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Sistema Publico Comunicacao Brasil livro

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Texto

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SiStema público

de comunicação

no braSil:

aS conquiStaS e

oS deSafioS

(2)

S i S t e m a p ú b l i c o d e c o m u n i c a ç ã o :

o q u e é e p a r a o q u e S e r v e ?

É possível encontrar diversos conceitos ou definições acerca do que podemos chamar de sistema público de

comunicação, seja em livros, pesquisas ou documentos oficiais. Geralmente, evoca-se o horizonte educativo e

cultural inerente a estas mídias. Em outros momentos, enfatiza-se o fato de serem empresas não-comerciais. Há ainda a noção de que mídia pública é aquela que cumpre o papel de dar visibilidade ao debate público, sendo autônoma em relação ao mercado e também livre das amarras ou das ingerências governamentais. Essas variadas ênfases ou visões são fruto das influências que a idéia de comunicação pública absorveu em seu per-curso histórico durante boa parte do século XX.

A definição atual de “mídia pública” incorpora essas facetas e sustenta algumas outras características relevan-tes, algo que podemos resumir nos seguintes termos: mídia pública é um meio de comunicação onde não se prevê atividade comercial direcionada à obtenção de lucro para proprietários particulares ou acionistas pri-vados e que apresenta, simultaneamente, algum nível de participação pública em seu gerenciamento. Quanto mais autônoma em relação ao mercado, quanto mais livre de ingerências governamentais e quanto mais aberta e predisposta à participação do cidadão, mais forte e qualificado é o adjetivo “público”.

Quando se fala em sistema público de comunicação pensa-se justamente em um conjunto de mídias públicas (nos diversos suportes como rádio, televisão, internet etc.) que operam de modo integrado e sistêmico, tendo como horizonte o interesse dos cidadãos.

Para o professor da Universidade de São Paulo (USP), sociólogo, jornalista e doutor em Ciências da Comunica-ção Laurindo Leal Filho – um dos pioneiros na pesquisa sobre mídia pública no Brasil – este não é um conceito fechado. “Em princípio, todo o sistema de comunicação deveria ser público, uma vez que a sua missão é pres-tar um serviço público. Nesse sentido, poderiam até variar as formas de financiamento, mas o controle deve

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ser da sociedade. De algum modo, é o que acontece em alguns países onde órgãos reguladores estabelecem as diretrizes para o todo o setor das comunicações eletrônicas. De maneira mais restrita, costumamos chamar de público o sistema não-comercial e, de alguma forma, independente do Estado. E aí temos inúmeras nuances: de sistemas ditos públicos, mas que sofrem forte controle estatal, até outros onde essa relação é tênue”, explica Leal Filho, que também exerce a função de ouvidor da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

É possível apontar duas dimensões que podem ser determinantes para caracterizar uma mídia pública: a ori-gem do financiamento e o seu modo de gestão.

Se os recursos financeiros que sustentam uma instituição de mídia originam-se fundamentalmente na comer-cialização de sua audiência no mercado publicitário, seu perfil terá dificuldades em se encaixar na noção de mídia pública (ainda que, ressalte-se, este opere um serviço público através de uma concessão pública, como ocorre com o rádio e TV).

Se a gestão desta instituição estiver restrita às decisões de proprietários privados com fins comerciais ou sub-metida a estruturas governamentais, também há objeções para defini-la como pública. Ao mesmo tempo que uma rádio, TV ou agência de notícias pública necessitam de autonomia frente ao mercado, precisam também de autonomia face às influências políticas governamentais para cumprir o seu papel de servir ao interesse dos cidadãos.

Meios de comunicação de massa financiados por dinheiro público e livre do controle privado comercial têm sido um modelo de comunicação bastante explorado e consolidado na maioria das democracias modernas. Trata-se de algo tão antigo quanto o próprio surgimento da TV e do rádio. Diversos países sustentam hoje robustas corporações de mídia pública que concentram substancial fatia da audiência e são reconhecidas pela qualidade no conteúdo que produzem e transmitem. Uma das mais antigas em operação é a BBC do Reino Unido, criada nos anos 1920. A BBC tem servido como um modelo para muitas outras experiências que surgi-ram durante todo o século passado.

Do ponto de vista da legitimidade e relevância, os sistemas públicos de comunicação operantes hoje no mundo sustentam um alto grau de aprovação social. Segundo pesquisa realizada no ano de 2006 em sete países (Fran-ça, Coréia do Sul, Alemanha, Reino Unido, Itália, Estados Unidos e Japão) pelo Instituto NHK de Pesquisa em Radiodifusão (NHK Broadcasting Culture Research Institute), 4 em cada 5 cidadãos consideram necessário existir um sistema público de comunicação. Em países como Alemanha, Japão e Reino Unido – onde há co-brança de imposto específico que financia mídias públicas – 60% dos entrevistados consideraram importante pagar este tipo de tributo para sustentar tais corporações.

No Brasil, falar em mídia pública parece não despertar a mesma simpatia. Isso ocorre devido ao fato de o deba-te sobre o deba-tema deba-ter sido apagado durandeba-te quase todo o século XX. Não por acaso o país desenvolveu um sisdeba-tema de comunicação de perfil majoritariamente comercial – principalmente sob o incentivo do regime militar após os anos 60 – e relegou o projeto de um sistema público de comunicação ao esquecimento, subsistindo apenas através de algumas experiências isoladas. Como explica o professor da Universidade de Brasília (UnB) e dou-tor em Comunicação pela Universidade de Missouri-Columbia (EUA), Murilo César Ramos, a radiodifusão

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no Brasil nasceu pública, na forma da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, criada por Edgard Roquette-Pinto e Henrique Moritze em 1923, mas foi muito cedo transformada em um sistema comercial lucrativo. “Assim, quando a televisão chegou, nos anos 1950, já chegou comercial, privatizada e desregulamentada ao extremo, e assim permanece até hoje. O público não-comercial sempre foi marginal e assim permanece até hoje, apesar da esperança que foi – e é – a criação da Empresa Brasil de Comunicação, a EBC, e a constituição da Associação das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais, a Abepec”, analisa Ramos, que também é membro do Conselho Curador da EBC.

O fato deste debate ter sido abafado ao longo dos anos fez com que, no Brasil, pouco se saiba sobre o real papel da mídia pública, fazendo vingar uma visão distorcida a seu respeito. “A sociedade brasileira convive com o modelo comercial achando que ele é único, o que impede qualquer reivindicação transformadora. As iniciati-vas de radiodifusão pública que surgem a partir do final da década de 1960 no Brasil são tímidas e sem forças para concorrer com o modelo hegemônico estabelecido. Sofrem da falta de recursos, das ingerências político-partidárias e da ausência de programas de ação de médio e longo prazo. Além das pressões abertas ou veladas dos radiodifusores comerciais contra uma possível concorrência do modelo público”, acrescenta o professor Laurindo Leal Filho.

Para Murilo César Ramos, a consolidação da democracia no Brasil passa pelo desenvolvimento de um sistema público de comunicação. “É absolutamente essencial. É, junto com o fortalecimento das organizações sociais de base e do sistema político, a chave para a democratização social crescente em todo o mundo. O fortaleci-mento da radiodifusão pública é um dos grandes desafios, se não o maior, das políticas de comunicações no Brasil”, ressalta.

Independência e autonomia

“O modelo de serviço público foi baseado na idéia de que nem o mercado nem o Estado poderiam satisfazer adequadamente os objetivos do serviço de radiodifusão e agir pelo interesse público; na verdade, sentiu-se que o interesse público não coincide nem com interesses privados ou com interesses dos poderes políticos constituídos.” (Relatório da Unesco de 2001, intitulado “Radiodifusão pública: Porque? Como?” [Public Broadcasting: Why? How?])

