SBNp
sociedade brasileira deNeuropsicologia
AArtmed é a editora oficial da Sociedade Brasileira de Neuropsicologia
NEUROPSICOLOGIA
Catalogacáo na publicacáo: Poliana Sanchez de Arauja - CRB 10/2094
CDU 159.91:612.8 l. Neuropsicologia. l. Serafim, Antonio de Pádua. II. Saffi, Fabiana. Editado também como livro impresso em 2015.
ISBN 978-85-8271-182-8
N495 Neuropsicologia forense [recurso eletrónico] /Organizadores,
2015 versáo impressa desta obra: 2015
Antonio de Pádua Serafim
Fabiana Saffi
(orgs.)
NEUROPSICDLOGIA
FORENSE
SÁOPAUW
Av. Embaixador Macedo Soares, 10.735 - Pavilháo 5 Cond. Espace Center - Vila Anastácio
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©dreamstime.com / Gines Valera Marin, 2012: Brain icon set Ilustracóes
Gilnei da Costa Cunha Preparacáo do original Antonio Augusto da Roza
Leitura final Camila Wisnieski Heck
Projeto e editoracáo
Bookabout- Roberto Carlos Moreira Vieira Gerente editorial
Letícia Bispo de Lima Colaboraram nesta edicáo:
Coordenadora editorial Cláudia Bittencourt Assistente editorial PaolaAraújo de Oliveira Capa Márcio Monticelli © Artmed Editora Ltda, 2015
cologia e Neuropsicologia do IPq-FMUSP. Neu- ropsicóloga pesquisadora do Projeto Transtomos do Espectro Obsessivo-compulsivo (PROTOC). Secretária executiva da Sociedade Brasileira de Neuropsicologia (SBNp, 2013-2015).
Carolina Farias da Silva Bernardo. Psicóloga. Aperfeicoamento em Psicologia Jurídica Práti- ca Pericial no NUFOR/IPq-HCFMUSP, Impac- tos da Violencia na Saúde, coordenado pela Es- cola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (EAD/ENSP) e pela FIOCRUZ, Transtornos do Controle do Imp.ulso no.Ambulatório de 'Irans- tornos do Impulso (AMITI), HCFMUSP. Espe- cialista em Terapia Cognitiva. Professora adjunta do Centro de Terapia Cognitiva Veda. Psicóloga colaboradora do NUFOR e do Ai.'vlITI, IPq- -HCFMUSP.
Cristiana Castanho de Almeida Rocca. Psicó- loga. Mestre e Doutora em Ciencias pela USP. Professora colaboradora na FMUSP. Psicóloga Aires Evandro José Ribeiro. Psicólogo. Especia-
lista em Neuropsicologia pe1o IPq- HCFMUSP. Aline Lavorato Gaeta. Psiquiatra. Médica pre- ceptora do Programa de Suporte ao Aluno e Re- sidente do HCFMUSP.
Ana Jo Jennings Moraes. Psicóloga. Aprimo- randa do Servico de Neuropsicologia Hospitalar do IPq-HCFMUSP. Aperfeicoamento em Psico- logia Jurídica: Prática Pericial,
Anna Cecilia Santos Chaves. Advogada. Espe- cialista em Ciencias Crirninais pela Universida- de Cándido Mendes (UCAM). Doutoranda em Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia na Faculdade de Direito do Largo de Sao Fran- cisco da USP. Bolsista de Doutorado Direto da FAPESP. Membro do NUFOR/IPq-HCFMUSP. Carina Chaubet D'Alcant&. Psicóloga. Especialis- ta em Neuropsicologia. Mestre em Ciencias pela FMUSP. Psicóloga supervisora do Servico de Psi-
Antonio de Pádua Serafim. Psicólogo. Doutor em Ciencias pela Faculdade de Medicina da Uní- versidade de Sao Paulo (FMUSP). Coordenador do Núcleo Forense e Diretor do Servico de Psico- logia e Neuropsicologia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Me- dicina da Universidade de Sao Paulo (IPq-HCFMUSP). Professor colaborador do Departamento de Psiquiatría da FMUSP. Professor titular do Programa de Pós-graduacáo em Psicologia da Saú- de da Universidade Metodista de Sao Paulo (UMESP). Orientador do Programa de Pós-gradua- t¡:ao em Neurociencias e Comportamento do Instituto de Psicologia da Universidade de Sao Pau- 1o (IPUSP). Pesquisador do GT-ANPEPP Tecnologia Social e Inovacáo: Intervencóes Psicológicas e
Práticas Forenses contra Violencia.
