• Nenhum resultado encontrado

AS CONTRIBUIÇÕES DO GRUPO TEATRAL JOVENS ATORES PARA AS POLÍTICAS CULTURAIS DE DIADEMA NOS ANOS 1990

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2019

Share "AS CONTRIBUIÇÕES DO GRUPO TEATRAL JOVENS ATORES PARA AS POLÍTICAS CULTURAIS DE DIADEMA NOS ANOS 1990"

Copied!
154
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA CEART – CENTRO DE ARTES

MESTRADO EM TEATRO

CLÉBER PEREIRA BORGES

AS CONTRIBUIÇÕES DO GRUPO TEATRAL JOVENS ATORES PARA AS POLÍTICAS CULTURAIS DE DIADEMA NOS ANOS 1990

(2)

2012

CLÉBER PEREIRA BORGES

AS CONTRIBUIÇÕES DO GRUPO TEATRAL JOVENS ATORES PARA AS POLÍTICAS CULTURAIS DE DIADEMA NOS ANOS 1990

Trabalho de Dissertação apresentado ao curso de Mestrado em Teatro, Linha de Pesquisa: Teatro, Sociedade e Criação Cênica, da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC, como requisito obrigatório para obtenção do título de Mestre em Teatro.

(3)

FLORIANÓPOLIS, SC 2012

CLÉBER PEREIRA BORGES

AS CONTRIBUIÇÕES DO GRUPO TEATRAL JOVENS ATORES PARA AS POLÍTICAS CULTURAIS DE DIADEMA NOS ANOS 1990

Trabalho de Dissertação apresentado ao curso de Mestrado em Teatro, Linha de Pesquisa: Teatro, Sociedade e Criação Cênica, da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC, como requisito obrigatório para a obtenção do título de Mestre em Teatro.

Banca Examinadora:

Orientadora: __________________________________________________ Profª Drª Márcia Pompeo Nogueira

Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC

Membros: __________________________________________________ Prof. Dr. Elmir de Almeida

Universidade de São Paulo – USP

__________________________________________________ Profª Drª Vera Regina Martins Collaço

(4)

Florianópolis, SC 24/08/2012.

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à cidade de Diadema, sua gente e suas

histórias de luta e superação.

Dedico também este trabalho à minha família: minha mãe, minhas irmãs e meus irmãos e meus sobrinhos. Com carinho e amor.

(5)
(6)

AGRADECIMENTOS

Quero primeiramente agradecer a pessoa que mais acreditou e lutou por e comigo nessa minha árdua trajetória do Mestrado: minha orientadora, a Profª Drª Márcia Pompeo Nogueira. Muito obrigado pela fundamental e, sobretudo, humana orientação. E não apenas em relação à Dissertação, como também em relação à vida. Meus profundos e sinceros agradecimentos.

À minha família, “o clã Borges”, que me apoia incondicionalmente: minha mãe, Luzia; minhas irmãs, Rosângela e Regiane; meus irmãos, Renato, Júnior e Fábio. Sem vocês meu caminho até aqui seria impossível. Muito obrigado pelo amor e carinho.

Ao professor Elmir de Almeida que aceitou gentilmente compor a banca examinadora desse trabalho bem como pelo imprescindível parecer na fase de qualificação.

À professora Vera Regina Martins Collaço pelos apontamentos que me auxiliaram proficuamente na condução do texto.

À amiga querida Rosa Lucimara das Dores por sua ímpar contribuição crítica e importantes reflexões

Aos amigos de Diadema cuja contribuição, seja por entrevista ou seja por questionário, foi fundamental para este trabalho e por quem nutro profundo carinho e admiração: Ademir Antunes, Adolar Barreira, Donisete dos Anjos, Edson Cardoso, Elaine Alves, Eloi Rodrigues, Elvis Tavares de Albuquerque, Érica Farias, Francisco Glauter Leal, Ieda Cecília Gozzo, Jaime Souza, Leo Oliveira, Mônica Rodrigues, Rogério Maldonado, Newton Lira, Querubina Veiga, Renata Reis e Valdilene Santana.

À Ângela Barros, pelo carinhoso e responsável envolvimento com as políticas culturais de Diadema e cuja contribuição abriu os caminhos nos quais trilharam essas histórias.

(7)

À Isa Kopelman e Luiz Nunes pelo profundo aprendizado teatral.

À Malu, do Centro de Memória de Diadema, pela atenciosa e competente recepção, auxiliando-me nas buscas de documentos.

Ao William Charles van de Beld, que apesar dos solavancos da vida, nunca deixou de me apoiar no que foi necessário.

Ao Marcelo Tragtemberg, Michelle Lomba, Rose Mara Silva, Ana Rosa Tezza e Jonathas Gomes de Medeiros pelo apoio.

Às competentes secretárias do Programa de Pós-Graduação em Teatro da UDESC: Mila, Sandra e Francini.

Ao Luciano Flávio de Oliveira, pelas excelentes conversas acadêmicas e por quem tenho profunda admiração.

Ao Héliomar Jérry Dutra de Freitas, pela indicação do excelente material sobre políticas culturais.

Ao colega de Mestrado Wellington Menegaz de Paula, pelas trocas e ideias.

(8)

EPÍGRAFE

Não sou apenas objeto da História mas seu sujeito igualmente. No mundo da História, da cultura, da política, constato não para me adaptar mas para mudar.

(9)

RESUMO

Este trabalho busca compreender as contribuições do grupo teatral Jovens Atores no âmbito das políticas culturais implementadas em Diadema/SP a partir dos anos 1990. De início, apresenta noções e proposições sobre políticas culturais por meio da revisão da bibliografia especializada no tema. Indica autores e discussões pertinentes ao assunto e elege, para efeito de análise deste trabalho, o conceito de políticas culturais como sinônimo de públicas para a cultura. Os conceitos de políticas culturais expostos servem de parâmetro para o caso concreto da cidade de Diadema. Para tanto, o trabalho aborda seu contexto sociopolítico procurando identificar os indícios que motivaram as sucessivas gestões, a partir dos anos 1980, a implantar políticas públicas de forma sistemática para a diminuição de desigualdades sociais e como isso impactou no campo cultural. Ressalta, ainda, a problemática da violência presente na própria constituição da cidade à luz de estudos concernentes ao tema, indicando certa contradição entre o processo de melhorias sociais ao mesmo tempo em que há significativo aumento da violência. Paralelamente a isso, é apontado o contexto cultural de Diadema com a finalidade de refletir de que forma a cidade procurou combater o estigma de cidade violenta por meio da promoção cultural na gestão municipal do período 1993-1996. É nesse momento que as manifestações teatrais em Diadema voltam a florescer, a exemplo do que já que houvera nos anos 1970 com o Teatro-Escola. Os Jovens Atores de Diadema, nascidos de uma oficina teatral promovida pela mediação cultural, torna-se o expoente dessa arte na cidade a partir de 1995. O trabalho trata das montagens teatrais do grupo com a finalidade de extrair daí as contribuições e o legado por ele deixado na cidade. Aponta a importante metodologia de narração de histórias pessoais e da cidade na construção de um dos espetáculos e o quanto seu resultado impactou sobre o público. Ressalta ainda a relação qualidade artística e identidade com um dos fatores de sucesso do grupo. Como considerações finais, o trabalho aponta as contribuições do grupo para as políticas culturais questionando os limites dessas políticas.

(10)

ABSTRACT

This work seeks to understand the contributions of Jovens Atores theater group within the cultural policies implemented in Diadema / SP from the year 1990. At first, it presents concepts and propositions on cultural policy, from a review of relevant literature on the subject. Indicates authors and discussions relevant to the subject and elect, for the analysis of this work, the concept of cultural policy as a synonym for public support of culture. The concepts of cultural policies exposed are a parameter for the case of the city of Diadema. To this end, the work approaches its sociopolitical context, seeking to identify the clues that led to the successive administrations, from the year 1980, to implement public policies in a systematic way to reduce social inequalities and how it impacted the cultural field. Also highlights the problem of violence in the very constitution of the city in light of studies concerning this topic, indicating a certain contradiction between the process of social improvement while there is significant increase in violence. Alongside this is pointed out the cultural context of Diadema, briefly, in order to reflect how the city has sought to combat the stigma of violent city through cultural promotion from the municipal management 1993/1996. That's when the theater events in Diadema again flourish, as already there had been in the 1970s with the Theatre School. Jovens Atores de Diadema, born of a theater workshop organized by the cultural mediation, becomes the exponent of the art in the city since 1995. The work deals with the theatrical productions of the group in order to extract therefrom the contributions and the legacy he left in Diadema. Points out the important methodology of personal storytelling and the city in building one of the shows and how its outcome impacted on the public. It further emphasizes artistic quality ratio and identity with one of the success factors of the group. As conclusion, the work points to the group contributions to the cultural politics questioning the limits of cultural policies.

