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As abordagens semióticas das interações lúdicas dos jogos digitais: um estado da arte 1

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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação

XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016

As abordagens semióticas das interações lúdicas dos jogos digitais: um estado da arte1 Enrico Rossatto de DEUS2

Hilario Junior dos SANTOS3

Universidade Comunitária da Região de Chapecó, Chapecó, SC Resumo

O propósito deste artigo é compreender como seria possível analisar videogames por meio da ciência semiótica. Utilizando uma pesquisa básica, dedutiva e exploratória, buscamos por meio de uma abordagem de dados secundários publicações científicas bibliográficas cujo o conteúdo busca uma relação entre videogames e a ciência semiótica. Com o intuito de explicitar a sintaxe dos videogames utilizamos a abordagem MDA (LEBLANC; HUNICKE; ZUBEK, 2004) buscando relacionar o conteúdo encontrado com as categorias estabelecidas pela abordagem. Assim identificando que partes dos videogames foram mais abordadas e quais ainda se mostram pouco exploradas, conseguimos estabelecer que estudos se fazem necessários para um aprimoramento das abordagens já existentes de análise semiótica dos videogames.

Palavras-chave:​ semiótica; significação; jogos digitais; interação lúdica. Introdução

Ao longo dos último 50 anos os videogames vêm se estabelecendo como uma mídia muito expressiva em nossa cultura, mobilizando jogadores por todo o mundo e produzindo significações diversificadas. Na linha do que McLuhan (1969) defendeu, a ambiência criada pelos videogames afeta a percepção, a estética e os efeitos da experiência lúdica e o videogame deixou de ser apenas um "brinquedo", mas uma mediação imersiva que usa amplamente as linguagens sonoras, visuais e verbais.

Jogos digitais possuem aspectos muitos similares a outras mídias como o cinema por exemplo. Entretanto, se mostram muito mais complexos pelo seu fator interativo. A experiência ao jogar um videogame vai muito além de assistir um filme, pois o jogador não é apenas um espectador mas sim um indivíduo ativo, fazendo parte do processo de

1 Trabalho apresentado na Divisão Temática Comunicação Multimídia, da Intercom Júnior – 2020 Jornada de Iniciação Científica em Comunicação, evento componente do 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação

2 Estudante de Graduação 6º. semestre do Curso de Design da Unochapecó, Bolsista do Art. 171 Fundo de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da Educação Superior (FUMDES) e Unochapecó, email: enricord@unochapeco.edu.br 3 Orientador do trabalho. Doutor em Ciências da Comunicação e professor do curso de Design da Unochapecó, email: jresponde@gmail.com

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significação da própria mídia. Assim, não apenas o discurso é foco de significação, mas os fatores lúdicos, provenientes do game design.

Claramente videogames são repletos de signos que contribuem diretamente para a significação da experiência vivida ao se jogar um jogo. Considerando que a ciência semiótica vem sendo eficiente em analisar os diferentes signos presentes nas mídias e seus discursos, cabe problematizar se seria possível se apropriar dela para analisar semioticamente videogames e explorar como fazê-lo considerando os aspectos da interação lúdica.

O presente artigo tem como objetivo produzir um estado da arte (pesquisa da pesquisa) sobre como se tem abordado no contexto atual (2010-2019) em pesquisas científicas a relação entre videogames e a ciência semiótica a fim de descobrir como seria possível analisar jogos semioticamente. Nesta pesquisa básica, dedutiva e exploratória, adotamos como principal procedimento metodológico a abordagem de dados secundários, ou seja, publicações científicas bibliográficas que trazem as temáticas tangentes que rondam nosso problema de pesquisa.

Antes dos resultados do estado da arte, faz necessário uma breve definição da semiótica como ciência, esclarecendo seus objetos, problemas, vertentes e seus possíveis métodos para estudo da significação em diferentes mídias. Adicionalmente, situamos o MDA (LEBLANC; HUNICKE; ZUBEK, 2004) como nossa perspectiva de referência dentre tantas abordagens que procuram explicitar a sintaxe dos videogames, considerando sua coerência e frequência com que vem aparecendo nos game studies.

