tribunal estadual, os bons antecedentes e a primariedade do réu, não há falar em adoção do regime inicial fe-chado para o cumprimento da pena sob o argumento de que a referida modalidade de crime vem causando grande comoção social, restando, assim, evidente a ofensa ao art. 33, § 2o, ‘b’ e § 3o c/c art. 59 do Código Penal.

Incidência das Súmulas 718 e 719 do STF. Ordem concedida.”

(HC nº 83.605-4/SP, 2a Turma, rel. min.

Ellen Gracie, j. 02.03.04, v.u., DJU de

23.04.04, p. 39, nº 397). Denúncia. Inépcia.

Necessidade de descrição do nexo entre a conduta de cada acusado e o resultado dos crimes

“É inepta a denúncia que não estabelece o vínculo entre as condutas atribuídas aos acu-sados e os atos ilícitos supostamente pratica-dos. HC deferido.”

(HC nº 83.948-7/SP, 2a Turma, rel. min.

Carlos Velloso, j. 20.04.04, v.u., DJU de

07.05.04, p. 47, nº 588).

Medida de segurança. Ultrapassagem do prazo máximo de trinta anos. Extinção pretendida. Liminar. Transferência para hospital psiquiátrico da rede pública

“Observe-se a garantia constitucional que afasta a possibilidade de ter-se prisão perpétua. A tanto equivale a indetermina-ção da custódia, ainda que implementada sob o ângulo da medida de segurança. O que cumpre assinalar, na espécie, é que a paciente está sob a custódia do Estado, pou-co importando o objetivo, há mais de trinta anos, valendo notar que o pano de fundo é a execução de título judiciário penal conde-natório. O art. 75 do Código Penal há de merecer o empréstimo de maior eficácia pos-sível ao preceituar que o tempo de cumpri-mento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a trinta anos. Frise-se, por oportuno, que o artigo 183 da Lei de Exe-cução Penal delimita o período da medida de segurança, fazendo-o no que prevê que esta ocorre em substituição da pena, não podendo, considerada a ordem natural das coisas, mostrar-se, relativamente à liberdade de ir e vir, mais gravosa do que a própria apenação. É certo que o §1o do art. 97 do

Código Penal dispõe sobre prazo de imposi-ção de medida de segurança para

inimpu-tável, revelando-o indeterminado. Todavia, há de se conferir ao preceito interpretação teleológica, sistemática, atentando-se para o limite máximo de trinta anos fixado pelo legislador ordinário, tendo em conta a regra primária vedadora da prisão perpétua. A não ser assim, há de concluir-se pela incons-titucionalidade do preceito”.

(HC nº 84.219-4/SP, decisão liminar, rel. min. Marco Aurélio, j. 24.04.04, DJU de 03.05.04, p. 11, nº 88). Tráfico de entorpecentes. Usuário dependente. Semi-imputabilidade. Reconhecimento da possibilidade de responder o processo internado em clínica especializada e não no cárcere

“A mera acusação penal por suposta práti-ca do delito de tráfico de entorpecentes não impede que o Poder Judiciário, atento às pe-culiaridades do caso e às conclusões técnicas dos peritos oficiais do Juízo, assegure, excep-cionalmente, ao réu — cuja condição de semi-imputável e de usuário-dependente de múlti-plas drogas está parcialmente comprovada no processo penal de conhecimento — a inter-nação em clínica médica particular, desde que tal internação, sem qualquer ônus financeiro para o Estado, seja reconhecida como estrita-mente necessária ao tratamento do paciente (o que se acha cautelarmente privado da sua liberdade), e o Poder Público não disponha de condições adequadas e satisfatórias para dispensar, no âmbito do sistema prisional, essa mesma assistência médica de caráter especia-lizado. Deferimento parcial do HC para, mantida a prisão cautelar do paciente, asse-gurar-lhe, desde logo, sob a imediata supervi-são do Juízo processante a possibilidade de internar-se, sob suas próprias expensas, em clínica especializada”.

(HC nº 83.657-7/SP, 2a Turma, rel. min.

Celso de Mello, j. 30.03.04, v.u., DJU de

23.04.04, p. 40, nº 398). Recurso. Prazo.

Ministério Público. Termo inicial. Entrada do processo no órgão

“Descabe o tratamento desigual, assen-tando-se que os processos, após a entrada no setor próprio do Ministério Público, po-dem permanecer na prateleira aguardando que o titular da ação penal delibere, quan-do melhor lhe aprouver, sobre a fixação quan-do termo inicial do prazo para desincumbir-se de certo ônus processual. Significa afirmar que só corre o prazo recursal quando, de acordo com a conveniência própria, o inte-grante do Ministério Público lance no pro-cesso a ciência. Esse entendimento não se coaduna com a ordem natural das coisas, com a natureza do prazo recursal, com a paridade de armas que deve ser observada no trato da acusação e da defesa.

(...) Atende plenamente à citada prerroga-tiva a chegada do processo, devidamente for-malizada, às dependências do Ministério Pú-blico, imaginando-se que o servidor público que passa o competente recibo esteja devida-mente autorizado e que, a seguir, seja enca-minhado o processo a quem de direito.