Comunicação pública como contraponto

“A radiodifusão pública aparece em muitos países, especialmente na Europa, como um contraponto ao poder que o privado poderia ter sobre o público em razão dessa posição assimétrica. A comunicação pública tem servido, nos países democráticos, como parâmetro de competência e credibilidade no trato da informação.” (César Ricardo Bolaño, Universidade Federal de Sergipe)

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Produção independente

“Só há um fortalecimento do campo público de comunicação se houver uma aproximação estreita com a área cultural e o segmento da produção independente de conteúdos

audiovisuais. Quanto mais a produção for concentrada nas emissoras, mais dificuldade teremos. Temos que fazer essa parceria com os produtores independentes. Agora, sem perder de vista que há uma linguagem que é característica da TV.” (Regina Lima, Abepec)

Mais gente produzindo, mais diversidade

“Aposto mais no micro que no macro. Não quero dizer que não deva haver previsão de investimentos do orçamento e de fundos privados em produção de programas e programações de maior amplitude, mas preferia que houvesse mais incentivo a iniciativas mais pontuais, mais locais, como vem sendo feito aos poucos nos Pontos de Cultura, em algumas escolas e comunidades com o apoio de ONGs e/ou prefeituras. O investimento para a democratização da mídia é de longo prazo, exige uma mudança de comportamento em relação ao meio. Quanto mais gente produzindo hoje, mais diversidade e qualidade teremos em alguns anos. Mas isso tem que ser uma política nacional, que envolva recursos federais estaduais, municipais e privados.” (José Edgard Rebouças, Universidade Federal do Espírito Santo)

Programação da TV pública

“O II Fórum Nacional de TVs Públicas reivindica: - Formação e qualificação técnica e em gestão dos profissionais de comunicação e telecomunicação do campo público de televisão; - Fomento à estruturação de grupos de trabalho permanente, com formato de laboratório e participação de todas as vertentes do campo público de televisão, para a realização de pesquisa e desenvolvimento em inovação de linguagem, em conteúdos para convergência digital, criação de novos formatos de programação elaborados a partir das possibilidades interativas do público com a TV digital, multiprogramação, acessibilidade e usabilidade do controle remoto usado como miniteclado; - Fomento à produção independente, através da construção compartilhada com produtoras independentes, TVs Públicas, Ministério da Cultura, por meio da Secretaria do Audiovisual, e Agencia Nacional de Cinema (Ancine) de editais públicos específicos que considerem a vocação do campo público de televisão; - Fomento à produção cidadã, de conteúdos realizados diretamente pela sociedade, mediante a incorporação de modelos de produção audiovisual baseados na cultura colaborativa, compartilhada e participativa; - Fortalecimento e abertura de espaços para a veiculação dessas produções nas TVs do campo público, além da implementação de políticas de estímulo e fomento a esses modelos de produção, nos moldes do item anterior; - Realização de inventário, digitalização e disponibilização de acervos locais existentes.” (Trecho de documento de conclusões do II Fórum Nacional de TVs Públicas)

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p r i n c í p i o S d a m í d i a p ú b l i c a

S e g u n d o a u n e S c o

Em um relatório publicado em 2001 intitulado “Radiodifusão pública: Porque ? Como?” (no original, “Public

Broadcasting: Why? How?”), a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e Cultura (Unesco)

apontou quatro princípios a serem seguidos pela radiodifusão pública. São diretrizes e metas que tentam dar conta das diversas funções e facetas deste segmento de mídia. Veja abaixo alguns trechos do documento1:

a) Universalidade - A radiodifusão pública deve ser acessível a todos os cidadãos em todo o país. Esta é uma

meta profundamente igualitária e democrática, na medida em que coloca todos os cidadãos em pé de igualda-de, independentemente do seu status social ou econômico. Isso força a emissora pública a estar voltada para toda a população, buscando ser utilizada pelo maior número possível de pessoas. Isso não significa que a radio-difusão pública deve tentar otimizar seus índices de audiência em todos os momentos, como fazem as mídias comerciais. Devem, na verdade, esforçar-se para fazer a totalidade da sua programação acessível a toda a po-pulação. Isto não se limita a acessibilidade técnica, mas garantir que todos possam compreender e acompanhar esse conteúdo. Sendo democrática, a programação de serviço público de radiodifusão deve ser “popular”, não no sentido pejorativo que alguns possam dar a este termo, mas no sentido de que o fórum público que oferece não pode ser restrito a um grupo minoritário de cidadãos.

b) Diversidade - o serviço oferecido pela radiodifusão pública deve ser diversificado, pelo menos em três

mo-dos: no que se refere aos gêneros de programas oferecidos; no que diz respeito ao público visado e no tocante aos assuntos discutidos. A radiodifusão pública deve refletir a diversidade de interesses públicos, oferecendo diferentes tipos de programas, mediante transmissão de informação clara. Alguns programas podem ser desti-nados a apenas uma parte do público, cujas expectativas são variadas. No final, a radiodifusão pública deverá 1 Tradução livre a partir do original disponível em http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001240/124058Eo.pdf

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chegar a todos, não através de cada programa, mas através de todos os programas e sua diversidade. Final-mente, através da diversidade dos temas discutidos, a radiodifusão pública também deve procurar responder aos variados interesses do público e assim refletir toda a gama de assuntos atuais na sociedade. Diversidade e universalidade são complementares na medida em que produzir programas voltados às vezes para a juventude, às vezes para as pessoas idosas e às vezes para outros grupos, em última análise, significa que a comunicação pública atingiu a todos.

c) Independência - A radiodifusão pública é um fórum onde as idéias devem ser expressas livremente, onde

a informação, opiniões e críticas circulam. Isso só é possível se a independência – portanto a liberdade – da radiodifusão pública for assegurada contra pressões comerciais ou influência política. [...] Com efeito, se infor-mações fornecidas pela emissora pública forem influenciados pelo governo, as pessoas deixam de acreditar. Da mesma forma, se a programação da emissora pública for projetada para fins comerciais, os cidadãos não irão compreender porque estão sendo solicitados a financiar um serviço cujos programas não sejam substancial-mente diferentes dos serviços prestados por empresas privadas.

e) Diferenciação - Exige que o serviço oferecido pela radiodifusão pública deve se distinguir de outros serviços

de radiodifusão. Na programação de serviço público – na qualidade e caráter especial de seus programas – o público deve ser capaz de identificar o que distingue este serviço de outros serviços. Não é apenas uma questão de produzir o tipo de programas que os outros serviços não estão interessados em produzir, visando audiên-cias negligenciadas ou lidando com assuntos ignorados pelas outras mídias. É uma questão de fazer as coisas de forma diferente, sem exclusão de qualquer gênero. Este princípio deve conduzir emissoras públicas para inovar, criar novas faixas horárias, gêneros novos, definir o ritmo do mundo audiovisual e trazer outras redes de radiodifusão na sua esteira.

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a m í d i a p ú b l i c a n o m u n d o

e n o b r a S i l

A idéia de mídia pública surge com as primeiras experiências de estações de rádio ainda na década de 1920. Na Europa, a BBC surgiu em 1922, em Londres, como um conglomerado de grupos empresariais ligados à fabri-cação de equipamentos eletrônicos. Logo em seguida, em 1927, passou a ser controlada pelo governo britânico, tornando o serviço de rádio um monopólio público. No mesmo período, nas Américas, emergem as primeiras rádios de cunho educativo gestadas em universidades nos Estados Unidos. Ao final dos anos 50, após a chegada da televisão, diversos países criaram estações de rádio e TV pública que passaram a constituir um sistema de mídia (rádios e TVs) financiado com recursos públicos.

Em países como o Canadá e a Austrália, organizações de radiodifusão pública foram projetadas justamente para garantir pluralidade de vozes e fomentar a produção de conteúdo nacional. No caso canadense, a emer-gência de estações radiofônicas vinculadas a grupos religiosos ortodoxos e a invasão da produção da TV co-mercial estadunidense foram elementos propulsores para a criação da CBC/SRC como um contraponto: um equilíbrio necessário ao sistema de comunicação que crescia de modo pouco diversificado.

Na experiência australiana, o serviço de radiodifusão pública foi responsável por levar informação e conteúdo para as áreas mais remotas do país, onde a mídia comercial não estava propensa a investir recursos inicialmen-te. Durante o século XX, o Estado australiano criou duas organizações de radiodifusão pública: a ABC, voltada para produzir e transmitir conteúdo em língua inglesa; e a SBS, cujo objetivo é refletir a diversidade cultural do país, transmitindo conteúdo em 68 idiomas, incluindo línguas nativas. Nesses e em outros países, organi-zações de mídia pública floresceram principalmente na segunda metade do século XX como um mecanismo necessário às democracias modernas, buscando pluralidade e inovação na produção e transmissão de conteú-do e crianconteú-do mecanismos de financiamento público e de participação civil na sua gestão, através de conselhos diretores, comitês de audiência e outras instâncias similares.