Keywords: Cultural Policies. Theatre. Jovens Atores. Diadema. LISTAS DE ILUSTRAÇÕES

Figura1 - Mapa político da Grande São Paulo

... 37

Figura 2 - Construção de um CJC, em Diadema

(11)

Figura 3 - Atriz Valdilene Santana como Nhinhinha na peça Algumas estórias ... 94

Figura 4 – Cena de Algumas estórias

... 97

Figura 5 – Cena de Algumas estórias

... 97

Figura 6 – Cena de Algumas estórias

... 104

Figura 7 - Cena de Retratalhos

... 102

Figura 8 - Cena de

Retratalhos... 103

Figura 9 - Cena de Retratalhos

... 103

Figura 10 – Divulgação de Histórias que o povo conta ... 116

Figura 11 – Cena de Histórias que o povo

conta... 116

Figura 12 – Cena de Histórias que o povo

conta... 117

Figura 13 - Cena de Histórias que o povo conta ... 117

Figura 14 – Divulgação de As Troianas

... 124

Figura 15 – Apresentação de As Troianas no Teatro Clara Nunes, 1998 ... 127

Figura 16 – Apresentação de As Troianas

... 125

(12)

... 125

Figura 18 – Ensaio de O genro de muitas sogras ... 129

Figura 19 – Ensaio de O genro de muitas sogras ... 129

Figura 20 – Cena de O genro de muitas sogras

... 130

Figura 21 – Cena de O genro de muitas

sogras... 130

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Orçamento Ministerial Brasileiro – Ano-Base 2011 ... 24

Tabela 2 - Taxa de homicídios por 100 mil habitantes ... 53

(13)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABC Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul

ABCD Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul e Diadema.

ABCDMR Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, Diadema, Mauá, Rbeirão Pires e Rio Grande da Serra

ARENA Aliança Renovadora Nacional

CC Centro Cultural

CCD Centro Cultural Diadema

CJC Centro Juvenil de Cultura

EAD Escola de Arte Dramática

ELT Escola Livre de Teatro de Santo André

IMES Instituto Municipal de Educação Superior de São Caetano do Sul

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

MDB Movimento Democrático Brasileiro

ME Movimento Estudantil

NAP Núcleo de Atendimento à População

ONG Organização Não-Governamental

ONU Organização das Nações Unidas

PSB Partido Socialista Brasileiro

(14)

PTB Partido Trabalhista Brasileiro

PTN Partido Trabalhista Nacional

SEADE Fundação Estadual de Análise de Dados Estatísticos

SECEL Secretaria de Educação, Cultura, Esportes e Lazer de Diadema

SNC Sistema Nacional de Cultura

SUS Sistema Único de Saúde

TCN Teatro Clara Nunes

UBS Unidade Básica de Saúde

UDESC Universidade do Estado de Santa Catarina

UNE União Nacional dos Estudantes

UNESCO Organização para a Educação, Ciência e Cultura das Nações Unidas

USP Universidade de São Paulo

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 15

CAPÍTULO 1 - NOÇÕES E PROPOSIÇÕES DE POLÍTICAS CULTURAIS ... 21

• AÇÃO CULTURAL ... 31

1.1.1 Política de Eventos ... 33

1.1.2 Componentes de uma ação cultural ... 34

CAPÍTULO 2 - O CONTEXTO SOCIOPOLÍTICO DE DIADEMA ... 37

(15)

...42

2.2 ASCENSÃO DA ESQUERDA E AS PRIMEIRAS POLÍTICAS ... 43

2.3 A MELHORIA DA INFRAESTRUTURA ... 47

2.4 A CONTRADIÇÃO ENTRE AS MELHORIAS SOCIAIS E O INCREMENTO

DA VIOLÊNCIA

... 49

CAPÍTULO 3 - O CONTEXTO CULTURAL DE DIADEMA ... 54

3.1 O TEATRO-ESCOLA DOS ANOS 1970 ... 54

3.2 A POLÍTICA DE EVENTOS DOS ANOS 1980 ... 58

3.3 FORMAÇÃO DA REDE DE EQUIPAMENTOS CULTURAIS ... 59

3.4 AS POLÍTICAS CULTURAIS DOS ANOS 1990 ... 62

CAPÍTULO 4 – OS JOVENS ATORES DE DIADEMA ... 72

4.1 AS OFICINAS DE TEATRO ... 72

4.2 O SURGIMENTO DA OFICINA DE APROFUNDAMENTO: OBJETIVOS E CARACTERÍSTICAS ... 73

4.2.1 O modelo de Diadema

...75

4.2.2 Divulgação ... 77

4.2.3 Processo seletivo e seus objetivos ... 78

(16)

81

4.3 ESPETÁCULOS REALIZADOS

...82

4.3.1 Algumas estórias ... 83

4.3.1.1 A oficina continua: a aproximação com as comunidades ... 91

4.3.1.2 Participação em festivais de teatro amador ... 94

4.3.2 Retratalhos ... 97

4.3.3 Histórias que o povo conta ... 105

4.3.3.1 As histórias pessoais ... 107

4.3.3.2 Improvisação e construção da cena ... 108

4.3.3.3 Dramaturgia de Histórias que o povo conta ... 109

4.3.3.4 Resultado estético: breve análise do percurso da peça ...111

4.3.3.5 Remontagem e aprimoramentos de Histórias que o povo conta ... 113

4.3.3.6 Circulação e impacto do trabalho ... 114

4.3.4 As Troianas ... 119

4.3.5 O genro de muitas sogras ... 127

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 132

(17)
(18)

INTRODUÇÃO

Realizar esse estudo foi de suma importância para mim. Rever a Diadema de minha infância e adolescência através do olhar do pesquisador não foi tarefa nada fácil. As duas visões ora se confundiam oram se separavam. Nesse sentido, a minha orientadora teve um papel muito importante de ir clareando esse caminho.

Nasci e vivi em Diadema por vinte e sete anos. Foi lá que comecei a fazer teatro num grupo chamado Jovens Atores de Diadema, que na época, teve grande repercussão na cidade. Comecei como integrante e participei de quatro montagens do grupo. Nesse período, a vida cultural de Diadema era intensa, como eu jamais havia visto. Respirava-se cultura e arte pelos bairros. Eu já percebia que algo diferente estava acontecendo, porque a Diadema que eu estava acostumado era aquela que passava na televisão, falando dos crimes e da violência.

Perceber hoje que aquele movimento cultural foi único na história da cidade e que eu estive lá, no centro da ebulição, é uma satisfação enorme.

Os Jovens Atores eram a sensação de Diadema. Todo jovem que tinha aspirações ao teatro sonhava um dia entrar para o grupo. Isso eu pude comprovar por meio de entrevistas a agentes culturais que eram a linha de frente da mediação cultural. É sobre esse grupo, que teve suas atividades desenvolvidas entre 1995 e 1999, na cidade de Diadema/SP, que este estudo se debruça.

Portanto, o objeto desta pesquisa é a prática teatral do Grupo Jovens Atores de Diadema entre os anos de 1995 e 1999, no âmbito das políticas culturais adotadas pela municipalidade a partir dos anos 1990.

(19)

relações com as políticas culturais das quais ele se origina.

O problema consiste em saber, levando-se em consideração os diferentes contextos de Diadema que possibilitaram a existência de políticas culturais nos anos 1990, quais as contribuições do grupo Jovens Atores na perspectiva dessas políticas? Qual o papel desse grupo frente a política cultural adotada? De que modo o aprimoramento artístico do trabalho teatral dos Jovens Atores se relaciona com esse contexto?

