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Colecções de culturas microbianas como centro de recursos biológicos

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE CIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA VEGETAL

C

OLECÇÕES DE CULTURAS MICROBIANAS COMO

C

ENTROS DE

R

ECURSOS

B

IOLÓGICOS

:

DESAFIOS E

OPORTUNIDADES

Cláudia Andreia Serrano Carvalho

MESTRADO EM MICROBIOLOGIA APLICADA

2012

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE CIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA VEGETAL

C

OLECÇÕES DE CULTURAS MICROBIANAS COMO

C

ENTROS DE

R

ECURSOS

B

IOLÓGICOS

:

DESAFIOS E

OPORTUNIDADES

Dissertação orientada pelos Professores Doutores

Álvaro Fonseca (Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa)

Rogério Tenreiro (Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa)

Cláudia Andreia Serrano Carvalho

MESTRADO EM MICROBIOLOGIA APLICADA

2012

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C

OLECÇÕES DE CULTURAS MICROBIANAS COMO

C

ENTROS DE

R

ECURSOS

B

IOLÓGICOS

:

DESAFIOS E

OPORTUNIDADES

Cláudia Andreia Serrano Carvalho

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

2012

Esta dissertação foi realizada na Colecção Portuguesa de Culturas de Leveduras (PYCC) no Centro de Recursos Microbiológicos (CREM) sob a orientação directa do Prof. Doutor Àlvaro Fonseca no âmbito do Mestrado em

Microbiologia Aplicada da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

O Prof. Doutor Rogério Tenreiro foi o orientador interno designado no âmbito do Mestrado em Microbiologia Aplicada da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

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AGRADECIMENTOS

Quero deixar o meu agradecimento ao Professor Álvaro Fonseca por me ter acolhido na PYCC, pela sua orientação e sugestões e principalmente pela sua paciência.

Ao Professor Rogério Tenreiro por ter aceite a orientação interna desta tese e por me ter aceite no mestrado.

Quero deixar um agradecimento especial ao Dr. Andrey Yurkov que de uma forma desinteressada, se disponibilizou a ajudar-me, pela simpatia, e pelos momentos de cafés disponibilizados.

Um agradecimento muito especial ao Marco Guerreiro pela simpatia, que se disponibilizou a ajudar-me e com quem partilhei momentos de grande companheirismo. Fica a amizade que perdurará por muito e muito tempo.

Aos meus colegas do CREM e do DCV pela amizade e companheirismo.

Aos meus pais pelo incentivo constante e pela paciência pela filha mais nova. A toda a minha família.

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RESUMO

Em pouco mais de 100 anos as colecções de culturas (CC) estabeleceram-se como infraestruturas fundamentais de apoio a actividades de I&D nas áreas das ciências da vida e da biotecnologia. A sua importância na conservação da diversidade biológica e de recursos genéticos de enorme valor para o desenvolvimento científico e tecnológico tem vindo a ser reconhecida por governos e instituições internacionais. Ao longo do século XX diferentes tipos de CC foram estabelecidas um pouco por todo o mundo, inclusive em Portugal: a Colecção Portuguesa de Culturas de Leveduras (PYCC) foi estabelecida em 1952. O papel tradicional destas colecções foi o de providenciar acesso a culturas autenticadas e informação sobre as suas características, preservação e cultivo à comunidade científica. Nos anos recentes, outros serviços têm sido adjudicados às CC tais como o fornecimento de culturas para controlo de qualidade e/ou o depósito de culturas para efeitos de patente. Por outro lado, no plano actual de desenvolvimento económico têm surgido vários constrangimentos ao nível financeiro, que podem por em causa a subsistência das CC.

É neste contexto, que em 2001 a Organização para Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OECD) lança o conceito de Centros de Recursos Biológicos (BRCs), de forma a providenciar padrões de qualidade exigidos pela comunidade internacional de cientistas e da indústria no fornecimento de informação e de materiais biológicos e garantir a sobrevivência das colecções. De facto, são muitas as colecções de serviço que têm evoluído para BRCs em resposta ao desenvolvimento em várias áreas que vão da biologia molecular à bioinformática. Nos anos mais recentes tem sido reconhecida a importância da cooperação internacional entre os vários BRCs com o objectivo de agregar valor às colecções, incluindo os seus materiais, serviços, conhecimentos e competências, de forma a garantir a sua auto sustentabilidade. Um dos projectos de cooperação europeia mais recente é o MIRRI (Microbial Resource Research Infrastructure) como o objectivo de providenciar às CC europeias as ferramentas que lhes permitam evoluir para BRCs.

Uma análise comparativa das principais CC europeias que mantêm fungos mostrou que a maioria preserva diferentes tipos de organismos e apenas 6 são colecções especializadas. A mesma análise revelou que o tipo de financiamento determina decisivamente a quantidade de pessoal adstrito às colecções e o número e tipo de serviços que são oferecidos.

Nos últimos anos a PYCC passou por profundas alterações começando pela constituição de uma Comissão de Acompanhamento e publicação do regulamento da colecção. Um dos aspectos mais importantes daquela restruturação foi a digitalização de toda a informação sobre as suas estirpes numa base de dados e posterior publicação do catálogo online e website. Actualmente a PYCC contem um conjunto de estirpes de leveduras muito

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diversificadas (cerca de 3000) em que 28% são estirpes isoladas em Portugal e cerca de 46% são estirpes exclusivas. Com vista à obtenção da certificação da colecção foi realizado um estudo comparativo entre a PYCC e as colecções congéneres, concluindo-se que as características que mais contribuem para o desenvolvimento actual da PYCC são investigação em métodos de cultura, investigação em métodos de preservação, investigação na biodiversidade, controlo da pureza das culturas e oferta de outros serviços. Estas características contribuem para que a certificação da PYCC. Para que isto se verifique uma série de procedimentos terão de ser seguidos com base nas recomendações da OECD, nomeadamente a implementação de um Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ). O posterior desenvolvimento da PYCC em BRC depara com alguns constrangimentos ao nível financeiro e logístico que decorrem dos regulamentos da instituição de acolhimento. Contudo o facto de a PYCC ser actualmente a única colecção portuguesa de leveduras com um catálogo online e uma base de dados muito completa, constitui uma mais-valia para o seu desenvolvimento num BRC, o que poderá vir acontecer em associação com outras colecções portuguesas no âmbito do projecto MIRRI.

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ABSTRACT

In just over 100 years the culture collections (CC) have established themselves as key infrastructure to support R&D in the areas of life sciences and biotechnology. Its importance in the conservation of biological diversity and genetic resources of enormous value to the scientific and technological development has been recognized by governments and international institutions. Throughout the XX century several types of CC were established all over the world including Portugal: the Portuguese Yeast Culture Collection (PYCC) was established in 1952. The traditional role of the collections was to provide access to authentic cultures and information about its preservation and cultivation to the scientific community. In recent years, other services have been awarded to CC such as the provision of cultures for quality control and/or deposit of cultures for patent purposes. Moreover, in the current plan of economic development several constraints have emerged, which may jeopardize the livelihoods of CC.

In this context, in 2001, the Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD) launched the concept of Biological Resource Centers (BRC’s) in other to provide the scientific and industrial world with access to properly maintained cultivable biological material and regarded information in associated databases in other to assure the survival of the collections. Indeed there has been several services collections that have evolved into BRC’s in response of the molecular biology and bio-informatics development. In the more recent years it has been recognized that high quality services must be provided and international linkages established between several BRC’s with the goal to add value to the collections, including the materials, services, knowledge and competences as a way to ensure the sustainability of the collections. One of the most recent European project is MIRRI (Microbial Resource Research Infrastructure) with the objective to provide European CCs the tools that allow them to develop into BRCs.

A comparative analysis of the major European fungi collections showed that most of them preserves different kind of microorganisms and only 6 of them are specialized. The same analysis reveals that the type of financing decisively determines the amount of personnel attached to the collections and the number of services that are offered.