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No Brasil, a radiodifusão pública nasce na década de 30, através de duas iniciativas. A primeira foi a Rádio MEC (vinculada ao então Ministério da Educação e Cultura), nascida a partir da doação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro por Edgard Roquette-Pinto. Neste caso, o doador condicionou a transferência à manutenção do caráter educativo da emissora que até hoje mantém de certo modo tal perfil. A segunda foi a Rádio Nacio-nal do Rio de Janeiro, criada em 1936 pelas Organizações Victor Costa e incorporada pelo governo de Getúlio Vargas em 1940.

Após estas duas sementes, a demanda por educação no país fez com que o regime militar dos anos 60 fomen-tasse a criação das TVs educativas, através do Decreto-Lei 236/1967 e da criação da Fundação Centro Brasilei-ro de TV Educativa (FCBTVE).

Ao contrário do resto do mundo, que apostou na criação de um sistema público de radiodifusão com estações de TV e rádio operantes em territórios nacionais relativamente integrados e buscando um equilíbrio com o sistema privado de mídia, no Brasil não houve tal perspectiva. Primeiro, as iniciativas de rádios e TVs de ca-ráter público nunca chegaram a funcionar como um sistema integrado. Tornaram-se emissoras que operavam e transmitiam de modo isolado e com baixíssimos investimentos em equipamentos e produção. Segundo, no caso das TVs educativas, prevaleceu um modelo de forte influência dos governos estaduais, com estes determi-nando diretamente a gestão e gerência dessas emissoras.

O resultado foi um subdesenvolvimento da radiodifusão pública-estatal, que foi ao mesmo tempo engessada e fragmentada, apresentando sérios problemas estruturais e financeiros e pouca independência para cumprir sua missão. Por outro lado, gerou-se no Brasil uma anomalia caracterizada pela sobreposição da radiodifusão comercial que desenvolveu um mercado concentrado e robusto de emissoras a ponto de se tornar o modelo hegemônico no país até os dias atuais.

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a comunicação pública-estatal no brasil

1936

Doação da Rádio MEC por Edgard Roquette-Pinto ao governo

federal

1940

Incorporação da Rádio Nacional pelo governo Getúlio Vargas

1967

Decreto-Lei n. 236, cria as TVs educativas e um órgão voltado para

o seu fomento: a Fundação Centro Brasileiro de TV Educativa (FCBTVE)

1968

Criada a primeira TV universitária, em Pernambuco

1969

Governo de São Paulo adquire a TV Cultura

1975

Entra em funcionamento a TVE do Rio de Janeiro. O governo

Federal cria a Radiobrás.

1980

Empresas coordenadas pelo FCBTVE criam o Sistema Nacional de

Radiodifusão Educativa (Sinred)

1988

Promulgada a Constituição, com o artigo 223 que fala na

complementariedade entre os sistemas público, privado e estatal

2006

I Fórum Nacional de TVs Públicas

2007

Decreto 6.246 cria a Empresa Brasil de Comunicação (EBC)

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a c o n S t i t u i ç ã o d e 1 9 8 8

e o S S i S t e m a S d e r a d i o d i f u S ã o :

o l u g a r d a m í d i a p ú b l i c a

Apesar do não fomento ao modelo público de radiodifusão no Brasil e mesmo diante de um quadro regulatório que sempre foi omisso em relação a este tema, a Constituição de 1988 em seu artigo 223 acabou reenquadran-do o lugar da mídia pública dentro daquilo que chamou de “sistemas complementares”. O texto – aprovareenquadran-do sob pressão de segmentos da sociedade civil e de movimentos sociais – diz que “compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e ima-gens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal.” Na prática, isso significava dizer que o conjunto da radiodifusão deveria ser regulamentado buscando um equilíbrio entre essas três formas de organização de serviços midiáticos.

Como explica o advogado e doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) Ericson Meister Scorsim, esta divisão que coloca a complementariedade entre três modelos de radiodifusão não foi prevista em outros países e avalia: “Penso que o constituinte brasileiro foi sábio ao adotar o princípio da complementaridade en-tre os sistemas de radiodifusão privado, público e estatal. Trata-se de uma fórmula de compromisso enen-tre as diversas ideologias presentes no cenário nacional à época da discussão do capítulo constitucional dedicado à Comunicação Social.”

Para o professor da Universidade Federal da Bahia (UFBa) e doutor em Comunicação pela Universidade de Westminster (Inglaterra), Othon Fernando Jambeiro Barbosa, isso se deu justamente devido ao contexto de correlação de forças, articulações e negociações políticas da constituinte, o que também significou efeitos prá-ticos. “Creio que a solução brasileira foi um solução de compromisso, feita sob a tensão política que se

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estabele-ceu na reta final da conclusão da Constituição de 1988. O certo é que ficamos com esta complementaridade não conceituada (quem complementa quem e como?) e inédita na regulamentação brasileira de telecomunicações. Não tenho qualquer ilusão com relação à factibilidade deste dispositivo constitucional: foi feito – não tenho qualquer dúvida disto – para não ser aplicado.”

Embora seja de direito mas não de fato, o atual quadro legal está longe de ser unânime entre especialistas e estudiosos. Na opinião do professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e doutor em Comu-nicação e Cultura Contemporânea pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Valério Cruz Brittos, o modelo deveria ser outro, pois, ao separar o público do estatal acaba-se sugerindo que estatal não é público. “Isso seria um problema, porque quando o Estado entra para prover serviços públicos à população, seja para a saúde ou educação, não deixa de ser caracterizado como público. Então, quando temos a comunicação estatal, em qual-quer plano, ela é necessariamente pública. O ideal é pensar que existe um sistema privado e um público, esse podendo ser gestado pelo Estado, e não dividindo o público em dois“, contesta.

Ao falar das conclusões da sua pesquisa de mestrado sobre o tema, defendida recentemente na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a jornalista Mariana Martins também reforça as críticas. “Acho que essa não é a melhor forma de complementar os sistemas. Não só em outros países, mas na própria legislação brasileira, se observarmos outros setores, essa divisão não existe. Esta divisão da comunicação é algo bem peculiar e tam-bém bastante conjuntural do momento em que essa Constituição foi outorgada. O artigo 223 é uma armadilha normativa. Concluo que esta divisão é um equívoco motivado por uma conjuntura anti-estatal do final da década de 80.”

O professor Murilo Ramos vê neste capítulo da Constituição uma saída que beneficiou principalmente o seg-mento comercial-privado que teria galgado um status inexistente. “Na minha opinião, não existe sistema pri-vado de radiodifusão; o que existe é, por concessão, o Estado autorizar o pripri-vado a explorar comercialmente o serviço público de TV e rádio, utilizando, para isso, o instituto da concessão, permissão e autorização. Esta suposta complementaridade acabou sendo uma armadilha, porque aparenta ter um sistema privado. Quando se trata de outorga de concessão e permissão, não existe. Já na autorização, pode-se admiti-lo, uma vez que ela difere dos demais institutos em relação ao equilíbrio entre direitos e deveres. Advogando a existência do sistema privado, os radiodifusores comerciais querem a máxima segurança jurídica com máxima liberdade de mercado”, afirma.

Já para o professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e doutor em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo José Edgard Rebouças, o atual formato não deve ser visto como uma divisão e sim uma soma. “Eu gosto deste modelo, que deveria ser uma complementaridade, e não uma divisão. Não entendo complementaridade como 33,3%, 33,3% e 33,3%, mas 100% de intercâmbio o tempo todo, com co-produções e co-programações. Um exemplo disso seria o acordo que a TV Globo fez com a TV Cultura de São Paulo no início dos anos 1970 para realizarem a versão brasileira de Vila Sésamo. Cada um entrava com uma parte. O que defendo é a soma, não a divisão. Um completando o outro, sendo o resultado o interesse público, e não vejo problema em que isso gere lucro, contanto que haja políticas claras quanto a não ingerência exclusivamente comercial nos conteúdos e ao reinvestimento de parte de tais receitas em programas e progra-mações que garantam a diversidade”, argumenta.