Fabiana Saffi. Psicóloga. Especialista em Psicologia Hospitalar em Avaliacáo Psicológica e Neuropsi- cológica pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de Sao Paulo (HCEMUSP). Especialista em Psicología Jurídica pelo Conselho Federal de Psicología ( CFP). Mestre em Ciencias pela Faculdade de Medicina da Universidade de Sao Paulo (FMUSP). Psicóloga supervi- sora no Servíco de Psicologia e Neuropsicologia e no Ambulatório do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Psiquiatria Forense e Psicologia Jurídica (NUFOR), Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clí- nicas da Faculdade de Medicina da Universidade de Sao Paulo (IPq-HCFMUSP).
Psicogeriatria do Laboratório de Neurociencias (LIM-27) da FMUSP.
Juliana Emy Yokomizo. Psicóloga. Especialista em Neuropsicologia e em Psicologia Hospitalar pelo IPq-HCFMUSP. Pós-graduanda na FMUSP. Psicóloga supervisora do Servico de Psicologia e Neuropsicologia do IPq-HCFMUSP.
Leandro F. Malloy-Diniz. Neuropsicólogo. Dou- tor em Farmacologia Bioquímica e Molecu- lar pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professor adjunto da Faculdade de Medicina da UFMG. Coordenador do Labora- tório de Investigacóes em Neurociencias Clíni- cas do Instituto Nacional de Ciencia e Tecno- logia de Medicina Molecular (INCT-MM) da UFMG. Presidente da SBNp (2011-2015).
Luciana de Carvalho Monteiro. Psicóloga. Espe- cialista em Avaliacáo Psicológica e Neuropsíco- lógica pelo IPq-HCFMUSP. Mestre em Ciencias pela FMUSP. Psicóloga colaboradora do Servi- 90 de Psicología e Neuropsicologia do Centro de Reabilitacáo e Hospital-Dia (CHRD) e do Pro- jeto de Déficit de Atencáo e Hiperatividade em Adultos (PRODATH) do IPq-HCFMUSP.
Maria Fernanda F. Achá. Psicóloga. Mestre em Ciencias pela FMUSP. Neuropsicóloga do Hos- pital Israelita Albert Einstein. Pesquisadora co- laboradora do NUFOR/IPq-HCFMUSP.
Maria lnes Falcao. Psicóloga. Especialista em Neuropsicologia pelo CFP. Psicóloga superviso- ra concursada do Servico de Psicologia e Neu- ropsicologia do IPq-HCFMUSP. Professora do Curso de Especializacáo em Neuropsicologia no Contexto Hospitalar do Servico de Psicolo- gia/IPq-HCFMUSP, e no Curso de Graduacáo de Psicologia da Universidade Paulista (UNIP). Professora e membro da Sociedade Rorschach de Sao Paulo e Ger-A<;oes - Pesquisas e Acóes em Gerontologia.
Marianne Abt. Psicóloga. Especialista em Neu- ropsicologia pelo IPq-HCMFUSP.
Marina von Zuben de Arruda Camargo. Psicó- loga. Especialista em Neuropsicologia pelo Ins- tituto Neurológico de Sao Paulo. Mestre em Neurociencia e Comportamento pelo IPUSP. Docente dos cursos de Especializacáo em Neu- ropsicologia e Extensáo em Reabilitacáo Cog- supervisora no Servico de Psicologia e Neuro-
psicologia do IPq-FMUSP.
Cristiane Ferreira dos Santos. Psicóloga. Aper- feicoamento em Pericia Psicológica no NUFOR/ IPq-HCFMUSP. Psicóloga colaboradora no aten- dimento e avaliacáo no NUFOR/IPq-HCFMUSP. Daniel Martins de Barros. Psiquiatra. Bacha- rel em Filosofia. Doutor em Ciencias pela USP. Professor colaborador do Departamento de Psi-
quiatria da FMUSP.