(...) Nota-se, nesta Corte, que há diver-gência de opinião.

(...) A duplicidade de enfoques resolve-se por meio de interpretação mais adequada com o princípio básico do processo que é o da iso-nomia de tratamento das partes.

(...) Diante do exposto, concedo a ordem, para consignar a intempestividade do recurso especial interposto pelo Ministério Público, ficando, por conseguinte, restabelecido o acór-dão nessa via impgunado (...).”

(HC nº 84.159-7/SP, decisão liminar, rel. min. Marco Aurélio, j. 06.04.04, DJU de 20.04.04, p. 36, nº 824).

Crime eleitoral. Governador de Estado.

Reeleição. Competência. Prescrição “Realmente, os parâmetros da denúncia e o acórdão mediante a qual foi recebida afastam o enquadramento da hipótese na extravagante regra do art. 84 do Código de Processo Penal, perpetuando a jurisdição, pela Lei nº 10.628/02. O ato teria sido prati-cado pelo paciente na qualidade de candi-dato à reeleição, em 1998. Então, vindo a ser confirmada essa óptica pelo Colegiado, in-subsistente afigurar-se-á o recebimento da denúncia pelo Superior Tribunal de Justiça, porquanto incompetente para processar e julgar o paciente, incidindo, dessa forma, a prescrição, considerado o lapso — entre o fato reputado como criminoso e esta data — superior a quatro anos”.

(HC nº 84.152-0/AM, decisão liminar, rel. min. Marco Aurélio, j. 06.04.04, DJU de 20.04.04, p. 36, nº 823).

Trancamento parcial da ação penal. Imunidade material do advogado

“Na hipótese de as expressões tidas por ofensivas serem proferidas em representação penal, na defesa de seu cliente e no exercício de sua profissão, mesmo que em sede de pro-cedimento administrativo, incide a imunida-de material do advogado (art.7o, § 2o, da Lei

8906/94).

Está configurado o nexo causal entre o fato imputado como injurioso e a defesa exercida pelo recorrente, faltando, portanto, o elemen-to subjetivo do tipo. Precedente (HC 8139).

(HC nº 82.033-6/AM, rel. min. Nelson

Jo-bim, j. 29.10.02, m.v., DJU de 23.04.04, p. 40,

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SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Jurisprudência compilada por Cristiano

Avila Maronna, Leopoldo Stefanno Leone Louveira e Rodrigo Dall’Acqua

Inquérito policial. Arquivamento.

Exclusão de dados dos terminais do instituto de identificação

“Por analogia ao art. 748 do CPP — que assegura ao reabilitado o sigilo das condena-ções criminais anteriores na sua folha de an-tecedentes —, esta Corte Superior tem enten-dido que devem ser excluídos dos terminais dos Institutos de Identificação Criminal os dados relativos a inquéritos arquivados, de modo a preservar a intimidade do indivíduo. Precedentes. Recurso conhecido e provido.”

(RHC nº 14.376/SP, 5ª Turma, rel. min.

José Arnaldo da Fonseca, j. 02.03.04, v.u.,

DJU 29.03.04, p. 254). Sigilo bancário. Decretação de quebra para investigação criminal. Impossibilidade de

extensão à Receita Federal

“(...) No entanto, quanto à indevida ex-tensão do sigilo à Receita Federal e à Polícia Federal, tenho que a irresignação merece par-cial acolhida. Veja-se que não havendo pro-cesso administrativo instaurado ou procedi-mento fiscal em curso — pelo menos nada consta nos autos —, não poderia a quebra de sigilo se estender à Receita Federal. É o teor do art. 6º da LC nº 105/2001. Logo, realmente indevida a referida extensão. Não obstante, em relação à extensão à Polícia Federal, não vejo qualquer ilegalidade, uma vez que já instaurado inquérito policial para a apura-ção de eventuais ilícitos praticados, e tal que-bra, evidentemente, será fundamental para uma adequada instrução criminal. Entre-mentes, faço a ressalva de que a quebra de sigilo bancário estendida à Polícia Federal se restrinja tão-somente ao âmbito do inquérito instaurado para a apuração de eventual frau-de à licitação, frau-desvio e apropriação frau-de verba pública envolvendo a aplicação de recursos do Orçamento Geral da União, não poden-do ser utilizada para fim diverso.

Com essas considerações, dou parcial pro-vimento ao recurso.”

(ROMS nº 17.267/TO, 5ª Turma, rel. min.

Félix Fischer, j. 04.03.04, v.u., DJU 26.04.04,

p. 183).