Semiótica

Segundo Santaella, à medida que as comunicações vão se expandindo globalmente ao longos dos anos em conjunto com o grande desenvolvimento de mídias, um crescimento de signos se mostra evidente. Eventos como a invenção da fotografia, do cinema, a expansão da imprensa junto com a propagação da imagem, e a evolução exponencial das mídias eletrônicas contribuíram para uma quantidade de signos nunca antes vista (SANTAELLA, 2002, p. XIII).

Tendo em mente o crescimento quase ininterrupto de signos surge uma necessidade de que seja possível analisá-los e interpretá-los. Advindo dessa necessidade surge no final do século XIX o estudo da ciência semiótica de forma crescente. Embora tenha se

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popularizado como ciência a partir do século XX, tem sua origem muito antes. Desde o mundo grego busca-se compreender a natureza dos signos, da significação e da comunicação, normalmente com abordagens fenomenológicas e estéticas. Atualmente são várias as vertentes de estudo semiótico que buscam por diferentes abordagens compreender as condições de sentido da mente humana (SANTAELLA, 2002, p. XI-XIV).

A semiótica ou lógica compreende o estudo do pensamento e das condições estabelecidas para geração da verdade, alisando não só as condições gerais de um signo mas também como ocorre a transmissão de significado de um indivíduo para o outro. A semiótica é dividida em três ramos distintos. A Gramática especulativa busca compreender os mais variados tipos de signos e os formas de pensamento que os mesmos possibilitam. A Lógica crítica compreende os estudo dos tipos de interferência gerados pelos diferentes signos e como conduzem essas interferências conduzem o pensar, essas interferências são classificadas em estados: a abdução, indução e dedução. E, por último, o terceiro ramo da semiótica é conhecido como Retórica especulativa ou Metodêutica, tendo como objetivo analisar os métodos utilizados por cada uma das interferências a fim de criar significado (SANTAELLA, 2002, p. 3).

A fim de compreender uma mídia recente como os videogames, seria possível/apropriado utilizar a ciência semiótica para abordagem dos mesmos e seus signos? O desenvolvimento de significado em diferentes experiências de jogo se mostra evidente. Além disso, nos perguntamos se as relações de sentido no jogo estão sendo exploradas e estudadas para dar conta de analisar uma mídia tão complexa que, por muitas vezes, integra elementos de outras mídias, bem como deve considerar a interação. Para abordar a complexidade dos videogames, adotamos uma dentre tantas perspectivas que recentemente vêm abordando os videogames nos ​game studies​.

MDA

O framework Mechanics-Dynamics-Aesthetics (MDA), segundo os propositores, consiste em uma abordagem formal de análise para jogos. Desenvolvida entre 2001-2004 por Robin Hunicke, Marc LeBlanc e Robert Zubek, esta abordagem de análise tem como intuito entender as ligações entre o design e o desenvolvimento de jogos relacionando os objetos de estudo (jogos) em três aspectos: Mecânicas, Dinâmicas e Estéticas. Considerando cada um desses fatores individualmente e suas relações, seria possível

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entender como o objeto de estudo funciona em termos de design e interação, tornando, viável o processo de análise por pesquisadores, desenvolvedores e críticos, dentre os maiores interesses em estudar, produzir e avaliar videogames.

A abordagem compreende que videogames são unidades multiníveis que requerem um coerência sistemática, donde cada parte do desenvolvimento de um jogo possa se relacionar com o todo e que, para isso, é necessário transitar entre todos os níveis de desenvolvimento do mesmo, desde o código fonte, passando pelo conteúdo, até a experiência, por exemplo.