In the final years PYCC has been through some changes, starting with the formation of a Steering Committee and publication of the regulations. One of the first steps was to digitalized all the information of the strains existing in the collection on an associated database followed by the online publication of the catalogue and own website. Nowadays PYCC contains a set of yeast strains very diversified (about 3000), 28% are isolated in Portugal and 46% are exclusive to PYCC. A comparative study was made between PYCC and other similar collections to see

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what steps PYCC should implement in order to obtain certification. The characteristics that contribute to the presently development of PYCC are the investigation in culture methods, investigation in preservation methods, investigation in biodiversity, control of the cultures purity and existence of other services. These characteristics contribute in order to PYCC in obtaining certification. For this to happen a number of procedures have to be followed based on the recommendations of the OECD including the implementation of a Quality Management System (QMS). The subsequent development of PYCC into BRC has a number of constrains mainly on a financial level and regulations of the institution to which PYCC belongs. However the fact that PYCC is currently the only Portuguese collection of yeasts strains with an online catalog and a very complete and searchable database allows the development of PYCC into BRC with other Portuguese collections under the MIRRI project.

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ÍNDICE

I – Colecções de Culturas Microbianas e Centros de Recursos Biológicos

1 – Colecções de Culturas Microbianas

1.1 Breve historial e caracterização da missão das Colecções de Culturas Microbianas e das

suas actividades ……… 1

1.2 Tipologia das colecções de culturas microbianas………... 2

1.3 Evolução dos métodos de conservação ………. 4

1.4 Evolução dos métodos de identificação e caracterização de culturas microbianas ……… 8

1.5 Gestão da informação associada às colecções de culturas ……… 11

1.6 Diversidade de actividades e serviços prestados pelas colecções de culturas ……… 12

1.7 Papel das colecções de culturas e a sua intervenção na definição de políticas científicas, regulamentares e técnicas ……….. 14

2 – Levantamento de iniciativas e directivas internacionais sobre colecções de culturas 2.1 Conceito de Centros de Recursos Biológicos e programa MIRCEN da UNESCO ………..……… 17

2.2 Transição das Colecções de Culturas para Centros de Recursos Biológicos ……….………….… 18

2.3 Convenção sobre a Diversidade Biológica (CBD) ……….…………. 21

2.4 Federações internacionais de colecções de culturas: WFCC e ECCO ……….. 23

2.5 Relatórios e iniciativas da OECD ……….…….. 24

2.6 Projectos de cooperação internacionais: GBRCN e EMbaRC ……….……….. 26

2.7 Projectos futuros: MIRRI ………..……… 27

3 - O panorama europeu das colecções de culturas microbianas, com ênfase nas colecções de fungos: tipologias e desenvolvimento recentes; estudo comparativo …. 28

II – Caso de estudo: Colecção Portuguesa de Culturas de Leveduras (PYCC)

1 – Breve historial da PYCC e caracterização da sua missão e das suas actividades ….. 32

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3 – Perspectivas de desenvolvimento futuro da PYCC

3.1 Diversificação de serviços e actividades ………. 36

3.2 Medidas com vista à acreditação/certificação da PYCC ……… 39

3.3 Evolução para BRC ou integração em rede nacional de BRCs? ……… 43

3.4 Constrangimentos e desafios na implementação das medidas propostas ………. 44

Referências Bibliográficas ……… 45

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1: Representação esquemática da região do DNA ribossómico dos fungos e da maioria dos eucariontes ………. 10

Figura 2: Percentagem de microrganismos acumulativa existente em cada colecção de cultura europeias escolhida para o estudo comparativo ……….. 30

Figura 3: Sumário das relações entre as características (variáveis) e as colecções (amostras) europeias avaliadas. A rosa as colecções certificadas ..……….. 31

Figura 4: Distribuição das estirpes da PYCC de acordo com a proveniência geográfica (a) e a nível de substracto de isolamento (b) ..………..……….……… 33

Figura 5: Sumário das relações entre as amostras (colecções) à direita e as variáveis à esquerda das colecções de culturas congéneres nacionais e internacionais da PYCC. A rosa as colecções certificadas ……….……… 35

Figura 6: Árvore filogenética baseada nos domínios D1/D2 do gene LSU rRNA, representando as 80 estirpes basidiomicetas que entraram no projecto LUSOEXTRACT. As cores representam estirpes que foram sequenciadas durante o projecto. Verde: estirpes cuja sequenciação confirmou a espécie. Vermelho: estirpes re-identificadas ……….………. 38

Figura 7: Árvore filogenética baseada nos domínios D1/D2 do gene LSU rRNA, representando as 68 estirpes de ascomicetas que entraram no projecto LUSOEXTRACT. As cores representam estirpes que foram sequenciadas durante o projecto. Verde. Estirpes cuja sequenciação confirmou a espécie. Vermelho: estirpes re-identificadas ………. 39

Figura 8: Proposta de fluxograma de depósito de culturas microbianas evidenciando as etapas de controle de qualidade (em vermelho) seguindo as recomendações da OECD (2007) e da WFCC (2010) ……… 42

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ÍNDICE DE TABELAS

Tabela 1: Distribuição das colecções de culturas microbianas por continentes (adaptado de Smith, 2003, como dados actuais da WDCM) ………. 2

Tabela 2: Tipo de suporte financeiro e o número de colecções existentes (dados actuais da WDCM) ……….. 3

Tabela 3: Características das várias técnicas de preservação de microrganismos (adaptado de Ryan & Smith, 2004) ………..….. 7

Tabela 4: Tipo de serviços disponibilizados pelas colecções de microrganismos no mundo (dados da WDCM) ……… 14

Tabela 5: Colecções europeias que operam sob um sistema de certificação ou acreditação independente (adaptado de Smith & Ryan, 2012) ……… 20

Tabela 6: Exemplos de federações, consórcios e colaborações entre BRCs (adaptado de Janssens et. al., 2010) ……… 26

Tabela 7: Peso das contribuições e eigenvalues nos primeiros seis eixos para o total das amostras ………...…… 30

Tabela 8: Peso das contribuições e eigenvalues nos primeiros três eixos para o total das amostras ……….… 34

Tabela A1: Lista das colecções de culturas de fungos existentes na Europa e Portugal escolhidas para o estudo comparativo e as características correspondentes (dados obtidos a partir da WDCM). A rosa representa as colecções que estão certificadas ………...……… 48

Tabela A2: Lista das características (variáveis) e sua codificação escolhidas para a comparação entre as colecções europeias ……….……. 50

Tabela A3: Lista das características (variáveis) e a sua codificação escolhidas para a comparação entre a PYCC e as colecções nacionais e europeias congéneres ……….. 51

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LISTA DE ABREVIATURAS E ACRÓNIMOS

ATCC - American Type Culture Collection BRC – Biological Resource Centers

CABRI – Commons Access to Biological Resources CBD – Convention of Biological Diversity

CBS - Centraalbureau voor Schimmelcutures CSTP – Committe for Science and Technology Policy

DSMZ –Seutche Sammlung von Mikrorganismen un Zellkuturen EBRCN - European Biological Resource Centre Network

ECCO – European Culture Collections Organisation

EMbaRC – European Consortium of Microbial Resource Centre GBIF – Global Biodiversity Information Facility

GBIF.PT – Infraestrutura Portuguesa de Informação da Diversidade Biológica GBRCN – Global Biological Resource Center Network

IDA – International Depository Authority

IUBS – International Union of Biological Sciences MCL – Microbial Commons Language

MIRRI – Microbial Resource Research Infrastructure

MOSAICC – Microorganisms Sustainable Use and Access Regulation International Code of Conduct

MTA – Material Transfer Agreement

MUCL - Mycothéque de l’Universitée Catholique de Louvain OECD – Organization for Economic Co-operation and Development PIC – Prior Informed Consent

PYCC – Portuguese Yeast Culture Collection

RPCCM – Rede Portuguesa de Colecções de Culturas Microbianas SGQ – Sistema de Gestão da Qualidade

UKNCC – Unided Kingdom National Culture Collection WDCM – World Data Center for Microorganisms WFCC – World Federation of Culture Collections

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I - Colecções de Culturas Microbianas e Centros de Recursos Biológicos

1 Colecções de Culturas Microbianas

1.1 Breve historial e caracterização da missão das Colecções de Culturas Microbianas e das suas actividades

O estabelecimento de depósitos de material biológico e o desenvolvimento de técnicas para a sua preservação e manutenção têm correspondido ao interesse crescente na investigação em ciências da vida de uma forma geral, e em particular devido ao grande potencial biotecnológico que se pode obter a partir dos materiais biológicos. A disponibilidade e qualidade do material biológico contribuem decisivamente para a qualidade da investigação. É neste âmbito que surgem as colecções de culturas (Halluin, 1996).

