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A Cidade luz de Haussmann

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Academic year: 2021

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E MAIS: A PARIS QUE HAUSSMANN

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FLAGELO DO JAPÃO; LISBOA O NTEM E HOJE,* A HISTÓRIA EM C A R líf ir

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C H A R L E S E . R O T K IN / C O R B IS S T O C K P H O T O S

(3)

POR BERNARD BERGEROT

Tradução de Elvira Serapicos

Q

uando, em janeiro de 1870, Georges-Eugène Haussmann foi substituído por Emile O lli-

vier nas funções de prefeito do Sena, que — havia exercido durante 17 anos, tinha um só am igo, Napoleão III, já enfraquecido e doente. Em compensação, fizera m uitos inim igos, a começar pelos m inistros e parlamentares, que denunciavam a prioridade dada às grandes obras da capital. Também discordavam dele os membros do Conselho de Estado e do Tribunal de Contas, que não gostavam de ter sua serenidade perturba­ da, os magistrados da Ordem Judiciária, que outorgavam deliberadam ente grandes indenizações aos expropriados, e

alguns membros amedrontados do Conselho M unicipal. A todos se j untavam, ainda, inúmeros parisienses cansados de ter seus hábitos alterados e de se sujar nos imensos canteiros de obras abertos um após o outro.

Não é de surpreender, portanto, que a fama do m aior dos prefeitos parisienses tenha se evaporado no turbilhão de rejeição, ódio e menosprezo que provocou, logo depois da capitulação de Sedan, a queda do Segundo Império. Os novos detentores do poder, que no dia 4 de setembro de 1870 haviam proclamado a República, sem que qualquer instância constitucional tivesse esboçado algum a oposição, não guardaram da admirável obra de Elaussmann senão as contas fantásticas, a destruição de edifícios considera­ dos como obras de arte e, sobretudo, as diretivas de um a adm inistração m unicipal que ele dominava com firmeza e perspicácia, além das querelas partidárias, dos amores- próprios feridos, dos interesses particulares e da rotina.

O Segundo Império foi coberto de iniam ia e rejeitado como se tivesse nascido de um golpe de Estado, executado contra as facções contraditórias que se digladiavam no poder, e ratificado por um a esmagadora m aioria do povo. N enhum reconhecimento por um a obra útil. Aqueles que haviam sido alijados de seus cargos ou que os desdenhavam não conseguiam suportar que grandes coisas tivessem sido realizadas diante de seus olhos, sem que sobre eles pousasse

A s largas avenidas que se espalham como raios a partir do centro são uma herança da transformação realizada em Paris pelo barão Haussmann (no destaque)

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a reputação de sua autoria. Houve, de fato, um desenvolvimento econômico sem pre­ cedentes, verdadeiro triunfo da aplicação do ideário de Saint-Sim on e das grandes escolas científicas, que perm itiu a criação de um a indústria poderosa. Esta, com a ajuda dos bancos que se im punham aos britânicos, equipou a França e a Europa com estradas de ferro, caminhos e pontes, lançou o turism o moderno, transformou as grandes cidades e dobrou os salários dos trabalhadores. Os acontecimentos poste­ riores, às vezes cruéis, term inaram por apa­ ziguar os espíritos e fizeram com que fosse apreciado com m ais equanim idade um período memorável da história da França. A reabilitação de Napoleão III, depois de várias décadas, finalm ente aconteceu, da mesma form a que a de Haussmann.

Georges H aussm ann tinha 44 anos quando foi nomeado prefeito do Sena, em junho de 1853. Subprefeito de 1831 a 1848, m uito havia aprendidoe observado,

naquela região do sudeste capaz de refinar a inteligência de seus adm inistradores. Como prefeito de 1849 a 1853, adm i­ nistrara sucessivamente o Var, o "forme e a Gironda. Fora dali que o m inistro do Interior, Victor Fialin Persigny, o trouxera para avaliar sua capacidade. O que este observava era “um homem grande, forte, vigoroso, enérgico e ao mesmo tempo fino, astuto, com um espírito cheio de recursos”. E mais: “Cheio de audácia e de habilidade, capaz de opor expedientes aos expedientes, obstáculos aos obstáculos”. A inda em suas memórias, Persigny adm itia: “Eu gozava de antemão a idéia de jogar esse felino de grande porte no meio do bando de raposas e lobos amotinados contra as generosas aspirações do Império”.

