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Realização Grupo de Estudos em Reflexão Moral Interdisciplinar e Narratividade (GERMINA)

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Academic year: 2021

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Realização

Grupo de Estudos em Reflexão Moral Interdisciplinar e Narratividade (GERMINA)

Apoio

Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Departamento de Filosofia da UFSM

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Departamento de Filosofia da UFSC

Coordenação

Janyne Sattler

Capa e Ilustrações

Alexandre Beck

Diagramação

Jean M. Senhorinho

Revisão

Halyne Porto

Textos

Alexandre Ziani de Borba Úrsula Maria C. Lied Guilherme Pinto Ravazi Willian Martini Janyne Sattler

Jean M. Senhorinho Luana da Silva Seeger Lúrian Possebon

Marcos Antonio Maffisoni Mateus Stein

(4)

P418 Pensando cidadania / [coordenação Janyne Sattler ; capa e ilustrações Alexandre Beck ; textos Alexandre Ziani de Borba ... [et al.]]. – Santa Maria : UFSM, CCSH, Departamento de Filosofia, Programa de Pós- Graduação em Filosofia, GERMINA, 2016. 43 p. : il. ; 21 cm

1. Filosofia 2. Filosofia política 3. Cidadania I. Sattler, Janyne II. Beck, Alexandre III. Borba, Alexandre Ziani de

CDU 172 321.01 342.71

(5)

Sumário

Introdução

1 O que é um direito?

7

2 Aprendendo a aprender

9

3 Nossas diferenças

12

4 Isso é coisa de menina?

16

5

Os outros animais

21

6

Como julgamos?

23

7

Descolei um smartphone, e agora?

26

8

Uma ida ao cinema

31

9

Um super-herói responsável

34

10

O que é a felicidade?

37

11

Minhas reflexões escritas e desenhadas

42

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Introdução

O dicionário define a “cidadania” como a prática dos direitos e deveres de um indivíduo que vive sob um Estado, ou o “cidadão” como aquele que goza de seus direitos civis e políticos e que participa da vida em sociedade. Essa definição faz jus à própria origem do conceito na Grécia Antiga – com a Cidade-Estado como o centro dessa atuação.

O conceito sofreu modificações impostas por contextos políticos e sociais em diferentes momentos históricos, e atualmente engloba valores que determinam também o significado do nosso agir cotidiano sobre os seres que convivem conosco numa sociedade ampliada, extra-nacional, extra-humana. Uma cidadania cuja significação já não requer uma pertença localizada. Somos todos cidadãos de um mesmo mundo compartilhado. Entretanto, se assim não é ainda efetivamente, esta é ao menos a direção e a perspectiva almejadas pelas ideias expostas no presente livro.

Os textos aqui apresentados tratam de um modo cidadão

de ser no que diz respeito das questões que permeiam o nosso

dia-a-dia – cinema, quadrinhos, tecnologia, gênero, animais, e o que a filosofia tem a ver com tudo isso. Trata-se de uma conversa sobre maneiras de ver o mundo, e sobre como torná-lo sempre um pouquinho melhor com nossas próprias atitudes, ações e comportamentos.

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Trata-se também de uma conversa sobre as nossas responsabilidades de cidadão neste sentido mais amplo de cidadania segundo o qual todas as nossas ações têm implicação moral e política: porque ser cidadão não é apenas conhecer os seus próprios direitos (e deveres correlatos) e reivindicá-los, mas é sobretudo compreender que a cidadania só se vive no reconhecimento da cidadania do outro, e de todos os outros. Assim, se todos nós temos direitos que devem ser resguardados, todos temos igualmente muitas tarefas a cumprir – a começar pela tarefa de refletir sobre o nosso lugar em um mundo onde ainda há tanto para ser feito.

Um modo cidadão de ser.

E que ele possa incorporar também todos aqueles estatutos humanos que Thiago de Mello sonha em ver realizar-se em uma “vida verdadeira”, quando “o homem confiará no homem como um menino confia em outro menino” – tenhamos todos essa imensa ternura livre e justa, em prol de uma cidadania cheia de esperanças!

C

Janyne Sattler

(8)

O que é direito?

Os nossos direitos de cidadania estão escritos na Constituição Federal, que é a norma mais importante do país. Eles são divididos em três categorias: direitos civis,

direitos políticos e direitos sociais.

Os direitos civis são aqueles que garantem a nossa liberdade de escolher uma religião, um trabalho, a possibilidade de ir e vir e o acesso à justiça. Os direitos

políticos são uma categoria que envolve o direito eleitoral, o

direito de nos filiarmos a algum partido ou nos associarmos a algum sindicato. E o grupo dos direitos sociais é composto pelo direito à educação básica, à saúde, à moradia, ao lazer, entre outras coisas.

O direito é como se fosse uma autorização, um passaporte para fazermos algo sem sermos punidos por isso. Contudo, estamos autorizados a exercer os nossos direitos sempre nos limites impostos pela Constituição Federal. Ou seja, temos o direito de fazer o que essa norma

(9)

nos autoriza. O próprio exercício da cidadania é um direito garantido desta maneira.

