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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUCSP FABIANA GRIECO CABRAL DE MELLO

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Academic year: 2018

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC/SP

FABIANA GRIECO CABRAL DE MELLO

A INTRODUÇÃO DA TELEVISÃO NA ESFERA FAMILIAR PAULISTANA NOS ANOS 50:

As transformações nos vínculos comunicativos familiares

Mestrado em Comunicação e Semiótica

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Comunicação e Semiótica, na área de concentração Signo e Significação nas Mídias, sob a orientação do Prof. Dr. Norval Baitello Junior.

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BANCA EXAMINADORA

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Agradeço por todos aqueles que direta ou indiretamente contribuíram para a realização deste trabalho:

Aos meus pais Ernesto e Marilda, pelas infindáveis demonstrações de amor e ensinamentos de valores que levarei por toda a vida.

Aos meus irmãos Gabriela, Alexandre e Eduardo, pelo suporte e companheirismo que têm demonstrado por todos esses anos.

Ao namorado Fábio Vicente Vetritti Filho, pelo carinho, dedicação e coragem em me fazer sonhar, sempre.

Aos amigos do mestrado Juliano Cappi, Martinho Alves da Costa Junior e Rodrigo Daniel Sanches, pela frutífera amizade que traz boas idéias.

Aos valiosos relatos da especialista Maria Aparecida Baccega e das vovós Clarice Simões Grieco, Tamar Simões Fragnam, Lucila Diniz Vetritti e Jacira Diniz Baños, pela emoção que me levou a uma viagem ao passado.

Aos professores e funcionários da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, pela competência e prontidão que demonstraram nestes anos de convivência.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, pelo incentivo financeiro.

Aos colegas do Centro Interdisciplinar de Semiótica da Cultura e da Mídia - CISC, pelo espaço e oportunidade de aprendizado.

À Profa. Dra. Malena Segura Contrera, pelos ensinamentos que me levaram a me aventurar pelo universo da comunicação.

Aos examinadores da Qualificação Profa. Dra. Dieli Vesaro Palma e Prof. Dr. José Eugenio de Oliveira Menezes, pela contribuição para a realização deste trabalho.

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RESUMO

Esta pesquisa analisa o modo como ocorreu a introdução da televisão na esfera da família, principalmente na de modelo patriarcal paulistano dos anos 50, e as conseqüências desse processo nos vínculos comunicativos estabelecidos nessa esfera. Dessa forma, realizou-se uma contextualização histórica do período, bem como uma contextualização do cenário da família, em suas principais características do ponto de vista da comunicação. Além disso, buscou-se definir a forma como ocorreu a disseminação desse novo meio de comunicação: os principais temas inseridos nesse processo, os programas que marcaram a história da TV, o surgimento dos astros e das estrelas e o início do agendamento de temas, conhecido como "agenda-setting". Para tanto, a metodologia empregada foi constituída de pesquisa histórica, pesquisa bibliográfica e entrevistas em profundidade. A pesquisa histórica consistiu em investigação na seção de anúncios publicitários dos jornais “O Estado de São Paulo”, “A Folha da Manhã” e “Folha de São Paulo”. Por meio da pesquisa bibliográfica, a questão da introdução da TV na esfera familiar e seus desdobramentos foi analisada sob a luz de diversos estudiosos da comunicação, como Edgar Morin, Boris Cyrulnik e Harry Pross, com especial ênfase para este último autor. Os trabalhos desses especialistas permitiram discutir se a introdução da televisão no âmbito da comunicação familiar respeitou as oportunidades e a capacidade de diálogo social entre os familiares, ao invés de ter investido no desenvolvimento da multiplicidade que conduz ao isolamento e à perda da comunicação social. O resultado da pesquisa constatou que a televisão interferiu na dinâmica dos relacionamentos interpessoais e foi realmente capaz de transformar os vínculos comunicativos familiares. Vale, assim, ressaltar a contribuição da Dissertação para os estudos da Comunicação e Semiótica ao lançar um olhar sobre a nossa própria história e ampliar o horizonte do conhecimento que possa melhorar o desempenho de nossas habilidades comunicativas, tanto no seio da família, quanto nas mais diversas esferas sociais.

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in that one representing the patriarchal model of the 50´s in the city of São Paulo, Brazil, as well as the consequences of this process in the established communicative bonds in this sphere. Therefore, the historical period along with the family scenario were contextualized, considering their main characteristics from a communication viewpoint. Moreover, a definition of the ways and means of achieving the dissemination of this new media was investigated: the main topics inserted in this process, programs that stood out in the history of television, the making of stars and the beginning of the scheduling of subjects, known as “agenda-setting”. In order to achieve such goal, the methodology used was that of historical research, bibliographical research and in-depth interviews. The historical research was done through study of the advertising section of the following newspapers: "O Estado de São Paulo", "A Folha da Manhã" and “Folha de São Paulo”. Through bibliographical research, the question of the introduction of the TV in the familiar sphere and its consequences was analyzed according to the works of many communication experts, such as Edgar Morin, Boris Cyrulnik and Harry Pross, with special emphasis on this last author. The ideas of these specialists have allowed discussion as to whether the introduction of television in the scope of familiar communication respected the chances and the capacity of social dialogue among family elements, or if it invested in the development of the multiplicity that leads to isolation and the loss of social communication. The result of the research evidenced that the television intervened in the interpersonal relationships dynamics and was really able to transform the family communicative bonds. It is worth, thus, to point out the contribution of this paper to the studies of the Communication and Semiotics while casting an eye over our own history and broadening the horizons of knowledge that can improve the performance of our communicative abilities, in the midst of the family or in the most diverse social spheres.

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1 DESVENDANDO O CENÁRIO HISTÓRICO E ANALISANDO O CENÁRIO

DAS FAMÍLIAS DOS ANOS 50...11

1.1 Cenário histórico: conhecendo os principais acontecimentos que possibilitaram o surgimento da televisão...13

1.1.1 O universo político...14

1.1.2 O capital estrangeiro frente às leis de regulamentação dos meios de comunicação...18

1.1.3 A crise do papel e a liberdade de imprensa...22

1.1.4 O início do declínio do rádio após décadas de apogeu...26

1.2 Cenário familiar: o modelo patriarcal da família da elite paulistana nos anos 50 e a comunicação na esfera familiar...34

1.2.1 O papel dos pais...37

1.2.2 As relações e vinculações estabelecidas entre os familiares pelo nascimento...45

1.2.3 A formação da noção de comunidade por meio dos vínculos...48

1.2.4 Construção de vínculos familiares X troca de informações...51

2 MODUS OPERANDI: O FUNCIONAMENTO DO APARELHO...57

2.1 Principais aspectos inseridos no processo de disseminação da televisão ao longo da década de 50...60

2.1.1 A magia da tecnologia e a onda do futurismo...62

2.1.2 A divulgação dos bons costumes...69

2.1.3 O desenvolvimento da televisão atrelado ao futebol...75

2.2 Programas que marcaram a história da TV...86

2.2.1 Teleteatro – TV de Vanguarda...88

2.2.2 Telenovela – Sua vida me pertence...92

2.2.3 Telejornal – Repórter Esso...98

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3.1.1 O surgimento dos astros e estrelas – os artistas e as

garotas-propaganda...111

3.1.2 Fenômeno agenda-setting...118

3.2 Relação entre a introdução da televisão e a esfera da comunicação familiar paulistana...124

3.2.1 A interferência da televisão na comunicação primária...126

3.2.2 As modificações no tempo e no espaço...131

3.2.3 As transformações nos vínculos familiares...138

CONCLUSÃO...146

BIBLIOGRAFIA...155

ANEXOS...166

Anexo A - Roteiro da entrevista com especialista...167

Anexo B - Roteiro das entrevistas com moradores da cidade de São Paulo dos anos 50...169

Anexo C - Entrevista com Maria Aparecida Baccega...170

Anexo D - Entrevista com Lucila Diniz Vetritti...179

Anexo E - Entrevista com Jacira Diniz Baños...184

Anexo F - Entrevista com Clarice Simões Grieco...189

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É curioso observar o grau de penetração da televisão no cotidiano dos brasileiros das mais diversas regiões do país. Pesquisas mais recentes trazem dados significativos sobre esse aspecto ao revelar que há 162,9 milhões1 de pessoas que moram em domicílios com televisão colorida, o que significa dizer que mais de 90 % da população2 tem acesso a esse meio de comunicação. Atualmente o acesso à televisão parece ser um fator que independe da classe social, uma vez que famílias de classe alta e de classe baixa conseguem assistir aos mesmos programas exibidos pela TV aberta. Entretanto, essa questão do acesso à televisão não foi sempre assim.