Mecânicas (​Mechanics​) envolvem as regras do jogo (​game design​) e os recursos técnicos, como, o próprio código fonte (algoritmo) e interfaces físicas e lógicas. Dinâmicas (​Dynamics​) envolve os comportamentos e atitudes que ocorrem em decorrência dos aspectos mecânicos são afetados pelas ações do jogador. Já as Estéticas (​Aesthetics​) concerne às reações emocionais do jogador resultantes da sua interação com o jogo. "Do ponto de vista do designer, a mecânica dá origem ao comportamento dinâmico do sistema, que por sua vez leva a experiências estéticas. Da perspectiva do jogador, a estética dá o tom, que geram dinâmicas observáveis e, eventualmente, mecânicas operáveis" (LEBLANC et al., 2004, tradução nossa4​). Olhando com mais detalhes para o ponto de vista estético da

abordagem, envolve também a definição do que torna a experiência do jogo divertida ou o conjunto de sensações causadas pela experiência de um jogador em um determinado jogo. Dentre outras, os autores sugerem definições como fantasia, sociabilidade, desafio, narrativa, descoberta e sensação como estéticas mapeáveis.

As dinâmicas são as operações em que se desencadeiam as experiências estéticas, mobilizando comportamentos previstos e não previstos nas mecânicas. As mecânicas são que é o ponto alterado diretamente pelo desenvolvedor do jogo, que consiste nas possíveis ações do jogador no contexto do jogo. Junto com as limitações impostas pelo conteúdo do jogo.

Estado da Arte

4Texto original: "​From the designerís perspective, the mechanics give rise to dynamic system behavior, which in turn

leads to particular aesthetic experiences. From the playerís perspective, aesthetics set the tone, which is born out in observable dynamics and eventually, operable mechanics."

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Em busca de mapear o estudo da relação entre semiótica e videogames iniciamos umas busca em torno de trabalhos relacionados ao tema publicados nos últimos dez anos (2010-2019) e utilizando bases de dados virtuais como Scholar Google 5​, Ebsco6​, Capes7​,

DiGRA8 e Academia9​. Inicialmente com um intuito de focar em trabalhos transcritos em

português brasileiro utilizamos em nossa busca termos como: “jogos”, “semiótica” , “mecânica”, “estética”, “dinâmica”, “MDA”. Primeiramente nos deparamos com uma certa escassez de trabalhos relacionados ao tema escritos em português, fazendo com que fosse necessário expandir o escopo da pesquisa para outros idiomas.

A fim de expandir o repertório de pesquisa foram utilizados termos em inglês para a realização das buscas, sendo eles: “semiotics”, “games”, “analysis”. Com os resultados inicialmente realizou-se uma breve análise no conteúdo e, com um foco no resumo ou abstract, agrupamos as pesquisas que se relacionavam com o foco da pesquisa. Para definir a relevância das pesquisas foram utilizados critérios, nesta ordem: foco na análise semiótica de videogames, depois a relação dos conteúdos analisados com a abordagem MDA.

Seraphine (2014) traz um método de interpretação do lúdico em sua pesquisa “The intrinsic semiotics of videogames”. Baseando-se na semiótica peirciana ele classifica os gatilhos midiáticos nos videogames em 3 grupos: Actum, uma ação desencadeada pela interação do jogador com o jogo; Factum, uma ação acionada por uma gatilho não relacionado ao jogador; e Tactum, uma interação acionada pela influência conjunta de dois ou mais agentes dentro do jogo. Posteriormente, em um artigo mais recente - “Ethics at Play in Undertale: Rhetoric, Identity and Deconstruction” - Seraphine (2018) utiliza esse método para destacar o impacto que a interação mecânica no sistema de batalha do game Undertale (2015) causa na narrativa do mesmo, enunciando a mudança de interpretação que ocorre da perspectiva do jogador quando ocorre uma brusca mudança em um Factum. Segundo Seraphine (2018, tradução nossa10​):

5Disponível em: <https://scholar.google.com.br>. Acesso em: 3 abril 2020. 6Disponível em: <https://www.ebsco.com>. Acesso em: 31 outubro 2019. 7Disponível em: <periodicos.capes.gov.br>. Acesso em: 31 outubro 2019. 8Disponível em: <www.digra.org>. Acesso em: 10 março 2020.