Daniela Pacheco. Psicóloga clínica. Especialista em Terapias Cognitivas pelo HCFMUSP. Psicóloga colaboradora do Ambulatório de Saúde Mental da Mulher (ProMulher) do IPq-HCFMUSP.
tverton Duarte. Psicólogo, neuropsicólogo. For-
macáo em Neuropsicologia Clínica e de Pesquisa pelo Servico de Psicologia e Neuropsicologia do IPq-HCFMUSP. Mestre em Ciencias pelo Depar- tamento de Psiquiatria do IPq--HCFMUSP. Pro- fessor no Centro Universitário Sao Camilo de Sao Paulo. Colaborador no Servico de Psicologia e Neuropsicologia do IPq-HCFMUSP.
Flávia Celestino Seifarth de Freitas. Advogada. Especialista em Processo Civil pela Pontificia Universidade Católica (PUC). Diretora jurídica da Associacáo Brasileira de Alzheimer (ABRAz) Regional Sao Paulo.
Geraldo Busatto Filho. Psiquiatra. PhD em Psi- quiatria pela Universidade de Londres, Inglater- ra. Professor titular do Departamento de Psi- quiatria da FMUSP. Coordenador do Núcleo de Apoio
a
Pesquisa em Neurociencia Aplicada (NAPNA) da USP.Gra!(a Maria Ramos de Oliveira. Psicóloga. Es-
pecialista em Psicologia Hospitalar pelo CFP. Especialista em Psicologia Psicodinámíca pelo Sedes-Sapientae. Psicóloga supervisora do Ser- vico de Psicologia e Neuropsicologia do IPq- -HCFMUSP. Psicóloga colaboradora do Projeto Esquizofrenia (PROJESQ) no IPq-HCFMUSP. lvan Aprahamian. Geriatra. Mestre em Geron-
tologia pela Universidade Estadual de Cam- pinas (Unicamp). Doutor em Psiquiatria pela USP. Professor colaborador e docente da Pós- -graduacáo do Departamento de Psiquiatria da FMUSP. Professor adjunto da Faculdade de Me- dicina de Iundiaí, Coordenador do Programa de
Vi •
AUTORESIPq-HCFMUSP. Neuropsicóloga do Ambula- tório de Transtornos de Identidade de Género e Orientacáo Sexual (AMTIGOS) do NUFOR/ IPq-HCFMUSP.
Priscila Dib Gon!falves. Psicóloga. Psicóloga supervisora do Servico de Psicologia e Neurop- sicologia do IPq-HCFMUSP. Pesquisadora do Programa Interdisciplinar de Estudos de Alcool e Drogas (GREA) do IPq-HCFMUSP. Pesquisa- dora do Laboratório de Neuroimagem em Psi- quiatria (LIM-21) do IPq-HCFMUSP.
Roberto Augusto de Carvalho Campos. Neu- rocirurgiao. Mestre e Doutor em Medicina pe- la Universidade Federal de Sao Paulo (Unifesp) - Escola Paulista de Medicina (EPM). Professor doutor da Faculdade de Direito da USP.
Tánia
Maria Alves. Psiquiatra. Mestre e Douto- ra em Psiquiatria pela USP.Vanessa Flaborea Favaro. Psiquiatra. Assisten- te do HCFMUSP.
AUTORES •
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nitiva do Instituto Neurológico de Sao Paulo.Pesquisadora do Laboratório de Neurociencias (LIM-27) do IPq-HCFMUSP.
Mery Candido de Oliveira. Psicóloga clínica e forense. Especialista em Adultos e Adolescen- tes pelo Instituto Sedes Sapientiae. Mestre em Ciencia pela USP. Supervisora de Alunos pela Federacáo Brasileira de Psicodrama (FEBRAP). Coordenadora do Programa de Atendimento a Vítimas de Violencia e Agressores do NUFOR/ IPq-HCFMUSP. Supervisora da Psicoterapia na Pundacáo Casa.
Monica Kayo. Psiquiatra. Mestre em Ciencias pelaFMUSP.