Muitas vezes, no entanto, os direitos que estão escritos na forma da lei não se concretizam na prática. Não é dado a todas as pessoas possuir uma moradia, usufruir de um momento de lazer, ter o acesso à justiça, ou saber exigir igualdade de condições e de oportunidades, ou liberdade de formar sua própria família, de decidir sobre seu próprio corpo e escolher seu próprio governante – ou até mesmo de ser um governante. Neste sentido, podemos nos perguntar se basta haver uma lei que nos permita exercer a cidadania para que a cidadania seja, de fato, exercida.

Ter direito à cidadania como lei é apenas uma segurança formal. Mas exercer esse direito não é uma tarefa fácil. Significa, antes de mais nada, buscar conhecer os direitos que já temos garantidos e, acima de tudo, conquistar aqueles que ainda faltam na construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

C

Luana da Silva Seeger

Graduada em Filosofia pela UFSM Mestranda em Direito pela UFSM

(10)

Aprendendo a aprender

Por que não tem fraldário no banheiro masculino?

Questionamentos pertinentes como este podem surgir de nós ainda na fase da infância. Neste caso, ele veio de uma menina de 10 anos que esteve em um programa televisivo. Seu nome é Anita. Na verdade, não me surpreende que tal questão tenha sido colocada por uma criança, pois é uma característica delas serem curiosas e inquisitivas. No entanto, mesmo sendo a curiosidade e a inquisitividade características da infância, elas são pouco exploradas em sala de aula. Esse estado de coisas parece merecer nossa atenção.

Muitas vezes, o aprendizado é associado a experiências negativas e desencorajadoras e isso se torna perigoso na medida em que passa a ser a principal causa da evasão escolar. Talvez – e é isto o que quero sugerir aqui –, um aprendizado focado na inquisitividade, na curiosidade, na autonomia intelectual etc., seja a maneira mais eficaz de

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nos apresentar experiências positivas e motivadoras dentro das escolas. Tal aprendizado teria, como foco, o nosso desenvolvimento intelectual e se daria por meio de um processo de assimilação de determinadas práticas que nos ajudariam a cultivar e aperfeiçoar bons hábitos de pensamento e formação de opinião.

Em Filosofia, a inquisitividade, a mentalidade aberta, a coragem intelectual etc., são entendidas como virtudes

intelectuais. Mas por que é tão desejável cultivar virtudes

intelectuais? Como alguns pesquisadores argumentam, enquanto cidadãos e cidadãs forem incapazes de refletir criticamente acerca daquilo que escutam ou leem, incapazes de lidar com suas emoções e desejos no debate público e incapazes de estabelecer um diálogo saudável com aqueles de quem discordam, a estabilidade da democracia se torna ameaçada.

Nesse sentido, cultivar bons hábitos de pensamento, formação de opinião e engajamento no debate público – o que envolve aprender a lidar melhor com nossas emoções e desejos – é imprescindível para o exercício apropriado de nossa cidadania. Trata-se, com efeito, de algo que influencia todo o rumo de nossa civilização.

O ambiente normalmente hierárquico da sala de aula não permite, muito menos estimula, o hábito da autonomia e da mentalidade arejada, da indagação e da curiosidade, da coragem e responsabilidade intelectuais. Assim, se quisermos viver em um ambiente que incentive bons

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hábitos de pensamento, formação de opinião e engajamento no debate público, precisamos organizar nossas vidas na comunidade escolar, bem como negociar nossos interesses nela, reconhecendo o conjunto de valores que acompanha a cidadania: igualdade, cooperação, participação, consenso autenticidade, autonomia etc.

Trata-se de uma tentativa de colocar em prática uma educação que cultive em nós o desejo de continuar aprendendo a aprender, a indagar, a ouvir e a opinar.

C

Alexandre Ziani de Borba

(13)

Nossas diferenças

Um país estabelece suas leis de modo que elas sejam coerentes com o espírito comum da nação. Isso implica, então, que uma constituição também deve ter por base uma “cultura nacional”, um modo comum de vida, valores morais compartilhados, uma mesma língua, etc. O fato de muitos brasileiros gostarem de futebol, por exemplo, pode ser encarado como um traço comum do povo brasileiro. Assim, tradicionalmente, foi muito frequente a relação entre as palavras “cidadania” e “nacionalismo”. As leis, até certa medida, têm de respeitar as práticas e costumes do povo ao qual se dirigem, do contrário, haveriam resultados bastante indesejáveis.

Sabemos que grandes países, como é o caso do Brasil, são formados por uma vasta diversidade racial, étnica e cultural. Nosso país agrega pessoas vindas de todos os continentes do planeta, são descendentes de imigrantes europeus, indígenas nativos, afrodescendentes, japoneses, árabes, etc.

(14)

O caso é que nossa nação não é homogeneamente formada por um grande grupo de pessoas que possuem crenças semelhantes e concepções morais comuns sobre a vida em sociedade. Se alguém é católico, outra pessoa é candomblecista; se uma menina adora usar minissaia, outra não sai de casa sem estar vestindo o seu véu.

Podemos notar que tais questões não envolvem diferenças de um tipo mais simples, como preferir natação em vez de futebol. Questões acerca de diferenças religiosas, por exemplo, não dizem respeito apenas às diferenças pessoais de gosto, mas elas podem referir-se fundamentalmente à maneira como uma pessoa compreende a si mesma.