Pena. Substituição por

pena não privativa de liberdade. Necessidade de expor os motivos da modalidade de pena adotada

“Percebe-se dos autos que a pena de 2 (dois) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão foi, em grau recur-sal, substituída, na forma do art. 44 do CP, por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária. Cumpre, inicialmen-te, asseverar que a substituição em tela pode-ria se dar, em tese, por três outras formas, a saber: perda de bens e valores, interdição tem-porária de direitos e limitação de fim de

se-mana. Desconsiderada, aqui, a divisão dou-trinária estabelecida entre penas genéricas e específicas. Ocorre, contudo, que a escolha foi feita sem qualquer motivação. Vale dizer, a opção deveria, ainda que sucintamente, ser fundamentada. É flagrante, pois, a au-sência de motivação concreta, vinculada, com evidente adoção do vedado princípio da convicção íntima ao invés do livre con-vencimento concretamente fundamentado. O princípio da persuasão racional ou livre convencimento (art. 157 do CPP) exige fun-damentação concreta, calcada na prova dos autos, observadas as regras jurídicas perti-nentes e as da experiência comum aplicá-veis. A convicção pessoal, subjetiva, do ma-gistrado, alicerçada em aspectos outros que não os acima indicados, não se presta para supedanear uma decisão. Aliás, está na ‘Ex-posição de Motivos’ do CPP que ‘é a motiva-ção da sentença que oferece a garantia contra os excessos, os erros de apreciação, as falhas de raciocínio ou de lógica ou os demais vícios de julgamento’ (nº XII, in fine).”

(HC nº 29.357/RS, 5ª Turma, rel. min.

Félix Fischer, j. 18.03.04, v.u., DJU 10.05.04,

p. 313).

Foro privilegiado. Lei nº 10.628/02. Crime relacionado

à gestão administrativa. Competência dos tribunais

“A questão acerca da inconstitucionalida-de da Lei nº 10.628/02, que alterou o art. 84 do CPP, tem sido objeto de intensos debates perante o Colendo Supremo Tribunal Fede-ral, não tendo ainda, aquela Corte, chegado a um posicionamento conclusivo. O que se tem, entretanto, são decisões proferidas em sede de liminar, tanto na ADIN 2.797, de re-latoria do e. ministro Ilmar Galvão e ADIN nº 2.860, de relatoria do ministro Sepúlveda

Pertence, sendo que, em ambas, como

salien-tado pelo zeloso causídico, houve indeferi-mento de liminar. (...) Nesta Corte, tal ques-tão foi objeto de análise em algumas oportu-nidades, sendo que, em todas elas, decidiu-se pela competência dos tribunais, desde que os delitos tenham relação com a gestão adminis-trativa.”

(RHC nº 14.740/PR, 5ª Turma, rel. min.

Jorge Scartezzini, j. 18.03.04, v.u., DJU

10.05.04, p. 301). Crime hediondo. Liberdade provisória.

Necessidade de fundamentação “Não foi dado ao legislador ordinário legi-timidade constitucional para vedar, de forma absoluta, a liberdade provisória quando em apuração crime hediondo e assemelhado. In-constitucionalidade do art.2°, II, da Lei nº 8.072/90. A manutenção da prisão em fla-grante deve, necessariamente, ser calcada em um dos motivos constantes do art. 312 do Código de Processo Penal e, por força do art.

5º, XLI e 93, IX, da Constituição da Repúbli-ca, o magistrado, ao negar a liberdade provi-sória, está obrigado a apontar os elementos concretos mantenedores da medida.

(RHC nº 15.478/MG, 6ª Turma, rel. min.

Paulo Medina, j. 06.04.04, v.u., DJU 10.05.04,

p. 347).

Prisão especial para magistrado. Lei Orgânica da Magistratura. Aplicabilidade

“(...) com base no art. 295, inciso VI, do Cód. de Processo Penal c/c o art. 33 da Lei Complementar nº 35/79 (LOMAN), não há, nas novas dependências da Superintendên-cia da PolíSuperintendên-cia Federal em São Paulo, ‘local condizente com os ditames da lei’ (fls. 58) para acomodar o paciente, juiz aposentado do Tri-bunal Regional do Trabalho. Prisão domici-liar concedida.”

(HC nº 29.642/SP, Corte Especial, rel. min.

Francisco Peçanha Martins, j.18.02.04, v.u.,

DJU 03.05.04, p. 85). Férias forenses. Prazos para recursos. Ininterrupção

“A despeito de ter havido inicialmente al-guma vacilação na jurisprudência, e bastante controvérsia, ainda hoje, na doutrina, o en-tendimento predominante nesta Corte apon-ta no sentido de que a regra insculpida no art. 798 do CPP subsiste, isto é, os prazos para a interposição de recursos criminais são fatais: contínuos e peremptórios, não sendo inter-rompidos ou suspensos por férias, domingos ou feriados, ressalvadas as excepcionalidades previstas no próprio dispositivo legal em co-mento, ou, ainda, obviamente, no caso de o respectivo tribunal, no período de recesso, não ter disponível o serviço de protocolo geral.”

(REsp. nº 511.100/PR, 5ª Turma, rel. min.

Laurita Vaz, j. 23.03.04, v.u., DJU 10.05.04,

p. 330).

Busca e Apreensão.