Este trabalho se justifica, primeiramente, por se caracterizar em um estudo de caso pioneiro sobre a prática teatral do grupo Jovens Atores de Diadema por conta de sua importância no contexto local e por se configurar, na segunda metade dos anos 1990, o expoente da produção teatral daquele município. A partir do modelo de grupo teatral adotado pelos Jovens Atores, surgiram outros coletivos teatrais na cidade de Diadema.

Pela possibilidade de dar visibilidade e voz a pessoas, que como eu, viveram ou vivem em uma cidade estigmatizada pela violência. Cidade que soube, como poucas, encontrar soluções pautadas na diminuição das desigualdades sociais. Esse trabalho se justifica, ainda, pelo resgate de parte da história teatral de uma importante cidade no contexto econômico e social do país. E, por último, o meu interesse por esse tema se justifica porque eu iniciei minha carreira artística no grupo Jovens Atores, ainda na adolescência, como um dos atores do elenco. Assim sendo, “[...] o observador é da mesma natureza que o objeto, e o observador é, ele próprio, uma parte de sua observação” (LÉVY-STRAUSS apud MINAYO, 2007, p. 13)

Metodologicamente, este trabalho é um estudo de caso, realizado através de pesquisa qualitativa. Para a elaboração do corpus documental, adotei diferentes procedimentos: pesquisa de campo e pesquisa bibliográfica.

(20)

ações da prefeitura e dados oficiais. No caso do Jornal da Cidade eu fotografei e anotei as referências. Ainda nessa visita, contatei pessoas e visitei espaços culturais para falar sobre o meu trabalho com o intuito de preparar as possíveis entrevistas.

A segunda visita a Diadema, em maio de 2010, teve o intuito de realizar entrevistas. As entrevistas foram todas semiestruturadas, contando com um roteiro básico de perguntas que eu considerei imprescindíveis para esse trabalho, tais como: de que forma o entrevistado soube da oficina de teatro, como foi o processo seletivo, como foi o processo criativo das montagens, sobre a recepção do público aos espetáculos, das viagens e prêmios, etc. Estruturei diferentes roteiros para as diferentes pessoas levando em consideração a sua função em relação ao grupo Jovens Atores. Eu realizei dez entrevistas no total, com a média de duração de uma hora por entrevistas, sendo que algumas duraram bem mais que isso. Entrevistei cinco ex-integrantes, um agente cultural, um bailarino da Cia de Danças de Diadema que trabalhou com o grupo, uma bailarina que à época era uma “amiga” dos Jovens Atores e acompanhava o trabalho; uma funcionária do Teatro Clara Nunes e o diretor dos últimos três espetáculos, Luiz Nunes.

As entrevistas foram realizadas no Teatro Clara Nunes ou nas residências dos entrevistados. Como sou amigo de deles, isso facilitou, também, o acesso a materiais de acervo pessoal tais como fotografias, programas das peças, cartazes, convites, notícias de jornal, certificados de participação em eventos, textos das peças, etc. Esse acervo pessoal foi muito importante no curso da pesquisa e na formulação do corpus documental. Uma parte considerável desse material não existe no Centro de Memória, sobretudo os documentos emitidos fora de Diadema, como a participação em festivais de teatro pelo interior de São Paulo.

Nessa segunda visita a Diadema tive acesso ao rico acervo de dissertações e teses sobre Diadema no Centro de Memória que, infelizmente, sofreu um incêndio há alguns anos destruindo parte considerável do acervo videográfico, incluindo-se aí as gravações das peças realizadas pelos Jovens Atores.

(21)

se revelou muito eficiente. As entrevistas via Skype ou Facebook foram ao vivo, porém, por escrito.

Para a realização da pesquisa bibliográfica, busquei autores e obras que pudessem embasar teoricamente esse trabalho. Foram utilizados livros, dissertações, teses e artigos dos mais varidos temas que envolvem esse trabalho. Em linhas gerais, foram contemplados os seguintes campos teóricos: políticas culturais, o contexto de Diadema, teorias sobre teatro baseados em comunidade.

Este trabalho está estruturado em Introdução, seguida de quatro capítulos e as considerações finais. No Capítulo 1, abordo noções e proposições acerca de políticas culturais, procurando compreender, ainda que sucintamente, definições que me auxiliaram no percurso desse trabalho. Desse modo, busco evidenciar que no campo das políticas culturais existem distintas maneiras de abordar essa temática. Assim, parto dos pressupostos teóricos tratados por vários autores como Maria das Graças Rua, Eloisa Höfling, Teixeira Coelho, Lia Calabre, entre outros

O Capítulo 2 aborda o contexto sociopolítico de Diadema desde sua emancipação política, no final dos anos 1950, até a década de 1990. Esse recorte temporal tem por objetivo demonstrar a transformação da cidade através das sucessivas gestões municipais. Inclui o período repressivo da Ditadura Militar, evidenciando o quanto esse regime foi responsável ao mesmo tempo pela forte industrialização da Região do ABCD Paulista, onde está localizada Diadema, e também pela criação de bolsões de pobreza promovidos por esse mesmo surto desenvolvimentista. Nesse capítulo, as análises efetuadas sobre as políticas públicas de Diadema estão amparadas nos estudos da antropóloga francesa Jeanne Bisilliat assim como os apontamentos sobre o contexto diademense se fundamentam nas análises de Absolon Oliveira e Margaret Keck. Para compreender as questões sobre violência, assunto presente nesse capítulo, conto com as contribuições de Marisa Feffermann e Raquel Rolnik. Por meio do trabalho desses(as) autores(as) pude refletir sobre as sucessivas gestões políticas e seus efeitos nas diferentes áreas sociais no período recortado por essa pesquisa.

(22)

Godoy, que se efetuaram um levantamento sobre os equipamentos culturais de Diadema. Para o período específico do surgimento dos Jovens Atores, recorri aos estudos do professor Maurício Cardoso, que realizou uma pesquisa sobre a gestão de José de Fillipi Jr. (1993/1996). Para um aporte mais crítico sobre a questão da política cultural recorri aos apontamentos de Marilena Chaui e Suzana Viganó. Daí, o recorte temporal desse capítulo abrange o mesmo período do anterior, ou seja, da década de 1960 a 1990. Isso porque na década de 1970 aconteceram as primeiras manifestações culturais da cidade de Diadema por meio da abertura do Teatro-Escola, que dinamizou, em seu tempo, as ações culturais em torno do teatro. O texto demonstra que os anos 1980 foi profundamente marcado por políticas de eventos – ações culturais pontuais que, conforme explica Teixeira Coelho, não deixam resíduos nas pessoas que delas participam. O texto avança sobre os anos 1990 para aí evidenciar a mudança substancial na implementação de políticas culturais. O capítulo termina constatando que a segunda gestão de Gilson Menezes manteve, em linhas gerais, as mesmas políticas de formação, produção e difusão cultural de seu antecessor.

O Capítulo 4 trata exclusivamente sobre as atividades da oficina teatral Jovens Atores de Diadema. A oficina nasceu em agosto de 1995 e, durante seus quase cinco anos de existência, produziu cinco espetáculos. O grupo foi formado a partir de uma demanda das oficinas de iniciação teatral dos Centros Culturais de bairro por uma oficina que possibilitasse um aprofundamento na prática teatral.

Chamo a atenção para dois aspectos importantes na estratégia de formação dessa oficina: a divulgação e o processo seletivo. O processo seletivo, rigoroso, imprimiu, conforme depoimentos dos ex-integrantes, uma seriedade ao trabalho que não era vista nos bairros. O texto passa a abordar, entre outras questões, as montagens realizadas, procurando evidenciar as características que marcaram cada processo criativo.

(23)

foi o terceiro a ser montado e o único que contou com uma metodologia de narração de histórias pessoais e histórias da cidade. Sobre esta metodologia, conto com os estudos de Jan Cohen-Cruz, estudiosa estadunidense do teatro baseado na comunidade, que trata de processos de narrar histórias (Storytelling, no inglês) com grupos marginalizados ou em posição social desfavorável.

