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Remendando as relações Brasil-EUA

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O Estado de São Paulo

Quarta-feira, 25 de junho de 2014

Remendando as relações Brasil-EUA

MARCELO DE PAIVA ABREU*

A Copa do Mundo tem estimulado manifestações grotescas de nacionalismo. Exemplar é o artigo de Sam Borden (New York Times, 16/6). O foco foi no pênalti “cavado” pelo brasileiro Fred no jogo contra a Croácia. Após lamentar a disseminação de simulações de faltas na tentativa de iludir os árbitros, o artigo defende a tese de que os jogadores norte-americanos não agem dessa forma. Tab Ramos, ex-jogador dos EUA, hoje auxiliar de Jürgen Klinsmann, técnico dos EUA, é citado: “É absolutamente claro que nós (norte-americanos) não praticamos (tais simulações) da mesma forma que fazem outros times... a natureza dos americanos é tentar ser corretos ao jogar. É como são os americanos”. A implicação é que os jogadores dos EUA não simulam faltas como os jogadores de quase todos os outros times e que estariam em posição eticamente menos condenável (“standing on the moral high ground”).

Como ressaltou Ruy Castro (Folha de São Paulo, 18/6) ainda há quem se lembre de famosos campeões norte-americanos como Lance Armstrong, no ciclismo, ou Marion Jones e Tim Montgomery, no atletismo, que enganaram o mundo com resultados obtidos com o uso de doping e foram depois desmascarados. Será que a superioridade ética dos atletas dos EUA está circunscrita ao futebol?

Essas manifestações seriam apenas ridículas se não revelassem a visão de muitos setores nos EUA quanto às relações do país com o resto do mundo. Os EUA seriam não apenas a potência dominante, mas também defensora de padrões éticos mais exigentes do que os do resto do mundo. Esse diagnóstico alicerçou a política externa dos EUA até a 2ª Guerra Mundial e justificou o isolacionismo como defesa em relação aos desatinos das potências europeias.

Depois de 1945, essa percepção de superioridade ética perdurou, apesar do envolvimento reiterado dos EUA, como potência global, em ações que desmentiam frontalmente tal diagnóstico.

A arrogância da potência dominante não é inédita na história mundial. Atenas, Roma, Espanha, França, Grã-Bretanha tiveram seus momentos de delírio quanto à pretensa superioridade de seus valores em relação aos valores de seus competidores. Aos demais países cabe buscar o ponto de equilíbrio que otimize o balanço de vantagens e desvantagens em resistir, com maior ou menor intensidade, às ações objetáveis da potência hegemônica.

O Brasil nos últimos anos optou por uma política externa que esteve longe desse ponto de equilíbrio. Mesmo nos episódios em que era racional resistir às pressões dos EUA, como por exemplo as negociações da Alca, argumentos políticos sectários prevaleceram em relação a análises objetivas. O protagonismo brasileiro no Oriente Médio, mal alicerçado em efetivos recursos diplomáticos, somou- se ao apoio a Cuba e a governos neopopulistas na Argentina, Equador e Venezuela, aumentando o estranhamento entre Brasília e Washington.

Mais recentemente, as relações bilaterais foram afetadas pela espionagem das comunicações do governo e de empresas no Brasil por órgãos de segurança dos EUA. É claro que o governo

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brasileiro deveria reagir – como reagiu – energicamente. Mas trata-se de minueto imposto pelas práticas diplomáticas. Seria ingênuo supor que órgãos de segurança de qualquer país do mundo se comprometam a cessar suas atividades de espionagem cm respeito a padrões éticos. A reação mais eficaz não é ficar amuado à espera de improváveis desculpas, é buscar melhor proteção nas comunicações.

O Brasil necessita urgentemente mudar a sua posição de hostilidade dogmática aos EUA. Há significativos benefícios líquidos do ponto de vista econômico e político numa reaproximação bilateral. É essencial dominar a arte de conviver com a potência dominante, conter o destempero e administrar com mais astúcia as fricções decorrentes da arrogância que acompanha a hegemonia.

* Doutor em Economia pela Universidade de Cambridge, é Professor Titular no Departamento de Economia da PUC-Rio.

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