Napoleão III queria “destruir os bairros insalubres da capital, melhorar as condi­ ções de vida das classes populares e fazer de Paris a mais bela capital do mundo”. Ele mesmo havia traçado, em detalhes, o

plano que considerava necessário realizar. O imperador jam ais esquecera a magnífica recepção que lhe havia sido oferecida por Haussmann em Bordéus, alguns dias antes da proclam ação do Im pério, ratificada por 97,2% dos votantes na Gironda. Foi, portanto, um a satisfação para o m ais po­ deroso dos franceses nomear prefeito do Sena aquele homem excepcional para a realização de um a obra grandiosa.

Se o m inistro do Interior apreciara em seu novo prefeito do Sena o homem de caráter, havia ignorado a form ação intelectual; mas ela era notável. O jovem parisiense Haussmann se destacara como estudante nos cursos secundário e superior. N a província, havia tido tempo de con­ frontar a teoria e a prática e adquirir assim um a experiência verdadeira.

Paris ainda era, em meados do século XIX, a cidade descrita pelo escritor Eugène Sue. Na Ile de la C ité, por exemplo, “as casas cor de barro, cortadas por algumas

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A Rue Monge foi instalada onde antes ficava a montanha Sainte-Geneviève

raras janelas com caixilhos carcomidos, quase se tocavam nos telhados de tal forma eram as ruas estreitas”. Essa cidade de 3.450 hectares era um a das menores entre as ca­ pitais européias, fechada que fora durante séculos por suas sucessivas m uralhas e por suas barreiras alfandegárias. D ividida em

12 distritos, a m aioria com excesso de po­ pulação, contava com aproximadamente 1 m ilhão de habitantes. Os recursos de água potável mostravam-se insuficientes; a rede de esgptos, iniciada, estava longe de corresponder às necessidades; o tifo e a peste grassavam, em condições endêmicas.

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A R EC O N Q U IST A D O ESPAÇO

À esquerda, esquema das obras de Haussmann: em preto, as novas vias, no quadriculado os novos bairros, em verde, os novos parques públicos, em vermelho a “grande cruz”, em rosa a área da Paris pré-Haussmann, com 12 arrondissem ents (regiões, semelhantes a bairros). Acima, as novas vias e as casas desapropriadas até 1876

A circulação de pessoas e de mercadorias era difícil. O abastecimento de alimentos e de m atérias-prim as dependia ainda de rios que não eram navegáveis durante todo o ano. Em um a palavra, Paris era “inabitável e desorganizada em todos os aspectos”.

C om sua vontade tenaz e sua habilida­ de, Haussmann rompeu com a lentidão das melhorias executadas por seus antecessores. Transformou Paris num ritm o frenético. Era preciso impor a higiene que fizera tanta falta no passado: no ar, na ilum inação, na água, um a circulação fácil. Os grandes caminhos retilíneos traziam um a solução global. Pela prim eira vez em sua história, a cidade foi concebida em conjunto com sua circulação, m odificada também pelas recentes estações ferroviárias:

Para levar a efeito tal program a ha­ via que contar com recursos técnicos e financeiros. Homem de ciência que era, Haussmann começou por m andar fazer a triangulação e o nivelamento de Paris, que jam ais haviam sido realizados; assim as conexões das vias seriam feitas nos mesmos níveis. Em relação às finanças, pôs-se a estudar o orçamento da cidade. Encontrou excedentes que seriam utilizados, sem que fosse preciso aum entar os impostos. Esses excedentes, gradüalm ente elevados com a execução de operações lucrativas e pelo enriquecim ento dos habitantes, foram destinados diretam ente para o pagamento dos trabalhadores, para regular os juros e as amortizações dos empréstimos.

■ A lém disso, o Estado participava de

30% da regulam entação dos trabalhos. Foi para obter m ais facilidades de crédito do parlam ento que se usou o argumento - transformado em acusação pela oposição - de que as grandes avenidas facilitariam a repressão das sublevações (tese não confir­ m ada pelos movimentos de 1871 e 1944). De fato, é evidente que todas as estações passaram a ser interligadas e ligadas ao centro por grandes avenidas e que todos os bairros de Paris se beneficiaram com a m aior facilidade é rapidez na circulação.