Grande parte da formação da nossa identidade depende de práticas e valores compartilhados que compõem a nossa cultura de origem. É através de tais valores e práticas que aprendemos a ver o mundo e a interagir com o nosso meio. Para algumas minorias, como estrangeiros ou povos nativos, a constituição que é legalmente imposta com base na cultura dominante não contempla as suas necessidades particulares.

O multiculturalismo pode ser considerado como um ramo da filosofia política que trata exatamente de questões relacionadas aos problemas de convivência entre diferentes grupos culturais em um mesmo território nacional. Apesar de o nosso país ser muito rico em sua diversidade cultural, existem poucos projetos políticos que declaradamente assumem alguma orientação multicultural. Talvez a questão acerca da demarcação das terras indígenas, atualmente em

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debate, seja uma oportunidade para levantarmos outras discussões sobre o multiculturalismo e sobre como é importante garantir os direitos de um determinado grupo cultural e manter vivas as práticas e valores com os quais as pessoas desse grupo se reconhecem.

O multiculturalismo pretende se afastar das diretrizes monoculturais que se espalham por todo o globo. Alguém que está viajando pelo mundo para conhecer alguns países pode não ficar surpreso se encontrar praticamente as mesmas coisas em Pequim ou em São Paulo: prédios, lanchonetes, ruas lotadas, pessoas ocupadas, muitos carros e muita fumaça, poluição sonora, visual, etc. Isso sem contar as legiões de desempregados e miseráveis que naturalmente se formam em qualquer país “civilizado”. A assimilação das diferenças já foi tomada como expressão de progresso, mas hoje buscamos formas de entender as várias culturas a partir daquilo que cada uma é.

O devido reconhecimento do valor da cultura alheia é por isso requerido pelos adeptos do multiculturalismo, e isso se traduz em políticas afirmativas que pretendem garantir a possibilidade de sobrevivência das práticas culturais características de um determinado grupo. Uma das consequências disso é que leis especiais podem ser criadas com o objetivo de atender às necessidades (religiosas, de língua, de território, etc.) de grupos culturais minoritários. Estas seriam leis aplicáveis aos indivíduos que pertencem a

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um grupo cultural específico, o qual não está disposto a se adequar a todas as normas e leis locais.

Além da reivindicação de ordem política por leis que ostentem um caráter multicultural, existe também o objetivo de que, enquanto cidadãos, nos tornemos mais conscientes da importância do respeito à diversidade cultural.

Será que somos realmente capazes de reconhecer as práticas e os costumes diferentes como sendo tão dignos quanto os nossos? Por que muitas vezes o nosso jeito de ver e de fazer as coisas parece “melhor” do que o jeito dos outros? Será que nos importamos com aqueles que não têm os mesmos hábitos e as mesmas opiniões que nós temos? Será que os nossos representantes políticos estão levando tais diferenças em consideração em suas propostas e projetos de lei?

Ao procurar as respostas para essas perguntas, precisamos lembrar que o Brasil compreende diversas versões daquilo que é “ser brasileiro”: alguns vivem nas grandes metrópoles, outros vivem no meio da floresta e em contato direto com a natureza. Se todos querem um país mais justo, pacífico e com reais chances de prosperar, temos de aprender a cultivar o respeito às nossas diferenças.

C

Willian Martini

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Isso é coisa de menina?

Podemos definir gênero como a identidade que a pessoa assume, o que pode depender de seu sexo biológico e de outros fatores psicológicos. Em sua maioria, as pessoas se identificam como pertencentes ao gênero feminino ou ao masculino, mas também pode haver outras identificações.

As questões de gênero estão ligadas a diferenças políticas e de poder entre as pessoas, as quais podem gerar desigualdades e injustiças. Historicamente, podemos constatar que as mulheres, por exemplo, sempre estiveram atrás dos homens na garantia de seus direitos.

Apesar de o voto feminino ser uma conquista consolidada há muitos anos, no Brasil as mulheres ainda não vivem plenamente sua cidadania: ainda há muitos obstáculos que se impõem, seja através de práticas sociais que as inferiorizam, seja por falhas do próprio Estado em garantir condições básicas para que isso aconteça.

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direitos podem ser observados na disparidade salarial entre homens e mulheres que ocupam o mesmo cargo, na carência de creches para que mães possam deixar seus filhos – o que, por sua vez, acarreta na impossibilidade de trabalhar e de se sustentar –, no julgamento social sofrido por aquelas que exercem sua liberdade de maneiras não convencionais e até mesmo nos altos índices de violência doméstica de que se tem registro.

Podemos encontrar as raízes da maioria destas situações na própria história, em que o papel da mulher branca era relegado ao cuidado da casa e dos filhos. Considerada incapaz de cuidar de si própria, ela passava de propriedade do pai para propriedade do marido. Já as mulheres negras tinham outra realidade: uma realidade de pobreza e discriminação que as levou a trabalhar em jornadas exaustivas por salários muito inferiores a qualquer outro. O trabalho doméstico, por sua vez, fosse nas famílias brancas ou negras, era sempre das mulheres. Além disso, elas eram consideradas fracas, emocionais e incapazes de agir moral e racionalmente como os homens. Assim, como seria permitido a elas os direitos já garantidos ao gênero masculino, se eram consideradas inferiores em todos os aspectos?