9Disponível em: <https://www.academia.edu>. Acesso em: 3 abril 2020.

10​Texto original: "​Toriel’s attack sprites, as long as they don’t hit the player, are factums, interpretable interactions, that are observable, but unrelated to the player’s input. When Toriel’s attacks are moving in patterns difficult to avoid, they can be interpreted as factum-indices, as they are an ‘indicator’ of aggressivity from Toriel. Those factum-indices, when their constitutive legisign – or rule – is shifted to a moving pattern that avoids hurting the player, are no longer indicating aggressivity, they are now rather an indicator of pity. In this situation; the player may realize that Toriel never had the intention to beat them. Thus, the whole fight will start to feel unfair towards Toriel."

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Os sprites de ataque de Toriel, contanto que não atinjam o jogador, são factums, interações interpretáveis, que são observáveis, mas não relacionadas à ação do jogador. Quando os ataques de Toriel estão se movendo em padrões difíceis de evitar, eles podem ser interpretados como índices factum, pois são um "indicador" de agressividade de Toriel. Esses indicadores de fato, quando seu legi-signo constitutivo - ou regra - é deslocado para um padrão de movimento que evita ferir o jogador, não estão mais indicando agressividade, sendo agora mais um indicador de pena. Nesta situação; o jogador pode perceber que Toriel nunca teve a intenção de vencê-lo. Assim, toda a luta vai começar a parecer injusta com Toriel.

O que mais chama atenção na pesquisa de Seraphine é sua análise de como as dinâmicas de Undertale (2015) despertam um questionamento no jogador sobre violência e pacifismo, abalando seus pilares morais como ser humano. O autor propõe um método muito interessante de análise da dinâmica classificando as interações do jogo com o jogador em três grupos, se mostrando eficaz na obtenção de resultados sobre a significação que as dinâmicas geram no jogador. Algo importante a ressaltar é que em seu trabalho Seraphine utiliza dados coletados em entrevistas para estabelecer resultados de significação convincentes, compreendendo que por mais que ele entenda certa ação mecânica do jogo como geradora de pena, outros jogadores podem não ter a mesma experiência significativa em Undertale (2015). Desta forma, foge um pouco do viés semiótico ao tender a uma abordagem de recepção.

Lemos (2013), em seu trabalho “Composições e articulações do imaginário para a compreensão dos jogos digitais que tratam de saúde” enfatiza a figuratividade gerada pela questão artística do jogo, utilizando uma análise semiótica da perspectiva greimasiana. Lemos (2013) afirma como a “a tela do parecer” utiliza imagens para mediar e fomentar o imaginário do jogador a fim de atribuir sentido, e que para isso são utiliza estéticas familiares ao mundo real em que o jogador está inserido, como placas indicativas de direção, por exemplo. A própria sonoridade do jogo tem o papel de animar o jogador o incentivando a adentrar nessa aventura. Segundo ela:

Reafirma-se que a figuratividade se constituiu como 'a tela do parecer' em busca do 'fazer-ser'. Como em um desenho, 'cria mundos futurísticos de ficção científica, ciberpunques sofisticados, retornando aos mitos, heróis e guerreiros' (Rahde, 2001). Em um viés semiótico, Privates também deixa ver um destinador programador, que quer atingir ('fazer-crer') um destinário-gamer ou usuário interativo), 'protagonista em todo o conjunto de deslocamentos narrativos' (Shaw, 2005, p. 356), que 'quer-fazer' (ou jogar) para adquirir competência para 'poder fazer'. (LEMOS, 2013)

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Seguindo a perspectiva Peirce, Leonardo Vieira da rocha (2015), em seu trabalho “Columbia Cidade Símbolo: um olhar semiótico sobre o espaço em Bioshock Infinite”, traz algumas semelhanças em sua análise estética do jogo Bioshock Infinite (2013), em que utiliza os princípios da primeiridade, secundidade e terceiridade para analisar os aspectos estéticos e mecânicos do cenário (espaço) em que o jogador está inserido. A análise evidencia a função narrativa do cenário, tanto em situações em que o cenário, como função mecânica, física e estrutural, se opõe ao jogador, quanto em situações em que a função estética do cenário produz anseio e conflito aos personagens da história.