Delimitação do ato. Exacerbação. Juiz como Autoridade Coatora. Delegado mero executor

“A alegação também está vazada contra o próprio ato que determinou a referida busca e apreensão, no sentido de que teria sido pro-latado de forma genérica, oportunizando, desta feita, que o delegado cometesse excessos durante o ato. Legitimidade do exmo. sr. juiz apontado como coator. Recurso provido com a anulação do aresto recorrido e novo pro-nunciamento da Corte a quo no tocante ao próprio mérito da controvérsia.”

(ROMS nº 13.101/DF, 5ª Turma, rel. min.

José Arnaldo da Fonseca, j. 13.04.04, v.u.,

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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL

Jurisprudência compilada por

Andréa Cristina D’Angelo,,,,, Bárbara Machado Franceschetti

e Cláudia Pinto Moreira Falsidade ideológica.

Consumação. Confissão. Obrigatoriedade de seu reconhecimento. Réu reincidente.

Pena. Substituição por restrititiva de direitos. Possibilidade

“O crime de falsidade ideológica consu-ma-se com a omissão ou inserção direta ou indireta da declaração falsa ou diversa da que devia constar. Trata-se de crime de natureza formal, que não exige prejuízo efetivo, bas-tando a possibilidade de dano.

É assente o entendimento do Superior Tri-bunal de Justiça no sentido de que a confis-são espontânea configura-se tão-somente pelo reconhecimento do acusado em juízo da auto-ria do delito, pouco importando se o conjunto probatório é suficiente para demonstrá-la.

O art. 44, § 3º, do CP, permite a substitui-ção da pena privativa de liberdade por restri-tiva de direitos ao condenado reincidente, desde que a medida seja recomendável.”

(TRF 4ª Região, Ap. nº 200271000503631, 8ª Turma, rel. des. fed. Otávio Roberto

Pam-plona, j. 03.03.04, v.u., DJU 10.03.04, p. 555).

Receptação dolosa. Elemento subjetivo. Dolo direto.

Mutatio libelli. Segunda Instância. Impossibilidade.

Súmula 453 do STF.

Absolvição. Ausência de prova “Não se configura o delito de receptação dolosa quando ausente nos autos prova do elemento subjetivo do tipo — ciência inequí-voca, pelo agente, de que a coisa é produto de crime (dolo direto).

Havendo meros indícios de que o réu co-nhecia a proveniência ilícita, em face das cir-cunstâncias em que os cheques foram deposi-tados em sua conta, poder-se-ia configurar a forma culposa do crime de receptação. Po-rém, se a denúncia não descreve, sequer im-plicitamente, o procedimento culposo, não há como reconhecê-lo em segunda instância, sem dar cumprimento à regra do art. 384, caput, do CPP, sob pena de ofensa ao princípio cons-titucional da ampla defesa. A Súmula 453 do STF, entretanto, deixou assentada a impos-sibilidade da mutatio libelli em segunda ins-tância, razão pela qual deve ser mantido o decreto absolutório.”

(TRF 4ª Região, Ap. nº 200304010430650, 8ª Turma, rel. juiz. fed. Otávio Roberto

Pam-plona, j. 18.02.04, v.u., DJU 03.03.04, p. 521).

Competência. Concussão. Crime praticado por médico credenciado ao SUS. Art. 109, IV, da CF. Competência da Justiça Estadual

“A Constituição Federal, em seu art. 109, IV, dispõe ser da competência dos juízes fede-rais processar e julgar ‘(...) as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autár-quicas ou empresas públicas (...)’.

A eventual cobrança indevida de valores,

por médico credenciado ao Sistema Único de Saúde - SUS, não lesiona o patrimônio ou os interesses da União, uma vez que somente atinge o paciente atendido. Incompetência da Justiça Federal. Precedentes.

Recurso criminal improvido.”

(TRF 1ª Região RC nº 200238030051975, 4ª Turma, rel. des. fed. Ítalo Fioravanti Sabo

Mendes, j. 18.02.04, v.u., DJU 11.03.04, p. 43).

Contribuição previdenciária. Lei nº 8.212/91, alínea ‘d’ e § 1º do art. 95. Atual art. 168-A do CP

“A falta de recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas dos salários de empregados constitui crime cuja punição exi-ge, como prova de sua prática, mais do que fotocópia de peças do proceosso administra-tivo-fiscal que apurou o crédito tributário.

Para a caracterização do delito previsto na Lei nº 8.212/91, art. 95, ‘d’, é imprescindível a existência do elemento subjetivo do tipo, cons-ciente na vontade de apropriar-se indevida-mente dos valores devidos à previdência.

Se os fatos narrados na denúncia não apontam a existência do elemento subjetivo, a conduta descrita é atípica.

Alterações promovidas no Código Penal pela Lei nº 9.983/00 não alteram os funda-mentos do voto na vigência do art. 95, ‘d’ da Lei nº 8.212/91.

Sentença que se reforma para absolver a apelante.

Recurso provido.”

(TRF 2ª Região, Ac. nº 2002.02.01.001258-1, 1ª Turma, rel. juíza fed. Julieta Lídia Lunz, j. 28.04.03, m.v., DJU 03.05.04, p. 159). Denúncia estribada em inquérito policial. Art. 514 do CPP. Inaplicação. Concessão da

liberdade provisória mediante fiança. Pena inferior a 2 anos.

