Mais
de
60%
dos
contratos
das
câmaras
sem
concurso
Estudo
diz que recurso
ao ajuste
direto
para
bens,
serviços
e
obras
aumenta
o
risco
de corrupção
Análise
também
denuncia
falta
de
transparência
no registo
de
Ajuste
direto
em
60%
das
compras
dos
municípios
Municípios com melhor classificação no índice Global deQualidade de Governação Local
Estudo
que avalia
a
qualidade da governação
local
alerta
para
risco
de corrupção na
contratação.
Mealhada
e
Abrantes entre
os
melhores
Carla
SofiaLuz
carlaluz@jn.pt
municípios A generalidade das câ-maras opta pelo ajuste direito, no
momento da aquisição de bens, de
obras ou de serviços. Entre 2013 e
2016, só 39% dos vários milhões
alocados àcontratação pública
pe-los municípios foram gastos com recurso a concursos públicos. É
uma das conclusões do estudo
"Qualidade da Governação Local em Portugal", que alerta para o ris-co acrescido de favorecimento e
de corrupção, sobretudo quando
os sistemas de controlo externo
são débeis efalta escrutínio
públi-co desses gastos. Tal como
aconte-ce no nosso país.
O recurso amétodos contratuais transparentes éum dos
indicado-res onde amaioria das 308
autar-quias falha, com exceção dos bons
exemplos de Sines, de Fundão, de
Palmeia edeVidigueira, que
gasta-ram mais de 80% do
montante
destinado a contratação por con-curso público nos três anos
anali-sados pela equipa de
investigado-res, coordenada por Luís de Sousa
e por António Tavares, docentes
do Instituto das Ciências Sociais daUniversidade de Lisboa eda Es-cola deEconomia eGestão da
Uni-versidade doMinho.
A avaliação, que é apresentada
hoje em Portalegre e editada pela
Fundação Francisco Manuel dos Santos, denuncia falta de
transpa-rência na contratação pública, em que a "disponibilização proativa
de
informação"
é sistematica-mente baixa, "o que pode gerar mádespesa pública eriscos de
favore-cimento ecorrupção". Mas não é
apenas nesta área que há opacida-de. Oexpoente máximo, notam os
investigadores, é no escrutínio
dos interesses dos eleitos.
POUCA TRANSPARÊNCIA
Alfândega da Fé é aúnica
autar-quia adisponibilizar online o re-gisto de interesses dos autarcas.
Há 118 câmaras a divulgar as re-munerações e97apublicar os cur-rículos detalhados dos eleitos. Só
40municípios mostram as
decla-rações deincompatibilidade e
ren-dimento e 19expõem as declara-ções patrimoniais. Um terço das
câmaras nada revela nos seus sites.
"A dimensão de gestão
financei-ra éaquela onde adisponibilização
de informação éum pouco
me-lhor, porque há obrigatoriedade por lei.Nas outras dimensões, não há essa obrigatoriedade, mas há
um dever de informação. Éóbvio
que ninguém está àespera que o
registo de interesses e a declara-ção patrimonial vão desvendar
todo o tipo de práticas ilícitas,
mas são instrumentos
interes-santes e o
próprio
Tribunal
Constitucional nãotem feito
um excelente trabalho nafisca-lização das declarações
patrimo-niais", assinala Luís de Sousa.
O investigador regista como positivo que grande parte das câ-maras coloque as contas na In-ternet. Nesse capítulo, um dos
documentos menos
representa-doonline é alista das dívidas aos
fornecedores. Ainda assim, é
di-vulgado por 188 câmaras.
132CAMARÁS BOAS E 153 CAPAZES
Os investigadores avaliaram 22
indicadores em cinco
dimen-sões da governação local para
de-terminar aqualidade da gestão das autarquias: aparticipação
dos cidadãos e aprestação de contas; aestabilidade política; a
eficácia da governação,
incluin-do a sustentabilidade e a quali-dade dos serviços públicos; o
acesso ea regulação do mercado;
eaprevenção da corrupção.
Concluíram que 132 câmaras
têm
um desempenho bom ousuperior, 153 apresentam um
desempenho capaz (onde se
in-clui Lisboa) e23 possuem
Osmelhores municípios, classi-ficados como "líderes", encon-tram-se no arquipélago dos
Aço-res: São Roque do Pico, Lajes das
Flores, Santa Cruz das Flores.
Alista das 25 autarquias do
continente com maior
pontua-ção no índice global de
qualida-de qualida-de governação local é encabe-çada por Mealhada, Abrantes, Oliveira do Hospital, Boticas e
Proença-a-Nova. Nessa lista, há poucas câmaras de grande di-mensão: constam uma capital
dedistrito, Bragança, edois
mu-nicípios da área metropolitana
de Lisboa, Loures eBarreiro.»
| EM DETALHE |
Falta
sustentabilidade
O estudo analisou aqualidade e
asustentabilidade dos serviços
essenciais prestados pelas câ-maras: água, saneamento e
tra-tamento de lixo. Em 211
muni-cípios, esses serviços carecem de sustentabilidade financeira. Há 62câmaras com serviços
sustentáveis eboas práticas de
fixação de preço. O desempe-nho global émelhor na recolha
etratamento dos lixos.