As colecções de culturas são infraestruturas de apoio a uma grande variedade de trabalho biológico. A sua função primária é de obter, manter e distribuir culturas biológicas para ensino, investigação, ensaios de controlo, biotecnologia, etc. São ainda um meio de preservação da diversidade biológica ex situ. As primeiras colecções de culturas foram as de estirpes celulares microbianas e originaram-se quando a escola de Koch introduziu o conceito de culturas puras em bacteriologia. A primeira colecção de serviço estruturada com a finalidade de fornecer culturas puras para estudos comparativos e identificação de bactérias foi a colecção criada pelo Dr. Frantisek Král na Universidade Alemã de Praga, provavelmente em 1890, destinada a conservar e distribuir microrganismos para o diagnóstico, ensino, investigação e indústria. Král publicou o primeiro catálogo de estirpes em 1900, com organização alfabética e temática das espécies, correspondeu-se com os microbiólogos de renome da época a quem solicitava o depósito de estirpes com algum interesse na “Král’she Sammlung vom Mikrooganismen” a fim de as conservar e tornar acessíveis a outros, assim como realizou exposições onde se podiam apreciar não só o aspecto macroscópico das colónias formadas em meio sólido, como fotografias que revelavam a morfologia microscópica dos microrganismos (Spencer-Martins, 1994; Uruburu, 2003).

Nas quatro primeiras décadas do século XX, outras colecções de serviço foram estabelecidas na Europa, Estados Unidos e Japão com a finalidade básica de fornecer material de referência para estudos de taxonomia. Como exemplo temos a “Mycothéque de l’Universitée Catholique de Louvain” (MUCL), Louvain-la-Neuve, Bélgica, fundada em 1904, a “Centraalbureau voor Schimmelcutures” (CBS) em Utrecht, Holanda, fundada em 1906 e a “American Type Culture Collection” (ATCC) que foi fundada em Washington em 1925 e se encontra localizada actualmente em Manassas, Virgínia. Estas colecções passaram por um

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processo contínuo de evolução visando atender à procura de material biológico decorrente dos avanços da microbiologia industrial (década de 1960), biotecnologia (década de 1980) e biologia molecular (década de 1990 até à actualidade). Nos cerca de 120 anos de existência de colecções de cultura não existem dados que indiquem com certeza o número de colecções fundadas, mantidas e/ou desaparecidas. No Centro Mundial de Dados de Microorganismos (WDCM – World Data Center for Microorganisms www.wfcc.info/ccinfo/statistics/) tem registadas cerca de 625 colecções de culturas, distribuídas por 71 países (ver Tabela 1).. Este número, no entanto, não reflete a luta continua que a grande maioria das colecções (listadas ou não) têm para obtenção de fundos, a quantidade e/ou diversidade de investigação realizada pelas colecções, assim como a falta de apoio das instituições de acolhimento ou países. Apenas 4 colecções de culturas portuguesas se encontram registadas na WDCM (Stackebrandt, 2010; Uruburu, 2003).

Tabela 1: Distribuição das colecções de culturas microbianas por continentes (adaptado de Smith, 2003;

com dados actuais da WDCM).

Continente Número de colecções Número de estirpes Percentagem do nº total de estirpes África 11 15 266 0,8 Ásia 215 767 233 38,1 Europa 210 682 506 33,8 América 147 461 402 22,9 Oceânia 42 89 257 4,4 Total 625 2 015 664 100

O valor das colecções de culturas reside na qualidade e abrangência das suas culturas, na informação existente sobre as estirpes e na capacidade de atenderem à procura gerada por programas de inovação tecnológica, actividades de produção biotecnológica, programas de qualidade e competitividade industrial e de apoio às actividades de investigação básica e aplicada no sector académico.

1.2 Tipologia das colecções de culturas microbianas

As colecções de culturas podem ser classificadas em três categorias, nomeadamente, colecções privadas, especializadas e públicas. As colecções de culturas privadas são as que se constituíram com o objectivo de servir a instituição em que se localizam, como por exemplo as que estão associadas a determinadas empresas ou indústrias. As colecções de culturas especializadas desenvolveram-se em resultado dos interesses de investigação específicos de um determinado investigador, sendo as que contêm, geralmente, informação muito rica e especializada mas também as que comportam maior risco de desaparecer ou porque o investigador passou a ter interesses diferentes ou porque se reformou ou mudou de emprego.

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As colecções de culturas públicas são aquelas que têm como função primária a distribuição de culturas e a prestação de serviços de utilidade pública (Spencer-Martins, 1994; Mahilum-Tapay, 2009; Gransalke, 2010).

As colecções públicas e privadas poderão ser igualmente consideradas como colecções de serviço, quando para além da principal função de agir como depósito de microrganismos também fornecem serviços de identificação ou distribuição de estirpes. Certas colecções vocacionadas para a prestação de serviços estão igualmente acreditadas para funcionar como depósito de estirpes protegidas por patentes (Kirsop, 1984; Spencer-Martins, 1994).

O tipo de colecção de cultura vai determinar o tipo de financiamento que a colecção pode obter ou projectos a que poderá candidatar-se. De acordo com a WDCM

(http://www.wfcc.info/ccinfo/statistics/) (Tabela 2) existem essencialmente cinco tipos de

apoios financeiros. Como se pode verificar o maior número de colecções existentes são as financiadas pelo governo ou pelas universidades, sendo que a maioria são colecções de serviço, enquanto que as apoiadas de forma privada são apenas 35. É de apontar que a indústria tem o menor número de colecções inscritas na WDCM, mas este número não é de admirar pois a maioria das empresas industriais preferem manter as estirpes importantes em colecções de serviço que forneçam serviços de “Safe-deposit” ou de depósitos de patentes (ver secção 1.6). O custo operacional de uma colecção de serviço é em parte coberto pelos serviços de consultadoria, desenvolvimento de projectos e venda de culturas. Entretanto, o elevado custo das actividades de rotina e curadoria, tais como autenticação, preservação, controle de qualidade e documentação de propriedades das culturas, raramente são cobertos pela venda de serviços. Torna-se, então, necessário que haja um outro apoio financeiro nomeadamente através de recursos públicos. Por exemplo, no ano 2010-2011, a CBS teve cerca 58% do seu orçamento proveniente da Academia Real Holandesa para as Artes e Ciências (KNAW – Royal Dutch Academy of Arts and Sciences) e cerca de 42% proveniente de fontes externas em que se incluem projectos, venda de estirpes, depósito de estirpes, serviços de identificação, cursos, etc (CBS, 2011).