Analisando semioticamente a cidade-espaço Columbia, percebe-se que sua função vai além da simples identificação de remissões e ancoragem dos elementos constituintes da narrativa. Sua importância funcional temática, caracterizada explicitamente no enredo do game, simboliza, por metáfora, uma materialização do conflito interno do protagonista entre dever, (como ex-soldado da cavalaria americana, onde por ordens de seu país, matou centenas de indígenas em suas comunidades) e fé (pelo seu desejo de expurgar, não apenas os seus pecados por meio do batismo católico, mas todos os pecados existentes aquém em um grande batismo de fogo). Além disto compreende-se que esta dualidade, dever e fé, desenvolve uma cidade quimera onde prevalece uma sociedade excepcionalista e eugênica. (VIEIRA, 2015).

Mancini e Souza Júnior (2015), por sua vez, em seu artigo “O que a análise semiótica de um jogo do mario tem a dizer sobre a interatividade nos videogames”, utilizam a semiótica a fim de entender o efeito da interatividade. Ao analisar o videogame de Nintendo Wii Super mario galaxy (2007) são identificadas algumas estratégias utilizadas pelo jogo para causar um sincretismo actancial entre o jogador (enunciatário) e o protagonista do jogo (Mario). Ou seja, analisando mecanismos utilizados pelo jogo para amarrar o jogador ao protagonista, o artigo cita como a vibração que o jogador recebe pelo controle ao Mario sofrer dano, gerando um estímulo físico em seu corpo, proporcionando efeito de sentido para essa relação. É constante a troca entre referências ao jogador e ao protagonista, como quando alguma nova habilidade é ensinada ao protagonista dentro do universo do jogo também é ensinado um novo comando para o jogador, a maneira com que a gestualidade do jogador controla os movimentos do protagonista contribui para essa imersão, por exemplo. Outro fator destacado é a maneira como o jogo se comunica textualmente com o jogador. Segundo os autores:

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Quando o enunciador projeta na tela um elogio a Mário que ao mesmo tempo vale para o jogador, percebemos que a manipulação se dá por sedução, que é quando o destinador constrói uma imagem positiva do sujeito. Já quando Mario cai em um abismo, e o narrador afirma Too bad, configura-se uma provocação, quando o destinador constrói uma imagem negativa do sujeito. Acontece que o sujeito em questão, Mario, está sincretizado com o jogador (enunciatário), fazendo com que a manipulação valha tanto para a narrativa projetada como para a narrativa pressuposta. Não é apenas Mario que é provocado ou seduzido, mas também o jogador. (MANCINI; SOUZA JÚNIOR, 2015).

Esses diversos fatores contribuem para construção estética (MDA) permitindo assim, que ocorra uma interação imersiva fazendo com que o jogador justifique sua motivação com seu protagonismo paralelo ao do personagem do jogo (Mario).

Seguindo na mesma ideia de que as ações físicas do jogador no controle e as respostas que o mesmo envia para o jogador influenciam na criação de sentido dentro do game nos deparamos com o trabalho de Blomberg (2018), intitulado “The Semiotics of the Game Controller”. Em seu artigo Blomberg estabelece uma relação entre o jogador e o joystick associado ao console por meio de três fundamentos semióticos: semelhança (iconicidade), contiguidade (indicialidade) e convenção (simbolicidade) seguindo a semiótica peirceana. Em um primeiro momento o autor argumenta sobre como joysticks que se assemelham a ação realizada no jogo se mostram mais eficazes na criação de significado, como o caso da guitarra em Guitar Hero (2005). Porém, destaca o quão ineficaz pode ser essa obtenção de significado argumentando que um joystick de guitarra ainda que represente uma guitarra não é igual a uma, possui botões ao invés de cordas.