Atualmente, essas noções sobre o que caracteriza ser

mulher já não são aceitas, e caminhamos para uma visão mais

igualitária dos gêneros – de todo modo, ainda convivemos com discriminações que continuam a barrar a liberdade e a

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autonomia femininas. Isso acontece porque ainda há traços mais sutis dessa visão inferiorizante em nossa cultura: o corpo feminino continua a ser considerado algo a ser guardado para não perder seu valor; também persiste o pensamento de que o modo como as mulheres se comportam e se vestem pode permitir abusos e violências contra elas; os trabalhos domésticos ainda são considerados tarefas femininas; a violência doméstica tem como base a ideia de que a mulher é propriedade do homem e, portanto, é seu direito dispor dela como quiser; somado a isso, a falta de punição dos crimes cometidos contra elas favorece o clima de impunidade e insegurança.

O tratamento dispensado a cada gênero desde o nascimento molda o modo como vemos o mundo, nossos comportamentos, nossos interesses e nossas escolhas. Enquanto aos homens é comumente incentivada a criatividade, a expressão de opiniões e a participação na vida pública, às mulheres valoriza-se a beleza, a docilidade, a vontade de ser agradável aos outros. Essas diferenças formam cidadãos que participam da vida pública e que desempenham papéis importantes na sociedade – como políticos, líderes comunitários, empresários –, e cidadãs pouco atuantes nesses mesmos ambientes, uma vez que acabam assumindo funções mais modestas e do âmbito privado.

Apesar de também ocuparem algumas posições de destaque social, as mulheres ainda representam uma minoria

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nesses lugares, e o tratamento dispensado a elas é desigual justamente por conta dessa cultura em que estão inseridas: mesmo em posições de liderança, precisam lidar com pressões sociais para cuidar da beleza, casarem-se com um homem, ter filhos, manterem-se “femininas” mesmo que ocupem um cargo “masculino”.

Ainda assim, elas estão há bastante tempo inseridas no mercado de trabalho, o que geralmente implica em jornadas duplas ou triplas, já que acumulam o cuidado com os filhos e as tarefas domésticas. Quando têm condições de contratar alguém para essas funções, geralmente são também mulheres – em sua maioria negras e pobres –, as quais deixam seus próprios filhos para cuidar dos filhos das mulheres mais abastadas. Sendo assim, mais do que leis, é a nossa cultura que precisa considerar as mulheres como iguais aos homens de fato.

Essa mudança, porém, exige desde cedo uma valorização das meninas, considerando-as iguais em potencial criativo e intelectual, encorajando-as a desenvolver

todas as habilidades que venham a apresentar: não podemos

condicionar a realização de suas vidas a partir da beleza ou de suas conquistas amorosas.

Além disso, é importante que as próprias mulheres conscientizem-se sobre sua condição para que possam se empoderar: muitas vezes, os preconceitos são tão sutis e enraizados em nossa cultura que pensamos que são normais, sem perceber que eles são a causa de uma série

(21)

de violências e violações de direitos que possuímos como cidadãs. A condenação social de alguns comportamentos das mulheres está tão naturalizada que as próprias vítimas muitas vezes acreditam ser culpadas pelas violências – que não são necessariamente físicas – que sofrem.

Sobretudo, é preciso mostrar à sociedade como um todo algo que deveria ser óbvio: que as mulheres possuem o mesmo valor que os homens, isto é, nenhum comportamento

ou expressão do gênero feminino pode dar ou tirar o respeito que é intrínseco a todo ser humano.

C

Lúrian Possebon

(22)

Os outros animais

Na estrebaria, a avó tinha uma vaca preferida. Era a Mimosa.

A formosura do nome faz a gente pensar nas conversas que elas podiam ter, e nos tapinhas na barriga

rechonchuda depois do leite fresco.

Para a menina que olhava de longe, ficava sempre a pergunta sobre se as vacas iam pro céu depois do fim. Não dava para saber, mas ela preferia não arriscar. E esperava que continuassem placidamente

conversando com a avó ali mesmo, enquanto havia tempo.

De qualquer forma, em se tratando das vidas dos outros, não dava pra perder nenhum tempo. Para cada um, passa muito, muito depressa. Imaginar que a vida de sua amiga Laika dava só um pedaço da sua! E ela queria ficar por perto para saber como era viver uma vida de vaca, uma vida de galinha e uma vida de cachorro – desses que a gente vê

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passando o tempo tão despreocupadamente. (Embora ela soubesse de alguns que não eram felizes em

absoluto!)

E como era viver uma vida de tatu ou de passarinho ou de onça – esses que pareciam bem mais atarefados do que ela. (Devia dar uma baita trabalho procurar comida o dia todo!)

A avó nunca contava as conversas com Mimosa, por mais que insistisse. E era uma pena, porque decerto daria para saber alguma coisa do que significava para ela viver na casa da avó. E se ela quisesse um dia ir embora?

Não dava para saber, mas ela preferia não arriscar. Para saber como era viver uma vida de bicho, ela tinha que olhar para eles o tempo todo e eles tinham que estar por perto. E era uma pena que para alguns não desse tempo, que os levassem embora cedo demais, perplexos demais.