Outro aspecto levantado nesse último capítulo é a aproximação dos Jovens Atores das comunidades de Diadema em suas inúmeras apresentações em Centros Culturais de bairro e como isso incentivou a presença de público nesses equipamentos culturais. Indico dois fatores que contribuíram para o aumento do público: a questão identitária em relação ao grupo e a qualidade artística/estética dos trabalhos.

Para finalizar, discorro ainda sobre as duas últimas montagens, As Troianas, o único espetáculo que não pôde circular devido ao tamanho de seu cenário, e O genro de muitas sogras, de Arthur de Azevedo. Este último foi o espetáculo mais premiado do grupo dentro e fora de Diadema. O final do ano de 1999 culmina com o encerramento das atividades da oficina por parte do Departamento de Cultura, sem prévia consulta aos participantes.

(24)

CAPÍTULO 1 - NOÇÕES E PROPOSIÇÕES DE POLÍTICAS CULTURAIS

Este capítulo visa abordar conceitos e proposições sobre o que são políticas culturais, seus objetivos e ocorrências. O termo, formado a partir de uma composição binária – política e cultura – é tema de importantes debates dentro e fora do Brasil. Cada um dos termos formadores desse binário já possibilitaria teses e estudos vastíssimos tamanha a sua complexidade e abrangência.

Meu objetivo não é esmiuçar o assunto, ou seja, reconstruir todo o percurso já feito por especialistas da área. Por essa razão, trago somente à baila conceituações e proposições que contribuem para a compreensão das políticas culturais adotadas em Diadema nos anos 1990. Tais políticas culturais foram as responsáveis pelo reflorescimento teatral na cidade naquele período específico e, mais diretamente, pelo surgimento do grupo teatral Jovens Atores, objeto de análise deste trabalho. Portanto, neste capítulo busco oferecer um referencial teórico com vistas a auxiliar no entendimento do procedimento cultural ocorrido em Diadema, estabelecendo, assim, parâmetros de análise para os capítulos subsequentes.

Todavia, ao iniciar os estudos sobre políticas culturais deparei-me com uma profusão de termos sobre o assunto. Mais difícil foi conseguir escrever as primeiras linhas a esse respeito. Para começar, qual seria o conceito mais adequado a ser utilizado neste trabalho? Políticas públicas, ou seria políticas públicas para a cultura? Ou, simplesmente, políticas culturais? Com a finalidade de evitar dubiedades, procurei compreender sucintamente as abordagens dos diversos autores para só depois definir o conceito que orientou as análises desse trabalho.

O primeiro conceito que passo a desenvolver é o de políticas públicas. Maria das Graças Rua (1998, p. 1), em seu artigo “Análise de Políticas Públicas: conceitos básicos”, esclarece que as políticas públicas são resultantes da atividade política por compreender o conjunto das decisões e ações relativas à alocação imperativa de valores, pois “geralmente envolve mais do que uma decisão e requer diversas ações estrategicamente selecionadas para implementar as decisões tomadas”. E continua:

(25)

centrais é o fato de que são decisões e ações revestidas da autoridade soberana do poder público. As políticas públicas envolvem, portanto, atividade política. (RUA, 1998, p. 2).

Política essa representada e exercida pelos governos que, lançando mão da estrutura do Estado, implementam suas ações de governança por meio de um mandato de tempo determinado. Em linhas gerais, políticas públicas se caracterizam como programas governamentais concebidos dentro de uma condição de emergência cujo objetivo é o de atenuar ou suprir os desníveis sociais causados pelo sistema econômico por meio de mecanismos de operação que visam impactar sobre a ordem social e/ou econômica. Isto quer dizer que as políticas públicas são voltadas a atender, sobretudo, aqueles que têm menos condições de usufruir de todos os benefícios sociais, ou seja, aqueles que por razões múltiplas não conseguem ganhar ou acumular riqueza na quantidade suficiente para sanar suas necessidades. Para Eloisa Höfling (2001), o conceito de políticas públicas deve ser entendido como o “Estado em ação”:

O Estado implantando um projeto de governo, através dos programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade. Estado não pode ser reduzido à burocracia pública, aos organismos estatais que conceberiam e implementariam as políticas públicas. As políticas públicas são aqui compreendidas como as de responsabilidade do Estado – quanto à implementação e manutenção a partir de um processo de tomada de decisões que envolve órgãos públicos e diferentes organismos da sociedade relacionados à política implementada. Neste sentido, políticas públicas não podem ser reduzidas a políticas estatais. E políticas sociais se referem a ações que determinam o padrão de proteção social implementado pelo Estado, voltadas, em princípio, para a redistribuição dos benefícios sociais visando a diminuição das desigualdades estruturais produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico. (HÖFLING, 2001, p. 31).

Essa articulação entre Estado e sociedade civil pode ser alcançada por meio da escuta e do debate entre os diferentes atores sociais, podendo se caracterizar como um processo social maduro de envolvimento entre ambos – o que implica, muitas vezes, em conflitos difíceis – cujo objetivo é implementar as ações eleitas como prioridade dentro desse acordo mútuo. Isso significa que o governo deve criar as instâncias e canais de diálogo capazes de deixá-lo em constante contato com as demandas que lhe são cobradas pelos vários setores da sociedade civil.

(26)

proteção social de um ou mais setores específicos da sociedade?

Uma possibilidade de resposta a essas questões é sugerida por Isaura Botelho (2001). Botelho compreende que a cultura abarca duas dimensões distintas: a antropológica e a sociológica. Conforme expõe Botelho (2001, p. 74):

Na dimensão antropológica, a cultura se produz através da interação social dos indivíduos, que elaboram seus modos de pensar e sentir, constroem seus valores, manejam suas identidades e diferenças e estabelecem suas rotinas. Desta forma, cada indivíduo ergue à sua volta, e em função de determinações de tipo diverso, pequenos mundos de sentido que lhe permitem uma relativa estabilidade. Desse modo, a cultura fornece aos indivíduos aquilo que é chamado por Michel de Certeau, de “equilíbrios simbólicos, contratos de compatibilidade e compromissos mais ou menos temporários”.

Para Botelho (2001), os fatores que orientam a construção desse universo pessoal e protegido têm origem diversa para cada indivíduo. Assim, fatores regionais, de interesses profissionais ou econômicos, esportivos ou culturais, de sexo, de origens étnicas, geracional, etc. podem, segundo a autora, ser tomados como ponto de partida para a elaboração individual de um universo particular que vai interagir com outros universos particulares. Nessa dimensão, afirma Botelho (2001, p. 74), “a interação entre os indivíduos é um dado fundamental, a sociabilidade é um dado básico”, e continua, ao resumir que a “cultura é tudo que o ser humano elabora e produz, simbólica e materialmente falando”. É na dimensão antropológica que se encontram, segundo Botelho (2001, p. 74), os “hábitos e costumes arraigados, [...] as relações familiares, [...] de vizinhança e a sociabilidade [...], a organização dos diversos espaços por onde se circula habitualmente, o trabalho, o uso do tempo livre, etc.” Em suma, a dimensão antropológica diz respeito diretamente ao plano do cotidiano do indivíduo.

Já a dimensão sociológica se reporta diretamente a um âmbito especializado. Para Botelho (2001, p.74), ela se caracteriza como sendo “uma produção elaborada com a intenção explícita de construir determinados sentidos e de alcançar algum tipo de público, através de meios específicos de expressão”.

(27)

própria. Ela compõe um universo que gere (ou interfere) um circuito organizacional, cuja complexidade faz dela, geralmente, o foco das atenções das políticas culturais, deixando o plano antropológico relegado simplesmente ao discurso (BOTELHO, 2001, p.74).

Nessa perspectiva, a dimensão sociológica prevê instituições e/ou sistemas organizados socialmente, visando estimular a produção, a circulação e o consumo de bens simbólicos, tornando-a um circuito visível e palpável. Por essa condição mesma, a dimensão sociológica da cultura em relação à antropológica se torna mais facilitada principalmente no que concerne à possibilidade de planejar uma interferência apoiada na busca de resultados que sejam relativamente previsíveis e/ou quantificáveis. No Brasil, essa dimensão é respaldada por investimentos públicos federais (Ministério da Cultura – MinC), estaduais (secretarias de cultura) e, por fim, municipais (departamentos, secretarias ou fundações culturais), além de iniciativas privadas e de autarquias.