Boa
concorrência
Apesar daproliferação de ajus-tes diretos, oestudo indica que,
nos contratos acima dos 150
mil euros (éobrigatório fazer
concursos públicos), as
autar-quias garantem "níveis saudá-veis de concorrência", diversi-ficando os fornecedores. A
maioria celebrou, em média, menos de dois contratos com a
mesma empresa. Sóquatro câ-maras (que oestudo não iden-tifica) deram três ou mais
Investigador Luís de Sousa
Descentralizar
é
mais do
que
dar
valências
e
dinheiro
Luís
de
Sousaquer
debate
sobre
arquitetura
municipal
governação
O debate sobre adescentralização, centrado em
torno das competências edo
en-velope financeiro que o Estado
está disposto adar, éredutor. O
in-vestigador Luís de Sousa, um dos
coordenadores do estudo sobre a
qualidade da governação local e
re-presentante da Transparência
In-ternacional emPortugal, entende
que deve repensar-se a
arquitetu-ra
institucional
dos municípiospara torná-los "mais aptos a
res-ponder aos desafios". E isso não se
faz sem uma avaliação da
demo-craticidade dos processos de
toma-dade decisão.
"Coexistem dois modelos de
go-vernação local em Portugal. Há um novo modelo em gestação de
governação em rede, em que o
município, embora central, éum
entre vários parceiros que
coope-ram paramelhorar aeficácia da
go-vernação local. Esse modelo
coe-xiste com o modelo centrado no
presidente", em que nada se faz
sem aordem do autarca,
especifi-caLuís de Sousa, na expectativa de que osautarcas olhem para o
estu-do epara asrecomendações como
"uma ferramenta para melhorar". Na dimensão da eficácia
gover-namental, oestudo mostra que os
territórios com maior densidade
populacional
têm
mais eficácia. No entanto, osinvestigadores não propõem afusão de câmaras,ape-sar de Luís de Sousa reconhecer
que o Governo Local é
"demasia-do pequeno", correspondendo a
"um quinto da governação do país
em termos financeiros". A escala
éimportante e,argumenta, pode
ser resolvida com oreforço do
in-termunicipalismo.
•
carlasofialuzPrincipais
recomendações
Divulgar
remuneração
einteresses
Para permitir oescrutínio dos eleitos, propõe-se a
obrigatoriedade de publicação online dos registos de interesse, do currículo detalhado com a
identifi-cação dos cargos públicos eprivados exercidos edas
declarações depatrimónio, de incompatibilidade e
derendimentos dos autarcas. Os organismos res-ponsáveis pela monitorização destas práticas
de-vem ser dotados dos meios necessários.
Adoção de
orçamentos
participativos
Realizar orçamentos participativos em todos os
municípios e, nos casos emque já existe essa expe-riência há vários anos, recomenda-se oreforço das
verbas destinadas aessa iniciativa, sobretudo nos
municípios demaior dimensão. É necessário
refor-çar, também, apresença dos cidadãos em reuniões municipais abertas aopúblico.
Reforço
daAssembleia
Municipal
As assembleias municipais estão "subassessoradas, sem unidades técnicas deapoio orçamental ecom
uma reduzida importância das comissões parla-mentares". Em simultâneo, háuma excessiva
con-centração de poder no presidente deCâmara, o que
prejudica opluralismo etem riscos financeiros e
reputacionais. Para corrigir aassimetria, sugere-se
oreforço dos poderes de fiscalização ede
responsa-bilidade política das assembleias municipais, assim
como aatribuição de assessoria técnica capaz.
Consulta obrigatória
àOposição Tornar obrigatória aconsulta dos vereadores da Oposição edos grupos políticos das assembleiasmunicipais nas principais áreas deintervenção
ca-marária, na elaboração doorçamento e das grandes opções do plano, nas auditorias, nas fiscalizações e
nos inquéritos àautarquia.
Auscultação
aosatores
locaisAs camarás devem promover mais instrumentos e
espaços de auscultação dos atores locais, como em-presas eassociações, envolvendo-os na definição
depolíticas locais dedesenvolvimento económico.
CCDR
eentidades
intermunicipais
ativas
Recomenda-se um papel mais ativo das comissões de coordenação edesenvolvimento regional
(CCDR), asáreas metropolitanas eas comunidades
intermunicipais no desenvolvimento económico local eregional, demodo apromover ações
concer-tadas entre os municípios com desafios comuns.
Ligação ao
Ensino Superior
As instituições do Ensino Superior, em particular
ospolitécnicos, devem fortalecer os laços com os
atores políticos eeconómicos locais, para que o
co-nhecimento produzido nas instituições seja usado