O surgimento da televisão em 1950 foi um acontecimento que marcou a história dos meios de comunicação do país. Apenas 200 televisores (MATTOS, 2002, p. 81) foram importados por Assis Chateaubriand e espalhados pela cidade de São Paulo, instalados em estabelecimentos comerciais ou casas de famílias da elite. O difícil acesso aos televisores foi um fator importante para a construção de um diferente cenário comunicacional nos quais os aparelhos foram introduzidos. Na verdade, a questão do acesso à TV na primeira década de sua implantação é um fator importante, porém ineficiente para responder como foi o processo de introdução da televisão no Brasil.

Partindo da consideração de que nos dias de hoje os índices de acesso à televisão são altos e tendo como interesse a verificação sobre a forma como os telespectadores tiveram acesso às primeiras televisões do país, é que o desejo para a realização desta pesquisa foi ganhando força. É evidente que apenas o desejo pessoal em ler sobre determinado tema não teria garantido a realização deste trabalho. A vontade em estudar o período de surgimento da televisão no país foi crescendo à medida que as leituras avançaram sobre o vasto campo da comunicação.

Conforme a leitura começou a indicar, a maior parte dos livros sobre televisão, comunicação e jornalismo tratava a questão do advento e do desenvolvimento da TV a partir de uma ótica puramente histórica. E não há nenhum problema nesse tipo de abordagem, já que muitos trabalhos que se ocupam desta temática pelo viés histórico o

1 Dado retirado do texto Brasil tem mais TV em cores do que esgoto, escrito por Talita Bedinelli e divulgado

no dia 19 de março de 2007. Encontra-se na seção de reportagens do site do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, disponível em: www.pnud.org.br. Os dados para o texto foram extraídos da PNAD 2005 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio), realizada pelo IBGE.

2 Essa estimativa foi possível graças aos dados do Censo Demográfico de 2000: Resultados do Universo,

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fazem com maestria. A grande questão é que o desejo pessoal de entender o processo de surgimento da TV acabava buscando respostas que não estavam estampadas nos livros de história. Porém, como conhecer o processo de surgimento da televisão no Brasil, se não há nenhum tipo de estudo que analise de maneira relacionada esse advento e as pessoas que viviam nos ambientes nos quais foram introduzidos esses novos meios de comunicação?

Esta foi a chave para a realização desta pesquisa. É possível encontrar livros e estudos que analisam a televisão sob uma ótica histórica, bem como há materiais que realizam esta análise sob a ótica publicitária, econômica, enfim, há inúmeros assuntos que podem ser relacionados com a televisão. Acontece que há uma lacuna nos estudos da Comunicação e da Teoria da Mídia, que visa ser preenchida com a realização desta pesquisa ao fazer uma análise que relaciona o advento e o desenvolvimento da TV no país com os grupos mais afetados pela introdução dos aparelhos em suas esferas comunicacionais.

Logo, foi estabelecido o objetivo principal deste trabalho: verificar como ocorreu o processo de introdução da televisão na esfera familiar paulistana nos anos 50 e quais foram as conseqüências desse processo nas estruturas comunicativas entre os familiares. De forma mais específica, este trabalho pretende analisar se a introdução da televisão nessa esfera foi capaz de transformar os vínculos comunicativos estabelecidos entre os familiares. A partir dessa definição objetiva do que devia ser avaliado neste trabalho, houve a escolha de uma metodologia que desse suporte para o desenvolvimento da pesquisa.

É importante ressaltar que as escolhas, nesse momento, não partiram simplesmente de uma questão de gosto pessoal. As leituras e a oportunidade de conhecimento do tema antes da definição metodológica evitaram que uma metodologia previamente estabelecida amputasse o objeto ou lhe colocasse em uma camisa de força. Conforme as leituras foram sendo feitas, o próprio objeto foi determinando quais caminhos deveriam ser seguidos para que a pesquisa ficasse mais completa e respeitasse a veracidade dos acontecimentos ligados à televisão nos anos 50.

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profundidade. A pesquisa bibliográfica foi, então, a primeira etapa e representou um procedimento fundamental para o embasamento teórico dos conceitos desenvolvidos nos capítulos a seguir. Dentre os muitos estudos e teorias consultadas, merecem destaque os trabalhos do neuropsiquiatra francês Boris Cyrulnik, do sociólogo francês Edgar Morin e do jornalista e teórico da comunicação alemão Harry Pross.

A utilização de alguns conceitos dos três autores acima citados parece ser a adoção de uma medida abrangente, de acordo com as diferentes áreas nas quais cada um se insere. No entanto, é fundamental ressaltar o caráter investigativo desta pesquisa ao avaliar tópicos que são objetos de estudo de diferentes campos, mas que tenham feito parte do processo de introdução da televisão na esfera social da família dos anos 50. Dessa forma, os conceitos desenvolvidos por cada um desses estudiosos deram uma contribuição efetiva no que diz respeito aos diferentes itens analisados nos três capítulos que dão corpo a este trabalho.

De forma geral (e resguardando a apresentação dos principais assuntos abordados em cada capítulo, como consta no fim desta introdução), a pesquisa foi divida em três grandes partes: o retrato do cenário histórico-familiar dos anos 50, os temas e programas característicos no período de surgimento da televisão e as conseqüências geradas pelo processo de introdução da TV na esfera da família. Sendo assim, podemos identificar que determinados conceitos desenvolvidos por esses estudiosos esclareceram temas que acabaram por dar sustento a esta análise.

Por exemplo, Boris Cyrulnik desenvolve pesquisas muito interessantes sobre o comportamento dos animais em seu meio natural, assim como avalia o ser humano a partir de uma abordagem da psiquiatria, biologia, lingüística e outras áreas do conhecimento. O que mais interessa nesta análise é a utilização de conceitos sobre o vínculo, a noção de pertencimento ao clã, à família, enfim, à comunidade na qual o homem está inserido e a necessidade do afeto. Esses conceitos desenvolvidos por Cyrulnik foram essenciais no primeiro capítulo para que, tendo-os como base, fosse possível compreender de que modo os meios de comunicação são capazes de atuar e interferir nas características inerentes ao ser humano.

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diferentes períodos da história. Os conceitos apresentados nos dois volumes da publicação Cultura de Massas no Século XX foram primordiais para situar o homem em meio a um conjunto de mudanças características dos anos 60 e 70 ao analisar “as conseqüências sociais, psicológicas e espirituais da penetração da Tierce Culture ou da mass culture nos aglomerados sociais3”. Ainda que possa parecer um equívoco a utilização dos livros que analisam o cotidiano das pessoas nas décadas de 60 e 70, deve ficar claro que os conceitos apresentados nessas obras não se encerram em si mesmos.

As obras de Edgar Morin deram embasamento teórico e possibilitaram uma comparação entre seus escritos e os fenômenos observados na sociedade brasileira com o surgimento da televisão nos anos 50. Essa comparação fica evidente em alguns itens, como por exemplo, no momento em que os artistas e garotas-propaganda ganharam status de astros e estrelas da TV. Ainda a respeito dos estudiosos que foram indispensáveis para a realização desta pesquisa, é necessário apontar a importância vital das teorias de Harry Pross. Esse teórico da comunicação elaborou conceitos que guiaram o percurso desta pesquisa, partindo do pressuposto básico de que os meios de comunicação podem ser definidos em três instâncias.

Somente por meio da compreensão sobre os conceitos de comunicação primária, secundária e terciária tornou-se possível compreender a comunicação interpessoal dos familiares e a introdução da televisão nessa instância. Isso porque o diálogo, caracterizado pela comunicação interpessoal, presencial e marcada pela mesma noção de tempo e espaço, ganhou um novo elemento quando a TV foi introduzida no cenário comunicacional familiar. Com a televisão, a comunicação pautada no corpo, logo, nos meios primários, foi transformada. A TV é um meio terciário, “isto é, os que funcionam quando emissor e receptor possuem aparatos compatíveis, vinculados entre si por ondas eletromagnéticas” (2000, p. 79), que modificou a dinâmica da comunicação e o processo de vinculação na esfera familiar.