Tabela 2: Tipo de apoio financeiro e o número de colecções existentes (dados actuais da WDCM). Tipo de apoio financeiro Número de colecções Governamentais 245 Universidades 233 Semi-governamentais 59 Privadas 35 Indústria 17 Não identificadas 36

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1.3 Evolução dos métodos de conservação

Conservação vem do latim conservatione e significa acto de conservar, de manter intacto ou não deixar deteriorar, preservação. Ao longo dos anos, as colecções de culturas, principalmente as colecções de serviço, têm investigado os vários métodos de conservação de microrganismos, uma vez que têm um compromisso na preservação de culturas e a sua experiência é de grande importância para a comunidade científica em geral. Os desenvolvimentos de técnicas de conservação são importantes para que as características dos microrganismos permaneçam inalteráveis ao longo do tempo, mantendo a sua viabilidade. Os microrganismos incluem uma variedade de espécies, tanto de procariontes como de eucariontes, apresentando um desafio no que toca à sua preservação (Spencer-Martins, 1994; Hasegawa, 1996).

A conservação de microrganismos depende de alguns factores de forma a retardar o crescimento, tais como o método de cultivo, a temperatura, a composição, pH e arejamento do meio. A idade, a condição fisiológica e a concentração da cultura no momento da conservação também são de grande importância (Snell, 1984).

A composição do meio de cultura afecta a resistência celular. Geralmente recomenda-se um meio pobre em nutrientes para evitar o crescimento acelerado e geração de mutantes indesejáveis e normalmente o meio de cultura pobre é um sinal para direcionar o metabolismo da célula para armazenar energia. No entanto, em alguns casos o meio de cultivo rico é recomendado por causa da percentagem de células viáveis ser maior em relação ao meio pobre. Os meios de cultivo que conduzam à acumulação de proteínas, carbohidratos e lípidos podem também aumentar a resistência das células ao tratamento por liofilização. Um factor importante em algumas técnicas de conservação é a actividade da água do meio extracelular. A actividade da água afecta directamente o crescimento dos microrganismos. A resistência da célula durante a conservação pode depender da acidez do meio de cultivo. É bem conhecido que o pH do meio de cultivo influencia a propagação celular: há um pH óptimo para cada estirpe e o crescimento das células pode ser inibido se este factor não for adequado (Smith et. al., 2001).

A temperatura a que os microrganismos são armazenados também influencia a eficácia do método escolhido. Baixas temperaturas são usadas para retardar as reacções químicas, a acção das enzimas, e atrasar ou inibir o crescimento dos microrganismos indesejáveis. O congelamento evita a contaminação da maior parte dos microrganismos (Smith et. al., 2001).

A resistência de conservação pode depender das condições de arejamento durante o cultivo. Por exemplo, as estirpes de Saccharomyces cerevisiae cultivadas em condições aeróbias são mais resistentes em choque hipo e hipertónico (Smith et. al., 2001).

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Para a conservação de uma cultura é importante conhecer a idade da cultura para se obter uma alta viabilidade de recuperação das células. Alguns dados indicam o início da fase estacionária de crescimento como a fase ideal de recolha das células para a preservação. Dados confirmam que os microrganismos são mais resistentes ao congelamento ou desidratação no fim do crescimento exponencial ou no início da fase estacionária (Smith et. al., 2001).

As propriedades e características internas das células podem ser influenciadas pelo processo de conservação. Diferentes grupos de microrganismos apresentam diferentes resistências à preservação. As culturas produtoras de esporos possuem melhores resultados de viabilidade em todos os métodos de conservação; isto deve-se às pequenas quantidades de água presente nos esporos, uma forma de preservação natural. Os microrganismos que não esporulem não possuem a mesma capacidade de sobrevivência. Sabe-se que os procariontes são mais resistentes que os eucariontes, bem como as bactérias Gram positivas mais resistentes que as Gram negativas (Smith et. al., 2001).

O sucesso da conservação dependerá do método usado, da natureza dos microrganismos e do período de conservação. A grande diferença entre a resistência de cada cultura e os resultados obtidos durante a reactivação das células impede a determinação de um procedimento padrão de conservação aplicável a todos os microrganismos (Smith et. al., 2001). Existe uma multiplicidade de métodos de preservação de culturas descritos na literatura, mas nenhum método pode ou deve ser considerado infalível. Embora se tenha demonstrado que as reacções dos microrganismos aos diferentes métodos desenvolvidos variam até entre estirpes da mesma espécie, os métodos hoje mais generalizados são os que permitem uma maior capacidade de sobrevivência e uniformidade de características e propriedades (fisiologia, metabolitos secundários, enzimas, genoma, etc.), e que permitem longos períodos de armazenamento (Ryan & Smith, 2004). A Tabela 3 apresenta um resumo dos métodos de conservação mais utilizados, vantagens e desvantagens e quais os organismos a que se aplicam. Nas grandes colecções de serviço a liofilização e a criopreservação (em congelador mecânico ou azoto líquido) são os métodos de preservação preferencialmente escolhidos (Ryan & Smith, 2004).

Métodos básicos como a sub-cultura contínua, preservação em água, óleo, areia ou solo, e em sílica gel podem ser adequados na ausência de alternativas. Apesar destes métodos serem inicialmente rentáveis a curto prazo e relativamente simples, comportam riscos, nomeadamente o elevado risco de contaminação e deriva genética das estirpes a longo prazo.

A sub-cultura é um dos métodos mais antigos, e ainda muito utilizado, e consiste na transferência periódica da cultura para um meio fresco. O método de preservação em água

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consiste num bloco de agar contendo células adicionado a água estéril ou solução salina (no caso de microrganismos sensíveis a baixas pressões osmótica de soluções hipotónicas) e conservado a baixas temperaturas ou temperatura ambiente. A preservação em óleo consiste na aplicação de uma camada de óleo mineral estéril sobre uma cultura de microrganismos em meio sólido ou líquido, que irá limitar a quantidade de oxigénio disponível e causando uma diminuição no crescimento e no metabolismo do microrganismo. A preservação em areia, solo ou em sílica gel, consiste basicamente na inoculação do microrganismo em areia, solo ou sílica gel estéril e posterior secagem (Smith et. al., 2001).

A liofilização é um método que envolve o congelamento rápido da cultura seguido da sua posterior secagem por sublimação do gelo com pressão reduzida, originando que as culturas permaneçam num estado inactivo e de baixa humidade para menos de 5%, sendo necessário a adição de um crioprotector. O material líquido é congelado em ampolas que são ligadas a uma bomba de vácuo acoplada a um sistema colector de vapor de água. Após a liofilização as ampolas são guardadas à temperatura ambiente ou entre 4-6ºC. Este método é o escolhido principalmente para os fungos conidiogénicos, no entanto, não é o ideal para culturas que não esporulem. Em contrapartida, este método permite atingir um tempo de armazenamento entre 20-50 anos e as ampolas podem ser enviadas directamente aos clientes sem ser necessário revitalizar os organismos, diminuindo os portes de envio e danos ao organismo durante o transporte (Ryan & Smith, 2004; Kurtzman et. al., 2011).

A secagem líquida, “L-Drying” ou “Liquid Drying” é um processo semelhante à liofilização, com a excepção de que as células e a solução criopreservante são apenas secas e não sujeitas a uma congelação prévia. Este método é utilizado em algumas colecções de serviço para preservar bactérias (Morgan et. al., 2006; Smith & Ryan, 2012).

Apesar da eficácia das duas técnicas descritas previamente (liofilização e secagem líquida) estas têm uma baixa taxa de sobrevivência, em particular quando aplicadas a fungos filamentosos. A criopreservação surge então como um método que permite uma conservação longa, e é aplicável a quase todos os tipos de microrganismos, sendo preciso apenas alguns ajustes aos protocolos, e é utilizada pela grande maioria das CC no mundo desenvolvido. Algumas CC utilizam a criopreservação em congelador mecânico de baixas temperaturas, entre -80ºC e -150ºC, mas a grande maioria utiliza o azoto líquido. De qualquer forma, independentemente do método de criopreservação, é necessário a existência de uma solução crioprotectora, nomeadamente glicerol (Kurtzman et. al., 2011; Smith & Ryan, 2012).