Ela não compreendia por que as outras pessoas

achavam isso tão desimportante, já que viviam ao lado deles tanto quanto ela. E não compreendia por que ela devia comer sem reclamar e sem ficar inventando histórias.

Mas, e se tivesse sido uma amiga de Mimosa? Ela preferia não arriscar.

C

Janyne Sattler

(24)

Como julgamos?

Os direitos e deveres ligados ao exercício da cidadania levam em conta o fato de que há ações que são consideradas corretas e erradas. Na Filosofia, a área que mais se preocupa em pensar sobre nossas ações e comportamentos é a Ética: a sua função é, entre outras coisas, questionar aquilo que as pessoas fazem em seu dia a dia. Mas este tipo de investigação filosófica pode contar também com o auxílio de áreas do conhecimento como a ciência e suas diversas subdivisões.

Imagine a seguinte situação: uma pessoa pergunta a outra se ela deseja participar de uma ação entre amigos para ajudar nos custos financeiros de um hospital, ela recusa e não participa da ação. Você acharia essa atitude correta ou errada? Agora pense em outra ocasião: alguém passa mal dentro de um ônibus e os demais passageiros não prestam nenhum socorro. Você julgaria a atitude como certa ou errada? Provavelmente, a maioria das pessoas entenderia o primeiro caso como normal e aceitável e o segundo como moralmente incorreto, mas se alguém perguntasse o motivo da diferença

(25)

nos julgamentos, as pessoas não saberiam responder. A ausência de uma resposta ocorre quando julgamos sem realizarmos um raciocínio, ou seja: há situações em que avaliamos algumas atitudes de forma inconsciente.

Mas quando julgamos sem raciocinar, julgamos baseados em quê? O que orienta estas opiniões? Em busca de um esclarecimento sobre as diferenças entre os julgamentos morais de ações semelhantes como as exemplificadas acima, alguns neurocientistas têm monitorado, através de imagens cerebrais, as atividades que ocorrem no cérebro das pessoas enquanto elas respondem a dilemas morais. Tais experimentos revelam que muitas vezes julgamos as ações como corretas ou erradas sem ao menos termos uma justificativa, guiados pelas emoções, por exemplo – uma reação bastante espontânea, impensada, da nossa parte.

O interesse da Ética sobre os resultados deste tipo de investigação está em apontar para a necessidade de conhecermos melhor o modo como funcionamos diante de certas circunstâncias cotidianas, levando-nos a uma reflexão mais consciente contra um julgamento apressado – até para que possamos decidir por nós mesmos se ajudamos uma instituição de caridade, um doente ou se atendemos a uma emergência, e por que.

É preciso salientar que o papel da ciência é tentar nos ajudar a compreender por que pensamos do modo como pensamos, sem a pretensão de dizer se os nossos julgamentos são adequados ou não.

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Cabe à Filosofia levantar a discussão acerca dos princípios da ética, propondo debates e incentivando o questionamento daquilo que é aceito ou repudiado, para que estas discussões façam parte da nossa cultura, no pleno exercício de nossa cidadania.

E este é apenas um de vários exemplos possíveis. Pense em todas as outras ocasiões em que a ciência efetivamente contribuiu para que compreendêssemos melhor o nosso próprio comportamento!

C

Úrsula Maria C. Lied

(27)

Descolei um smartphone,

e agora?

Ultimamente tem se falado bastante a respeito do impacto provocado pelos avanços tecnológicos em nossas vidas. Como veremos mais adiante, esse pode ser positivo ou negativo, e isso depende, em grande parte, do modo como iremos utilizar os produtos resultantes desses avanços. Em geral, não costumamos questionar o fato da tecnologia tornar nossas vidas menos complicadas. Entre outras coisas, ela auxilia na execução de uma série de tarefas que somos obrigados a realizar diariamente.

Imaginemos como deve ser difícil ter que escrever dispondo apenas de tinta nanquim e uma pena. Agora tentemos imaginar alguém escrevendo um livro inteiro fazendo uso apenas dessas ferramentas. Quanto trabalho! No passado, esse era um processo que poderia levar muito tempo. Hoje em dia, por outro lado, dispomos de computadores portáteis e impressoras a laser, editores

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de texto e corretores ortográficos, e para complementar, podemos realizar pesquisas na internet sobre praticamente qualquer coisa que seja de nosso interesse. Pensemos em qualquer coisa! Qualquer coisa mesmo! Os algoritmos de busca do Google provavelmente irão encontrar o que estamos procurando.

Nossos antepassados realmente deviam dispor de bastante tempo livre para conseguirem escrever livros inteiros usando somente penas e algum tipo de tinta pegajosa. E a verdade é que eles quase certamente tinham mesmo à disposição mais tempo livre do que nós; afinal, eles ainda não conheciam as diversas distrações da modernidade.

Se viagens no tempo se tornassem uma realidade, e a partir de agora fôssemos capazes de viajar até a Grécia antiga para bater um papo com Sócrates, e tentássemos explicar para ele a quantidade de tempo que gastamos tocando em objetos retangulares brilhantes, em vez de nos dedicarmos ao estudo da Filosofia, por exemplo, Sócrates certamente concluiria que somos um bando de indivíduos sem noção.