O dado negativo provém, infelizmente, do orçamento destinado ao Ministério da Cultura que não chega a 0,1% do montante geral das verbas destinadas aos vinte e cinco ministérios brasileiros, ocupando a penúltima posição entre os investimentos ministeriais. A tabela abaixo serve para exemplificar, de modo claro, como é visto o campo cultural em termos de investimentos públicos federais.

COLOCAÇÃO MINISTÉRIOS PARTICIPAÇÃO

ORÇAMENTÁRIA (%)

1 FAZENDA 59,672%

2 PREVIDÊNCIA SOCIAL 15,185%

3 SAÚDE 4,040%

4 EDUCAÇÃO 3,798%

7 DESENV. SOCIAL COMBATE À FOME 2,244%

9 TRANSPORTES 1,304%

15 CIÊNCIA E TECNOLOGIA 0,415%

20 MEIO AMBIENTE 0,193%

22 ESPORTE 0,133%

24 CULTURA 0,098%

25 PESCA E AQÜICULTURA 0,029%

Tabela 1: Orçamento ministerial brasileiro – Ano base 2011

A partir dos dados acima, a conclusão é que, no Brasil, o segmento cultural ainda é visto como um setor da administração pública inferior aos demais, ainda que seja a cultura um elemento fundamental para o (des)envolvimento humano dos indivíduos, além de contribuir para o empoderamento e coesão sociais.

Se a situação cultural apresentada pela tabela acima parece dramática, Cristina

(28)

Carvalho (2009), ao tratar da história do campo cultural no Brasil desde o Estado Novo (1937-1945) até a elaboração, em 2005, do Sistema Nacional de Cultura (SNC), defende que os setenta anos que separam os dois marcos foram fundamentais para o processo de luta social pela transformação do caráter das políticas públicas para a cultura no Brasil, sendo que tal fato não se constitui em apenas uma maior participação concedida (grifo meu) pelos dominantes. Carvalho salienta a importância da dimensão cultural e a defende como importante acesso à cidadania. Para Carvalho (2009, p. 20):

As organizações do domínio da cultura contribuem para a construção de uma consciência de cidadania e seu desenvolvimento amplia o espaço da cultura como elemento importante na construção da participação ativa e consciente da sociedade na solução de seus problemas. Sua principal contribuição está na capacidade de, em sua especificidade, desenvolver ações que representam as interpretações que os indivíduos têm do mundo e de seu cotidiano. Dessa maneira, elas materializam a complexa diversidade cultural que constitui o puzzle que é o mundo contemporâneo.

A fala de Carvalho corrobora a importância da dimensão antropológica exposta anteriormente com a descrição dos impactos que o desenvolvimento cultural pode acarretar a um indivíduo num plano simbólico por meio da construção de uma consciência de cidadania à qual acrescento a melhoria da autoestima. Essa importância da cultura no desenvolvimento global do indivíduo não pode passar ao largo das medidas sociais adotadas pelos governos que pretendam diminuir os desníveis e desigualdades sociais, pois a cultura é componente intrínseco ao ser humano por atuar diretamente no plano simbólico que cada um carrega dentro de si e que permite e orienta as relações interpessoais.

Contudo, as políticas públicas para a cultura precisam ser capazes de organizar e articular as diferentes esferas sociais, além de se pautarem em pesquisas quantitativas e qualitativas eficientes com a finalidade de mapear e compreender as características e necessidades de seu público-alvo, e, consequentemente, atingir o cotidiano dos indivíduos. O fato de compreender a dimensão antropológica, isto é, o indivíduo no seu cotidiano, contribui para ações culturais mais eficazes em uma dimensão sociológica por meio da elaboração e efetivação de políticas culturais.

(29)

campo cultural aborda, entre outros assuntos, a proteção aos bens culturais e à cultura em geral. Conforme propõe o artigo 215, “o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.” E continua, no artigo 216, § 3º: “A lei estabelecerá incentivos para produção e o conhecimento de bens e valores culturais”.

Os incentivos descritos acima podem ser elaborados em âmbitos federal, estadual ou municipal, por meio direto da gestão e aplicação de políticas públicas para a cultura. O que se observa, porém, conforme a Tabela 1, é que a questão cultural ainda está longe de ocupar, ao menos em termos orçamentários, um nível de investimento que garanta o cumprimento da Carta Magna brasileira.

Todavia, apesar do disparate orçamentário observado acima entre os ministérios brasileiros, Lia Calabre (2009) vê com otimismo as questões relacionadas ao debate cultural no Brasil, chamando a atenção, contudo, para que o estipulado na Constituição Federal Brasileira saia do plano teórico e passe à ação concreta. Para Calabre:

Vivemos um momento em que a cultura passa finalmente a ser encarada enquanto direito, como verdadeiramente o é. O direito à cultura está garantido na Constituição Federal, nas constituições estaduais e em muitas das leis orgânicas municipais. O desafio que se impõe é transformar a lei em realidade. (2009, p.294).

Calabre (2009, p.82) esclarece ainda que “a partir de 1988, com a promulgação da nova Constituição, os municípios tiveram aumentadas suas atribuições e responsabilidades na prestação de serviços públicos à população.” Pela própria proximidade da prefeitura em relação à população, o município se torna lugar privilegiado para a elaboração e implementação de políticas públicas para a cultura. Sobre essa especificidade, diz Botelho:

(30)

Nesse sentido, a definição de Höfling para políticas públicas, como sendo uma responsabilidade do Estado no que se refere à implementação e manutenção a partir de interações com a sociedade civil, encontra ressonância em Carvalho, Calabre e Botelho.

Assim, a política pública para a cultura diz respeito a um apoio estatal para a consolidação de ações e medidas que visem ao fortalecimento do campo cultural, do ponto de vista da produção, do incentivo, da manutenção, da difusão, etc.

Mas não é somente o Estado que atua nessa dimensão sociológica da cultura. Outras iniciativas oriundas da sociedade civil também são atuantes, chegando muitas vezes, em certas localidades, a suplantar a pública. Nesse caso, portanto, se torna mais coerente e apropriado o termo “política cultural” em vez de “política pública para a cultura”, visando não restringir o termo somente à esfera do poder público. Desse modo, já numa perspectiva de política cultural, esclarece Teixeira Coelho (2004, p. 293):

[...] a política cultural é entendida habitualmente como programas de intervenções realizadas pelo Estado, instituições civis, entidades privadas ou grupos comunitários com o objetivo de satisfazer as necessidades culturais da população e promover o desenvolvimento de suas representações simbólicas. Sob este entendimento imediato, a política cultural apresenta-se assim como um conjunto de iniciativas, tomadas por esses agentes, visando promover a produção, a distribuição e o uso da cultura, a preservação e a divulgação do patrimônio histórico e o ordenamento do aparelho burocrático por elas responsável.

(31)

por meio de investimento direto realizado por pessoas jurídicas privadas ou físicas. Outra definição próxima a de Coelho está prevista na Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural da Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura das Nações Unidas (UNESCO). Publicada em 2002, em seu artigo 9, denominado “As Políticas culturais, catalisadoras da criatividade”, a Declaração traz um dado a mais que aquele apresentado por Coelho: a indústria cultural.

As políticas culturais, enquanto assegurem a livre circulação de ideias e das obras, devem criar condições propícias para a produção e a difusão de bens e serviços culturais diversificados, por meio de indústrias culturais que disponham de meios para desenvolver-se nos planos local e mundial. Cada Estado deve, respeitando suas obrigações internacionais, definir sua política cultural e aplicá-la, utilizando dos meios de ação que julgue mais adequados, seja na forma de apoios concretos ou de marcos reguladores apropriados (UNESCO – DECLARAÇÃO UNIVERSAL SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL, 2002).