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Embora a idéia de três sub-sistemas complementares seja aceita por uns e contestada por outros, boa parte dos pesquisadores e entidades que se dedicam ao tema da comunicação acreditam na necessidade de se pensar a radiodifusão no âmbito de uma nova regulamentação para o setor. Diante do quadro Constitucional atual, Ericson Meister Scorsim lembra que é necessário pensar num novo marco regulatório para a comunicação e também aplicar aquilo que a Constituição de 1988 incorporou, quanto ao princípio da complementariedade entre os três modelos de radiodifusão. “Entendo que aplicação do mencionado princípio requer a compreen-são dos diferentes papéis do Estado, da sociedade e do mercado. A questão central é cumprir a Constituição e realizar os direitos fundamentais mediante a atividade de comunicação social. Daí a necessidade de um novo marco regulatório da comunicação adequado ao desenvolvimento econômico, social e tecnológico, compro-metido com a efetivação dos direitos fundamentais e que concretize, na prática, o mencionado princípio cons-titucional. É preciso investigar o porquê da complementaridade em suas origens. Trata-se de um mandamento de otimização para possibilitar a oxigenação de toda a comunicação social, diante da hegemonia do modelo comercial, garantindo-se o equilíbrio e a harmonia sistêmicos”, acredita.

O contexto da Constituinte de 1988

“A criação do Conselho de Comunicação Social; a complementaridade entre os sistemas público, privado e estatal; a regionalização da produção, subordinada a lei a ser feita posteriormente (promessa jamais cumprida) são exemplos de acordos construídos naquele momento. Havia, de um lado, uma proposta de transformação de todos os meios de comunicação do país (jornal, revista, rádio e TV) em fundações; e, de outro, uma proposta, ora explícita ora implícita, de deixar tudo como estava. Havia propostas subsidiárias a estas, é claro. Como não havia ocorrido qualquer acordo, por mínimo que fosse, na comissão setorial nem na comissão de articulação, tudo teve de ser decidido no plenário, onde ou se negociava ou se perdia tudo, já que era inevitável a votação, no prazo estabelecido por Ulysses

Guimarães.” (Othon Jambeiro Barbos, prof. da UFBA)

Sobre a atual legislação brasileira de radiodifusão

“Temos aqui outro problema mais de fundo do que de forma. Não adianta propormos a regulamentação mais moderna em termos de conteúdos, geração e até recepção. O artigo 221 da Constituição é quase perfeito. O que é preciso é a criação de mecanismos para que tais normas sejam cumpridas. Mas, enquanto permanecer este estado de anomia, onde a cada proposta de regulamentação há uma grita sobre a volta da censura, ao autoritarismo... enquanto tivermos um Executivo refém das corporações, um Legislativo omisso e com o rabo mais que preso, e um Judiciário nada cego; e enquanto o cidadão não souber que pode exigir seus direitos... Quem dera esta 1ª Conferência Nacional de Comunicação conseguisse dar um grande sacolejo em todas estas questões.”(José Edgard Rebouças, UFES)

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a c r i a ç ã o d a e b c : l e g i t i m i d a d e e a

b u S c a p o r u m S i S t e m a

Mesmo diante da redemocratização do país, que passou a ser guiado por uma nova Constituição e por eleições diretas ao final dos anos 80, a mídia pública continuou sendo um tema negligenciado pelo Estado e pelas po-líticas públicas que se seguiram. O fortalecimento do segmento comercial, o sucateamento das TVs educativas nos estados e a falta de legislação que apontasse para o desenvolvimento da radiodifusão pública marcaram as duas décadas que se seguiram.

Só duas décadas depois da promulgação da Constituição de 1988, o projeto de um sistema público de comuni-cação ganhou um novo fôlego com a criação da Empresa Pública de Comunicomuni-cação (EBC) através do Decreto Presidencial 6.689 de 11 de dezembro de 2008. Em seu artigo primeiro, o decreto estipula que a EBC é “uma empresa pública, organizada sob a forma de sociedade anônima de capital fechado, vinculada à Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República”.

Para o professor Laurindo Leal Filho, a criação da EBC aparece como um dos elementos necessários ao fortale-cimento democrático do país, juntamente com a revisão do marco regulatório da comunicação. “É fundamen-tal para a democratização da radiodifusão brasileira. Esse processo tem que se dar em dois níveis: com uma nova regulação que abra o espectro eletromagnético para outros atores, a exemplo do que está ocorrendo na Argentina2, e com a criação de emissoras públicas. É ai que se coloca a EBC. Ela tem tudo para retomar, mais de 50 anos depois, o projeto de uma rede nacional pública de televisão concebido no segundo governo Vargas, agora associada à rede de emissoras de rádio e aos serviços informativos prestados on-line. Mas para isso ela precisa estar presente, com destaque, em todo o território nacional.”

2 O professor refere-se ao novo marco regulatório do setor aprovado pelo Congresso argentino, a Ley de Servicios Audiovisuales (Lei de Serviços Audiovisuais), que estabelece, entre outras medidas, a reserva de 33% do espectro radioelétrico para mídias não-comerciais, além de garantir espaço para emissoras de universidades públicas e para alguns entes estatais.

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Na avaliação de Jonas Valente, membro do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Brasília (UnB), a EBC foi uma vitória dos segmentos progressistas da sociedade brasileira e deve ser defendida. Para ele, apesar de apresentar problemas em sua atual formatação, a empresa precisa ser fortalecida a fim de cumprir sua missão e servir como pólo catalisador de um sistema de comunicação pública no país. “A EBC e as demais emissoras do campo público precisam de investimentos para cumprir o seu papel e minimizar os efeitos da hegemonia do segmento comercial no país. O hiper-desenvolvi-mento do modelo comercial que se deu no Brasil é uma aberração, que não existe nem nos países mais capita-listas do mundo. Para cumprir essa tarefa, empresas como a EBC precisam de recursos e de independência dos humores governamentais através de mecanismos de blindagem contra as pressões políticas. Para isso, precisa criar instâncias participativas em sua estrutura de gestão, algo que ainda não foi devidamente previsto em seu atual formato”, ressalta.

Os avanços conseguidos até o momento também são destacados com alguns poréns pelo professor Valério Brittos: “Na área pública [da comunicação] em particular já houve um avanço, mas há necessidade de uma le-gislação que transcenda o governante de plantão, deixando muito claro o percentual do orçamento do Estado, para que [o seu financiamento] não fique oscilando, um governo aplique mais, outro aplique menos. Deve-se também ter conselhos de controle desse sistema, não só da TV, mas da própria aplicação das verbas de comu-nicação do Estado, para que essas verbas sejam bem aplicadas e não haja mau uso político.”

Finalidades da EBC

(Art. 2º do Decreto nº 6.689, de 11 de dezembro de 2008) I - complementaridade entre os sistemas privado, público e estatal;

II - promoção do acesso à informação por meio da pluralidade de fontes de produção e distribuição do conteúdo;

III - produção e programação com finalidades educativas, artísticas, culturais, científicas e informativas;

IV - promoção da cultura nacional, estímulo à produção regional e à produção independente; V - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família;

VI - não discriminação religiosa, político partidária, filosófica, étnica, de gênero ou de opção sexual;

VII - observância de preceitos éticos no exercício das atividades de radiodifusão;

VIII - autonomia em relação ao Governo Federal para definir produção, programação e distribuição de conteúdo no sistema público de radiodifusão; e

IX - participação da sociedade civil no controle da aplicação dos princípios do sistema público de radiodifusão, respeitando-se a pluralidade da sociedade brasileira.

Objetivos da EBC

(Art. 3º do Decreto nº 6.689, de 11 de dezembro de 2008)

I - oferecer mecanismos para debate público acerca de temas de relevância nacional e internacional;

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II - desenvolver a consciência crítica do cidadão, mediante programação educativa, artística, cultural, informativa, científica e promotora de cidadania;

III - fomentar a construção da cidadania, a consolidação da democracia e a participação na sociedade, garantindo o direito à informação, à livre expressão do pensamento, à criação e à comunicação;

IV - cooperar com os processos educacionais e de formação do cidadão;

V - apoiar processos de inclusão social e socialização da produção de conhecimento, garantindo espaços para exibição de produções regionais e independentes;

VI - buscar excelência em conteúdos e linguagens e desenvolver formatos criativos e inovadores, constituindo-se em centro de inovação e formação de talentos;

VII - direcionar sua produção e programação pelas finalidades educativas, artísticas, culturais, informativas, científicas e promotoras da cidadania, sem com isso retirar seu caráter competitivo na busca do interesse do maior número de ouvintes ou telespectadores;

VIII - promover parcerias e fomentar produção audiovisual nacional, contribuindo para a expansão de sua produção e difusão; e

IX - estimular a produção e garantir a veiculação, inclusive na rede mundial de computadores, de conteúdos interativos, especialmente aqueles voltados para a universalização da prestação de serviços públicos.