Outras técnicas de criopreservação menos conhecidas são a vitrificação e a criopreservação por encapsulamento que apresentam um elevado potencial para preservar microrganismos recalcitrantes, no entanto, são técnicas demoradas e caras. No caso dos

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patogénios obrigatórios ou microrganismos mutualistas a preservação em conjunto com o seu substrato de isolamento ou hospedeiro tem sido estudada (Smith & Ryan, 2012).

Tabela 3: Características das várias técnicas de preservação de microrganismos (adaptado de Ryan &

Smith, 2004).

Método de

preservação Vantagens Desvantagens Organismos

Tempo de armazenagem Sub-cultura Rentável a curto prazo, método simples Curto período de tempo de sub-cultura Risco de contaminação e deriva genética Bactérias (incluindo Actinomicetas), Fungos filamentosos, Leveduras, Protozoários 2 Semanas a 1 ano Preservação em água Rentável a curto prazo, método simples Deterioração da cultura; risco de contaminação e deriva genética Fungos filamentosos, Leveduras Até 2 anos Preservação em óleo Rentável a curto prazo, método simples Deterioração da cultura; risco de contaminação e deriva genética Fungos filamentosos, Leveduras Até 10 anos Preservação em areia ou solo Rentável a curto prazo, método simples Degeneração da cultura se a humidade for alta; risco de deriva

genética Actinomicetas, Fungos filamentosos Até 10 anos Preservação em sílica gel Rentável, método simples Toxicidade do gel de sílica Fungos filamentosos, Leveduras Até 25 anos Liofilização Facilidade e longo tempo de armazenamento; distribuição por ampolas Método complexo, demorado e caro; não adequado a fungos que

não esporulam Bactérias (incluindo Actinomicetas), Fungos filamentosos, Leveduras, Protozoários Até 50 anos Secagem líquida (“Liquid Drying”) Não existe congelamento das células

Equipamento caro Bactérias Até 10 anos

Criopreservaç ão (congelador mecânico) Métodos simples; deterioração de estirpes reduzida Equipamento caro; necessário fornecimento de electricidade; alguns criopreservantes podem ser tóxicos

Bactérias (incluindo Actinomicetas), Fungos filamentosos, Leveduras, Protozoários Até 40 anos Criopreservaç ão (azoto líquido) Optimização do métododo para diferentes microrganismos; deterioração de estirpes reduzida Equipamento caro; necessário controlo de temperatura e de azoto líquido; alguns

criopreservantes podem ser tóxicos

Bactérias (incluindo Actinomicetas), Fungos filamentosos, Leveduras, Protozoários Potencialmente ilimitado

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Independentemente do método de preservação escolhido pelas colecções de culuras existe um critério que deve ser observado e colocado em prática pelo pessoal adstrito à colecção que consiste na verificação da viabilidade, pureza e identidade da cultura imediatamente após a preservação de cada estirpe microbiana (Smith & Ryan, 2012).

1.4 Evolução dos métodos de identificação e caracterização de culturas microbianas

As colecções de culturas devem dominar as técnicas disponíveis para caracterizar, identificar e autenticar as estirpes microbianas. É importante aceder às propriedades e características dos microrganismos para que possam ser utilizados não só na investigação mas também na indústria. Várias técnicas e metodologias de identificação e caracterização de microrganismos são originárias de várias disciplinas biológicas como bioquímica, bacteriologia, micologia e ecologia, de forma a providenciar dados morfológicos, fisiológicos e bioquímicos sobre as diferentes estirpes. Tal informação não só providencia dados sobre estas características como também propriedades dos microrganismos que podem ter importância industrial ou farmacológica (Vaughan-Martini, 2003; Smith et. al., 2008).

O uso de microscopia óptica já permite verificar a pureza das culturas e por vezes distinguir entre grupos de organismos, como por exemplo, nas leveduras em que existe uma diferença na estrutura da parede celular entre ascomicetas e basidomicetas que pode ser confirmada com a utilização de um simples teste de DBB (Vaughan-Martini, 2003).

A taxonomia agrupa organismos relacionados filogeneticamente dentro do mesmo taxon, utilizando caracteres informativos ao nível genético em conjunto com os testes convencionais. Os métodos moleculares são cada vez mais utilizados para a identificação de espécies com difícil visualização de características micromorfológicas, como os esporos. Além disso, são uma ferramenta indispensável na análise filogenética dos microrganismos (Kurtzman & Robnett, 1998). A principal vantagem dos métodos moleculares é de serem rápidos, reprodutíveis e acessíveis e, actualmente, a grande maioria das CC tem laboratórios ou acesso a equipamento que permita a utilização destas novas metodologias de identificação molecular (Spencer-Martins, 1994; Pincus et. al., 2007; Smith et. al., 2008).

Muitas das novas técnicas de identificação molecular requerem a obtenção de DNA purificado, que tem de ser extraído das células com a mínima disrupção mecânica do ácido nucleico. Os procedimentos mais comuns passam por provocar uma lise das células (através de uma solução de lise) seguida de uma purificação e conservação do DNA numa solução tampão apropriada. “Kits” comerciais e simples encontram-se disponíveis podendo ser utilizados para a extração de DNA humano, animal, bacteriano e fúngico. No entanto, existem alguns fungos filamentosos e plantas cujo DNA é mais difícil de obter devido à natureza das suas paredes

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celulares, sendo necessário outras metodologias e/ou protocolos de extração de DNA (Smith et. al., 2008).

Os primeiros métodos moleculares a serem utilizados para a comparação de espécies de microrganismos foram a determinação do conteúdo molar em guanina e citosina (%mol G+C) do DNA genómico e a cinética de reassociação DNA-DNA. A correlação entre a temperatura de desnaturação e a composição do DNA baseia-se no conhecimento de que se estabelecem três ligações de hidrogénio entre as bases de guanina e citosina, enquanto que apenas duas ligações do mesmo tipo são estabelecidas entre a timina e adenina. Uma maior percentagem das primeiras confere maior estabilidade à dupla cadeia e a desnaturação do DNA ocorre a temperaturas mais elevadas. No caso das leveduras, as ascomicetas apresentam genomas com valores de % G+C entre 27 e 50 %, enquanto que as basidiomicetas têm um conteúdo molar em GC que varia entre 50-70%. Considera-se que estirpes pertencentes a uma mesma espécie não divergem em mais do que 2,0-2,5% na %mol G+C (Kurtzman et. al., 2011). No entanto, como a composição em bases não reflecte a sequência nucleotídica do DNA, estirpes com percentagens molares idênticas podem pertencer a espécies diferentes. Composições semelhantes requerem experiências posteriores de reassociação DNA-DNA para determinação da conspecificidade.

As experiências de reassociação DNA-DNA permitiram avaliar a complementaridade global das sequências nucleotídicas do DNA genómico de duas estirpes de leveduras diferentes. A determinação do grau de complementaridade envolve a desnaturação térmica do DNA das amostras e a comparação cinética da renaturação do DNA de cada uma das estirpes e da sua mistura em partes iguais. Estirpes com valores superiores a 70-80% de complementaridade DNA-DNA eram consideradas pertencentes à mesma espécie. Pelo contrário, eram consideradas estirpes de espécies diferentes quando a complementaridade era inferior a 20-30%. Os valores intermédios, entre 30-70% tinham de ser analisados conjuntamente com outras características, podendo corresponder a variedades duma mesma espécie. Deve, no entanto, assinalar-se que existem algumas, embora raras, excepções a estas regras. A determinação do grau de reassociação DNA-DNA revelou que algumas estirpes fenotipicamente distintas correspondiam, de facto, a uma mesma espécie e vice-versa, i.e., que certas estirpes fenotipicamente indistinguíveis representavam espécies diferentes (Kurtzman et. al., 2011).