Além disso, o conceito de “economia de sinais”, definido como “a tendência de superar no menor tempo possível os maiores espaços possíveis com o menor gasto possível para a comunicação individual” (1989, p. 97), dá suporte para entendermos a lógica do funcionamento da televisão e o interesse em superar no menor tempo as

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maiores distâncias em função do menor gasto. Essas questões vão ao encontro das indagações que surgem ao longo da pesquisa, como pode ser verificado nos capítulos apresentados.

Deste modo, Boris Cyrulnik, Edgar Morin e Harry Pross foram indispensáveis, embora os conceitos de muitos outros autores também tenham sido importantes ao longo da pesquisa bibliográfica. Conforme a pesquisa bibliográfica foi avançando, iniciou-se a pesquisa histórica. Essa atividade esteve focada na investigação de anúncios publicitários veiculados nos jornais O Estado de São Paulo, A Folha da Manhã e Folha de São Paulo durante a década de 50. Os anúncios que melhor ilustram o quadro de surgimento da televisão, de venda dos aparelhos, de mudança de comportamento da população e de qualquer aspecto relevante para o desenvolvimento desta questão, foram fotografados e dispostos ao longo do corpo do texto desta pesquisa.

É importante ressaltar que os anúncios não foram colocados em anexo por dois motivos principais. O primeiro se refere à capacidade ilustrativa que os anúncios oferecem pela utilização do texto e das imagens, ou seja, os anúncios conseguem mostrar como a publicidade da época tratou o surgimento da televisão. Segundo, o material colocado em anexo neste trabalho diz respeito somente às entrevistas que aparecem transcritas e editadas segundo a consistência das próprias informações.

Deve ser feita uma consideração sobre as entrevistas colocadas em anexo. Foram realizadas cinco entrevistas em profundidade, sendo uma com a especialista Maria Aparecida Baccega e as outras quatro com moradores da cidade de São Paulo que viveram no período de surgimento da televisão. As entrevistas foram transcritas e editadas, segundo a relevância das informações para a realização deste trabalho. Sendo assim, as entrevistas não tendem a dar conta do tema da introdução da televisão na esfera familiar paulistana, embora sejam de grande valia para a pesquisa. As entrevistas são enriquecedoras à medida que trazem dados importantes e que, muitas vezes, estão diretamente relacionados aos itens tratados neste trabalho.

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considerando o enfoque dado ao surgimento da TV e a interferência desse novo meio de comunicação nos vínculos comunicativos estabelecidos entre os familiares. Porém, essa resposta corresponde a uma parte da problemática sobre o advento da TV e seus desdobramentos no cenário familiar.

Seguindo essa linha de raciocínio, devemos considerar que o estabelecimento de um objetivo e a busca por seu cumprimento representa uma questão de ordem teórica. A partir do momento em que se optou pela utilização das teorias de determinados autores, conseqüentemente acabou ficando de fora uma série de outros autores que também poderiam vir a acrescentar. Só que, essa agregação de um maior número possível de teorias necessariamente não responderia aos questionamentos que surgiram ao longo da análise.

Este é o caso, por exemplo, da maneira como foi tratada a questão da linguagem trabalhada por Vigotski.Se de um lado, está a complexidade e a importância de seus estudos, de outro, avaliou-se a necessidade de compreender o cenário comunicacional da família dos anos 50 e a interferência da televisão nesse processo. O resultado dessa ponderação foi o cuidado em não deixá-lo de fora desta análise, embora se haja evitado o aprofundamento de suas teorias. Os professores que compuseram a Banca de Qualificação deram contribuições valiosas com a citação de autores que poderiam dar suporte às idéias apresentadas neste trabalho. No entanto, não foi possível desenvolver novas pesquisas que contemplassem a profundidade dos autores e dos temas abordados por eles dentro do cronograma previsto para a realização desta pesquisa. A fim de evitar o risco de utilizar conceitos de forma equivocada, os estudos de recepção, a relação dialética/dialógica e as teorias acerca da metáfora, desenvolvidas por George Lakoff, não foram incluídos nesta pesquisa.

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As entrevistas foram de extrema importância para o delineamento do cenário histórico e familiar nos quais os entrevistados estavam inseridas nos anos 50. A limitação encontrada, no momento em que as perguntas estavam sendo formuladas, foi a possível dificuldade que os entrevistados teriam para lembrar com exatidão determinados aspectos que respondiam às perguntas feitas anteriormente. Diante dessa falha de memória que dificultaria o andamento das entrevistas, foram tomadas duas medidas que acabaram por facilitar essa atividade.

A primeira se refere à escolha dos entrevistados. Foram selecionados entrevistados que fizessem parte da mesma família, ou seja, o caráter das entrevistas em profundidade dá a possibilidade de tratar as mesmas questões com dois membros da mesma família, o que diminui o risco de falta de informações. Outra medida que contribuiu para a estrutura das entrevistas ficar mais clara foi a transcrição e a edição das informações, como foi dito anteriormente.

A partir dessas considerações, podemos dar início a definição da estrutura deste trabalho. Logo após esta introdução, há três capítulos que foram organizados de modo a cumprir o objetivo, já sinalizado, de avaliar o processo de introdução da televisão na esfera familiar paulistana nos anos 50 e as conseqüências desse processo nas estruturas comunicativas entre os familiares. Essa estrutura, aparentemente enxuta, diminui o escopo e aprofunda o tratamento das temáticas abordadas em cada capítulo.

Sendo assim, no primeiro capítulo serão apresentados os dois principais cenários que dão suporte para o advento e o desenvolvimento da televisão. O cenário histórico revela o universo político da década de 50, a constante mudança de presidentes, a interferência do capital estrangeiro nos meios de comunicação e a crise do papel que afetou a liberdade de imprensa. Ainda nesse item, é feita uma explanação sobre a importância do rádio e o papel que vinha desempenhando no período chamado de “fase de ouro do rádio”.

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sociedade paulistana com cada uma dessas famílias. O que resultaria em uma abordagem exaustiva e pouco esclarecedora.

O surgimento da televisão, representado por 200 aparelhos instalados nos estabelecimentos comerciais e nas casas das famílias da elite, acabou definindo o modelo de família a ser analisado. Na década de 50, o principal grupo social que teve acesso à televisão foi a família de modelo patriarcal da elite paulistana e seus agregados, como parentes, amigos e vizinhos. Nesse modelo de família patriarcal havia uma organização própria de um núcleo pai-mãe, acrescido de filhos que se mantêm fiéis aos comandos do chefe da família. Além disso, o capítulo apresenta o estabelecimento de relações interpessoais através dos vínculos e sua importância para a noção de comunidade.

Após essa apresentação dos cenários histórico e familiar, o capítulo 2 trata a questão do funcionamento do aparelho. Isto é, a partir do momento que se conhece o cenário no qual a televisão foi inserida nos anos 50, é necessário conhecer a forma como esse novo meio de comunicação começou a se desenvolver. Primeiro, o desenvolvimento da televisão está relacionado a temas, como o da tecnologia, da divulgação dos bons costumes e do futebol. Junto ao tema, estão os programas de diferentes gêneros que marcaram a história da TV: o teleteatro – TV de Vanguarda, a telenovela – Sua vida me pertence, o telejornal – Repórter Esso e o programa de perguntas e respostas – O céu é o limite.

Por meio da análise sobre os principais temas que fizeram parte do processo de introdução da televisão na esfera familiar paulistana e dos programas de grande sucesso que chamaram a atenção do público, foi possível verificar o início da interferência da televisão na organização da família de modelo patriarcal da elite paulistana dos anos 50. E é exatamente essa relação entre a televisão e a comunicação característica do cenário familiar que foi estabelecida no capítulo 3.

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Na segunda parte é possível estabelecer uma conexão entre todos os pontos que foram anteriormente apresentados no capítulo 1 e 2 e na primeira parte do capítulo 3. A avaliação dos acontecimentos que deram suporte para o surgimento da TV e da forma como esse meio foi se desenvolvendo, por meio de temas, programas e fenômenos gerados em sua própria estrutura, é indispensável para que possamos compreender a atuação desses fatores no processo de introdução da televisão na esfera familiar paulistana dos anos 50.