TV pública versus audiência I

“É preciso mesmo multiplicar os usuários de um serviço financiado majoritariamente por recursos públicos. No caso da TV Brasil, o exame também honesto mostra que tem havido evolução e que atribuir-lhe traço de audiência é uma hipérbole da má vontade. Programas infantis de corte nacional, como ‘Um Menino Muito Maluquinho’ e ‘A Turma do Pererê’ nun-ca têm menos de 2,5% de share. O ‘Repórter Brasil’, transmitido para 19 Estados, consolidou audiência em torno de 2%, o que para sua tenra idade é muito promissor. O programa diário de Leda Nagle, ‘Sem Censura’, raramente não alcança os 5 pontos. A faixa de cinema nacional também bate freqüentemente esta marca. Mas ainda há programas de baixa audiência, que puxam a média para baixo. Em 2009, será maior o esforço para qualificar a grade.” (Tereza Cruvinel, diretora-presidente da EBC, trecho de artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, em 2 de janeiro de 2009).”

TV pública versus audiência II

“A audiência é desejável. Quanto maior, melhor. Mas é preciso ir com calma. Para uma TV comercial, os índices de audiência vêm em primeiro lugar porque são a medida de sua mer-cadoria: o que ela vende para os anunciantes são os olhos da platéia - e quem mede a quan-tidade de olhos são os pontos do Ibope. Já para uma TV pública, o que mais importa é levar cultura e informação de qualidade aos diversos segmentos da população. A quantidade de telespectadores é um dos critérios a levar em conta, por certo, mas não é o único nem o prio-ritário (se assim fosse, bastariam alguns auditórios espalhafatosos no domingo e noticiários sensacionalistas nos finais da tarde).” (Eugênio Bucci, artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, em 26 de março de 2009)

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Autonomia e participação na EBC

Intimamente ligado ao problema da blindagem em relação a interesses de natureza partidária ou privada, isto é, da autonomia e independência de uma mídia efetivamente pública, está o problema da legitimidade, que remete à questão da participação.

Atualmente, a EBC tem uma instância deliberativa, o Conselho Curador, que tem a prerrogativa de aprovar anualmente o plano de trabalho da empresa, ratificar e acompanhar a aplicação da linha editorial e observar a veiculação da programação, fiscalizando e fazendo recomendações de acolhimento obrigatório pela diretoria-executiva da organização. O Conselho Curador da EBC é composto por 22 membros. São 15 representantes da sociedade civil (indicados pelo presidente da República nesta primeira gestão), 4 do Governo Federal (repre-sentantes dos ministérios da Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia e Comunicação Social, também indica-dos pelo Executivo Federal), 2 do Congresso Nacional (Câmara e Senado) e 1 indica-dos funcionários da empresa. Os membros têm mandato de quatro anos, com possibilidade de renovação a cada dois anos. A legislação também prevê que a renovação das vagas dos representantes da sociedade civil será feita através de uma consulta públi-ca, mas o formato desta consulta ainda não está definido.

A diretora-presidente da EBC, Tereza Cruvinel, acredita que a atual composição do conselho tem representação pluralista da sociedade, do governo, do Congresso e dos empregados. “O modelo é eficiente. Tem funcionado muito bem e está em sintonia com modelos mais avançados de comunicação pública do mundo. A pluralidade da representação é um mérito do modelo, juntamente com os poderes concedidos ao conselho, entre eles o de emitir moção contra a diretoria, derrubando o diretor que receber duas moções consecutivas”, afirma.

Embora reconheçam que a existência de uma instância mista e com certo poder de decisão seja um ganho, organizações civis e especialistas reivindicam a qualificação do modo de escolha de seus membros e o aumen-to da participação da sociedade na atuação do próprio conselho. Para este coro, a EBC ainda não sustentaria os canais de participação necessários. O atual modelo seria frágil quanto aos critérios de indicação de seus membros, o que seria problemático e colocaria em xeque a legitimidade e autonomia necessárias a uma mídia pública. “O problema é que a falta de objetividade e de regras para essa escolha de representantes acaba se transformando em uma escolha personalista do Presidente da República. Como conseqüência, tal instância passa a ser influenciada por uma política de governo e não por uma política de Estado, como deveria ser e como acontece nos países onde o sistema é mais consolidado”, critica Jonas Valente.

Único membro eleito por seus pares no Conselho Curador, o representante dos trabalhadores da EBC, Lourival Antonio de Macedo, lembra que o debate sobre um aumento de participação civil na escolha dos membros do conselho já vem sendo travado internamente pela própria instância, mas segue indefinido. “Sim, devemos mudar a forma de composição do Conselho Curador. Acreditamos que pode ser através de inscrições de pes-soas ou entidades. Algo que seja aberto a ponto de garantir que o Conselho tenha proporcionalidade regional, diversidade de segmentos, pluralidade, onde todos os setores como cinema, audiovisual cultura se sintam representados”, afirma Macedo.

Para o presidente da Associação das Rádios Públicas do Brasil (Arpub), Orlando Guilhon, o fato de o conselho existir já é algo importante, mas ele também endossa a crítica ao seu modelo. “Considero que o modelo do

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Conselho Curador da EBC já foi um avanço em termos de marco regulatório para o setor, mas ele pode e deve ser aperfeiçoado, principalmente no sentido de garantir uma participação mais direta da sociedade civil orga-nizada na sua composição e também garantir regras mínimas de transparência para o seu funcionamento.” A participação é um elemento que precisa ser fortalecido não apenas em empresas como a EBC, mas também no plano mais amplo do campo da comunicação. “Sou a favor do controle social não apenas nas empresas ditas ‘públicas’, mas em todo o sistema”, afirma o professor José Edgard Rebouças. “Minha sugestão é que seja criado um Conselho Nacional de Comunicação. É um absurdo, nosso setor ser o único dentre os listados no título Da Ordem Social da Constituição a não ter uma instância de participação da sociedade na discussão de suas políticas. Sequer o Conselho de Comunicação Social, órgão auxiliar do Congresso, funciona. E, caso haja [esta instância], que seja com representantes indicados por um maior número possível de entidades da sociedade civil.”

Renovação do Conselho Curador

“A legislação prevê que, em suas próximas renovações, o Conselho faça consultas a um conjunto de entidades representativas de diferentes setores da sociedade para elaborar a lista de indicações.” (Do site da EBC)

Mais participação

“Com debate e diálogo podemos chegar a um bom modelo de conselhos mais participativos [nas emissoras públicas]. Ainda que não seja o ideal, que seja algo que consiga refletir melhor a sociedade e sua diversidade. A sociedade que recebe conteúdo também deve interferir na produção. Este é um cenário novo no Brasil. Estamos ainda engatinhando.” (Regina Lima, presidente da Abepec)

Ouvidoria da EBC

“Ainda dentro do âmbito da Ouvidoria e como duas de suas atribuições pretende-se criar Comitês de Usuários dos veículos da EBC e programas de alfabetização para a mídia. São projetos de médio prazo cujos exemplos que conhecemos mostram os seus efeitos altamente positivos para os dois lados do balcão: público e produtores. No Rio, a rádio MEC/FM, uma das emissoras da EBC, possui uma sociedade de ouvintes que funciona muito bem. Pretendemos ampliar esse tipo de associação para os demais veículos da empresa em diferentes regiões do pais. É uma tarefa difícil, mas, se implantada, dará ótimos resultados, sem dúvida. E a alfabetização para mídia é um programa já consolidado na Inglaterra, por exemplo, através de uma parceria entre a BBC e a Open University. Aqui, a idéia é realizarmos esse tipo de trabalho com escolas de todos os níveis. Devemos assinar o primeiro desses convênios com a Universidade de Brasília. No caso específico da alfabetização para a mídia, a idéia é desenvolver em crianças e jovens principalmente, mas sem excluir os adultos, conhecimentos e habilidades que dêem a eles condições de se tornarem mais críticos e exigentes em relação aos produtos oferecidos pelos meios de comunicação. Se tudo der certo haverá, sem dúvida, uma aumento não apenas numérico na participação dos cidadãos, mas também teremos uma participação qualitativamente mais elevada.” (Laurindo Leal Filho, Ouvidor da EBC)

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o c a m p o p ú b l i c o d a c o m u n i c a ç ã o

Se no nível nacional a tentativa é apostar na criação de um sistema público de comunicação tornando a EBC a ponta-de-lança deste projeto, no nível regional também já há uma mobilização em torno daquilo que vem sendo chamado de “campo público da comunicação”. Trata-se da aglutinação de canais não-comerciais – as emissoras estatais-educativas estaduais, além dos canais comunitários – em torno de uma mesma bandeira. A presidente da Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec) Regina Lima esclarece que a formação e a identificação das emissoras em torno de um campo público é fundamental para se consolidar um sistema. “Mas para isso, é preciso termos em mente a necessidade de se fortalecer cada um desses elementos, estatais, universitárias, comunitárias... Nenhum campo consegue se afirmar, de fato, com emissoras fragilizadas”, chama a atenção.