Nesse sentido, um joystick icônico não impõe que os jogadores tenham que representar diretamente as ações de seus avatares na tela, fazendo com que em pouco tempo as ação do jogador se tornem habituais e percam a conexão com a tentativa de realismo. Outro argumento levantado, é da significação direta do controlador associado ao videogame, significação essa que se embasa na convenção constituída ao longo da história em torno dos layouts de joysticks de videogame. Um exemplo disso é o direcional em cruz, originalmente desenvolvido para o NES/Famicom em 1983, que se faz presente até os dias de hoje acompanhando consoles contemporâneos. Por fim, o autor conclui que "embora sejam apenas uma parte da imagem, as propriedades semióticas dos controladores de

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videogame são, no entanto, características decisivas para fornecer ao jogador um link para o jogo. (BLOMBERG, 2018, tradução nossa11​).

Vale ressaltar que a convenção sobre os controladores faz com que o jogo tenha que se adaptar ao controlador, interferindo e, muitas vezes, prejudicando diretamente experiência de interação do jogo. O autor demonstra o impacto direto que o controle tem sobre a experiência de significação de um jogo, demonstrando que a análise do mesmo é essencial, a fim de desenvolver uma experiência estética desejada.

Outro ponto que se demonstra essencial para o desenvolvimento de uma experiência estética significativa é a coesão. No trabalho “Creating felicitous gaming experiences: semiotics and pragmatics as tools for video game localisation” Miguel Á. Bernal-Merino (2016) demonstra como a coesão dos sinais polissêmicos pode ser analisada para definir a qualidade da imersão em um jogo digital. Com o objetivo de criar ferramentas semióticas que ajudem desenvolvedores a localizarem(traduzirem) seus jogos para outras línguas para distribuição em outros países a pesquisa de miguel constrói umas análise semiótica aprofundada sobre a significação presente no conteúdo do jogo. Inicialmente o autor reforça a ideia de que o cérebro humano é mais eficaz em identificar significação quando recebe estímulos de diferentes fontes, dando ênfase ao fato de que por mais que um som seja em alta qualidade e com várias nuances, nunca será mais eficaz em obter significação do que um produto audiovisual. A sensação de interação com um jogo é alcançada pela entrada e saída multissensorial entre o jogador e o jogo envolvendo diversas camadas de signos em sua maioria visuais, acústicos e táteis. Se olharmos polissemioticamente para um café, por exemplo, ele não é apenas uma bebida feita com infusão de grão de uma planta, também é sua aparência, seu aroma, seu sabor, sua temperatura e a sensação que ela passa. Quanto maior o números de sentidos ativados mais profunda a significação. É imprescindível que as camadas polissemioticas sejam coesas, caso contrário o jogador deixa de significar o conteúdo do jogo o que gera uma experiência não programada, é como se de repente o café fosse frio e tingido de rosa. O autor também destaca que como a significação parte do jogador por mais que diferentes jogadores concluam a mesma obtendo os mesmos objetivos, a experiência de cada um deles pode ser distinta. Afim de evitar essa desconexão o autor detalha a experiência de jogo em 5 partes:

11Even though they are just one part of the picture, the semiotic properties of video game controllers are nevertheless decisive features for providing the player with a link to the game.

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Na mídia de entretenimento interativa, o jogador tem que decidir constantemente entre diferentes informações para vivenciar o jogo, sendo assim uma troca constante de signos(Tabela 1 abaixo) entre o jogo e o jogador. O processo da comunicação jogo/jogador pode ser ilustrado com o seguinte diagrama bidirecional:

JOGO ⇆ MENSAGEM⇆ CAMADAS DE CONTEÚDO ⇆ SIGNOS ⇆ JOGADOR (MERINO, 2016, tradução nossa12​).