Seria difícil explicar para Sócrates que esses mesmos objetos estão entre os aparatos tecnológicos mais sofisticados de nossos tempos, e que, além disso, nos garantem o acesso a praticamente todo o conhecimento produzido no mundo desde muito antes do próprio Sócrates nascer. Se alguém finalmente obtivesse sucesso

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em explicar a Sócrates diante de que tipo de dispositivo nossos dedos indicadores se encontram durante longos períodos ociosos de nossos dias, e ele nos perguntasse o que fazemos com todo esse conhecimento que esses dispositivos podem proporcionar, Sócrates passaria a assumir, então, que realmente somos um bando de indivíduos sem noção, mesmo que ele nunca admitisse que soubesse qualquer coisa com certeza absoluta.

Honestamente, quem de nós liga para todo o conhecimento do mundo quando podemos ver vídeos de gatos fofos fazendo gatices na internet? Ou ter mais de mil amigos no Facebook? Ou conversar de graça com os conhecidos residentes em qualquer canto do mundo pelo

WhatsApp? Ou jogar Candy Crush Saga até as 4 h da manhã,

quando temos aula ou algum outro compromisso dentro de aproximadamente três horas?!

Um Smartphone é um exemplo de aparato tecnológico que nos permite tirar fotos, fazer vídeos, reproduzir música, realizar cálculos complexos, acessar a previsão do tempo, conversar com nossas mães e pais, nos guiar quando estamos perdidos em uma outra cidade. Ele pode nos fornecer informações sobre livros, lugares, pessoas, ideias, atividades, filmes e séries.

Um Smartphone também nos possibilita produzir nosso próprio conteúdo. Pela primeira vez na história da humanidade qualquer pessoa com um objeto retangular brilhante e sofisticado em suas mãos é capaz de mostrar

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para todo mundo o que pensa e como vê as coisas. As possibilidades são praticamente infinitas e não cabe aqui enumerar todas elas!

Independentemente de como a tecnologia pode facilitar ou melhorar nossas vidas, é preciso ter em mente que um uso responsável é algo que devemos sempre buscar fazer Não podemos simplesmente fazer o que bem entendermos com um Smartphone e sair impunes ou sem, eventualmente, causar prejuízos para outras pessoas. Portanto, o uso responsável de aparatos tecnológicos como Smartphones também é um exercício de cidadania! Evitemos ser trolls da internet! Não compartilhemos informações sem conferir suas fontes ou sem saber se elas são verdadeiras. Exercitemos nosso raciocínio crítico! Jamais compartilhemos informações pessoais de conhecidos que possam embaraçar ou atrapalhar suas vidas. Sejamos gentis e busquemos entender e respeitar as outras pessoas.

Temos a obrigação de mostrar para Sócrates que não somos apenas mais um bando de indivíduos sem noção que passam o dia inteiro rindo de memes na internet. Se nós realmente gostamos das facilidades proporcionadas pelos avanços tecnológicos, por que não dedicamos nosso tempo e energia para buscar compreender melhor como funcionam as coisas? Usemos nosso tempo para aprender linguagem de programação, por exemplo. Eventualmente, iremos descobrir como fazer Apps e Games e poderemos até

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mesmo descolar uma boa grana com isso.

Aproveitemos o fato de vivermos em uma era em que existem tantas facilidades. Façamos bom proveito delas! Temos o dever de ser responsáveis e exercer nossa cidadania através de um uso consciente da tecnologia que se encontra ao nosso redor!

C

Mateus Stein

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Uma ida ao cinema

Frequentemente ouço alguém dizendo que olhar um filme é como “desligar o cérebro”. As imagens passam tão rápido diante de seus olhos que você não consegue pensar. É como se o filme invadisse sua mente por meio dos seus olhos e ouvidos e substituísse seus pensamentos por um mundo onde nada é real.

Nesse mundo, um gorila gigante pode lutar contra um dinossauro, viajar ao espaço não é assim tão difícil e voltar no tempo é como dar um passeio no parque. Ao menos por duas horas, você realmente acredita nessas coisas. Se não acreditasse, não seria tão legal.

Basicamente, quando assiste a um filme você voluntariamente concorda em ser enganado. O que não é, nesse caso, algo negativo. Faz parte da experiência do filme deixar-se conduzir pelas imagens que lhe são mostradas. Mas será que isso é o mesmo que “desligar o cérebro”? Será que você perde a capacidade de raciocinar

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quando se senta em uma sala escura comendo pipoca e tomando refrigerante?

Prefiro a ideia de que assistir a um filme é como sonhar acordado. Ou como naquelas raras ocasiões em que você sabe que está sonhando. A diferença é que o filme é um sonho compartilhado e que, muitas vezes, convida seus espectadores a imaginar como seria se houvesse um robô capaz de pensar ( como acontece nos filmes Inteligência

Artificial, Eu Robô e Her); se pudéssemos viajar no tempo (De Volta para o Futuro); se a vida fosse um sonho gerado por

uma máquina (Matrix) e assim por diante.

Essas perguntas funcionam do mesmo modo que os ‘experimentos de pensamento’ que os filósofos costumam criar para refletir sobre um assunto. São situações imaginárias que servem para ilustrar dúvidas que todos nós tivemos em algum momento em nossa vida.