Três redes viárias sucessivas, executadas em 17 anos, modificaram completamente

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Largos bulevares, como os de Strasbourg, de S t Michel, e a Rue de Rivoli facilitaram a circulação

a capital. Seria inútil descrever todas as aven idas (as que tinham mais de 20 metros de largura) que iam se abrindo diante dos olhos dos parisienses. “N a prática, a auto­ ridade pública constatava as necessidades gerais, a lei expropriava as propriedades particulares, o poder m unicipal lim pava os terrenos e abria as ruas; em seguida devia-se aos esforços dos indivíduos a construção, apropriação e aluguel das no­ vas habitações”. O prefeito do Sena seguiu atentam ente cada fase desse procedimen­ to: lutar contra a inércia desde o início, obter os créditos concedidos sempre com parcimônia, m ontar a operação financei­ ramente, supervisionar as atribuições dos trabalhos m unicipais, fazer com que os empresários respeitassem todas as regras que seu iastinto os faria transgredir, enfim, obedecer os prazos para que as operações se sucedessem em cadeia.

H avia que ter m uita energia para um a tarefa tão complexa. Em 1860, a extensão de Paris até as fortificações construídas anterio rroen te am pliou sua superfície para 8.400 hectares. Essa extensão, prevista ha­ via 20 anos, perm itiu a m ultiplicação dos

serviços públicos em uina região carente, a criação de grandes vias e a m elhoria da segurança pública. A cidade foi, daí em diante, dividida em 20 distritos (no lugar de 12) e 80 bairros. Nesse mesmo ano fo­ ram também redefinidas as competências entre a prefeitura do Sena e a prefeitura de polícia. Esta conservou como atribuição apenas a manutenção da ordem, tarefa por si só bastante absorvente.

No início de 1870, inúm eras melas infectas tinham sido destruídas, enquanto o com prim ento das vias públicas havia duplicado; 60 hectares de parques e jardins tinham sido criados. Com o reordenamen- to florestal do Bois de Boulogne e do Bois de V incennes, os transeuntes passaram a contar com 1.647 hectares de área; o

número de árvores que se alinhavam nas alamedas subiu de 50 m il para 95,5 m il. Serviços públicos também apresentaram sensíveis melhorias. O número de bicos de gás triplicou. A distribuição de água quadruplicou em volum e e a extensão da rede de esgotos quintuplicou. Foram dem olidos 92 m il alojamentos insalubres e construídos outros 215 m il, com condi­ ções de higiene.

Os grandes m onum entos de Paris haviam sido resgatados, o Louvre unido às Tulherias ao longo da Rue de Rivoli, e as escolas, os edifícios públicos, os hospitais, os teatros, as estações, as casernas, mercados de todos os tipos, e igrejas haviam sido construídos. A população da cidade tinha duplicado e estava bem abastecida, graças às estradas de ferro. Essa transformação de Paris custou 2,5 bilhões de francos, um pouco mais que o total do orçamento do Estado em 1869, sem que os impostos locais tivessem sua taxa aumentada.

A haussmanização tomou-se um a refe­ rência para os urbanistas do mundo inteiro e fez escola. O saneamento completo do velho centro da cidade, o alinham ento, a altura imposta aos edifícios, as perspectivas tom aram Paris harmoniosa, em compa­ ração com outras capitais. Naturalm ente, havia críticas, ampliadas por razões políti­ cas. Não por acaso, um homem político de boa-fé, Jules Sim on, escreveu, em 1882:

“Pouco im porta atualm ente que as contas do sr. H aussm ann tenham sido fantásticas. Ele havia se proposto a fazer de Paris um a cidade m agnífica, e alcançou

plenam ente seu objetivo”. □

BERNARD BERGEROT é escritor

GLO SSÁRIO /

Saint-SimonrCIaude-Henry de Rouvroy,.conde deSájnt-Simon (1760-1825),filósofo que

refletiu sobre o desenvolvimento ihdustriáj.è científico com vistas ^ reforma da sociedade;

ú'm dos fundadòrés do socialismo. ‘ : _

Gironda: parcela da ediíidade reunida ria Convenção e que agrupava òs deputados

republicanos liberais (representantes da alta burguesia); avêssos a alianças cõm o povo.

íle de la C ité: ilha no rio Sena, onde se desenvolveu ã cidade primitiva de Lutécia,

considerada o coração histórico de Paris; foi totalmente remodelada por Haussmann, que não hesitou em demolir uma série de construções antigas, inclusive igrejas.

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