Em decorrência disso, o autor propõe uma classificação das possíveis camadas da semiose a serem consideradas ao avaliar a geração de sentido em um jogo, sendo elas: linguagem escrita, linguagem falada, imagem, música, som, tato, percepção de espaço e percepção de equilíbrio. Posteriormente o autor divide cada camada em três categorias: signos icônicos, signos indexicais e signos simbólicos. Merino conclui que quando todas as camadas de semiose são coesas dentro do mundo do jogo, ele se torna um super sinal significando uma experiência única para o jogador.

Indo mais a fundo, com intuito de desenvolver um entendimento sobre como os jogos seriam capazes de criar experiências com características significativas, Aline Antunes de Souza (2017) propõe em sua tese “Os games enquanto jornadas fenomenológicas: a experiência estética semiótica nos jogos digitais” uma cartografia de experiências possíveis no ato de jogar, as tratando semioticamente como experiências estéticas. Tratando os Jogos como signos estéticos que incitam autocontrole ao desenvolver hábitos de sentimento conduta e pensamento em quem os joga. Focando na semiótica peirceana a autora utiliza seus conceitos de experiência estética semiótica para a atribuição de jogos enquanto linguagem potencial para produção de sentido evidenciando como a estética é recortada através do tecnológico.

A autora trata a estética experienciada através dos jogos como algo inerente a interatividade, tornando-a uma experiência estética de caráter processual, na qual o fluxo da experiência se dá no decorrência do tempo, pelas atualizações constantes desenvolvidas entre o jogador e o jogo, tornando assim a experiência estética em games um processo em eterno devir. O método de análise proposto po Souza (2017) se debruça sobre as teorias de Peirce utilizando os conceitos de primeiridade, secundidade e terceiridade. A autora propõe um roteiro compreendendo todas as etapas necessárias para uma análise semiótica de um jogo:

12In interactive entertainment media, the player has to constantly decide on information to experience more of the creation so it is a constant exchange of signs (Table 1 below) between the game-machine and the player. he process of

game-machine/player communication could be illustrated with the following bidirectional diagram: GAME-MACHINE ​⇆MESSAGE ​⇆ LAYER ​⇆ SIGN ​⇆ PLAYER

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1. O signo em si: a questão do game enquanto objeto estético em si, sua imanência enquanto signo estético.

1.1. Primeiridade, qualidades, ícones: forma

1.2. Secundidade, a experiência física do jogar, índices: gameplay 1.3. Terceiridade, interpretação cognitiva, símbolos: regras

2. A relação signo-objeto dinâmico: a relação que o game enquanto signo estético apresenta com seu contexto, sua objetividade semiótica.

2.1. Primeiridade, sugestão de aparência: contexto possível 2.2. Secundidade, rastro existente: tema

2.3. Terceiridade, lei por convenção social: gênero

3. O interpretante imediato predominante e algumas interconexões: sobre a predominância fenomenológica e a onipresença das categorias universais.

3.1. Primeiridade, nível interpretativo emocional: games que priorizam modos de sentir, a contemplação, as qualidades de sentimento, o poder de sugestão;

3.2. Secundidade, nível interpretativo energético: games que priorizam modos de agir, a ação física impelida, nos quais o corpo ganha maior destaque;

3.3. Terceiridade, nível interpretativo lógico: games que priorizam modos de pensar, via regras interpretativas internalizadas; enfatizam reflexões éticas e morais. (SOUZA, 2017, p. 83)

Souza (2017) enfatiza o fato de que jogos são mídias essencialmente interativas que sua produção de sentido é derivado do ato de jogar, logo qualquer jogo estará sob a predominância fenomenológica da secundidade. Nesse contexto, podemos verificar o potencial de relação da análise proposta por Souza (2017) com o MDA, de forma que, do jogador para o jogo podendo-se relacionar diretamente a primeiridade com a estética e a secundidade com dinâmica. A autora também acaba relacionando a terceiridade com as regras do jogo, o que se interpretado pela abordagem do MDA poderia ter uma relação com as mecânicas, porém levando em conta o que o estudo semiótico propõe a terceiridade acaba tendo uma relação mais com a estética do que com a mecânica em si.