Hoje o campo público da comunicação enfrenta um conjunto de dificuldades de cunho financeiro, tecnológico, legal ou de ingerência política. No caso das TVs estatais que operam nos estados, as atuais condições de infra-estrutura estão em boa parte defasadas, salvo raras exceções, como explica Regina Lima. “Podemos dizer que essas emissoras não estão atualizadas tecnologicamente. Os governos não investem na comunicação pública, salvo raras exceções, e esta é uma área onde a questão tecnológica tem uma velocidade absurda. É preciso um grande programa para garantir a manutenção e a atualização dessas TVs”, informa.

No que se refere à autonomia e independência, os canais estaduais são, em sua maioria, diretamente geridos pelos governos locais. Interessante notar que, ainda que a Constituição de 1988 as coloque como canais esta-tais, em muitos casos, as emissoras se auto-denominam “públicas”. Em sua pesquisa de mestrado, defendida neste ano na Universidade Federal da Bahia, a pesquisadora Edna Miola chama a atenção justamente para esse cenário de dependência em relação ao aparato governamental e a ausência de instâncias participativas. “Uma tentativa de reverter esse quadro de baixa autonomia administrativa é a alteração da forma legal das empresas

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com a implantação de órgãos deliberativos”, acredita. Para outra estudiosa do tema, a professora Regina Mota, nesses casos não haveria justificativa plausível para a inexistência de instrumentos de participação nos canais, incluindo os estatais, educativos e públicos. “A grande maioria das emissoras que se dizem públicas não ope-ra os seus dispositivos descentope-ralizadores, que acabam existindo paope-ra inglês ver, apenas na legislação, já que boa parte sequer instala os seus impotentes conselhos. Nos dados fornecidos pela Abepec em 2004, apenas a Fundação Padre Anchieta, mantenedora da TV Cultura de São Paulo, a TVE do Rio de Janeiro e a Fundação Cultural Piratini, mantenedora da TVE do Rio Grande do Sul, contam com conselhos efetivos e atuantes como parte da sua administração”, afirma em trabalho publicado nos anais do VIII Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, realizado na cidade de Coimbra em setembro de 2004.

Além das emissoras educativas-estatais e aquelas ligadas a fundações civis sem fins lucrativos, dois outros segmentos também entram no debate sobre o campo público de comunicação: as emissoras universitárias e os canais comunitários de rádio e TV. Embora sustentem formatos bastante distintos de conteúdo e transmissão, ambos os segmentos se vinculam ao campo através de sua aproximação com as comunidades ou nichos pú-blicos em que atuam, seja as comunidades universitárias, as comunidades de bairros urbanas ou em pequenas localidades do interior e povoados rurais.

No caso dos canais de televisão vinculados às universidades, a situação estrutural é bastante heterogênea, como explica o presidente da Associação Brasileira de Televisão Universitária (ABTU), Cláudio Márcio Magalhães. “Há de tudo um pouco: instituições de ensino superior (IES) que estão sucateando suas emissoras por motivos igualmente diversos (desde de pura falta de recursos financeiros até a simples desmobilização porque trata-se de um projeto de um reitor/coordenador anterior e não sintonizado com a atual gestão). Há a outra ponta, IES com investimentos maciços na construção ou reformulação do parque técnico visando a TV Digital ou mesmo a valorização das emissoras do campo público como um todo. No meio, aqueles com orçamentos modestos, mas suficientes para tocar um bom projeto; outros penando para colocar uma programação no ar; mais algu-mas que caminham para viabilizar a TV transformando-a em uma produtora de conteúdo”, descreve.

Ao ser indagado se as TVs Universitárias deveriam ser de fato consideradas peças de um sistema público de co-municação, Magalhães responde: “Sim, pelo aspecto de que o seu objetivo é o interesse público, que é refletido na sua programação, em detrimento à programação comercial voltada para anunciantes. Mas a diversidade das emissoras universitárias não nos permite dizer que todas elas serão ‘públicas’ nos termos que vários autores e entidades defendem.”

Magalhães acredita que “várias das TVs Universitárias não terão uma gestão da comunidade onde seus sinais chegam, pois as Reitorias não permitirão, mas também não serão bancadas majoritariamente com recursos públicos”. Segundo ele, a ABTU defende “uma gestão sempre feita com conselhos, no mínimo da comunidade acadêmica e representantes das demais comunidades, mas não excluímos aquelas IES que não o fazem”. “Para nós, da ABTU, o importante é uma programação voltada para o interesse público mesmo se ela for uma ou-torga comercial. Criar um contraponto as emissoras comerciais já seriam um grande avanço nos aparelhos de televisão brasileiros.”

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Já no caso dos canais comunitários, a aproximação com o campo público está na sua forma de gestão enraizada nas comunidades e a missão intrínseca de fomentar a diversidade da comunicação. Como explica o coordena-dor executivo da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), José Luiz do Nascimento Sóter, as rádios comunitárias fazem parte do sistema público não-estatal e o papel das emissoras comunitárias, afir-ma, é ser um instrumento de comunicação a serviço das comunidades onde estão localizadas. “Este caráter co-munitário é que diferencia a radiodifusão comunitária de outros veículos públicos. As emissoras comunitárias têm e devem ter uma relação orgânica com as comunidades. Isto significa estarem abertas à participação dos moradores e movimentos sociais da localidade, garantir o contraditório e a pluralidade de opiniões, prestarem serviços de utilidade pública, estar comprometida com as lutas e demandas da comunidade.”

Sóter enumera uma série de exigências feitas às emissoras comunitárias relacionadas a um modelo de gestão pública: deve estar abertas à filiação de qualquer morador de sua área de abrangência e ter, alem da diretoria da associação, um Conselho Comunitário, com a participação de, no mínimo, cinco segmentos da sociedade local.

Já a inserção das TVs comunitárias neste campo também é reforçada pelo vice-presidente da Associação Bra-sileira de Canais Comunitários (Abccom), Paulo Miranda ao afirmar que “se incorporaram ao sistema público de comunicação por opção e por meio do Fórum Nacional de TVs Públicas. As reivindicações das comunitá-rias são basicamente as mesmas das universitácomunitá-rias, legislativas, educativas e culturais, incluindo, é claro, a EBC e a TV Justiça”.

Atualmente, os canais comunitários enfrentam dificuldades decorrentes das limitações impostas pelas leis que os regulamentam. No caso das TVs comunitárias, criadas a partir da Lei 8.977/1995 – a chamada Lei do Cabo –, a legislação prevê sua vinculação aos serviços de TV paga a cabo exclusivamente, o que impossibilita a expansão deste segmento. Em relação às rádios, a Lei 9.612/1998 também limita o número e o alcance das emissoras por localidade, além de se verificar a persistência de empecilhos burocráticos que impede a grande maioria de atuarem legalmente. “Temos processos de rádios, efetivamente comunitárias, que levam anos tra-mitando, enquanto processos de rádios ligadas a lideranças políticas ou a grupos religiosos, tramitam rapida-mente e passam na frente”, denuncia José Sóter.

No caso das TVs comunitárias, Miranda explica que existem hoje cerca de 68 canais em operação. “Poderiam ser 220 canais comunitários, bem como 220 canais universitários se houvesse uma política de comunicação comunitária no país. Os canais são capengas e funcionam porque existem ‘moicanos’ ou famílias que tocam as TVs comunitárias com muito sacrifício, enfrentando a omissão do Estado e dos movimentos social e sindical”, lamenta.