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DESVENDANDO O CENÁRIO HISTÓRICO

E ANALISANDO O CENÁRIO DAS

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A introdução da televisão na esfera familiar paulistana foi um processo resultante do surgimento desse meio de comunicação no país. Na verdade, é fundamental partir do princípio de que o advento da televisão e sua introdução na esfera familiar são fatores que fazem parte de um conjunto de ações características de um período de mudanças na estrutura econômica, social e política no Brasil (MATTOS, 2002, p. 27). A fim de compreender com maior exatidão como ocorreu o surgimento da TV em meio a essas mudanças, é necessário verificar quais eram os fatores, os acontecimentos e os personagens que marcaram a história do país nesse período.

Conhecer os eventos mais relevantes desse período, desde as movimentações políticas até as condições da imprensa e do rádio, é a única forma de começarmos a identificar quais foram os fatores que possibilitaram o surgimento da televisão. Sendo assim, a primeira parte deste capítulo ocupa-se dessa função, retomar o quadro de mudanças sociais de acordo com uma visão que privilegie os acontecimentos que acabaram por definir o modo e a forma como ocorreu o início da televisão brasileira.

Acontece que o início da televisão brasileira está diretamente associado às pessoas que começaram a ter acesso a esse novo meio de comunicação. Havia uma movimentação em torno da TV que suscitava interesse e curiosidade da população por aquele novo veículo. Tanto é que, do início dos anos 50 ao início dos anos 60, houve um salto representativo dos 200 primeiros aparelhos instalados pela cidade de São Paulo para os quase 600 mil aparelhos espalhados por todo o país (MATTOS, 2002, p. 83).

O salto no número de aparelhos reflete uma mudança de mentalidade e de comportamento da população que foi às lojas para comprar um televisor para colocá-lo em sua casa. Essa atitude foi responsável pelo início de um processo que trouxe uma dimensão diferente para as famílias que viviam nessa esfera. Logo, a questão da introdução da televisão na esfera familiar acaba por levantar uma questão fundamental. Se a televisão levada para dentro dos lares de muitas famílias brasileiras, inicialmente apenas das famílias paulistanas, trouxe uma nova dimensão comunicacional, como era o cenário dessas famílias antes desse acontecimento?

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social. O papel dos pais, as relações estabelecidas pelo nascimento e a noção de comunidade por meio dos vínculos são fatores importantes a serem abordados, pois são elementos fundamentais para compreender como se dava dinâmica dos relacionamentos interpessoais antes e depois da introdução da TV nessa esfera.

1.1 Cenário hist órico: conhecendo os principais acontecimentos que possibilitaram o surgimento da televisão

A introdução da televisão no país ocorreu em um importante cenário histórico brasileiro. De uma forma geral, podemos dizer que o período de origem e de disseminação da TV é abrangente, o que poderia nos levar a um estudo que compreende as últimas cinqüenta décadas. No entanto, o foco deste trabalho é analisar de uma forma específica o impacto desse meio de comunicação na esfera da comunicação familiar na primeira década de sua implantação, que compreende os anos entre a década de 50 e 60.

Essa delimitação pode parecer problemática em relação à compreensão do desenvolvimento da televisão no país, chegando até a representar uma possível falha metodológica ao estabelecer um intervalo de tempo que não fosse capaz de revelar os principais acontecimentos responsáveis pela compreensão do processo de introdução definido pelos objetivos. Na verdade, a delimitação de um período de dez anos não representa o risco de não dar conta das metas relativas ao procedimento metodológico.

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1.1.1 O universo político

A implantação da televisão no Brasil começou em fevereiro de 1949 por meio do suporte e incentivo de Assis Chateubriand. O jornalista iniciou as instalações, sob muito mistério (MATTOS, 2002, p. 171), a fim de inaugurar a televisão antes de países que também passavam por esse processo, como o México e Cuba. Apesar da sede da TV Tupi no Rio de Janeiro ter sido inaugurada em janeiro de 50, algumas dificuldades técnicas atrapalharam a transmissão de imagens, o que só foi ocorrer meses depois.

Exatamente no dia 10 de setembro, foi exibido um filme no qual Getúlio Vargas fala sobre seu retorno à vida política. Ainda que de forma experimental, a utilização das primeiras imagens transmitidas revela que o interesse por sua implantação passa pela questão política. O fim do Estado Novo e a saída de Getúlio Vargas do poder, após uma política populista que durou 15 anos, foram marcados pelo estabelecimento da Constituição de 1946, que representou uma tentativa de redemocratização com o fim da concentração de poderes na figura do chefe do Poder Executivo e o estabelecimento de uma divisão dos Poderes mais alinhada aos ideais democráticos (MOTA e BRAICK, 1997, p. 536).

O governo do presidente Eurico Gaspar Dutra, de 1946 a 1951, teve dois momentos principais. O primeiro, de 46 a 47, foi marcado pela política econômica liberal do laissez-faire, em que o desenvolvimento seria alcançado pelo mercado, uma vez que este regularia a economia. Já o segundo período, de 47 a 51, foi marcado por uma política intervencionista estatal através do plano de metas conhecido como SALTE – saúde, alimentação, transporte e energia. Ambas políticas estatais não obtiveram o êxito planejado, em especial pela falta de verbas públicas.

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É por isso que o discurso de Getúlio Vargas em setembro de 1950 foi tão importante. Não podemos atribuir sua vitória nas eleições presidenciais a essas imagens, pois na época não havia condições necessárias para seu recebimento. O interessante é verificar que Vargas atribuiu um importante papel aos meios de comunicação, ainda que a exibição dessas imagens funcionasse de forma precária.

Para se ter uma idéia dessa precariedade, pouco antes da inauguração da TV Tupi de São Paulo, Walther Obermüller, técnico americano responsável pela instalação dos equipamentos RCA Victor se deu conta de que não havia nenhum televisor para captar as imagens transmitidas na cidade (MATTOS, 2002, p. 80). Foi então que Chateubriand, sabendo da dificuldade que o presidente e seu governo teriam para importar os televisores por meio dos trâmites normais, ordenou que duzentos televisores fossem providenciados por contrabando.

Foi assim que a cidade de São Paulo começou a organizar seu sistema de televisão, instalando televisores em pontos comerciais e casas das famílias da elite. Em 18 de setembro de 1950 as primeiras imagens da televisão brasileira foram transmitidas pela PRF-3 TV Tupi-Difusora de São Paulo, que se tornou a primeira estação de televisão da América do Sul.

A TV Tupi de São Paulo transmitiu a apresentação do “Cisne Branco” realizada pela orquestra do maestro Goerges Henry, que também era diretor da Tupi. A programação inicial também contava com a cerimônia de inauguração dos estúdios, esquetes e show de Hebe Camargo, encerrando suas funções às 9 horas da noite. O que mais chama a atenção em relação ao funcionamento da TV Tupi é o improviso que driblou a falta de profissionais e de recursos.

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Esse improviso foi importante para o processo de surgimento e desenvolvimento da TV nas primeiras décadas, mas não apenas de boa vontade dos profissionais se sustentou esse modelo de comunicação. O início do novo Governo Vargas, em 1951, foi um importante passo para o desenvolvimento dos meios de comunicação, na medida em que deu continuidade à industrialização e lutou pelo que chamava de interesses nacionais.

Apesar da criação de canais, do aumento dos estúdios de televisão e do aumento do número de aparelhos, que de 200 foram para 598 mil (MATTOS, 2002, p. 83), é necessário considerar que o período foi caracterizado como uma fase elitista, em que “o televisor era considerado um luxo ao qual apenas a elite econômica tinha acesso” (MATTOS, 2002, p. 78). Em grande parte, o surgimento e a ampliação do sistema de televisão se deviam ao modelo de industrialização.

A industrialização estava pautada na produção de bens de consumo e de bens semiduráveis, mas com Vargas no poder defendendo a implantação de indústrias de bens duráveis e de materiais pesados, tal como a indústria automobilística, o quadro mudou de figura. De um lado a industrialização que crescia graças ao investimento estatal e estrangeiro e, do outro, uma política nacionalista que unia intelectuais, militares, estudantes, políticos, e líderes operários.

Independentemente do caráter da luta nacionalista, é importante ressaltar que o desenvolvimento da televisão a partir de uma visão quantitativa dependeu diretamente dos esforços políticos desse grupo. A compra de um televisor só era possível pela importação de peças e de televisores produzidos em países mais desenvolvidos, porém, em 1951, Bernardo Kogubeg iniciou a fabricação de televisores 100% brasileiros. Era o começo da marca Invictus.