Crime não causador de clamor público e não cometido mediante violência à pessoa ou grave ameaça. Aplicação dos arts. 5º, LXVI da CF e 323, I e V do CPP

“O rito processual estabelecido nos artigos 513 e 518 do Código de Processo Penal é apli-cável aos crimes funcionais típicos apenados com reclusão ou detenção, devendo, para tan-to, a denúncia ser instruída com documentos ou justificação que façam presumir a existên-cia do delito ou com declaração fundamen-tada da impossibilidde de apresentação de qualquer dessas provas.

No caso, em se tratando de denúncia ou queixa estribada em inquérito policial, a res-posta prévia de que trata o artigo 514 do Có-digo de Processo Penal se torna dispensável.

O fato do acusado ter sido condenado a pena inferior a dois anos, além do crime não ter causado clamor público, e nem tampouco ter sido cometido com violência contra a pessoa ou grave ameaça, enseja a aplicação do artigo 323, incisos I e V, do Código de Processo Penal.

Hipóteses autorizadoras da medida

caute-lar inocorrentes, sendo de rigor a concessão da liberdade provisória, nos termos do artigo 5º, inciso LXVI, da Constituição Federal, e artigo 323, incisos I e V, do Código de Processo Penal. Ordem concedida, no sentido de outorgar ao paciente a liberdade provisória mediante fiança.”

(TRF 3ª Região, HC nº 200203000465349, 5ª Turma, rel. des. fed. Suzana Camargo, j. 30.03.04, m.v., DJU 30.03.04, p. 175). Descaminho: princípio

da insignificância.

Denúncia: rejeição. CPP, art. 43, I “Não merece censura a decisão que rejeita a denúncia, entendendo como atípica a con-duta do denunciado, visto que a 3ª Turma vem entendendo que não se deve falar em descaminho, em se tratando de posse de pe-quena quantidade de mercadorias estrangei-ras, de reduzido valor, que por si só já indica inexistir lesão ao Fisco, de modo a autorizar a movimentação do aparelho estatal encarre-gado da repressão. Precedentes.

Recurso a que se nega provimento.” (TRF 1ª Região, RC nº 1998.01.00.000872-8, 3ª Turma, rel. des. fed. Cândido Ribeiro, j. 03.03.04, v.u., DJU 26.03.04, p. 127). Evasão de divisas.

Art. 22 da Lei nº 7.492/96. Art. 1º, VI, da Lei nº 9.613/98. Inquérito policial. Trancamento. Atipicidade da conduta

“Paciente preso em flagrante quando pre-tendia sair do País com certa quantia de dó-lares, encontrada no bolso de sua calça.

Habeas corpus para trancar o inquérito po-licial no qual se lhe atribui violação aos arts. 22 da Lei nº 7.492/86 e 1º, VI, da Lei nº 9.613/98. O trancamento do inquérito policial só é possível se houver atipicidade do fato, ou seja, se não houver crime a apurar.

Para configuração do tipo do art. 1º da Lei nº 9.613/98, há que se ter a pré-existência de outro crime, cujo produto se quer ocultar ou dissimular. Não havendo intenção de ‘la-var dinheiro sujo’ ou ‘esquentar dinheiro frio’, não se tem nem indícios da prática do delito. O tipo penal do art. 22, caput, da Lei nº 7.492/86 apresenta elemento normativo ma-terializado na expressão ‘não autorizada’, além do elemento subjetivo correspondente ao ‘fim de promover evasão de divisas do País’. No caso concreto a intenção do paciente não era re-meter clandestinamente divisas para o exte-rior, mas, sim, acudir seu irmão preso nos EUA. Falta de adequação típica subjetiva.

Ordem de habeas corpus concedida para trancar o inquérito policial instaurado.”

(TRF 2ª Região, HC nº 20010201466187, 3ª Turma, rel. juiz fed. Francisco Pizzolante, j. 14.10.03, v.u., DJU 24.11.03, p. 180).

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Invalidade da denúncia embasada em procedimento administrativo criminal do MP

“(...) Inicialmente, cabe ressaltar que o pro-cedimento administrativo impugnado no pre-sente habeas corpus, criado nos moldes do In-quérito Policial, pretende legitimar atos de natureza investigatória do Ministério Públi-co do Estado de São Paulo, realizando dili-gências, naturais da Polícia Judiciária, para proporcionar a instauração de eventual ação penal, pretende encontrar guarida nos Atos Normativos nºs 314- PGJ/CPJ, de 27 de ju-nho de 2.003, e 324-PGJ/CGMP/CPJ, de 29 de agosto de 2.003, de autoria do Órgão Mi-nisterial Estadual.

Portanto, deve ficar claro que os referidos Atos Normativos não têm força ou natureza de Lei Complementar, cuja iniciativa deve, necessariamente, ser do procurador-geral de Justiça, em se tratando de procedimento de ordem administrativa, de competência do Ministério Público, no âmbito estadual, e que não refogem a todo um procedimento legis-lativo de análise e promulgação.