Nos eucariontes, os genes do RNA ribossómico (rRNA) estão organizados numa unidade de DNA ribossómico (rDNA) que se repete sequencialmente, podendo ocorrer em várias dezenas de cópias por genoma haploide (Fig. 1). A unidade genómica do rDNA possui as seguintes regiões na disposição 5’-3’: a região espaçadora externa (ETS), o gene do rRNA 18S

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(SSU), a região espaçadora interna (ITS1), o gene do rRNA 5,8S, uma segunda região espaçadora interna (ITS2) e o gene do rRNA 26S (LSU). Este último apresenta sequências menos conservadas em relação aos genes 18S e 5,8S, sendo a região de escolha para estudos de filogenia de espécies e grupos taxonómicos mais relacionados. A região D1/D2 do rDNA 26S tem sido utilizada para diferenciar quase todas as espécies de leveduras estudadas (Kurtzman & Robnett, 1998). Porém, a sequenciação desta região não é capaz de diferenciar todas as espécies de leveduras de afinidade basidiomiceta, sendo necessário a sequenciação conjunta da região ITS (Fell et. al., 2000; Vaughan-Martini, 2003; Pincus, et. al., 2007).

Figura 1: Representação esquemática da região do DNA ribossómico dos fungos e maioria dos

eucariontes.

A utilização de rDNA na identificação molecular tem uma série de vantagens: (i) os ribossomas estão presentes em todos os organismos; (ii) são estruturas homólogas do ponto de vista funcional e evolutivo; (iii) parecem partilhar uma origem evolutiva comum, pois, apesar de serem muito conservados, revelam diferentes níveis de evolução, podendo funcionar como relógios moleculares; (iv) os genes do rRNA parecem não variar entre os indivíduos contemporâneos, reflectindo somente as relações evolutivas entre os organismos; (v) a totalidade de mais de 6.000 nucleótidos contidos nas sequências de rDNA (26S, 18S, 5.8S e 5S) é suficientemente elevada para resolver filogenias e fazer a respectiva análise estatística; (vi) a utilização de “primers”, para amplificação por PCR, permite o acesso a qualquer zona da unidade de rDNA, simplificando, deste modo, o estudo de um grande número de amostras; e (vii) a existência de bases de dados públicas de rDNA (por exemplo, GenBank:

http://www.ncbi.nlm.nih.gov/) permite a comparação de sequências de muitos e diversos

organismos (Kurtzman et. al., 2011).

O uso de “Multi Locus Sequence Typing” (MLST) tem sido também aplicado para o entendimento da biodiversidade e evolução dos microrganismos, em particular dos fungos. Esta metodologia baseia-se na sequênciação e análise de fragmentos de genes conservados (geralmente “housekeeping genes”), espaçados ao longo do genoma microbiano de pelo

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menos 100kb. A grande vantagem desta técnica é que a diferença entre estirpes é indexada directamente nas sequências de DNA. Como estes genes evoluem muito lentamente, tornam-se ideais para estudos de epidemiologia e identificação.

Recentemente, com a introdução de métodos baseados em espectrometria de massa, uma nova metodologia MALDI-TOF (matrix-assisted laser desorption/ionization – time of flight mass spectrometry) foi introduzida na sistemática. MALDI-TOF combina a vantagem de uma tecnologia de baixo custo com a ionização de proteínas (entre 2 000 a 20 000 Da) de elevada resolução. Actualmente, esta metodologia já é amplamente usada na classificação e identificação de microrganismos com aplicação em diagnóstico clínico, investigação taxonómica ou em controlo de qualidade alimentar (Smith et. al., 2008).

1.5 Gestão da informação associada às colecções de culturas

Um grande volume de informações sobre diferentes microrganismos é gerado em função das actividades de rotina e investigação com as estirpes das colecções de culturas. A informação gerada pode ser referente às características genotípicas e fenotípicas dos microrganismos, aplicações industriais, caracteres taxonómicos, resposta a diferentes métodos de preservação e processos de pedidos de patentes. Existe uma tendência crescente de informatização desses dados.

Sistemas eficientes de documentação e registo (tanto em meio impresso quanto na forma electrónica) do material depositado devem ser adoptados, incluindo a elaboração de formulários (ou fichas) de depósitos os quais devem ser previamente preenchidos pelo depositante. As informações requeridas nestes formulários variam entre as colecções. Entretanto, dados mínimos para a documentação e registo de estirpes devem ser exigidos, tais como: nome do organismo; número da estirpe; número em outras colecções; histórico; tipo de organismo; restrições; condições de crescimento; dados de isolamento (data, nome e localidade); dados taxonómicos (características morfológicas e fisiológicas); referências bibliográficas; nome do depositante (meta-informação). Sistemas informatizados de gestão sobre as estirpes permitem o rastreio rápido de informações associadas e a estruturação de catálogos on-line, com actualização periódica. Alguns sistemas de informação permitem incorporar ao registo das estirpes dados diversificados, tais como: fotografias, sequências de DNA, procedimentos padrão para formulação de meios e reagentes, propriedades específicas, aplicações potenciais, entre outros (Robert et. al., 2006).

Na última década tornaram-se acessíveis bases de dados digitais com as informações sobre as estirpes e, actualmente, a maioria das colecções de culturas têm catálogos disponíveis “online” através de aplicações da “web”, em vez da versão impressa. O nível de detalhe

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contido no catálogo depende da própria colecção, mas a informação detalhada é um incentivo a que os investigadores e indústria adquiram culturas dessas colecções (Verslype et. al., 2010).

Nos últimos anos tem sido feito um imenso esforço por parte da maioria das colecções em tornar a sua meta-informação disponível à comunidade científica em formatos “user-friendly” e padronizada, permitindo a ligação entre as colecções. Algumas tentativas de tornar esta informação padronizada e acessível foram realizadas no passado mas falharam na obtenção de uma infraestrutura que permitisse o processamento electrónico. Apesar de relativamente recente, a StrainInfo (http://www.straininfo.net) é uma plataforma digital que se está a tornar referência ao nível da informação e meta-informação dos microrganismos ao nível da estirpe. Esta plataforma integra informação de várias colecções de culturas e BRCs (ver próximo capítulo), assim como informação sobre as colecções e respectivas culturas. A StrainInfo utiliza a linguagem microbiana comum (MCL – Microbial Common Language), desenvolvida para permitir a troca de informação entre as várias bases de dados microbianas. Como resultado disso, a designação das estirpes, a informação histórica do depósito das estirpes nas várias colecções, as características de crescimento, o genoma, e publicações relevantes sobre a estirpe microbiana, são visualizados pelo utilizador de forma a integrarem as várias colecções e centros de recursos. Este sistema apresenta um potencial de evolução elevado, podendo tornar-se uma rede informática global em que os dados microbiológicos sejam directamente utilizados na investigação científica, por exemplo, em estudos de comparação genómica (Verslyppe et. al., 2010; Dijkshoorn et. al., 2010).

1.6 Diversidade de actividades e serviços prestados pelas colecções de culturas

As colecções de culturas tradicionalmente têm prestado serviços de apoio à comunidade académica, assim como a sectores da indústria que necessitam de serviços de microbiologia. A gama dos serviços especializados oferecidos tem aumentado nos últimos anos devido à crescente procura por parte dos utilizadores. Para além das três actividades básicas das colecções (depósito, manutenção e distribuição), estas disponibilizam uma série de outros serviços também descritos a seguir.

• Depósito: colecções de culturas são centros de conservação de recursos genéticos. Têm como função incorporar continuamente organismos relevantes para estudos científicos e aplicações tecnológicas, e torná-los disponíveis para os clientes interessados. Um dos serviços que a grande maioria das colecções de serviço disponibiliza, e que tem um interesse particular para a indústria, é o fornecimento de serviços “safe-deposit”. Algumas colecções têm a possibilidade de manter estirpes de importância industrial em condições óptimas, só sendo permitido o acesso às mesmas ao depositante. Isto permite, por exemplo, que a indústria

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mantenha o “trade secret”, ou seja, tenha uma cópia das estirpes com interesse industrial numa colecção de culturas e que apenas o depositante tenha acesso a essas estirpes, sem necessitar de patentear o microrganismo em questão (Kirsop, 1984; Boundy-Mills, 2012). • Preservação e manutenção: as culturas microbianas são preservadas e mantidas pelas colecções de culturas de forma a garantir a sua sobrevivência, estabilidade e pureza durante períodos prolongados de tempo, empregando métodos de preservação adequados (Kirsop, 1984).