O texto acima também chama a responsabilidade sobre a aplicabilidade de políticas culturais para o Estado bem como para as iniciativas privadas por meio da indústria cultural. Sem o propósito de desviar do assunto, só desejo chamar a atenção para o termo “indústria cultural” que aparece no texto da UNESCO. Marilena Chaui et al. (1985) esclarecem a diferença fundamental entre o propósito da indústria cultural e o das políticas culturais, que na visão dos autores são dois instrumentos poderosos de legitimação do Estado contemporâneo. Para Chaui et al. (1985), ambas estariam “encarregadas de disseminar, conservar e difundir a ideologia da classe dominante”. Porém, os autores fazem uma ressalva importante:

Evidentemente, as finalidades da política cultural e da indústria cultural são as mesmas, isto é, a conservação da ideologia dominante, porém, a política cultural pode oferecer-se como política nacional que interessa à nação e à sociedade como um todo, enquanto que a indústria cultural se oferece diretamente determinada pelo jogo do mercado e da competição. A política cultural pode aparecer como incentivo à produção cultural, enquanto a indústria cultural se baseia exclusivamente no consumo dos chamados bens culturais. (CHAUI ET AL., 1985, p. 9).

(32)

“política cultural” busca criar as condições de oferecer uma alternativa socializante da cultura no âmbito na qual está inserida. Numa perspectiva de âmbito nacional como apontada acima, o Estado seria o órgão mais adequado para esse fim. Ainda nessa perspectiva estatal da política cultural cabe citar o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE:

Política cultural é a ação do poder público ancorado em operações, princípios e procedimentos administrativos e orçamentários. Esta política é orientada para melhorar a qualidade de vida da população através de atividades culturais, artísticas, sociais e recreativas, proporcionando à mesma o acesso aos bens culturais. Trata-se de uma ação voltada para alguns segmentos da sociedade. (IBGE apud CALABRE, 2009, p. 85).

As políticas culturais podem ocorrer de muitas maneiras, a depender exclusivamente dos objetivos de quem as implementa e a quem se pretende atingir. Para Newton Cunha (2003, p. 511):

Por política cultural pode-se entender, inicialmente, o conjunto de intervenções dos poderes públicos sobre as atividades artístico-intelectuais ou genericamente simbólicas de uma sociedade [...]. Ela abrange tanto o arcabouço jurídico de tributos incidentes, de incentivo e proteção de bens e atividades, quanto, de maneira concreta, a ação cultural do Estado, frequentemente seletiva, e na qual se incluem: organismos ou estruturas administrativas; princípios, regras e métodos de atuação; gerenciamento ou formas de apoio a instituições, grupos, programas ou projetos; manutenção ou difusão de obras e de processos artístico-intelectuais.

Destaco, ainda, a contribuição do autor Harry Hillman-Chartrand que estabeleceu uma tipologia voltada à compreensão do papel e do nível de intervenção estatal em relação ao fomento cultural de um determinado país. No caso brasileiro, de muitos países latino-americanos e europeus, as políticas culturais acontecem, sobretudo, por meio de um “Estado-arquiteto”.

Para Hillman-Chartrand:

(33)

Compreender o tipo de Estado que é o Brasil numa perspectiva de política cultural é fundamental, até mesmo para se discutir a problemática que esse “tipo”, apontado por Hillman-Chartrand, costuma acarretar. Perceber o quanto determinadas características de outro(s) tipo(s) de Estado pode(m) contribuir ou aperfeiçoar o modelo atual brasileiro com a finalidade de, por meio de seu caráter como Estado legítimo, conferir-lhe uma atuação eficaz e comprometida para as diminuições das desigualdades socioculturais.

Isso porque, conforme disseram Chaui et al. (1985), a cultura deve se constituir em uma frente importante de luta. Para Cunha (2003, p. 512) “[...] a existência de uma política cultural – desde que coerente, ampla e eficaz – constitui uma forma de expansão de conhecimentos e de práticas simbólicas, de integração social e de exercício de cidadania”. Esse último ponto tratado por Cunha está estreitamente ligado à política social já apontado por Höfling.

O binário política e cultura carrega em si dois mecanismos dos quais o Estado mais se utiliza para garantir sua legitimação como apontado por Chaui et al. (1985). A “coisa pública” se caracteriza “como entidade que cuida de todos e em nome de todos fala”. (COELHO, 2004, p. 294). Para Miguel Abad:

[...] a política pública é a forma em que se concretiza a ação do Estado. Se admitimos que se delega ao Estado a autoridade para unificar e articular a sociedade, as políticas públicas são um instrumento privilegiado de dominação. A política pública, no entanto, é também uma decisão que supõe uma ideologia de mudança social, explícita ou não em sua formulação. Esta decisão é o resultado do compromisso de uma racionalidade técnica com uma racionalidade política. (ABAD, 2002, p. 119).

Portanto, haver instâncias pelas quais o Estado possa garantir a participação dos cidadãos e cidadãs é fundamental. Se considerarmos nosso atual modelo político, baseado em democracia participativa, esse se torna o único meio por onde o Estado pode ser cobrado ou pressionado a realizar as ações identificadas e eleitas como prioridade pelos mais diferentes setores da sociedade civil organizada.

(34)

Uma eficiente ferramenta para a efetivação de uma política cultural, que seja atuante para além de sua dimensão sociológica e que tenha o objetivo de atingir as pessoas em seu cotidiano, isto é, em sua dimensão antropológica, chama-se ação cultural. Teixeira Coelho (1999, p. 32) a define como um “conjunto de procedimentos, envolvendo recursos humanos e materiais, que visam pôr em prática os objetivos de uma determinada política cultural”. Essa denominação é de origem francesa –action culturelle–, surgida na Europa após a Segunda Guerra Mundial com a intenção de reconstrução social e educacional dos países arrasados pelos conflitos. Por meio da atuação da ONU e da UNESCO, o conceito tomou dimensões mundiais. No Brasil, a expressão disseminou-se, sobretudo, após os anos 1970, muitas vezes com o significado equivalente a animação cultural ou, ainda, a animação sociocultural.

Newton Cunha considera que a ação cultural surge em virtude do aspecto socializante das políticas culturais:

A necessidade de favorecer e ampliar as possibilidades de aprendizado, de criação e difusão pública da arte, em meio a uma civilização de massa, de produtos industriais onipresentes e homogêneos, poderosamente disseminados pelos meios de comunicação, induziu ao aparecimento de uma ação cultural [...] (CUNHA, 2003, p. 5).

Portanto, a noção de ação cultural retoma o princípio de que o tipo de medida adotada pelas políticas culturais deve fazer frente à indústria cultural e contrapor a cultura de massa por ela difundida.

Cunha (2003, p.5) ressalta a importância de a ação cultural não “reproduzir aqueles valores conformistas, irracionais ou de puro entretenimento que podem ser encontrados, com facilidade e apelo, na cultura de massa” porque o próprio mercado já se incumbe dessas “demandas”.

(35)

Cunha (2003) afirma que, sob esse aspecto, a forte presença da cultura de massa induziu ao aparecimento de quatro princípios norteadores, conforme os objetivos que uma dada ação cultural pretende atingir:

1. Social: O foco visa à integração dos indivíduos e grupos de diferentes idades e estratos sociais ao universo artístico e cultural. O objetivo é vincular os indivíduos, na medida do possível, às ações que resolvam ou minimizem problemas comunitários.

2. Conteúdo: O foco é o estímulo ao conhecimento e à convivência de novos públicos com linguagens, expressões ou signos menos recorrentes e usuais observados na cultura de massa. O objetivo é o de revelar obras, suas características e significados. Eleger e determinar critérios de escolha para obras produzidas na cultura de massa que contenham a qualidade necessária para uma abordagem diferenciada.

3. Organizacional: Atuação de profissionais de formação multidisciplinar em centros culturais de atividades múltiplas ou específicas, fundações ou associações. Objetiva-se, por meio desse princípio, criar e manter uma forma relativamente estruturada e permanente de intervenção institucional.

4. Educacional: Identificação com os princípios e objetivos da educação permanente ou informal, ou seja, educação espontânea e contínua realizada fora do ambiente formal da escola e do ambiente de trabalho. Seu principal objetivo é o de promover a autoformação, o desenvolvimento individual e a autodidaxia.