(...) A norma constitucional não contem-plou ao órgão ministerial as funções de reali-zação e presidência de inquéritos policiais, ainda que instaurados em face de uma ne-cessária investigação de autoridade policial, como no caso em espécie.

Seu papel de defensor da ordem pública jurídico-social, não afasta a existência de li-mites, também de ordem constitucional e legal, no seu âmbito de atuação, quando busca alcançar o exercício do poder puniti-vo do Estado, através da prestação jurisdi-cional.

(...) Não se pode, desta forma, seja cons-titucionalmente ou legalmente, afastar-se a falta de legitimidade do Ministério Pú-blico para realizar diretamente investiga-ções e diligência através de procedimento administrativo de natureza criminal, de sua autoria, ainda que com a finalidade de apuração de eventuais condutas ilícitas, co-metidas por autoridade policial, como no caso em espécie.

(...) Com o devido respeito, não podemos acolher considerações tais como — ‘quem pode o mais pode o menos’, ou seja, se com-pete ao órgão ministerial a interposição da ação penal pública, deveria ser entendida como pertinente a sua atuação no campo da persecução penal, pré-processual, de for-ma direta, através de sucedâneo de inquéri-to policial.

Se admitíssemos o procedimento adminis-trativo criminal, como legal e legítimo, estaría-mos diante de uma superposição do Ministé-rio Público em relação à Polícia Judiciária, em exercício de verdadeiro controle interno da Polícia, já que não estaria lhe sendo

atri-buído o poder de investigar, mas de controlar a atividade pré-processual de colheita de pro-vas, incompatível com quem pretende o exer-cício fiscalizador destas atividades.

(...) Portanto, não há como considerar vá-lida a denúncia ora impugnada, diante de seu vício originário nas peças de informa-ção, ilegal e ilegitimamente colhidas em pro-cedimento administrativo criminal interno do Ministério Público do Estado de São Paulo, realizado no âmbito do Gaerco de Campinas.”

(TJ/SP, HC nº 440.810-3/7, 1ª C. Crim. Extraordinária, rel. des. Marco Antonio, j. 18.02.04, m.v.). Tráfico de entorpecentes. Falta de aplicação do rito estabelecido na Lei nº 10.409/02. Nulidade

“(...) Não foi aplicado o novo rito previsto na Lei nº 10.409/2002 que oportuniza à ré apresentar a defesa preliminar. Esta tem por escopo evitar o recebimento da denúncia ofe-recida em seu desfavor.

(...) Como se vê, foi apresentada em favor da ré a tradicional defesa prévia e não a defe-sa preliminar exigida na nova lei de tóxicos. Embora as expressões defesa preliminar e defesa prévia guardem sinonímia, juridica-mente elas não são equipolentes.

(...) Ao que se vê, a peça apresentada pela defesa não demonstrou o seu objetivo, qual seja, o de fornecer elementos que pudessem justificar o possível não recebimento da de-núncia ofertada em desfavor da ré (...).

Limitou-se a noticiar os seus predicados pessoais e reservar a discussão do mérito da causa quando da instrução criminal, o que é incomportável do novo procedimento esta-belecido pela Lei nº 10.409/02.

Assim, ocorrido o recebimento da denún-cia anteriormente à apresentação da defesa escrita, é de se declarar a nulidade do proces-so como já se posicionou esta Egrégia Corte de Justiça em situações jurídicas semelhantes Nesta condições, ante a nulidade apon-tada é que de ofício declaro a nulidade do processo a partir da defesa preliminar, in-clusive. Expeça-se alvará de soltura em fa-vor da ré.”

(TJ/GO, Ap. nº 24483-1/213, 1ª C. Crim., rel. des. Paulo Teles, j. 16.12.03, v.u.). Contravenção de jogo do bicho. Liberdade provisória.

Ouvida do MP

“Entendo que a não-oitiva do Ministério Público, nos termos do art. 310 do Código de Processo Penal, é mera irregularidade não maculando com nulidade o ato decisório.

Em verdade, momentos há que a

urgên-cia impõe a omissão. Explico-me: no momen-to em que o juiz, de imediamomen-to, entende que o cidadão merece benefício da liberdade provi-sória, deve concedê-la sem maiores delongas, sob pena de se transformar em autoridade coatora — aliás, a liberdade se dá, inclusive, de ofício. Ao órgão acusador resta, então, re-correr de tal decisão, se com ela não se con-formar.

E não se trata — como quer fazer crer — de desobediência à lei, mas de respeito a princípio maior Constitucional, qual seja, ninguém é mantido em prisão se direito tem a liberdade. E tudo se faz de imediato, pena de se prolongar, injustificadamente, terrível coação ilegal — estamos a tratar de prisão!!!”

(TJ/RS, RSE nº 70008176414, 5ª C. Crim., rel. des. Amilton Bueno de Carvalho, j. 07.04.04, v.u.).

Princípio da insignificância.

Criação doutrinária e jurisprudencial. Embargos rejeitados

“A alegação dos representantes do Minis-tério Público que o colegiado foi omisso nos fundamentos jurídicos que possibilitaram a aplicação do princípio da insignificância, não tem procedência. O acórdão, citando dou-trina e jurisprudência, está motivado.