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Em 56, Juscelino Kubitschek chegou ao poder com seu discurso “50 anos em 5”: era a proposta de cinco anos de governo representando 50 anos de desenvolvimento. Seu Plano de Metas direcionado para os setores de energia, transporte, alimentação, indústria de base e educação acabou esbarrando na mesma problemática enfrentada por Vargas, uma vez que para realizar esse plano precisava do capital nacional e do capital estrangeiro (MOTA e BRAICK, 1997, p. 539).

A oposição entre nacionalistas e entreguistas se tornou inevitável. Os nacionalistas eram acusados de defender um desenvolvimento apoiado na indústria estatal, assim como no tempo de Vargas, enquanto os entreguistas, também chamados de liberais, eram a favor de um desenvolvimento alinhado ao capital estrangeiro, em vez do intervencionismo estatal. Kubitschek administrou tal discordância ao fazer concessões para as duas correntes e após seus cinco anos de mandato, em 61, ocorreu novamente a corrida presidencial entre os diferentes partidos.

Dessa forma, conseguimos observar os principais acontecimentos políticos no período dos anos 50 aos 60, o que nos dá condições de compreender como o cenário histórico da época possibilitou a introdução da televisão no país. Na verdade, não foram apenas esses fatores políticos que determinaram o desenvolvimento da TV. Como veremos ao longo deste trabalho, seu surgimento e desenvolvimento inicial foram resultados de uma série de acontecimentos na sociedade como um todo.

A política foi um fator importante porque a partir do interesse dos homens do poder e as medidas adotadas por eles puderam ser modificados muitos aspectos sociais. Tal como foi visto até aqui, a delimitação do cenário histórico político exerce um papel fundamental para a compreensão dessa temática. No entanto, entender política apenas como “os acontecimentos ligados à posse dos presidentes” não dá conta de explicar o porquê da televisão ter surgido da maneira como surgiu.

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principalmente a imprensa, passaram por situações extremamente difíceis na década de 50 devido ao alto investimento de capital estrangeiro.

1.1.2 O capital estrangeiro frente às leis de regulamentação dos meios de comunicação

“De instrumento de esclarecimento, a imprensa capitalista se transformou em instrumento de alienação, fugindo inteiramente aos seus fins originários”. Nelson Werneck Sodré

À primeira impressão, o investimento do capital estrangeiro nos meios de comunicação nacionais pode ser considerado uma tendência de todos os países em desenvolvimento. Em tese, os países mais ricos aplicam dinheiro em países que necessitam de capital para seu desenvolvimento, porém, na prática, o alto investimento estrangeiro em meios de comunicação pode representar o grau de interferência de determinado país na cultura daquele que recebe o investimento.

Acontece que na instauração da Constituição do Estado Novo, comandado pelo general Dutra, foi criado o artigo 160 que dizia:

“É vedada a propriedade de empresas jornalísticas, sejam políticas ou simplesmente noticiosas, assim como a de rádio-difusão, às sociedades anônimas ao portador ou a estrangeiros. Nem esses, nem pessoas jurídicas, excetuados os partidos políticos nacionais, poderão ser acionistas de sociedades anônimas proprietárias dessas empresas. A brasileiros (art. 129, números I e II) caberá, exclusivamente, a responsabilidade principal delas e a sua orientação intelectual e administrativa”. (SODRÉ, 1999, p. 396).

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governo estabelecia uma regra de conduta para que os meios de comunicação não fossem contaminados pela visão dos países ricos, mais especificamente os EUA.

De uma certa forma, a intenção deste artigo era legítima, já que conferia o monopólio formal da imprensa aos brasileiros. Entretanto, a elaboração do artigo foi por si só falha, pois de nada adiantava evitar a posse dos estabelecimentos jornalísticos pelos estrangeiros se os brasileiros que eram donos dos negócios não tinham condições de mantê-los, pois era necessária uma quantia significativa de capital que desse suporte a toda estrutura da informação e do entretenimento.

A questão é paradoxal, pois ao mesmo tempo em que a lei beneficiava os brasileiros, por outro os deixava sem alternativa para que pudessem dar andamento a produção. Logo, a própria lei estabeleceu um sistema de simulação. Os donos das empresas, de fato, eram brasileiros, mas os estrangeiros eram os responsáveis pela manutenção dessas empresas. O dinheiro aqui investido lhes garantia participação nas publicações e, em grande parte dos casos, as notícias já vinham prontas de uma agência para as empresas nacionais.

Nos deparamos com a observação de dois aspectos sobre o mesmo fenômeno. A imprensa se manteve graças aos investimentos estrangeiros, que permaneciam no pano de fundo dos acontecimentos, enquanto a formalidade garantia a liderança dos brasileiros nos postos de comando das instituições e a legitimidade dos conteúdos recebidos através das agências internacionais de notícias. A gravidade não estava no investimento por si só, mas em toda máquina que girava em torno dele.

A publicação de notícias estrangeiras no Brasil revelava que os meios de comunicação estavam mais suscetíveis à política internacional do que ao interesse de publicação daquilo que era importante a cultura nacional, já que nessa época havia a passagem do poder de Dutra para Vargas. O discurso era outro, havia uma campanha nacionalista, mas na contramão desses interesses estavam os EUA e seu discurso antinacionalista contrário à política de Vargas.

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materiais que iam diretamente ao encontro do interesse dos imperialistas em usufruir o petróleo disponível no Brasil e divulgar as idéias da Guerra Fria.

Na verdade, a questão da regulamentação dos meios de comunicação não estava apenas ligada à obrigatoriedade da posse de uma empresa por um brasileiro ou a divulgação de uma matéria proveniente de um país imperialista. A grande discussão também se refere à existência de uma publicidade que não poupava esforços para se fazer presente nos meios de comunicação. As agências de publicidade podiam atuar como as agências de notícias, pois se as empresas investiam nos meios de comunicação era porque tinham algum interesse nisso.

A publicidade impulsionava a produção de jornais, revistas, programas de rádio, e com o advento da televisão, a programação da TV, mas também obtinha lucro com esse investimento. As agências de publicidade passaram a exercer um papel de controle sobre os meios de comunicação da época, assim como sobre o pensamento da população. Talvez por isso é que durante o governo de Dutra, de Vargas e de Kubitschek, desconsiderando um pouco a dança de cadeiras entre Café Filho, Carlos Luz e Nereu Ramos, tenha havido uma separação clara entre os defensores da política pautada no Estado e aqueles que acreditavam no alinhamento com os países que representavam o imperialismo na Guerra Fria.

Abordar a temática da imprensa também é abordar a regulamentação dos meios de comunicação como um todo, pois o fenômeno de investimento de capital estrangeiro era inevitável. Todas as empresas jornalísticas dependiam do capital interno e do capital externo para que mantivessem seu funcionamento. No caso da televisão é fundamental considerar a efervescência desse meio de comunicação em detrimento da imprensa que, mais do que nunca, se mantinha graças às agências de publicidade estrangeiras.

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É interessante observar que a dificuldade de manutenção da imprensa no Brasil fazia parte de uma onda internacional de menos leitores e de mais consumidores de publicidade que começava a ser difundida pelo sistema de rádio-difusão. Na década de 50, momento de pós-Segunda Guerra, a política brasileira visava ao desenvolvimento da indústria de base e da organização dos centros urbanos que se voltavam para a produção.

Entretanto, o mesmo processo de urbanização e tentativa de reconstrução da ordem, no caso dos países diretamente envolvidos na guerra, acontecia simultaneamente em todo mundo. Nos EUA, por exemplo, “Os novos subúrbios (sem jornais próprios) e o fato de os trabalhadores irem e voltarem de carro, diminui o hábito da leitura de jornais em milhões de famílias” (BAGDIKIAN, 1993, p. 236).

Talvez a citação acima não expresse diretamente a realidade do Brasil nesse período, já que as empresas automobilísticas estavam sendo implantadas. Apesar disso, a citação é cabível neste contexto de avaliação de uma mudança no cenário social e suas conseqüências nos meios de comunicação. O fim da Guerra Fria exigiu novas formas de organização em torno da sociedade, seja ela nos EUA ou no Brasil.