• Distribuição: as colecções de culturas de serviço têm como função a distribuição de culturas para os interessados capacitados para a sua utilização.

• Serviços de identificação: a preservação e a manutenção de microrganismos requer um conhecimento preciso das estirpes depositadas na colecção. Assim, muitas colecções possuem pessoal qualificado e oferecem serviços de identificação. A realização deste tipo de serviço por uma colecção pode ser mais eficiente e economicamente vantajosa para o cliente, além de possibilitar interações técnicas e científicas entre a colecção e os seus utilizadores provenientes de instituições de investigação e/ou sector industrial (Spencer-Martins, 1994; Boundy-Mills, 2012).

• Informação: as actividades de rotina e investigação com estirpes microbianas resultam numa quantidade significativa de informação de natureza científica e tecnológica. Essa informação, quando não for de carácter confidencial, deve estar organizada de forma coerente e ser disponibilizada aos utilizadores, sendo tão importante como a estirpe. A disponibilização de dados de caracterização taxonómica e tecnológica de estirpes de uma colecção favorece e facilita a busca de organismos para aplicações específicas, bem como contribui para o conhecimento sobre os próprios organismos.

• Depósito de patentes: as colecções de culturas podem actuar como centros depositários de culturas-patentes ou envolvidas em processos de patentes. O patenteamento de processos que envolvem a utilização de estirpes microbianas, ou mesmo estirpes de organismos geneticamente modificados (OGM), tem crescido muito nos últimos anos (Boundy-Mills, 2012). • Formação de pessoal: as colecções de culturas desempenham um papel importante em programas de formação, principalmente em áreas como preservação, manutenção, taxonomia e identificação de microrganismos.

• Investigação: as colecções de culturas realizam investigação de interesse específico, por exemplo em métodos de preservação, manutenção de culturas e taxonomia. Muitas colecções realizam projectos com outras instituições ou empresas do sector biotecnológico para

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pesquisa de estirpes microbianas para aplicações específicas em processos industriais (Spencer-Martins, 1994).

• Consultadoria: devido à natureza das suas actividades, as colecções de culturas tendem a concentrar especialistas em taxonomia e biologia de diversos grupos de microrganismos sendo muitas vezes chamados a dar pareceres.

De acordo com a WDCM (www.wfcc.info/ccinfo/statictics/) são vários os serviços fornecidos pelas CC (Tabela 4). Como se pode observar o depósito (inclusive patentes) e distribuição de estirpes são dos serviços mais importantes das colecções de culturas. No entanto, nos últimos anos, têm aumentado os serviços de identificação de estirpes por parte das colecções, assim como, serviços de consultadoria a empresas de biotecnologia, de produção alimentar, farmacêuticas e governamentais, até à definição de políticas científicas e legislativas.

Tabela 4: Tipo de serviços disponibilizados pelas colecções de microrganismos no mundo (dados da

WDCM).

Tipo de serviços Número de Colecções

Depósito de estirpes 270 Depósito de patentes 90 Distribuição 288 Identificação 308 Formação de pessoal 261 Consultadoria 270

As colecções de culturas não são, portanto, meros “repositórios” e arquivos de estirpes, são por excelência centros de conservação de culturas ex situ, mantendo e estudando um pool genético para usufruto de gerações futuras, e oferecem serviços fundamentais para a comunidade científica e industrial do país. É ainda de salientar que muitas revistas de índole científica exigem que os materiais biológicos descritos em publicações estejam depositados em colecções de culturas e estejam acessíveis à comunidade científica (Boundy-Mills, 2012).

1.7 Papel das colecções de culturas e a sua intervenção na definição de políticas científicas, regulamentares e técnicas

Os microrganismos podem contribuir com soluções para os problemas da sociedade em geral e têm um papel importante no desenvolvimento sustentável uma vez que a biodiversidade microbiana, na maior parte inexplorada, poderá gerar um valor económico através do conhecimento de como as espécies se regulam umas às outras, e na extração de compostos activos com interesse biotecnológico e farmacêutico. (Smith, 2003; Spencer-Martins, 1994). Nos últimos anos tem existido um aumento do uso de organismos geneticamente modificados em variadíssimas utilizações e de utilização de compostos activos

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provenientes dos variados recursos biológicos na indústria alimentar e/ou farmacêutica, que levantaram questões éticas (por exemplo, uso de material genético humano e necessidade de confidencialidade e consentimento) que têm de ser regulamentados pelos decisores políticos. As colecções de culturas surgem, então, como uma fonte importante de conhecimento no desenvolvimento e implementação de políticas, uma vez que esse conhecimento tem um elevado potencial industrial, económico, biotecnológico e farmacêutico (OECD, 2007).

As colecções de culturas activas encontram-se numa posição privilegiada, especialmente com a experiência que detêm em técnicas de taxonomia molecular, para participarem na avaliação in situ e manutenção ex situ dos recursos genéticos, de que dependem futuras aplicações em saúde, agricultura, produção alimentar, biotecnologia, farmacologia, etc. (Spencer-Martins, 1994). As colecções providenciam, assim, experiência e conhecimentos que permitem aos governos formular políticas sobre recursos biológicos e assegurar informação e segurança ao público, podendo servir como interface entre os governos e a indústria e o público em geral, ajudando, inclusive, os governos e público a desenvolver regulamentos e directivas sobre boas práticas do uso seguro e ético dos recursos biológicos (OECD, 2007).

Nos países em desenvolvimento, as colecções de culturas não têm merecido a devida atenção de formuladores de políticas para biotecnologia, agências de financiamento e órgãos governamentais. Geralmente as colecções são consideradas subprodutos da investigação, em especial da investigação básica, e as suas actividades e manutenção são consideradas atribuições e responsabilidades dos próprios investigadores. Nesses países, o governo e grande parte do sector empresarial privado ignoram a importância dessas colecções como infraestruturas relevantes para a inovação tecnológica e para a competitividade industrial. Em contraponto, colecções de culturas e bancos genómicos são considerados peças fundamentais em programas de bioprospecção e desenvolvimento em empresas que actuam no sector da biotecnologia em países industrializados. Cabe às colecções o papel de ajudar os governos dos países com uma biodiversidade rica compreender o imenso potencial natural e sustentável que detêm

A consolidação das principais colecções internacionais como infraestruturas para a prestação de serviços ocorreu nas últimas décadas do século XX. O mesmo não ocorreu com as colecções de países em desenvolvimento, principalmente em função da ausência de políticas adequadas para o sector e da falta de procura industrial qualificada. Na década de 1990, mudanças de cariz político, regulatório e tecnológico afectaram de forma profunda a operação de colecções de serviço de interesse biotecnológico, criando novos desafios que devem ser superados. Entre eles destaca-se a necessidade de desenvolvimento de capacidade institucional (infraestrutura e recursos humanos) para atender às novas regras estabelecidas

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na Convenção sobre Diversidade Biológica. Mudanças na legislação internacional referente às questões de bioética, bioterrorismo e segurança biológica, resultaram na imposição de medidas muito restritivas no acesso a material biológico patogénico. Essas restrições incluem o acesso a material de referência, fundamental para o controle epidemiológico de doenças infecciosas, controle de pragas agrícolas e testes de qualidade de produtos industrializados. Esse tipo de restrições podem, no entanto, trazer mais valias aos países em desenvolvimento, uma vez que se tiverem uma política protecionista podem proteger a sua biodiversidade e as colecções de culturas tornam-se as infraestruturas ideais para conservarem e protegerem essa biodiversidade.