Por fim, a autora ressalta “que toda a análise semiótica pressupõe, necessariamente um intérprete singular que reflete acerca do signo” (SOUZA, 2017, p. 84). Ou seja, a análise sempre será do ponto de vista do indivíduo que está interpretando a experiência do jogar. Portanto, a análise será sempre relativa e nunca definitiva, podendo em muitos casos ser considerada falha.

A fim de construir uma análise ainda mais aprofunda Soura (2017) ainda ressalta algumas características da produção de sentido que devem ser analisadas, sendo estas:

As qualidades das heurísticas – das escolhas, da variedade, das consequências, da previsibilidade, da incerteza e da potencial satisfação –; a relevância da ação do jogador para a mudança de estado; a qualidade da imersão, determinada pela

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agência e determinante da sensação de presença no mundo virtual; o potencial de prazer e de frustração imanentes; as possibilidades de antecipação e encerramento consequente; as estratégias de envolvimento priorizadas pelos games, extraídas de seus gêneros e discursos de lançamento (por meio de entrevistas, prévias e propagandas); e a potencialidade de portabilidade de sentido, que será averiguada, principalmente, pelas possibilidades de compreensão e de interpretação a serem atualizadas. (SOUZA, 2017, p. 174).

Por fim, Souza (2017) conclui que jogos digitais podem ser pensados e analisados como signos estéticos e que têm um enorme potencial em proporcionar novos modos de sentir agir e pensar. Apesar de desenvolver um método eficaz de análise semiótica de games a autora conclui que o tema ainda demonstra como potencial para estudo, se questionando se seria por meio da análise de vários interpretantes (jogadores) traçar novas possibilidades da obtenção de sentido.

Conclusões

Após a análise do cenário como um todo é possível ver uma crescente no interesse de estudos sobre o tema nos últimos anos, justificada pela potencialidade comprovada dos jogos como geradores de signos e significados, potencialidade essa que enfatiza a complexidade desse tipo de análise.

Jogos digitais como objeto de estudo semióticos se mostram extremamente complexos, com diversas camadas da significação possíveis, em sua maioria causadas pela intrínseca interação presente na mídia. Interação essa que por sí só já traz inúmeras nuances, como é apresentado por Seraphine (2018) e Blomberg (2018) em seus respectivos trabalhos. Além disso, ainda devemos considerar como a estética influencia na interação e vice-versa, o que torna tudo ainda mais complexo e trabalhoso.

O MDA acaba se mostrando bem útil, muitas vezes se relacionando quase que intrinsecamente com a semiótica peirceana (do ponto de vista do jogador para o jogo), trabalhos como o de Souza (2017) demonstram como a semiótica pode utilizar conceitos intrínsecos aos jogos digitais como mecânica, dinâmica e estética para o desenvolvimento de uma análise da significação eficaz. Em seu trabalho Seraphine (2018) já dá indícios sobre os resultados que essa abordagem poderia gerar, porém, por conta de sua complexidade na obtenção desses dados, esse tipo de abordagem ainda se mostra uma terra inexplorada.

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Por fim, conclui-se com este estado da arte que, por mais que uma análise semiótica de jogos seja eficaz, a mesma ainda não pode ser considerada definitiva, ao menos do ponto de vista singular de quem analisa. O questionamento que fica é se seria possível então com uma análise plural advinda de muitos jogadores traçar semelhanças as significações a fim de compreender o reais fatores gerativos de significação em um jogo específico. Ou ainda, se faltam usos e experimentações das possibilidades analíticas para uma verificação mais adequada.

Referências

BLOMBERG, Johan.​ The semiotics of the game controller​. Suécia: Lund University, 2018. LEBLANC, Marc; HUNICKE, Robin; ZUBEK, Robert.​MDA​: a formal approach to game design and game research. San Jose, 2004.

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