Filmes como De volta para o futuro e Efeito Borboleta, por exemplo, apresentam diversas questões que nos fazem pensar sobre o impacto de nossas ações na vida dos outros. De volta para o futuro mostra como a mudança de um acontecimento pode alterar elementos chave do destino de um grupo de pessoas – os traços de personalidade, a profissão e a classe social. Em Efeito Borboleta a mudança afeta muito mais do que isso – a vida ou a morte, a loucura ou a sanidade, a doença ou a saúde. Seguindo a teoria que nomeia o filme, um pequeno evento pode ser a causa de

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uma cadeia de acontecimentos absurdamente maiores. Estes filmes nos fazem refletir sobre “Quais foram os momentos mais importantes da minha vida?” Outra pergunta importante é “Se eu pudesse viajar no tempo o que eu mudaria?”. Talvez consertar algum erro ou uma decisão importante. Seria ótimo poder fazer tudo isso, mas vivemos em um mundo no qual a viajem no tempo não é uma possibilidade. Possuímos apenas uma tentativa para fazer tudo certo, ou, pelo menos, o melhor possível. Assim, nossa única solução é procurar viver de forma que jamais precisemos de uma máquina do tempo.

C

Guilherme Pinto Ravazi

Graduado em Filosofia pela UFSM Graduando em Letras pela UFSM

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Um super-herói

responsável

Dentro da nossa cultura, encontramos uma grande variedade daquelas frases impactantes, carregadas de sabedoria, que chamam a nossa atenção imediatamente. Podemos nomeá-las de máximas. Em diversos momentos, as máximas nos inspiram a refletir sobre a maneira como conduzimos a nossa vida. Este breve texto é um desses momentos.

Certa vez, um pensador nascido nas páginas das histórias em quadrinhos disse: “Grandes poderes

trazem grandes responsabilidades”. Esta frase, dita pelo

Tio Ben, tornou-se uma espécie de guia para o seu sobrinho, Peter Parker, o Homem-Aranha. Talvez ela possa se tornar para nós também.

Vou supor que você também já tenha imaginado como seria possuir um superpoder como, por exemplo: a capacidade de voar apenas com o próprio corpo, um soco

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capaz de arrasar quarteirões ou a habilidade de transitar pela cidade num piscar de olhos. O que você poderia fazer

com tanto poder? Quem sabe arranjar algum dinheiro ou

intimidar quem se opusesse a você. Inicialmente, antes de se tornar o Homem-Aranha, Peter Parker pensava assim. Parece uma decisão simples, afinal, o que há demais em agir como se deseja?

Todas as nossas ações ou omissões trazem consequências, seja para nós, seja para os outros. Algumas dessas consequências são trágicas. No caso de Peter, a sua escolha em pensar apenas nos próprios interesses, isto é, a sua omissão em relação aos problemas alheios, levou à morte o seu próprio tio. Claro, as situações ou decisões do nosso cotidiano nem sempre estão carregadas com tamanha dramaticidade – ao menos aparentemente.

Você pode concordar comigo, ou talvez não, mas vou arriscar uma breve reflexão. Embora não tenhamos super habilidades, todos nós temos poderes capazes de afetar quem somos, o meio em que vivemos e as pessoas com quem convivemos. Quando usamos os nossos poderes de maneira irresponsável, arriscamos trazer prejuízos ao mundo. Além disso, se não nos responsabilizamos pelos efeitos negativos das nossas ações, corremos o risco de manter esses prejuízos no mundo. Quero dizer: somos

responsáveis por nossas escolhas.

Como observamos nas histórias em quadrinhos ou no cinema, às vezes, viver com responsabilidade traz

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desvantagens e exige uma reflexão constante. Quem sabe, por um lado, essa capacidade de suportar o peso dessas desvantagens e, por outro lado, essa preocupação em procurar a melhor escolha possível, sejam dois motivos que nos levem a identificar os super-heróis como símbolos da bondade?

Para agirmos com responsabilidade, precisamos refletir sobre as nossas escolhas e mantermos a firmeza para respondermos pelos seus efeitos. Talvez essa seja a mensagem ou uma das mensagens possíveis desta história sobre poderes e responsabilidades. Mas não vamos parar por aqui, continuemos a nos perguntar.

Será que está tudo bem se o mais forte abusar do mais fraco? Por que o Homem-Aranha ajuda aqueles que poderia dominar? Grandes poderes trazem apenas grandes privilégios ou Tio Ben tem razão? O que tudo isso tem a ver com a nossa vida?

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Jean M. Senhorinho

Graduado em Jornalismo pela UFSM Mestrando em Filosofia pela UFSM

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O que é felicidade?

Por que fazemos tudo que fazemos? O que dá sentido para nossa vida? Para que serve viver? Independente do jeito que você pensa ser certo viver, das escolhas que faz, do que você faz com sua vida ou do que a sua vida faz com você, se tem algo que você realmente quer, que você espera ter na vida, é felicidade. É pouco provável que você encontre alguém que diga, sinceramente, que vive para encontrar tristeza, ou que simplesmente não está preocupado em ser feliz. Foi um filósofo chamado Aristóteles quem primeiro disse que, no fim das contas, tudo o que fazemos é com uma finalidade: a de encontrar felicidade.