A agravante no caso do Brasil é que as empresas jornalísticas necessitavam de investimento, mas o próprio governo também necessitava de investimento. A saída era pedir ajuda ao capital estrangeiro, enquanto nossas empresas, que divulgariam seus produtos em publicidades locais, ainda engatinhavam. O quadro é extremamente complexo, pois a política interna e externa, o desenvolvimento das empresas de bens duráveis, as empresas jornalísticas e a publicidade estavam todos interligados.

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Ainda a respeito da questão do investimento do capital estrangeiro nas empresas jornalísticas, somos obrigados a citar a transmissão, em 1° de abril de 1952, da primeira edição do Repórter Esso4 (MATTOS, 2002, p. 172). Como o próprio nome anunciava, o telejornal era patrocinado pela empresa líder no ramo de petróleo e petroquímica, uma espécie de publicidade, mas que era capaz de garantir o tom jornalístico do programa. O Repórter Esso foi uma sensação na produção de notícias para a televisão, sendo mantido no ar por dezoito anos.

O Repórter Esso é o melhor exemplo de que a informação estava diretamente associada ao sistema de capitais. O investimento do capital estrangeiro na televisão fez parte de um movimento que abrangia todos os meios de comunicação. Contudo, há uma peculiaridade na relação entre as empresas responsáveis pela publicação de jornais e revistas e as empresas de televisão. As duas dependiam do capital estrangeiro, a primeira em resposta à grave crise do papel e a segunda em resposta ao entusiasmo pela introdução da televisão no país.

1.1.3 A crise do papel e a liberdade de imprensa

É interessante observar a multiplicidade de fatos importantes na década de 50. Esse período de pós-guerra foi decisivo porque os países eram obrigados a escolher que rumo seguir para o desenvolvimento econômico resultante da ação de suas empresas. No Brasil o período de redemocratização visava ao estabelecimento de uma ordem menos independente dos estrangeiros e isso também estava voltado para as empresas jornalísticas.

Como foi visto até aqui, as empresas jornalísticas enfrentavam dificuldades econômicas que acabavam por interferir diretamente na forma como se fazia jornalismo. A imprensa dependia do capital estrangeiro para suas publicações, porém este capital vinha imbuído de uma carga ideológica que defendia os interesses dos EUA e seu American way of life. Dessa forma, o investimento de capital trazia consigo uma falta de liberdade de imprensa nas empresas jornalísticas brasileiras.

A liberdade de imprensa era tolhida. A realidade para os profissionais do jornalismo era triste, pois ao mesmo tempo em que a lei lhes garantia um sistema mais

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nacionalista, por meio do artigo 160, o esquema de produção estava completamente amarrado ao capital estrangeiro. Mais ainda, um dos aspectos fundamentais para a difícil situação da imprensa foi a crise do papel que se estendeu por mais de décadas.

Se considerarmos dois decênios, de 1943 a 1963, o aumento do preço do papel importado para a imprensa foi de mais de 5744%. Isso significa que o preço do quilo do papel de imprensa importado em 1943 era de 2,35 cruzeiros e em agosto de 1963 chegou a 135 cruzeiros (SODRÉ, 1999, p. 411-412). O aumento do preço do papel acompanhou a ascensão do preço do dólar para essa importação e os valores de compra de papel ficaram exorbitantes.

Podemos dizer que a falta de liberdade de imprensa não se restringiu ao investimento de capital estrangeiro nas empresas e à utilização dos espaços de jornais e revistas para a publicidade. Este é apenas um lado da questão se analisarmos que a imprensa utilizava o papel impresso como meio de divulgação de seus produtos, mas não tinha suporte para que a matéria-prima de suas publicações estivesse disponível no mercado.

Ora, se para produzir jornais e revistas é necessário papel, então o governo devia oferecer condições materiais para que as empresas tivessem quantidades suficientes de tal material que possibilitassem trabalhar com o pouco de liberdade que lhes restava. De uma certa forma, o governo não tinha condições de oferecer melhores condições para as empresas jornalísticas, e isso passava pela questão do papel, porque dependia de um esquema mais amplo entre o Brasil e os países investidores.

Porém, é necessário considerar que uma política pública que priorizava o produto nacional podia, e devia, objetivar o bom desempenho de suas empresas. A crise do papel atingia as empresas jornalísticas, mas também atingia os mais diversos grupos que direta ou indiretamente estavam associados a ela. Os leitores conseguiam identificar que as taxas cambiais de importação do papel dificultavam o trabalho final dos jornalistas e isso podia ser visto na diminuição do número de páginas dos jornais e revistas.

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métricas de papel e um ano depois a quantidade havia sido reduzida para 82.000 toneladas métricas (SODRÉ, 1999, p. 411) é porque havia uma falha no sistema que disponibilizava determinados bens de consumo.

Foi pensando nessa questão que os governos da época modificaram seu discurso político, de acordo com o que foi descrito acima. Dutra, Vargas e JK foram representantes de uma tentativa de controlar as taxas cambiais, a fim de facilitar o processo de importação, e, principalmente, de ampliar a atuação das indústrias que operavam timidamente, na maior arte dos casos na produção de bens de consumo não duráveis. A lógica, até então, era de exportar matéria-prima e importar produtos manufaturados.

Para exemplificar alguns dos principais acontecimentos que iam ao encontro dessa política, destacamos a inauguração do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), em 52, no governo Vargas, e que nos anos 80 passa a ser chamado de Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O primeiro de muitos financiamentos foi voltado para o setor de energia e o dos transportes, absorvendo 60% dos créditos aprovados. Os outros 40% foram utilizados nos demais ramos da indústria, como papel e metalurgia5.

Algumas das empresas beneficiadas por esses investimentos foram a Suzano e a Klabin, importantes indústrias no ramo do papel. Para entender melhor como essas empresas se desenvolveram com o passar das décadas, é interessante observar o histórico6 desses grupos:

HISTÓRICO DO GRUPO SUZANO

O grupo nasceu em 1923 com a criação da Leon Feffer & Cia, que comercializava papéis nacionais e importados. À revenda seguiram-se uma gráfica e uma pequena fábrica de artefatos de papel. Em 1939 a empresa iniciou a produção de papel e em 1946, sob nova denominação, já operava três máquinas de papel, iniciando-se as pesquisas de celulose com uso da base florestal nativa. Em1951 implantou seu primeiro empreendimento florestal. A Cia. Suzano de Papel e Celulose surgiu em 1956. A planta operava três máquinas de papel e cartão para embalagem e oferecia condições para

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desenvolver em escala industrial a tecnologia de celulose de fibra curta. Em 1957 a Suzano começava a produção pioneira de celulose de eucalipto, utilizada para fabricar papel de imprimir e escrever. Nos anos do governo JK a unidade Suzano aumentou sua capacidade produtiva em celulose alvejada e instalou uma quarta máquina, sendo os financiamentos do BNDES importantes para essa expansão.

HISTÓRICO DO GRUPO KLABIN

A Klabin Irmãos e Cia. foi criada em 1899 para atuar nos setores de tipografia e importação de materiais para escritório. Quatro anos depois, inicia a produção de papel para impressos e invólucros pelo arrendamento de uma fábrica de papel. Em 1909 é criada a primeira fábrica do grupo, a Cia. Fabricadora de Papel. Na década de 30, durante a industrialização acelerada, surgem dois empreendimentos. Primeiro, por aquisição, uma fábrica de porcelanas (1931). Três anos depois é fundada a Klabin do Paraná (IKPC), primeira fábrica integrada de papel e celulose do país, e adquirida a Fazenda Monte Alegre, cuja reserva florestal serviu para suprir a IKPC. O início das operações, no entanto, só ocorreria no imediato pós-guerra, em 1946. A produção de embalagens inicia-se seis anos depois, na Fabricadora. Os anos do Plano de Metas da administração JK são de forte expansão para o grupo com a ampliação da produção de celulose e implantação de novas fábricas de papel. Novos investimentos ocorreriam apenas em 1967, com a aquisição de nova fábrica de papel, junto com a constituição da Papelão Ondulado do Nordeste.

O histórico dos grupos Suzano e Klabin serve de exemplo para verificar como a política governamental da década de 50 atuou de forma a beneficiar determinados segmentos de produção. No caso, as indústrias produtoras de papel foram alvo de investimentos que, dentre outras melhoras, facilitaram a capacidade produtiva em celulose. O aumento de produção de celulose foi uma conseqüência direta dos investimentos realizados pelo governo que demonstrou o interesse na modificação da estrutura econômica existente.