Fórum de TVs Públicas I

“Nove meses transcorridos desde o chamamento para o 1º Fórum Nacional de TVs Públicas, uma iniciativa pioneira do Ministério da Cultura, por meio da Secretaria do Audiovisual, com apoio da Presidência da República, podemos afirmar que este nosso clamor soma-se aos anseios da sociedade brasileira. Neste processo, o Brasil debateu intensamente a televisão

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que quer e pretende construir, quando estamos à porta da transição para a era digital. Nesse período, superamos a dispersão que nos apartava de nós mesmos e descobrimos uma via comum de atuação, que tem como rota o reconhecimento de que somos parte de um mesmo todo, diverso e plural, complementar e dinâmico, articulado em torno do Campo Público de Televisão. Um corpo que se afirma a partir da sua heterogeneidade, mas compartilha visões e concepções comuns.” (Trecho do Manifesto pela TV Pública independente e democrática, I Fórum Nacional de TV’s Públicas, 2006)

Rádios comunitárias e sistema público

“A Abraço defende a criação de uma Lei Geral da Radiodifusão, que contemple os sistemas público (incluído as rádios comunitárias), estatal e privado. Esta nova lei deverá assegurar o livre funcionamento das rádios comunitárias, como um serviço público relevante e com um tratamento isonômico. Também, defendemos a regulamentação do artigo 223 da CF, destinando 1/3 dos canais para cada sistema, o público, o estatal e o privado.”( José Luiz do Nascimento Sóter, Abraço)

Formação profissional e comunicação pública

“Não vejo a maioria das instituições de ensino superior se preparando para isso, nem mesmo as universidades públicas. A ABTU reivindicou, perante a comissão que estuda a mudança de currículo de jornalismo, uma série de reformulações. A principal: não há qualquer disciplina sobre comunicação pública! O assunto depende do engajamento e disponibilidade de colegas em discutir o assunto dentro de outras disciplinas. Assim, não estamos formando profissionais para tudo isso que estamos discutindo.” (Cláudio Magalhães, presidente da ABTU)

Rádios e sistema público

“Temos trabalhado entre nós mais o conceito de sistema público do que de rede pública, por entender que, no caso do rádio, não cabe um conceito de ‘rede’, com ‘cabeça de rede’ no sentido formal e vertical, e sim um ‘sistema’, algo mais horizontal e mais compartilhado. Temos trabalhado com diversas iniciativas: a) troca de conteúdos entre as rádios públicas; b) coberturas conjuntas de eventos nacionais (culturais, sociais e políticos); c) alguns produtos comuns (jornal em rede, programa Conexão Brasil, campanhas institucionais); d) projetos comuns junto a terceiros, tais como I Festival Nacional de Música das Rádios Públicas e I Concurso de Produção de Programas Radiofônicos.” (Orlando Guilhon, Arpub)

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p a r t i c i p a ç ã o e f i n a n c i a m e n t o

peSquiSa aponta aS experiênciaS de doze paíSeS e traz liçõeS

para o braSil

Em junho de 2009, o Intervozes publicou um livro intitulado “Sistemas públicos de Comunicação no mun-do: experiências de doze países e o caso brasileiro. A pesquisa avaliou itens como história, estrutura, gestão, financiamento, programação e debates atuais em países de quatro continentes: Alemanha, Austrália, Canadá, Colômbia, Espanha, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Portugal, Reino Unido e Venezuela. O livro também aborda o caso brasileiro e aponta algumas perspectivas sob a luz dessas experiências internacionais.

Para o coordenador da publicação e também um dos autores, Diogo Moyses, o trabalho reafirma a preocupa-ção do Intervozes em pensar e debater a relapreocupa-ção entre democracia, mídia e interesse público. “Nós já havíamos divulgado uma proposta concreta para a criação e desenvolvimento de um sistema público no país que foi apresentada oficialmente no I Fórum Nacional de TVs Públicas, em maio de 2007. A partir daí, percebemos que era preciso aprofundar a análise das diversas experiências internacionais a fim de contribuir e qualificar ainda mais o debate sobre este tema”, afirma.

Moyses explica ainda que os sistemas públicos mais avançados e consolidados no mundo são justamente aque-les que possuem autonomia financeira-administrativa e sustentam diversos mecanismos de participação civil em sua estrutura. “Geralmente sua arrecadação é baseada em tributos que são recolhidos diretamente para as empresas públicas e, por isso, não oscilam quando o humor do governo muda. Isso dá autonomia prática à mídia pública. Por outro lado, do ponto de vista da participação, enquanto no Brasil a lei não estabelece crité-rios claros para a composição das instâncias decisórias destas empresas, em países como a Alemanha, Japão, Espanha, França, EUA e Reino Unido existe formas de representação objetivada de setores da sociedade civil, incluindo mecanismos de eleição bem mais sofisticados que a pura indicação do presidente da República”, ressalta. E complementa: “A pesquisa, que também analisou o caso brasileiro e traçou análises comparativas, conclui que o modelo atual de composição do Conselho Curador da EBC é bastante frágil e está bem aquém

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dessa sofisticação encontrada nos países estudados. No caso do Brasil, é o que chamamos de modelo simplifi-cado, isto é, aquele que não dispõe de mecanismos de participação avançados e que está sob forte influência da esfera governamental”, ressalta.

Dentre os doze países pesquisados, veja o ranking de investimento, tomando como base receitas compreendi-das no período de 2006-2008 (valores aproximados, convertidos de diversas moecompreendi-das para o real):

Quadro comparativo de receitas (estimativas / em bilhões R$)

ALEMANHA R$ 23,3 REINO UNIDO R$ 15,0 JAPÃO R$ 12,2 ITÁLIA R$ 8,9 FRANÇA R$ 8,1 EUA R$ 5,2 ESPANHA R$ 4,3 CANADÁ R$ 2,7 AUSTRÁLIA R$ 2,1 PORTUGAL R$ 0,8 COLÔMBIA R$ 0,2* BRASIL R$ 0,5

VENEZUELA (sem estimativa)

Fonte: Intervozes (Sistemas públicos de Comunicação no Mundo, Editora Paulus, 2009)

* No caso específico da Colômbia, os autores ressalvam que o valor possa ser superior, devido ao cruzamento de outras receitas indiretas não identificadas com exatidão durante a coleta de dados.

Audiência das TVs públicas em alguns dos países pesquisados:

Reino Unido (Sistema BBC) 43,0%

Portugal (Sistema RTP) 30,8%

Itália (Sistema RAI) 43,6%,

França (Sistema Frances Télévisions) 42,0 %

Espanha (Sistema RTVE/ Forta) 38,0%

Alemanha (Sistema ZDF /ARD) 42,5%

Japão (Sistema NHK) 28,5%

Canadá (Sistema CBC) de 10 e 22 %

EUA (PBS) 7ª posição (num universo de 30 canais/redes comerciais)

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Financiamento I

“Tomando como base o orçamento de 2007, o Brasil investiu

cerca de 2% dos recursos financeiros que a Alemanha empregou em mídia pública. Isso demonstra bem a dimensão da nossa carência e o quanto o país ainda precisa avançar.” (Diogo Moyses, Intervozes)

Financiamento II

“Para 2009, o orçamento proposto pelo Governo foi de R$ 350 milhões. O Congresso cortou R$ 91 milhões, o que muito prejudicou o desempenho da empresa. A proposta para o exercício de 2.010 é de R$ 446,7 milhões. O Congresso Nacional ainda não aprovou a proposta orçamentária para o ano que vem e esperamos que não haja cortes.”(Tereza Cruvinel, EBC)

Financiamento III

“É preciso haver uma política de financiamento e integração e quebrar a dependência dos governos federais ou locais” quando tem 100 % de orçamento vinculado ao estado e ele contingência existem dificuldades.”(Regina lima, Abepec)

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a c o m u n i c a ç ã o p ú b l i c a f r e n t e à

d i g i t a l i z a ç ã o

Se o Brasil ainda investe pouco em mídia pública e enfrenta dificuldades para efetivar um sistema público de comunicação, este cenário se torna ainda mais complexo com a digitalização da TV e do rádio. O processo de convergência digital já está em processo de implementação e traz novos elementos para este debate.

Para o professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS) e doutor em Ciência Econômica pela Universidade Estadual de Campinas, César Bolaño, toda a economia política dos meios de comunicação está passando por uma mutação de enorme profundidade, que inaugura uma nova época. Essa mudança, acredita, está intima-mente relacionada com a reestruturação capitalista iniciada nos anos 70 do século passado. “O mundo todo está mudando, em suma, e isso se traduz, no campo da comunicação, num processo complexo de digitalização, convergência, mudanças de hábitos de audiência etc. Todos os que disputam esse espaço têm que se adaptar e o Estado também. A TV pública, por exemplo, precisa se preparar para essa nova situação, explorando todas as possibilidades de democratização do sistema. Multi-programação, interatividade, novos meios, tudo deve estar voltado para a construção, no novo ambiente que se desenha, de um sistema de comunicação nacional mais democrático do que aquele que herdamos do século XX”, afirma.