No que concerne ao sistema de produção cultural, Teixeira Coelho identifica quatro fases, níveis ou circuitos para os quais as ações culturais podem estar voltadas: produção, distribuição, troca e, por último, uso (ou consumo). Na definição de Teixeira Coelho:

(36)

(preço de um livro, por exemplo) ou do ingresso que a ela dá acesso (ingresso para teatro, cinema, etc.). Finalmente, a ação cultural voltada para o uso procura promover o pleno desfrute de uma determinada obra, o que envolve o entendimento de seus aspectos formais, de conteúdo, sociais e outros; para tanto, recorre à elaboração de catálogos, programas de apresentação de um espetáculo ou filme, palestras, cursos, seminários, debates, etc. (1999, p. 32-33).

A ação cultural, como instrumento de uma política cultural engajada, deve ter seus princípios bem definidos. Nesse sentido, uma ação cultural se aproximaria ao que Höfling denominou de política social, sendo a cultura, aqui nesse caso, um entre tantos outros benefícios sociais que visam à diminuição das desigualdades estruturais produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico, a inércia e a ausência de condições para o livre exercício de cidadania experimentada por uma ampla parcela da população.

1.1.1 Política de eventos

Todavia, há que se distinguir uma política de eventos ou de animação cultural de uma política cultural. Tanto a política de eventos quanto a animação cultural não se caracterizam, propriamente, como uma ação cultural, mas, pelo contrário, empreendem ações isoladas umas em relação às outras e não configuram um plano de ação coordenado. Tampouco prevê a participação ativa do público nos modos de elaboração e vivência dessas ações.

Para Teixeira Coelho (1999, p. 300), o resultado de uma política de eventos diz respeitos aos “resíduos” de cultura que normalmente não ficam nos participantes, por se tratar de algo passageiro, sem continuidade e que visa tão somente a espetacularidade e divulgação de um nome, de políticos ou partidos, autoridades e personalidades de notoriedade pública. O evento é uma forma de marcar território, sobretudo no que tange à ação política que se utiliza dos poderosos instrumentos de mediação cultural que políticas culturais são capazes de empreender. Teixeira Coelho (1999, p.300-301) diz ainda que são modelos de políticas de eventos:

(37)

eventos; se o concerto é precedido ou seguido por uma “clínica” em que os músicos orientam jovens profissionais, ou se o concerto se encaixa numa série que explora ordenadamente um movimento ou período musical, dando ao público as condições para que sejam devidamente apreciados todos os aspectos envolvidos, diz-se que ele integra uma política cultural.

Por essa razão é que política de eventos é amplamente criticada por especialistas e expertos do assunto por conta de seu caráter imediatista que se encerra em si mesma e não raro oportunista. Para sua realização, não é necessário um plano elaborado de ação, bastando para tanto haver os recursos disponíveis para a contratação dos profissionais.

Evidentemente, se um determinado evento está inserido dentro de um plano organizado e bem coordenado de políticas culturais, eles não só devem ser muito bem vindos, como podem preencher grandes espaços vazios dentro da programação de uma política cultural em andamento. Desse modo, não se pode confundir que o evento em si caracteriza uma política de eventos, é preciso avaliar as condições e objetivos de sua execução.

1.1.2 Componentes de uma ação cultural

Função de extrema importância dentro de uma perspectiva de política cultural e, por extensão, de uma ação cultural, o agente cultural é a figura que intermedeia as relações entre o público e/ou participantes e o proponente, sendo ele o Estado ou não. Os agentes culturais devem ser previamente preparados para lidar no dia-a-dia com questões de ordem diversa, propondo, sugerindo, problematizando, solucionando e auxiliando os participantes e/ou público.

Deve-se levar em conta, ainda, públicos determinados, procurando criar um liame entre esse público e uma obra de cultura ou arte. Cunha (2003, p. 5) define:

(38)

É comum que agentes culturais atuem em edificações destinadas a práticas culturais, tais como teatros, museus, bibliotecas, centros de cultura, etc. Essas edificações são comumente denominadas de equipamentos culturais, embora esse termo possa abarcar também “grupos de produtores culturais abrigados ou não, fisicamente, numa edificação ou instituição (orquestras sinfônicas, corais, corpos de baile, companhias estáveis, etc.)” (COELHO, 1999, p. 165). Refletores, projetores, molduras, livros, pinturas, filmes, etc. e demais aparelhos ou objetos que tornam operacional um espaço cultural também podem ser denominados como equipamentos culturais.

Já a noção de espaço cultural (COELHO, 1999, p. 187) se refere a um local de pequeno porte mantido pela iniciativa privada, onde não se costuma observar uma programação sistemática cultural e tampouco um acervo de obras. Contrariamente a essa noção, Teixeira Coelho explica que:

[...] o centro cultural é geralmente uma instituição mantida pelos poderes públicos, de porte maior, com acervo e equipamento permanentes (salas de teatro, cinema, bibliotecas, etc.), voltadas para um conjunto de atividades que se desenvolvem sincronicamente e oferecem alternativas variadas para os seus frequentadores, de modo perene e organizado. (1999, p. 168).

Casa de cultura pode designar tanto um centro cultural de porte pequeno, com pouco ou nenhum acervo, localizada, geralmente em bairros ou na periferia e que procura reproduzir a cultura instituída, por meio de cursos e oficinas e incentivo de produção local. Ou, ainda, a casa de cultura pode se destinar a uma manifestação artística ou cultural específica, como o teatro ou a poesia. Conforme explica Teixeira Coelho (1999, p. 168), a casa de cultura se destinaria mais como espaço de produção comunitária, ao passo que o centro e o espaço cultural mais à recepção cultural, embora essas condições não sejam uma regra.

(39)

(possibilidade econômica de produzir ou consumir um produto cultural); acesso intelectual (possibilidade de apreender um produto cultural em todas as suas dimensões para a elaboração de interpretações da vida e do mundo, deixando-lhe uma marca, um “resto”).

A efetivação do acesso cultural se dá por meio ao acesso à informação (divulgação), acesso a equipamentos de produção (câmeras, filmadoras, computadores, etc.) e acesso a reprodução (televisores, Cd player, salas de exibição, etc.).

(40)

CAPÍTULO 2 - O CONTEXTO SOCIOPOLÍTICO DE DIADEMA

O grupo teatral Jovens Atores, objeto central desta pesquisa, foi atuante, enquanto resultado de políticas culturais empreendidas em Diadema/SP, entre 1995 e 1999. Desse modo, sua existência esteve diretamente atrelada ao contexto sociopolítico e também cultural daquele município. Nesse sentido, entendo que efetuar uma contextualização do período em questão contribui para uma maior compreensão do objeto da pesquisa. A fim de facilitar a leitura e dinamizar a articulação dos fatos, separei esses contextos em dois capítulos diferentes, sendo este somente sobre as questões de ordem sociopolíticas e o capítulo seguinte acerca dos aspectos culturais. Portanto, os dois capítulos são complementares entre si.

Diadema é uma cidade de apenas 30,7 quilômetros quadrados, localizada entre os municípios de São Paulo e São Bernardo do Campo, de quem foi distrito até 1958, na Região do Grande ABC. Tornou-se município autônomo em 1958, depois de acirrada disputa com São Bernardo do Campo, tendo o jurista Miguel Reale atuado como um dos responsáveis pela emancipação ao lado do professor Evandro Caiafa Esquível. Este viria a se tornar o primeiro prefeito em 1960 pelo Partido Trabalhista Nacional (PTN).

Reale tinha propriedades na região, daí adveio seu envolvimento com o assunto. Foi por sua sugestão que se batizou o novo município paulista com o nome Diadema, uma alusão à coroa da santa Nossa Senhora da Conceição, padroeira da cidade. Mas também porque se inicia pela letra “d”, completando, dessa forma, a sigla “ABC” que designa o mais importante conjunto de cidades industriais do Brasil.

(41)

Figura 1. Mapa político da Grande São Paulo. Fonte: http://www.sp-turismo.com/grandesp.htm

Não obstante a Grande São Paulo receber fluxos migratórios intensos, decorrentes de sua rápida industrialização ao longo do século XX, foi nas décadas de 1960 e 1970 que a região passou por um inchaço populacional sem precedentes, o que desestruturou muitos municípios paulistas. A grande maioria dos migrantes era de origem nordestina. Enquanto os municípios vizinhos como São Bernardo do Campo, Santo André e São Caetano do Sul se desenvolviam vertiginosamente, Diadema demorou mais tempo para sentir os efeitos da industrialização paulista. Para se ter uma ideia, o município tinha como base econômica atividades de agricultura, muitas áreas rurais e uma população estimada de 12 mil habitantes em 1960.