A importação do papel gerou uma grave crise nas empresas jornalísticas, mas antes disso, gerava uma crise proveniente da falta de investimentos em indústrias que já atuavam, mas que não tinham condições de ampliar sua participação no mercado

6 O histórico das empresas aqui apresentado foi retirado do texto As estratégias dos grandes grupos

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nacional. Participando mais, produzindo mais e disponibilizando mais produtos no mercado, as empresas geravam uma atividade que estimulava outros setores sociais.

Seguramente a ampliação da produção de papel não sanou os problemas econômicos relativos à escassez que dificultavam a atuação das empresas jornalísticas. A imprensa continuou tendo uma liberdade mais ou menos restrita, dependendo do grau de interferência do capital estrangeiro. O mais importante é considerar que esses investimentos do governo na produção de papel foram um primeiro passo em relação à diminuição do grau de dependência dos estrangeiros.

Esse fenômeno de empresas jornalísticas em associação com o capital estrangeiro foi um episódio que nos renderia muitos assuntos a serem tratados neste trabalho. Principalmente nos anos 60, quando o Grupo Time-Life remeteu ao Grupo Globo, liderado pela figura de Roberto Marinho, mais de 2.838.613, 28 dólares (SODRÉ, 1999, p. 439). No entanto, a presente pesquisa se atém às questões específicas da década de 50, período em que ocorreu a introdução da televisão no país.

A questão suscitada pela crise do papel e todo o quadro das empresas jornalísticas nos levam a considerar os fatores do cenário histórico que deram suporte para o surgimento da televisão. Todos os pontos apresentados, a política governamental, o capital estrangeiro, a publicidade, a liberdade de imprensa e a crise do papel foram, em certa medida, fatores importantes que colaboraram no processo de introdução da TV no país.

Além disso, a estrutura, o modo como os fatos foram se desenhando, possibilitou o começo de uma nova era de comunicação que passava a contar com um sistema de transmissão diferenciado. A televisão teve um processo de experimentação muito peculiar, um jogo de erros e acertos, uma espécie de abertura para os meios de comunicação que se viam no epicentro da crise, no caso dos jornais e revistas, ou no apogeu de suas produções, no caso da fase chamada de “era de ouro” do rádio.

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Apesar da crise que assolava a imprensa e a falta de liberdade dos profissionais de jornalismo nos meios de comunicação, como um todo, o rádio vinha seguindo um caminho trilhado pelo sucesso. De fato havia o investimento do capital estrangeiro, mas a questão da divulgação ideológica ficava em segundo plano diante da genialidade dos profissionais responsáveis pela grade de programação das emissoras.

A ideologia por trás da notícia até podia existir, mas essa interferência direta entre a informação e o antinacionalismo era uma questão administrada com mais facilidade pelos profissionais do ramo. No rádio havia sido descoberta uma fórmula de sucesso na divulgação de notícias. Vale citar a primeira edição do Repórter Esso transmitida pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro em 1941 (programa que seria reproduzido em 52 com formato para televisão, como foi dito anteriormente). Durante 17 anos o programa estabeleceu uma nova forma de se fazer radiojornalismo, com uma maior dedicação no tratamento das informações, um ritmo diferenciado e uma linguagem acessível aos ouvintes.

Essa descoberta relativa ao radiojornalismo se estendeu por toda a programação que ao invés de ficar amarrada na divulgação dos principais acontecimentos no cenário político ou dissertar sobre os planos que tentavam modificar a estrutura das indústrias, se voltou para o entretenimento. Os ouvintes queriam saber das notícias, mas também queriam partilhar desse universo que lhes permitia sonhar.

O sonho vinha dos programas de humor, de esporte, de auditório e, principalmente, das radionovelas. As radionovelas foram responsáveis por um alto índice de audiência, de acordo com medições do período realizadas pelo IBOPE7, durante boa parte de suas transmissões no rádio. Para se ter uma idéia desse sucesso, a primeira radionovela apresentada em 41 foi uma versão da mexicana Em busca da felicidade e a atração continuou no ar por três anos.

Na seqüência veio a adaptação da cubana O direito de nascer e a resposta veio imediatamente com o interesse de inúmeros ouvintes, entre eles donas de casa, que passaram a reservar as noites para acompanhar os capítulos da radionovela. “Tendo as

7 A possível contagem do número de ouvintes começou em 1942, por conta do surgimento do Instituto

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donas de casa como público alvo, as histórias exageravam no drama, sem deixar de lado a religião e o romance água com açúcar” (ALVES e MORAIS, 2004, p. 5).

O sucesso foi tamanho que, até meados da década de 50, o Rádio-Teatro Nacional já havia transmitido 861 novelas8. Havia uma tendência do número de radionovelas aumentar com o passar dos anos, considerando o caráter das produções em atingir um grande público e lançar artistas que se tornavam celebridades. É interessante observar como as novelas do rádio conseguiram fazer uso do imaginário popular e lançar profissionais que foram “apadrinhados” pelo público, segundo uma lógica de heróis-modelos que propõe mitos de nossa auto-realização (MORIN, 1997, p. 90).

Talvez o surgimento de bons profissionais por meio da prática de determinado trabalho tenha sido o grande responsável pela reviravolta de sucesso, no que diz respeito ao apogeu do rádio e ao início do declínio, com a introdução da televisão quando o rádio vivia sua fase chamada de “era de ouro”. A televisão deu início a suas atividades, assim como o rádio na década de 20, por meio de experimentações. No entanto, havia um câmbio de profissionais que modificou a estrutura do rádio, uma vez que muitos dos responsáveis pela programação decidiram se aventurar por terras desconhecidas em estúdios de televisão.

Além dos profissionais responsáveis pela parte técnica e operacional, os artistas “apadrinhados” pelo público se sentiram convidados a tentar outros tipos de trabalho, com a possibilidade de se fazer telenovela e ter sua imagem conhecida pelo público ouvinte que conferia suas atuações nas radionovelas.

“Não existe, no Brasil, anteriormente à formação destes meios, uma tradição de radialistas ou escritores de radionovelas ou radioteatros. Alguns produtores são importados de outros países, como Gloria Magadan, que escreve roteiros de radionovelas e, posteriormente, de telenovelas. É também assim com a televisão. Autores como José Castelar vêm do rádio para TV; outros, como Durst, migram do cinema; outros ainda, como Lauro César Muniz ou Dias Gomes, trazem, do teatro para a TV, a experiência

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dramatúrgica. É de maneira experimental que se constrói a história do rádio e televisão no Brasil”. (BORELLI, 1996, p. 130)

A passagem desses profissionais para a televisão foi uma ação que anunciou a necessidade de mudança do rádio. Não era possível manter a estrutura, apresentar a mesma linha de programação e oferecer os profissionais remanescentes da “era de ouro”. A introdução da televisão abalou a estrutura do rádio e obrigou que fossem tomadas medidas enérgicas para que conseguisse manter os índices do IBOPE, sem que essa mudança de postura significasse a perda das características principais desse veículo.

Por isso é pretensioso dizer que a introdução da televisão na década de 50 acabou com o rádio. O rádio não acabou e dificilmente vai acabar, pois a diferenciação entre o que é produzido para o rádio e para a TV, o formato, a linguagem, a duração, entre outros fatores, revelam que cada um mantém um público cativo. Além disso, o público ouvinte e o telespectador conseguem reconhecer as diferenças entre os dois veículos. Parece mais adequada a afirmação de que o surgimento de um meio de comunicação que se apropriou dos profissionais e de muitas características de um outro meio, fosse capaz de anunciar a transformação, que neste caso se refere ao início do declínio do rádio após décadas de apogeu.

A modificação imposta ao rádio vai deixar ainda mais claro que era necessário encontrar uma forma de se comunicar por este meio que já não fosse a fórmula que vinha sendo utilizada desde 22. O impulso para essas mudanças veio com o passar do tempo, fazendo uso, novamente, da experimentação em tentar levar ao ar uma programação mais específica. Dessa forma, o rádio começou a se tornar um meio mais segmentado, apresentando formatos distintos entre as emissoras e oferecendo mais estilos de programas informativos, a fim de atrair um maior número de pessoas com diferentes perfis.

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uma linha telefônica privada, na qual a onda de FM ligava os transmissores de rádio ao estúdio.