“Nesse momento acredito que a convergência digital pode ser um catalisador para criar um sistema público mais eficiente, pois permite que este trabalhe mais a diversidade, transmitindo mais conteúdos, levando mais canais e introduzindo a interatividade, que é a plena participação do cidadão, potencializando e havendo uma convergência nos vários canais públicos”, avalia o professor Valério Brittos. Para ele, a TV Brasil (principal emissora da EBC) vem conseguindo se desenvolver de modo relativamente versátil, através de um modelo que pode ser tanto analógico quanto digital.

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Atualmente, a TV Brasil já transmite em canais digitais no Rio de Janeiro, Distrito Federal e São Paulo. Apenas a geradora do Maranhão ainda não migrou para o sistema digital. Segundo a presidente da empresa, Tereza Cruvinel, já foram comprados os equipamentos para garantir que a produção como um todo passe também a ser feita em tecnologia digital.

Embora a digitalização possa trazer um novo cenário para a comunicação pública, o professor Othon Jambeiro Barbosa lembra que o subdesenvolvimento deste setor no Brasil não é um problema técnico ou de tecnologia. “Desde que surgiu como proposição governamental, no Decreto 21.111 de 1932, com o nome de Rede Nacio-nal de Radiodifusão, jamais foi considerada seriamente por qualquer governo brasileiro. Sequer foi implantada tal rede. E quando o foi, no período da ditadura militar, já não tinha os mesmos objetivos de antes, pois que a idéia passara a ser a de Rede Educativa. Um fracasso retumbante, aliás. O que se tem hoje são emissoras liga-das a governos, que ostentam o título de públicas mais por charme ideológico do que propriamente por terem gestão pública”, adverte. Ainda assim, Jambeiro aposta nas potencialidades da digitalização que poderiam ser apropriadas de forma benéfica pelas emissoras públicas. “A tecnologia digital poderá ajudar a construir um conceito para a radiodifusão pública brasileira. Há experiências em vários países do mundo com tecnologias avançadas aplicadas ao rádio, não necessariamente de natureza pública ou estatal, que podem oferecer sub-sídios para isto.” Jambeiro reforça, no entanto, que antes destas mudanças técnicas ou estéticas “é necessário que haja no país rádios e TVs efetivamente públicas, no sentido de gestão, de concepção de programação,de interação com o público e de uso de tecnologias que favoreçam tal interação.”

Do ponto de vista jurídico, a digitalização também levanta questões não previstas no atual quadro regulatório brasileiro. O advogado Ericson Meister Scorsim, que publicou recentemente o livro “TV Digital e Comunica-ção Social: aspectos regulatórios”, pela Editora Fórum, acredita que a evoluComunica-ção tecnológica subverteu paradig-mas e ainda vivenciamos um momento de transição da era analógica para a digital que sustenta determinadas peculiaridades. Para Scorsim, é justificável que os membros da Constituinte de 1988 não previssem o avanço das transformações tecnológicas, mas falta a “discussão e a aprovação de uma nova lei geral de comunicação social eletrônica”, que desse conta de regular as tecnologias e serviços na era digital.

Para Jonas Valente, do Intervozes, o sistema público de comunicação estaria hoje ainda muito vinculado à TV e ao rádio e isso precisaria evoluir, avalia, para englobar outros serviços de mídia, desde aqueles audiovisuais até os de provimento de acesso à dados e à internet. “Os reguladores britânicos nomeiam esta transição da mudança do conceito de Public Service Broadcasting (Serviço de Radiodifusão Pública) para Public Service

Media (Serviço de Mídia Pública). Isso implica, em primeiro lugar, pensar a produção e difusão de conteúdos

de modo multiplataforma. Ou seja, um conteúdo realizado no interior de um operador do Sistema Público de Comunicação deve formatar seu telejornal, ou programa, ou as notícias de sua agência, para que sejam veicu-ladas na TV, na internet, pelo celular ou até mesmo por satélite ou cabo”, explica.

Outra característica da digitalização que deve ser aproveitada pela mídia pública é a interatividade. “Esta fun-cionalidade permite quebrar a lógica vertical e unidirecional da radiodifusão, dando ao telespectador, ouvinte, usuário uma condição de sujeito ao poder organizar a informação que irá acessar e interferir naquele conteúdo veiculado”, aponta Valente.

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Especificamente no que diz respeito à infra-estrutura das transmissões digitais, atualmente está em processo de formulação e possível implementação o chamado operador de rede para transmissão dos canais públicos-estatais de TV digital – além da TV Brasil, a TV Justiça, a TV Câmara, a TV Senado e os canais ligados ao Executivo criados pelo decreto que instituiu o Sistema Brasileiro de TV Digital.

O operador de rede é um ente que recebe uma outorga para fazer a irradiação dos canais de televisão de um grupo de prestadores. Na prática, funciona como uma “antena única” ou um “provedor único” para um con-junto de canais. Seria uma plataforma conjunta para os canais públicos que a utilizariam como infra-estrutura de transmissão. O objetivo seria possibilitar a construção de uma rede entre as emissoras públicas, de modo sistêmico, menos custosa e mais eficiente. “A implantação de um operador único é um pequeno passo dado em direção a uma ambição maior, que é a construção de um sistema público complementar, com produção mais integrada de conteúdos”, avaliou o diretor de serviços da EBC, José Roberto Garcez, durante o II Fórum Nacional de TVs Públicas, em março deste ano.

Operador de rede e canais públicos

“No Brasil, como o Decreto 5.820, de 2006 [que estabelece as diretrizes do Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre], prevê 6 MHz para cada emissora, a figura do operador de rede não é obrigatória e, talvez por isso, não tenha sido prevista. Isso não significa, porém, que ela não possa ser muito útil. (...) Acreditamos que a melhor alternativa seria destinar dois ou três canais de 6 MHz para serem operados em multiprogramação (SDTV) pelas emissoras dos três poderes da União, destinando, ainda, programações para as TVs estaduais, as Assembléias Legislativas, as TVs dos municípios e as TVs comunitárias, todos com

uma programação em SDTV, criando-se a figura de um Operador de Rede - que poderia ser público ou privado - que faria a implantação e a operação das antenas e transmissores, recebendo pelos serviços prestados o pagamento dos veiculadores da programação. Com esse sistema, além da economia resultante, se alcançará uma cobertura muito maior e em muito menor tempo.” (Vilson Vedana, consultor Legislativo da Câmara dos Deputados)

Digitalização dos canais universitários

“Há dois quadros aí. Quem está aprisionado no cabo, tem pouco a ver com essa história pois sua produção já é digitalizada e suas transmissões, pouco a pouco, vão migrando para o sinal digital. Já as emissoras abertas têm pouco ou nenhum projeto de digitalização dos seus sinais (assim como boa parte das emissoras educativas) por simples falta de recursos ou mesmo pela incerteza que ainda cerca a digitalização brasileira. Há pouca discussão sobre o tema nas emissoras, talvez porque estamos discutindo isso há mais de 10 anos, com a participação das universidades em todo o processo. Agora, há um clima de espera. Mesmo porque o que mais nos interessa é a potencialidade desta TV digital no que tange à interatividade e à possibilidade da ocupação do sinal aberto.” (Cláudio Magalhães, ABTU)

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TV digital e TVs educativas-estatais

“A Abepec está realizando um levantamento através de consulta a todos os gestores dos canais estatais hoje operantes nas Unidades da Federação para termos um diagnóstico mais exato desse problema. Isso nos servirá para conhecermos o quadro da migração para o digital. O que sabemos agora é que há um quadro bastante diverso. Enquanto algumas emissoras já produzem seus conteúdos em modo digital e estão quase prontas para transmitir, há outras onde nada da transmissão é digital e até a captação ainda é analógica.” (Regina Lima, Abepec)

Digitalização versus canais comunitários

“Na década de 70, os principais mestres da comunicação glorificavam as novas tecnologias como libertadoras e democratizantes. Mas o que se viu foi o contrário. As tecnologias multiplicaram os canais de comunicação e os concentraram em poder de poucos conglomerados. Portanto, com a digitalização poderá ocorrer a mesma coisa. Porém,

devemos enfrentar a concentração danosa no setor e buscar apoio da sociedade, dos governos e até de empresários nacionalistas para que a indústria nacional não morra diante do grande poder do capital internacional.” (Paulo Miranda, Abccom)

Referências

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