A Grã-Bretanha foi um dos primeiros países a reconhecer a necessidade de uma política nacional para a conservação de culturas microbianas. A Rede Britânica de Colecções de Culturas de Microrganismos originou-se de uma conferência de especialistas realizada em 1947, na qual se decidiu pelo estabelecimento, com recursos do governo, de um sistema descentralizado de colecções sediadas em diferentes instituições actuantes em áreas diversas da microbiologia básica e aplicada, composta por 9 colecções de serviço. Em 1996, e no seguimento da estratégia do governo para as colecções microbianas foi criado o UKNCC (United Kingdom National Culture Collection) com o objectivo de coordenar as actividades, investigação e marketing das colecções nacionais britânicas. Em resultado da experiência e conhecimento proveniente das colecções britânicas, em 2001 a UKNCC publicou um manual de gestão e procedimentos para as colecções de culturas (Smith et. al., 2001).

Em Portugal, em resposta ao relatório da OECD (Organisation for Economic Co-operation and Development) sobre os Centros de Recursos Biológicos de 2001 (OECD, 2001), foi realizado um primeiro relatório, entregue ao Ministério de Ciência e Tecnologia, sobre o estado das colecções de microrganismos na tentativa de estabelecer uma rede nacional de Colecções de Culturas de Microrganismos que conduzisse à criação de um BRC nacional (Lima & Spencer-Martins, 2001). Em 2006 foi proposto a criação de uma Rede Portuguesa de Colecções de Culturas Microbianas (RPCCM) com os seguintes objectivos (Lima et. al., 2006): (i) melhorar o desempenho na conservação dos recursos biológicos em Portugal; (ii) atingir níveis de qualidade com padrões reconhecidos nacional e internacionalmente; (iii) informatizar dados e serviços; (iv) criação da RPCCM; (v) criação do catálogo nacional virtual de culturas microbianas; (vi) criação de um portal único de acesso ao catálogo virtual da RPCCM; (vii) criação de mecanismos de transferência de material e de protecção da propriedade intelectual; (viii) implementação dos princípios de segurança para salvaguarda do material; (ix) implementação de uma cultura científica nacional que permita garantir o depósito dos novos isolamentos microbianos na RPCCM; (x) participação nas iniciativas e organizações

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internacionais relevantes; (xi) auxiliar a criação de uma entidade independente para acreditação/certificação dos BRCs nacionais. Contudo não existem dados de que esta iniciativa tenha sido bem sucedida, o que poderá vir a acontecer com a implementação do MIRRI (ver ponto 2.6).

2 Levantamentos de iniciativas e directivas internacionais sobre colecções de culturas

2.1 Conceito de Centros de Recursos Biológicos e programa MIRCEN da UNESCO

O conceito de Centros de Recursos Biológicos (BRC – Biological Resource Centres) foi lançado nos fins dos anos 40 do século XX pela UNESCO-MIRCEN. Em 1974 o Programa para o ambiente das Nações Unidas (UNEP – United Nations Environmental Program) estabeleceu o consórcio MIRCEN (Microbial Resources Centres) com o objectivo de preservar e explorar a diversidade microbiana e tecnologia resultante, e torná-las acessíveis aos países em vias de desenvolvimento, assim como apoiar as actividades de investigação e desenvolvimento nas áreas da microbiologia ambiental e biotecnologia.

A relevância dos BRC tem vindo a consolidar-se com o aumento da percepção política e pública da importância dos recursos biológicos e genéticos. A OECD considera “recursos biológicos” como o conjunto de organismos vivos, células, genes e informação a eles associada, que, por sua vez, são os materiais utilizados na investigação e desenvolvimento das ciências naturais e no avanço da biotecnologia e saúde (OECD, 2001).

O acesso aos recursos biológicos requer a existência de centros de depósito e distribuição, nomeadamente BRCs. Considerando a tremenda evolução da biotecnologia e bioeconomia na década de 90 do século passado, em 1998, o Japão tomou a iniciativa de propor à OECD os BRCs como elementos chave da infraestrutura científica e tecnológica para as ciências da vida e biotecnologia, responsáveis pela preservação e distribuição dos materiais biológicos e informação e em 1999 a OECD estabeleceu um grupo de trabalho (Fase 1: 1999-2001) para discutir os desafios e as oportunidades associadas ao estabelecimento de uma Rede Global de BRCs, a ser consolidada a partir das colecções de serviço credenciadas. Como resultado deste esforço, em Fevereiro de 1999, realizou-se em Tóquio um workshop da OECD dedicado aos BRCs. Passados 2 anos, em 2001 a OECD publica o relatório “Biological Resources Centres – Underpinning the Future of Life Sciences and Biotechnology”, que define o conceito de BRC e recomenda o estabelecimento de uma Rede Global de BRCs (OECD, 2001; Lima, 2007).

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De acordo com a definição da OECD, os BRCs são “uma parte essencial das infraestruturas de sustentação das ciências da vida e da biotecnologia. Consistem em prestadores de serviços e repositórios de células vivas, genomas de organismos e informação relacionada com a hereditariedade e funções dos sistemas biológicos. Os BRCs contêm colecções de culturas de organismos (microrganismos, células de plantas, animais e humanas), as suas partes replicativas (genomas, plasmídeos, vírus e cDNAs) e ainda organismos não cultiváveis, células e tecidos, assim como bases de dados contendo informações moleculares, fisiológicas e estruturais relevantes para estas colecções e a bioinformática associada” (OECD, 2001). Muitas das funções dos BRCs são transversais às próprias colecções de culturas (ver capítulos anteriores) com a diferença de que os BRCs devem obedecer a padrões de qualidade internacionais, assim como serem centros de conservação dos recursos biológicos, tal como enfatizado pela Convenção sobre a Diversidade Biológica (CBD). Outra diferença é que os BRCs podem servir como repositório de microrganismos com o propósito de procedimentos de patentes.

Entre as funções e serviços prestados pelos BRCs destacam-se (i) Centros de Recursos Genéticos para a conservação e arquivo da diversidade biológica e variabilidade genética, fornecimento de culturas para a biotecnologia, distribuição de material de referência para controle de qualidade, selecção de material biológico para uso industrial, aplicações das culturas em diversas áreas da saúde, agricultura, meio ambiente e educação; (ii) Centros de Informação para organização e disponibilização de dados taxonómicos e tecnológicos sobre o material biológico, disponibilização da informação sobre as culturas para o ensino, investigação e biotecnologia; (iii) Centros de Formação sobre a preservação do material biológico, a bioinformática e informática, a biodiversidade, biossistemática e taxonomia; (iv) Centros de Serviços Especializados com capacidade de realizar caracterização taxonómica do material biológico, controle e testes de qualidade, e depósito de material biológico para fins de patente.

2.2 Transição das Colecções de Culturas para Centros de Recursos Biológicos

A definição da estratégia de implementação da Rede Global de BRCs foi objecto de estudo de um novo grupo de trabalho estabelecido no âmbito do Programa de Biotecnologia da OECD (Fase 2: 2002-2004). Nesta segunda fase da iniciativa da OECD os esforços foram concentrados na discussão e definição de critérios de acreditação de acordo com normas internacionalmente aceites, critérios de qualidade e padrões de operação dos BRCs e na abordagem de questões associadas à biossegurança e harmonização da legislação (OECD, 2004). Na reunião de ministros de Ciência e Tecnologia da OECD, realizada em Janeiro de 2004,

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Tabela 1: Distribuição das colecções de culturas microbianas por continentes (adaptado de Smith, 2003;
Tabela 2: Tipo de apoio financeiro e o número de colecções existentes (dados actuais da WDCM).
Tabela  3:  Características  das  várias  técnicas  de  preservação  de  microrganismos  (adaptado  de  Ryan  &
Figura  1:  Representação  esquemática  da  região  do  DNA  ribossómico  dos  fungos  e  maioria  dos  eucariontes.
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