Natali Maia Marques. Psicóloga. Especialista em Avaliacáo Psicológica e Neuropsicológica pelo Servico de Psicologia e Neuropsicologia do IPq- -HCFMUSP. Mestranda no Programa de pós- -graduacáo de Neurociencia e Comportamen- to do IPUSP. Psicóloga supervisora no NUFOR/
realizando um trabalho pioneiro tanto
e
rn
termos de producáo de conhecimento co- mo no investimento na forrnacáo de recur- sos humanos da área.Os capítulos, escritos por profissio- nais de diversas áreas de atuacáo relacio- nadas
a
neuropsicologia forense, estáo or-ganizados em cinco partes. Na primeira delas, Fundamentos, os autores caracteri- zam a neuropsicologia forense em termos de seus fundamen tos, aplicacóes principais, sua história e sua
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e
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com outras áreas. Na segunda parte,Pu
n
cáes
neuropsicol
é
gi
-
cas e aplicar-aes forenses,
sao apresentados capítulos sobre a relacáo entre diferentes módulos cognitivos e a prática da neuro- psicología forense. Essa estrategia didática permite ao neuropsicólogo a compreensáo das implicacñes forenses de alteracóes em diferentes domínios da cognicño. Na tercei-ra parte, A11a
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ágíca forense
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os autores ex- ploram as interfaces entre neuropsicolo- gia e psiquiatría COITI énfase na prática da avaliacáo neuropsicológica. Nas duas últi- mas partes doli
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lógica forense ern
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As-pectos éticos e pe
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iciais,
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quest6es fundamentáis da prática forense: a simulacáo de déficits cognitivos, a avaliacáo de menores infratores e a producáo/rnane- jo de documentos periciais. Consideramos que o percurso escolhido pelos organiza- dores oferece ao leitor um texto capaz de conciliar a apresentacáo de conceitos intro-O crescimento da Neuropsicologia no Bra- sil nas últimas décadas é
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otá
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Além does
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conquistado aos poucos em cur-sos de graduacáo, proliferaram os cursos de
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de formacáo continua- da. Para atender as demandas da capaci- tacáo básica,v
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s
títulos generalistas fo- rarn lancados nos últimos anos, facilitando o acesso ao conhecimento inlrodutórioa
neuropsicologia, estimulando a busca por formacác na área. No entanto, com o au- mento continuo do número de neuropsi- cólogos e interessados pela área, aumentou tambérn a demanda deli
v
r
os
direcionados a temas mais específicos e coro maior apro- fundamento.A retomada da série "Temas em Neu- ropsicologia" no ano de 2013 teve, entre seus principais propósitos, fomentar a pu- blicacño de livros capazes de apresentar aos neuropsicólogos brasileiros o "estado da arte" em áreas específicas de aplicacáo da neuropsicologia. O primeiro livro da série,
Neuropsicolegia geriátrica,
mostrou o quáo acertado foiesse
direcionamento.Mantendo a
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do enfoque em áreas especificas, apresentamos o segundo livro da série Temas em Neuropsicologia,Neuropsicologia
forense
.