(42)

populares. Tal medida despertou a atenção de setores mais conservadores da sociedade brasileira, sobretudo os militares, que viam em Jango um perigo iminente de um golpe socialista por conta de sua proximidade com países como China e Cuba. Com o aumento da tensão social, os militares, em 1964, efetivaram o golpe, destituindo Jango do governo. O ano de 1964 foi marcado pelo início da Ditadura Militar legitimada pelo Ato Institucional Número 1 (AI-1), o qual, entre tantas medidas adotadas, cassou políticos, aposentou juízes, dissolveu os partidos políticos e restabeleceu uma nova ordem ideológica conservadora, repressiva e bastante focada em criar uma imagem de “grande nação” como forma de governar o Brasil.

Tais medidas se concretizaram num tipo de política nacional verticalizada “de-cima-para-baixo” o que acabou por afetar também os municípios. Em Diadema, a pacata cidade do início dos anos 1960, começou a ter sua fisionomia drasticamente alterada. As sucessivas administrações municipais, fortemente impulsionadas pelo crescimento econômico da Região do ABC, passaram a criar condições locais para atrair fábricas e indústrias por meio de incentivos fiscais e a criação de áreas da “Cidade Micro Indústria”. Diadema transforma-se em cidade-dormitório para milhares de trabalhadores e migrantes pobres. Segundo Absolon Oliveira:

Os primeiros governos investiram na perspectiva de uma vocação de centro fabril para a cidade, como forma de aumentar as receitas. Assim, as primeiras visaram regulamentar incentivos fiscais para as indústrias que se instalassem na cidade. Esse processo resultou no aumento de empreendimentos em Diadema. [...] Na questão da cultura pouco foi feito por esses governos, a carência era de todos os serviços públicos e nesse caso, como não é privilégio dos tempos atuais, cultura tornou-se perfumaria. (2002, p.25).

Outro aspecto que favorecia tais interesses locais de crescimento econômico foi a estratégica posição geográfica na qual está Diadema, entre a capital paulista e o mais importante porto do país, em Santos. Porém, industrializar uma cidade requer planejamento de ação e estudos sobre os impactos urbanos decorrentes de tais medidas. E isso não foi feito. Outro ponto que vale ressaltar é a visão desenvolvimentista acima citada, muito em voga na época, que buscava apenas o crescimento industrial, não tendo em consideração questões de outra ordem.

(43)

processo foi caracterizada por longas jornadas de trabalho, péssimas condições de trabalho, ausência de investimento público em áreas como habitação, educação, saúde e transporte, ao longo das décadas de 1960 e 1970. Mesmo nessas condições, a criação de novos postos de trabalho fez sextuplicar a população de Diadema, que era de aproximadamente 12 mil habitantes em 1960, para a casa dos 78 mil habitantes, em 1970.

Muito embora as duas primeiras administrações municipais tivessem seus esforços voltados para a criação das instâncias administrativas do município, isso não as eximia da responsabilidade de ter um olhar atento para as questões de cunho socioestrutural.

Essa negligência inicial impediu que muitas ações e políticas públicas importantes pudessem ter sido elaboradas e executadas, na direção de aumentar a proteção social dos mais desfavorecidos, ao mesmo tempo em que pudesse garantir uma ordem mínima de ocupação territorial. Tal crescimento desordenado levou à ocupação precária e irregular das áreas antes ocupadas apenas por chácaras e áreas de mananciais. A Represa Billings, importante fonte de abastecimento de água da Grande São Paulo, tornou-se poluída. Inúmeras favelas se formaram por toda a cidade e por cerca de três décadas, não dispuseram de ruas pavimentadas, água encanada ou esgoto.

Parte da explicação dessas ações da parte do governo municipal está no alinhamento com a direita nacional do regime militar a partir da gestão do prefeito Lauro Michels, inicialmente afiliado do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Michels assumiu o cargo em 1964, ano da instauração da Ditadura Militar, efetuando um governo que procurou valorizar apenas as áreas centrais da cidade em detrimento dos bairros e comunidades mais afastados. Esse tipo de pensamento prevaleceu na esfera política brasileira como um todo. Enquanto o Brasil florescia economicamente, aumentavam os bolsões de pobreza por todos os lados tanto nos centros urbanos quanto no campo.

Daí em diante, a sucessão de governos pouco comprometidos com os bairros mais afastados levou a uma ocupação irregular e desordenada também ao longo da década seguinte. Para agravar a situação:

(44)

favelas. O censo do IBGE de 1980 indicava essa população como jovem e pobre, com um enorme grau de carência em saúde, educação, saneamento básico, habitação, etc. Uma cidade industrial com um alto índice de pobreza inserida em uma das principais regiões industriais do país, o Grande ABC, sentiu a crise econômica nacional do início dos anos 80, com um aprofundamento de seus problemas sociais. (OLIVEIRA, 2002, p. 14).

(45)

2.1 OS PRIMEIROS INDÍCIOS DE VIOLÊNCIA URBANA NOS ANOS 1970

Decidi tratar da temática violência, nesse trabalho, por estar indissociável da história de Diadema. Meu intuito com essa escolha é demonstrar que, na esteira industrial, na qual a cidade se expandiu, a pobreza da população e a ausência de condições sociais mínimas para um terço dela desembocou, inevitavelmente, nessa problemática. As condições socioestruturais da cidade criaram um ambiente propício ao desenvolvimento de conflitos. Desde os anos 1970, até meados da década seguinte, Diadema caracterizou-se por uma cidade sem lei, onde os próprios moradores se estabeleciam às custas de seus próprios esforços pessoais. Tal fato não impediu, contudo, o aparecimento de novos bairros-favela que passavam a contar com comércios de subsistência bem precários: padarias, pequenos mercados, bares e botecos, etc. num cotidiano que se poderia resumir na expressão “terra de ninguém”. Manso et al. (2005, p.6) comenta que “[...] a quase plena liberdade de agir permitiu também que o uso individual da força se transformasse em uma ferramenta para impor a própria vontade aos outros moradores”.

Imagem

Tabela 1: Orçamento ministerial brasileiro – Ano base 2011
Figura 1. Mapa político da Grande São Paulo. Fonte: http://www.sp-turismo.com/grandesp.htm
Tabela 2  - Taxa de homicídios por 100 mil habitantes. Fonte: Folha de São Paulo, 15/08/1999 apud  OLIVEIRA, 2002, p.21.
Figura 2 - Construção de um CJC, em Diadema. Fonte: Pé na Rua – Região  Ruyce/Portinari/casa Grande/Promissão/Marilene – IPD, n
+7

Referências

Documentos relacionados

E uma investigagao que se assume como particularistica, isto e, que se debruga deliberadamente sobre uma situagao especifica que se supoe ser unica ou especial, pelo menos em

Guimarães, Ferreira e Roazzi (2001) e Guimarães (2009) realizaram uma pesquisa com 107 alunos do 4º ano de Ensino Fundamental, buscando investigar a compreensão dos mesmos

Amado in Brasile, sia a livello di critica letteraria che di successo di pubblico. Sarà interessante, in questo capitolo, analizzare il ruolo ricoperto dal

Atrás destes mesmos balcões existe um móvel munido de gavetas onde se guardam produtos como termómetros, testes de gravidez, soro fisiológico, algodão, entre outros,

A autora ressalta que a rotina escolar deve contemplar períodos razoavelmente longos entre as atividades dirigidas, para que as crianças se sintam à vontade para brincar; que

manter o ativo na carteira, como no caso de uma oscilação forte na ponta longa da curva de juros, que pode levar a entidade a atingir o seu limite de risco de mercado e obrigá-la

A experiência apoiada pelo PDA, juntamente com outras ações voltadas para a produção agroecológica, ações de formação e capacitação, bem como aquelas voltadas à questão

O presente trabalho foi desenvolvido objetivando inventariar um fragmento florestal e indicar espécies arbóreas para a recuperação das áreas de reserva legal e