Mas, o que é felicidade?

Há muitas respostas possíveis. Para a indústria farmacêutica, a felicidade é uma questão de equilíbrio das substâncias em nosso cérebro. Corrige-se a tristeza com

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remédios, portanto. Para os gurus da autoestima e vendedores de princípios, a felicidade é uma fórmula: comprando um livro com dez passos básicos você aprende o que é e como ser feliz. Para muitas religiões, a felicidade é uma coisa que está depois desta vida. E para uma sociedade consumista, felicidade é possuir coisas, na esperança de que a admiração alheia lhe confira o sentido que as coisas não podem lhe dar... Todas essas são respostas fáceis e se você puder ser feliz com esse tipo de resposta, fazendo as escolhas que elas exigem e vivendo a vida que elas propõem, então não há mais nenhum problema.

Mas, se respostas tão fáceis dessem mesmo conta de proporcionar uma felicidade suficiente, certamente já teríamos extinguido do mundo a depressão e todos os parentes dela: o mau humor crônico, a melancolia exagerada, a chatice doentia dos mal resolvidos e o triste hábito que algumas pessoas têm de cuidar da vida alheia. Não parece ser este o caso. Então, aqui, a Filosofia talvez possa nos ajudar um pouco.

Tratar filosoficamente um problema é não se contentar com respostas fáceis, mas permitir-se pensar para além do que é tido como certo, do que é respondido corriqueiramente e aceito sem maiores reflexões. É por isso que na filosofia acabamos encontrando muito mais perguntas do que respostas. Mas assim, pelo menos, podemos nos livrar daquelas que não nos servem.

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Por que é que não nos serve a resposta que diz que a vida feliz é a que consegue juntar mais coisas? Não é porque as coisas não tragam felicidade alguma quando enfim as possuímos, mas porque essa felicidade não é durável e também porque somos induzidos a um erro quando identificamos uma coisa, um lugar, ou até mesmo uma pessoa, com a felicidade: o erro de confundir uma causa com a própria coisa.

Parece difícil, mas não é. Imagine que em um dia insuportavelmente quente alguém lhe dê um picolé de limão. Você sentirá alegria em degustá-lo, principalmente se você gostar de picolés de limão. Nenhum problema há nisso. Mas se você passar a acreditar que picolé de limão é a felicidade, aí sim há um grande problema: uma coisa que em certo momento lhe proporcionou alguma alegria não é a própria felicidade. É provável que você rapidamente enjoe de picolés de limão e que, no inverno, você passe a acreditar que a felicidade, na verdade, está em tomar um bom chocolate quente: mas você apenas terá trocado uma coisa por outra.

Dessa forma, será necessário estar sempre em busca de outra coisa, enquanto a vida passa e a felicidade, que você desejaria que fosse duradoura, não consegue se estender para além de breves momentos alegres.

Epicuro, outro grande filósofo grego, percebeu que se acreditarmos que a felicidade está no fim de uma busca, em um ‘final feliz’, é provável que termine a vida

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antes que chegue o dia em que nos consideremos de fato felizes. Felicidade é sentir-se feliz: eis uma resposta óbvia!

Mas é muito difícil sentir-se feliz se você sente que sempre falta alguma coisa. Os momentos realmente felizes são aqueles

que valem por eles mesmos, momentos em que sentimos que a vida vale a pena ser vivida, momentos que não são vividos em função de outros, momentos em que nos sentimos satisfeitos apenas por poder viver o momento que vivemos. É feliz quem aprende, apesar das dores que inevitavelmente a vida tem, a fazer suas escolhas e orientar sua vida de forma a ter tantos momentos assim quanto possível for. E como se aprende isso?!

Infelizmente, não existe uma fórmula. E é exatamente porque não existe uma fórmula que sirva para todo mundo que esta é uma questão filosófica. Da mesma forma que ninguém além de você mesmo pode fazer suas escolhas, ninguém poderá filosofar por você. As respostas fáceis sobre como proceder para encontrar a felicidade não lhe servem porque você precisa da resposta que apenas você mesmo pode se dar, e não é possível encontrá-la sem observar e refletir sobre a própria vida...

Nos livros que os filósofos escrevem, aprendemos a pensar sobre questões de que ainda não havíamos nos dado conta, mas de nada lhe servirão se você não se dispuser a filosofar. Claro que pensar sobre si mesmo, refletir sobre suas ações e sentimentos, aprender a viver e conviver de um jeito que seja melhor e mais feliz não é fácil e não se termina

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da noite para o dia. Mas, se você não começar, ninguém vai começar por você: porque ninguém pode ser feliz por você!

No começo deste texto a pergunta era ‘o que é

felicidade?’, agora a pergunta é: ‘o que é felicidade para você?!’

Aliás, usei tantas vezes o pronome ‘você’ para deixar bem claro que a felicidade é uma busca muito pessoal. Pensar filosoficamente sobre este problema certamente lhe trará muito mais dúvidas do que certezas. Mas talvez as incertezas lhe digam muito mais sobre a vida do que as supostas respostas certas.E já que a vida não vem com manual de instruções: por que você mesmo não escreve o seu?!

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Marcos Antonio Maffisoni

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Minhas reflexões

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Referências

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