O mais interessante dessa história é que a modificação na estrutura do rádio não dependia somente da introdução da televisão no país, como se fosse um evento isolado. Seu surgimento e disseminação estavam diretamente ligados aos fatos políticos do período, assim como os acontecimentos no rádio ocorriam de forma concomitante. Isso para dizer que a criação da Rádio Imprensa FM foi resultado de uma ação política, na qual Anna Khoury havia sido espoliada da Rádio Eldorado AM em resposta ao interesse de grupos jornalísticos politicamente influentes.

O surgimento da Rádio Imprensa FM foi tão inovador que a emissora utilizou o primeiro transmissor construído no país e teve de começar a produção de rádios receptores de FM. Com a fabricação dos receptores, os clientes passaram a locar esses aparelhos e ouvir música durante a programação. Após duas décadas de domínio da Rádio Imprensa, que liderava solitariamente o universo da FM, outras emissoras surgiram e a grade musical passou a ser formada por momentos de locução.

A Rádio Imprensa FM é um dos casos que exemplifica a realidade do rádio na década de 50 em ter de modificar a estrutura do veículo tal como existia. A segmentação do rádio e a criação de uma FM musical foram medidas que driblaram as perspectivas daqueles que anunciavam a morte do rádio. Na verdade, essa questão do rádio e da televisão se inter-relacionam de modo a influenciar e sofrer influências. A introdução da televisão nos anos 50 influenciou uma modificação no rádio, enquanto o modelo de funcionamento do rádio era a principal estrutura de comunicação utilizada para o processo de implantação da TV.

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Um dos fatores responsáveis pela co-existência desses dois meios de comunicação foi essa capacidade quase que paradoxal de manter algumas características em comum e estabelecer determinados pontos que fossem diferentes entre eles. O início do declínio do rádio e o furor causado pela introdução da TV são aspectos que determinaram uma convivência entre essas duas realidades. Uma convivência difícil de ser compreendida, mas que conseguiu resistir ao longo dos anos, de acordo com o entendimento por parte de seus profissionais de que cada veículo devia desenvolver um tipo de mecanismo próprio de sua linguagem. O rádio procurou manter o número de ouvintes e a televisão a chamar cada vez mais telespectadores.

Indo mais além, o reconhecimento de que o rádio e a televisão deviam manter suas diferenças provenientes do caráter de cada um é uma estratégia apontada pela reação do próprio público. Isso porque o rádio e a televisão são instâncias que competiram de forma mais acentuada durante a década de 50, já que o rádio vinha desenvolvendo trabalhos notórios e obtendo um alto índice de audiência, quando a televisão chegou e diminuiu um pouco seu grau de atuação.

O surgimento de um aparelho que permitisse a transmissão de imagens por meio de uma estrutura própria, que contava com receptores de TV, foi um grande impacto. Na verdade, a sociedade como um todo passava por mudanças que visavam à movimentação da economia, o crescimento das indústrias, a geração de empregos, o desenvolvimento dos centros urbanos e isso também tem a ver com os bens de consumo aos quais as famílias passavam a ter acesso.

O objeto de estudo deste trabalho é a televisão, mas é fundamental esclarecer que a geladeira, o carro e, até mesmo, o rádio, passaram por uma fase em que poucos podiam desfrutar de seus benefícios. Essa dificuldade encontrada pela população em poder possuir determinado produto foi o que gerou um certo sentimento de desejo. E não podia ser diferente. Os primeiros 200 televisores implantados no país não conseguiam estar ao alcance de todos os que se interessava por esse novo aparelho, já que apenas na cidade de São Paulo o número de habitantes era de 2,2 milhões (MELLO, 1998, p. 586).

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objeto de desejo. Na verdade, a televisão se tornou um objeto de desejo por causa das condições de compra, mas também porque a curiosidade das pessoas deu início a um pequeno processo de mudança de comportamento das famílias que gostariam de saber do que se tratava a televisão.

A comoção em torno de um novo “eletrodoméstico” foi um misto de acontecimentos que levaram toda a situação do surgimento da televisão às páginas dos jornais. Os anúncios da época apresentavam os novos aparelhos como criações fundamentais para a possível distinção entre as classes sociais. De forma mais específica, podemos dizer que houve uma certa valorização social daqueles estabelecimentos que conseguiram comprar a televisão. Se para os estabelecimentos comerciais a posse da TV era um grande diferencial, a questão se tornava muito mais relevante quando essa relação de status se refere às famílias da época.

Figura 1: O Estado de São Paulo - Caderno Principal - p.16 - Domingo, 28 de agosto de 1955.

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público cativo ao rádio. Até mesmo algumas famílias que tiveram condições financeiras não se animaram logo no princípio para introduzir a televisão dentro de seus lares única e simplesmente porque ainda não haviam pensado em introduzir esse novo costume9 de assistir à televisão em seus lares.

De imediato, a população não tinha condições financeiras, nem estava habituada a uma forma de entretenimento e de informação que fosse diferente do rádio. Porém, ao longo de dez anos, o número de aparelhos no país chegou a quase dois milhões (MATTOS, 2002, p. 176) o que revela uma abertura, tanto em termos financeiros como em termos de comportamento. Uma parcela maior da população conseguiu adquirir o televisor, bem como ampliou sua noção de meio de comunicação quando passou a aceitar a existência da televisão em sua esfera familiar.

Isso porque o número, que pode parecer relativamente pequeno se pensarmos na proporção continental do território brasileiro, é um termômetro positivo. As pessoas adotaram uma postura que representou um “boom” na disseminação da televisão se imaginarmos que, pouco tempo antes de sua implantação, não havia nenhum televisor no país. Essa reação representada pela mudança nos costumes e no comportamento de muitas famílias é notória, pois até mesmo aquelas famílias que não tinham condição de comprar o televisor, tinham acesso à sua programação. Muitas famílias abriam suas casas para a comunidade, para os parentes mais próximos, para os vizinhos e para os conhecidos que queriam conhecer aquele aparelho e acabavam se interessando pelos programas exibidos.

A partir do momento em que se conhecem alguns dos muitos fatores responsáveis pelo surgimento da TV no país e das características da sociedade brasileira nos anos 50, por meio do cenário histórico apresentado nesse primeiro item do capítulo 1, podemos analisar qual era o ambiente em que esses televisores estavam sendo introduzidos. A fim de que o trabalho conte com um embasamento teórico satisfatório, além do cenário histórico da década de 50, serão apresentados o cenário familiar e a forma como se dava a comunicação por meio de vínculos nesse ambiente. Todavia, é importante ressaltar que o cenário familiar discutido nessa pesquisa parte de um modelo específico

9 Essa questão foi abordada pelos entrevistados e pode ser encontrada na seção de entrevistas em anexo,

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que mais se aproxima ao modelo patriarcal existente no período, como poderá ser visto adiante.

1.2 Cenário fam iliar: o modelo patriarcal da família da elite paulistana nos anos 50 e a comunicação na esfera familiar

“_Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O

essencial é invisível para os olhos”. Antoine de Saint-Exupéry

Compreender como a família se comunicava na década de 50 é lançar um olhar sobre as bases da comunicação, pois é nessa relação entre os familiares que podemos visualizar de maneira mais clara a forma como se dão os processos comunicativos entre as pessoas. De forma mais específica, é necessário pontuar que a avaliação da comunicação na esfera familiar a ser tratada nesse item está de acordo com as teorias desenvolvidas por estudiosos da comunicação e do comportamento humano, tais como Harry Pross e Boris Cyrulnik.

Os estudos desses especialistas, e de muitos outros, correspondem à fundamentação teórica dos conceitos aqui utilizados, o que é de suma importância para a ampliação do conhecimento. Porém, deve ser ressaltado que o atual trabalho não de limita a comparar teorias distintas e estabelecer um raciocínio que dialogue somente com suas teorias. O objetivo principal desse trabalho é verificar como ocorreu o processo de introdução da televisão na esfera familiar paulistana nos anos 50 e as conseqüências desse processo nas estruturas comunicativas entre os familiares.

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Figura 1: O Estado de São Paulo - Caderno Principal - p.16 - Domingo, 28 de agosto de 1955.
Figura 4: A Folha da Manhã - Assuntos da Vida Social II - p.2 - Domingo, 1 de junho de 1958.
Figura 5: A Folha da Manhã - Assuntos Gerais - p. 20 - Domingo, 7 de novembro de 54.
Figura 6: O Estado de São Paulo - Caderno Principal - p.5 - Quinta, 3 de junho de 1954.
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Referências

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