Organizado pelos doutores Antonio de Pádua Serafim e Fa- biana Saffi, este Iivro propóe um aprofun- damento em questóes teóricas e metodoló- gicas dasapli
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Presidente da Sociedade Brasileira de
Neuropsicologia (SBNp)
(2011-2013; 2013-2015)
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neuropsicologia brasileira
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cia forense, para embasar os capítulos se- guintes, que abordam as nocóes básicas do direito, a pericia ern saúde mental e a .im portáncia, nesse contexto, das estruturas cerebrais envolvidas. Em seguida, o livro descreve as funcoes neuropsicológicas e su- as implicacóes forenses, para depois abor- dar com profundidade, em quinze capítu- los, a avaliacáo neuropsicológica forense dos princípais transtornos .neuropsiquiá-
trices, Nas duas últimas secóes do livro sao apresentados aspectos da avaliacáo neurop- sicológica forense em situacóes específicas, como a simulacáo de déficits cognitivos e os jovens infratores, e, por
fim,
os aspectos éticos em pericias neuropsiquiátricas.Saúdo os colegas Antonio de
P
á
du
a
Serafim e Fabiana Saffi, assim como todos os autores dos capítulos, pela iniciativa de produzir um livro tao oportuno e necessá- rio. 'Ienho plena conviccáo de que esta obra será, em breve, considerada urna referencia, podendo auxiliar muitos colegas a produ- zir laudos periciais mais consistentes, pre- cisose
úteis, que poderse auxiliar decisiva- mente na resolucáo de inúmeros processos judiciais.A Neuropsicologia e a Psiquiatría Foren- ses tém recebido mais atencáo nos últimos anos, provavelmente pelo grande número de situacñes nas quais os profissionais des-
s
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sido chamados a atuar, bem como pelo grande número de colegas que estáo atuando como peritos judiciais. In- felizmente, ainda ternos poucos livros téc- nicos publicados sobre o terna, e cada vez mais existe a necessidade de embasar os métodos e as conclusóes apresentadas nos processos judiciais em conhecimentos téc- nicos consistentes e atuais.R
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o con- vite para prefaciar este livro sobre Neuro-p
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Forense, organizado pelos profes- sores Antonio de Pádua Serafim e FabianaSaffi
,
porque sei que seus autores sao colegas que se dedicarnhá
bastante tempo, de for- mas
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coerente, a produzir laudos e ava- liacóes judiciais, sempre preocupados como rigor académico e coma importancia decisi- va dessasav
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técnicas sobre a resolu- yao dos processos judiciais.O Iivro, rnuito bem organizado em quatro
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inicia abordando os aspec- tos históricos da neuropsicologia clínica e forense,e
as características da neurocién-parte
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neuropsicológica
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forense
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Atengao 71Luciana de Carvalho Monteiro, Fabiana Saffi
7
Memória 78Mery Candido de Oliveira, Antonio de Pádua Serafim
8
Pensamento 88Marla Pernanda F. Achá, Vmtessa Flnborea Pavaro
9
Inteligencia 97Natal! Mala Marques, Maria Pernanda F. Achá, Marianne Abt
10
Linguagem 104Pabiana Saffi, Maria Inés Palcüo
11
Emo~a
o 113Ana fó [enning: Moraes, Antonio de Pádua Serafiru
12
Funcoes executivas 121Antonio de Pádua Serafim, Aires Evandro fose Ribeiro, Leandro F. Malíoy-Diniz par te
3
Avalia~ao neuropsicológica forense: quadros neuropsiquiátricos
13
Esquizofrenia 133Gra.¡:a Maria Ramos de Olive ira, Tá11ia Maria Al ves, Pabiana Saffi
parte
1
Fundamento
s
1
Aspectos históricos da neuropsicologia clínica e forense 17 Antonio de Pádua Serafim, Éverton Duarte, Maria Pernanda F. Ac/1á2
Neurociencias forenses 26Daniel Martms de Barros, Aline Lavorato Gaeta, Geralda Busatto Pilho
3 No~lies básicas do direito. orientaebes para a perícia ern saúde mental 34 Anna Cecilia Santos Clmves, Roberto Augusto de Carvalho Campos
4
A perfcia em saúde mental 46Antonio de Pádu« Serafim, Pabiana Saffi
5
Estruturas cerebrais 57Marina vo11 Zuben de Arruda Camargo, Ivan Aprahamian
Sumário
Indice 285
parte
5
Aspectos éticos em perícias
30
O contato como periciando, os procedimentos e os documentos forenses 277 Pabiana Saffi, Natali Maia Marques, Antonio de Pádua Serafimparte
4
Avalia~ao neuropsicológica forense em situa~oes específicas
2
8
Simula~ao de déficits cognitivos 261Antonio de Pádua Serafim, Daniela Pacheco
29
Jovens infratores 269Natali Maia Marques, Mery Gandido de Oliveira
14
Psicoses orgánicas 145Monica Kayo, Fabiana Saffi
15
Transtorno de déficit deatenc
á
o/h:
peratividade em adultos 155 Luciana de Carvalho Monteiro, Antonio de Pádua Serafim16
Quadros depressivos 162Pabiana Saffi, Antonio de Pádua Serafim
17
Transtorno bipolar 170Cristiana Castanho de Almeida Rocca, Fabiana Saffi
18
Ansiedad e generalizada 181Carina Chaubet D'Alcante, Fabiana Saffi
19 Transtorno obsessivocompulsivo 189
Carina Chaubet D'Alcante, Antonio de Pádua Serafim
20
Transtorno de estresse póstraumático 197Mery Gandido de Oliveira; Natali Maia Marques
21
Retardo mental 205Natali Maia Marques, Cristiane Perreira dos Santos
2
.