(...) No caso em exame (e somos obrigados a discutir a subtração de poucas abóboras, meus Deus), o acórdão, como se verá infra, analisou os fundamentos jurídicos aplicá-veis à insignificância e concluiu por sua apli-cação. Não houve nenhuma omissão, a não ser que os autores da petição de em-bargos, ‘porque não tem nada a fazer e o ócio cansa’, querem o impossível: dispositivos legais a respeito.

Afinal, eles sabem, ou deveriam sabê-lo, que a idéia de afastar o direito penal destes fatos irrelevantes é uma criação da doutrina que vem sendo acolhida pelos tribunais. Não existem normas legais a respeito.

(...) Ora, o que distingue uma ação consi-derada de bagatela ou insignificante, de ou-tra penalmente relevante e que merece a per-secução criminal, é a soma de três fatores: o valor irrisório da coisa, ou coisas, atingidas; a irrelevância da ação do agente; a ausência de ambição de sua parte em atacar algo mais valioso ou que aparenta ser.

(...) Assim, nos termos supra, rejeito os embargos.

(TJ/RS. Emb. Decl. nº 70007545148. 8ª C. Crim.,rel. des. Sylvio Baptista, j. 19.11.03, v.u.).

Jurisprudência compilada por

Carlos Roberto Isa, Paulo Sérgio de Oliveira e Vinícius de Toledo Piza Peluso

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TRIBUNAL DE ALÇADA CRIMINAL

TRIBUNAL DE ALÇADA CRIMINAL

Jurisprudência compilada por

Paula Kahan Mandel, Renato Spaggiari e Vanessa Pelhe Gimenez

Acidente de trânsito.

Condenação em primeira instância por crime culposo fundamentada na exigência de previsibilidade do acidente. Impossibilidade de exigência de conduta diversa. Fato imprevisível. Ausência de culpa. Recurso provido

“(...) as testemunhas que se encontravam dentro do veículo foram unânimes em afir-mar que a vítima, enquanto fazia o percurso do acidente, parou no meio da pista, mos-trando-se insegura quanto a continuar o per-curso, momento em que optou por seguir em frente, vindo a ser fatalmente atingido.

Além disso, é preciso considerar que o arti-go 254, V do Códiarti-go de Trânsito Nacional, tratando dos deveres do pedestre, elenca como infração passível de multa, ‘andar fora da fai-xa própria, passarela, passagem aérea ou sub-terrânea’.

Portanto, não é possível deixar de consta-tar que a vítima contribuiu para o resultado da ação uma vez que não tomou as precau-ções que devia quando decidiu cruzar a via asfáltica.

Dessa forma, não é possível exigir, ao ho-mem médio, que consiga prever a possibilida-de possibilida-de um transeunte, em possibilida-desrespeito às normas de trânsito, cruzar a via rápida fora do local adequado, sem prestar a atenção necessária.” (TA/PR, Ap. nº 249.596-3, 4ª C. Crim, rel. juiz Marcus Vinicius de Lacerda Costa, j. 18.03.04, v.u., DJ 08.04.04).

Lei nº 9.271/96. Fato anterior a sua vigência. Não aplicação, por conter preceito penal mais gravoso

“Versando a prescrição como direito mate-rial do acusado, revelando-se como instituto de direito penal, que pela Lei nº 9.271/96, alterou-se, tornando gravosa em relação ao ordenamento penal já referido, não deverá ser aplicada, ou melhor, não deverá ser sus-penso o prazo prescricional, porque a data do fato, do recebimento da denúncia e mes-mo da citação por edital ocorreram antes da vigência da Lei nº 9.271/96.

Observe-se a tese no sentido de não se apli-car a Lei nº 9.271/96 quando o crime foi co-metido anteriormente à mesma, hipótese dos autos, porque o aspecto processual da referi-da norma legal estabelece o princípio do tem-pus regit actum que torna inaplicável a lei mais benéfica quando o caráter substantivo (sus-pensão da prescrição) é mais gravoso que a norma anterior (novatio legis in pejus).

(...)

O mais correto, contudo, é examinar em cada caso concreto qual dentre as situações – curso da prescrição sem suspensão do pro-cesso e suspensão do feito, mas com suspen-são também, do prazo prescricional – seria mais favorável ao réu, tendo-se sempre em mente a indissociabilidade do sobrestamento do processo e da suspensão da prescrição dis-postos na referida lei, afirmada pelos prece-dentes citados do Supremo Tribunal Federal.

E, na espécie, parece evidente que a apli-cação da nova lei, ainda que integral, é preju-dicial ao réu, ou seja, a suspensão do processo e a suspensão da prescrição.”

(TACrim/SP, RSE n° 1.381.621/4, 16ª C. Crim., rel. juiz Marcos Ramos, j. 03.03.04, v.u.).

Remição de pena pelo estudo. Possibilidade. Analogia com a remição pelo tempo de trabalho

“Nos termos do artigo 1º da LEP, a execu-ção penal tem por objetivo efetivar as disposi-ções de sentença ou decisão criminal e propor-cionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.

O estudo é uma atividade laboral, espécie de trabalho intelectual, pois o estudioso dedi-ca parte de seu tempo na busdedi-ca pelo conheci-mento, com sacrifício e esforço físico, corres-pondente ao trabalho.

O incentivo a atividade estudantil, através do instituto da remição é perfeitamente pos-sível, objetivando, através deste, a ressociali-zação do condenado.

A melhor interpretação da lei é a que se preocupa com a solução justa, não podendo o seu aplicador esquecer que o rigorismo na exe-gese dos textos legais pode levar a injustiça.”

(TA/PR, Ag. nº 240.666-4, 4ª C. Crim., rel. juiz Lauro Augusto Fabrício de Melo, j. 25.03.04, v.u., DJ 16.04.04).

Sentença que condenou o

querelado pelo crime de difamação e absolveu-o do crime de injúria. Caracterização, no entanto, somente do crime de injúria.

Ausência de apelação do querelante. Proibição da reformatio in pejus. Absolvição para ambos os crimes

“(...) a expressão ‘praticou alguns ilícitos’ não configura difamação mas, sim, injúria.

(...)

Assim, por difamação não poderia ser o recorrente condenado porquanto a expressão desonrosa não configura tal modalidade pe-nal. Desse modo, não há que prevalecer a con-denação do querelado por difamação em ra-zão da atipicidade.

É sabido que o acusado defende-se da des-crição fática, não da capitulação contida na petição inicial. Não obstante, a queixa-crime atribuiu ao querelado a prática, pelo mesmo fato, de dois crimes, injúria e difamação. Da injúria houve, expressamente, absolvição. E difamação, vê-se nesta instância, não ocorreu mas sim injúria. Como só a defesa recorreu, não há como mudar a condenação de difa-mação pela de injúria sob pena de reformatio in pejus (CPP, art. 617).

Dou provimento ao recurso para absolver o apelante, também da acusação relativa ao art. 21 da Lei de Imprensa, com fundamento no art. 386, III, do Código de Processo Penal.” (TA/PR, Ap. nº 251.000-3, 1ª C. Crim., rel. juiz Rogério Kanayama, j. 15.04.04, v.u., DJ 30.04.04)

Homicídio culposo.

Crime comissivo por omissão. Necessidade de comprovação de que teriam os agentes não apenas a obrigação

de agir, mas sim a de impedir o resultado. Ausência de nexo

causal entre a conduta e o resultado “Cuidando-se de imputação pela prática de crime comissivo por omissão, para se cogi-tar da configuração do ilícito penal far-se-ia mister comprovar-se que a conduta (omitida) seria devida, bem assim hábil e suficiente para obstar o dano ocorrido, atestando-se que o comparecimento e a atuação direta dos réus no atendimento da vítima reverteria seu grave quadro e evitaria sua morte (nexo de evitabi-lidade). Ou seja, para responsabilizar os agen-tes pelo evento danoso imprescindível seria provar-se que os agentes não teriam simples-mente a obrigação de agir, mas sim a de impe-dir o resultado, o que, definitivamente, não se deu.”

(TA/PR, Ap. nº 0127217-1, 2ª C. Crim., rel. juiz Ronald Juarez Moro, j. 05.02.04, v.u., DJ 05.03.04).

Ausência de intervenção do MP em ato processual.

Nulidade relativa. Convalidação pela aceitação de seus efeitos

“É certo que cabe ao Ministério Público, titular da pretensão punitiva estatal, nos ter-mos do que dispõe o artigo 594, inciso III, letra ‘d’ do Código de Processo Penal, sob pena de nulidade, intervir em todos os termos da ação penal.

No entanto, não menos certo é que o mes-mo Estatuto Processual, em seu artigo 572 e incisos, indicam especificamente as nulida-des passíveis de serem sanadas, ou sejam, aquelas denominadas nulidades relativas.

A contrário senso, conclui-se que as de-mais são insanáveis, motivo pelo qual são cha-madas nulidades absolutas. São elas, por ex-clusão, as previstas no artigo 564, inciso I, II e III, letras ‘a’, ‘b’, ‘c’, ‘e’ (primeira parte), ‘f ’, ‘i’, ‘j’, ‘k’, ‘l’, ‘m’, ‘n’, ‘o’ e ‘p’, certo que, relativa-mente a elas, inexiste preclusão, podendo ser argüidas a qualquer tempo, mesmo que haja sentença transitada em julgado, ou reconhe-cidas de ofício.

Como se nota, em princípio não se consti-tui nulidade absoluta a falta de intervenção do Ministério Público em ato processual, já que essa falha pode perfeitamente ser sanada ‘se a parte, ainda que tacitamente, tiver aceito os seus efeitos” (sic – artigo 572, inciso III, do CPP).”

(TACrim/SP, Ap.-Det. n° 1.358.767/5, 16ª C. Crim, rel. juiz Marcos Ramos, j. 03.03.04, v.u.).

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