2
Aspectos neuropsicológicos e médicolegais na doen~a de Alzheimer. 210 Maria Fernanda F. Achá, Plávia Celestino Seifarth de Freitas, Juliana Emy Yokomizo23
Aspectos neuropsicológicos e médicolegais na doen~a de Parkinson 217 Juliana Emy Yokomizo, Plávia Celestino Seifarth de Freitas, Maria Fernanda F. Achá24
Traumatismo craniencefálico 224Ana Jo Jennings Moraes, Antonio de Pádua Serafim
25
Dependencia química: alcoolismo, maconha, cocaína ecrack
233
Priscila Dib Gonralves, Antonio de Pádua. Serafim
26
Transtornos da personalidade 241Antonio de Pádua Serafim, Natali Maia Marques
27
Transtornos do controle de impulsos 249Carolina Parias da Silva Bernardo, Antonio de Pádua Serafim
Platáo ( 428 a.C.) descreveu a rnedu-
la como urna das partes mais importantes do corpo, considerando-a urna extensáo
do cérebro, Alcmeón de Crotona, 110 século
V, na Grécia Antiga, julgava que o cérebro era o
ó
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á
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responsável pela sensacáo e pe-lo pensamento, afirmando que, para cada sensacáo, havia uma localizacáo específica no cérebro (Feinberg & Farah, 1997). U1n
século depois, Hipócrates ressaltava que o cérebro era responsável, pela inteligen-
cia, pela sensacáo e pela ernocáo, e disso-
ciava os quadros epilépticos das possessóes demoníacas.
J
á
Galeno (129 d.C.) explica-va que a sensacáo era a mudanca qualitati-
va de um órgáo dos sentidos, e a percepcáo
se
configurava como o estado de conscien-cia dessa mudanca (Kristensen et al., 2001).
A p
artil" do séculoXVIII,
o estudo en-tre mente e cérebro se desenvolve no esca-
po das Iocalizacóes. Inicia-se um processo de identificar regióes cerebrais com deter-
minadas funcóes. Nesse recorte da historia, podemos destacar as explicacóes de David Hartley, em 1777, que já apontava que aba-
se da sensacáo e do movimento era a subs-
tancia branca do cérebro e do cerebelo. Essa descricáo preconiza as concepcóes localiza-
cionistas, intensamente difundidas no sé-
culo XIX. O fato de que tuna acáo violenta possa nao
ter relacáo com tuna disfuncáo cerebral e a possibilidade de que urna alegacáo de am- nésia seja apenas urna simulacáo de déficit cognitivo visando a explicar UD1 desvio de dinheiro sao exemplcs de contextos da in
terface entre a saúde mental
e a ju
stica.A investigacáo do funcionamento ce- rebral e da expressáo do comportamen-
to faz parte de urn contexto de questiona- mentes que aproxima, ao longo da história, a psicología, a neurología e, mais recente- mente, a neuropsicologia. Essa aproxima- c;:ao se deu no fim do século XIX, na Alema- .nha, a partil" da obra
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ógic
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de Wundt, estabelecendo um conceito que perdurou porm
u
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tempo e que dizia respeito ao corpo de pesquisas realizadas ern laboratorio (Kristensen, Al-meida, &Gomes, 2001).
O percurso histórico do surgimento da neuropsicologia tem inicio comos estu- dos dos antigos egípcíos, que, ernbora acre- ditassem que o coracáo e o diafragma fos- sem os centros vitais,
j
á
faziam rnencóes a alteracñes comportamentais resultantes de Iesñes no cránio.FUNDAMENTOS HISTÓRICOS
ANTONIO DE PÁDUA SERAFIM ÉVERTON DUARTEMARIA FERNANDA F. ACHÁ
Aspectos históricos da
Fonte: Luria (1981).
Responsável por programar, regu
lar e verificar a atividade mental. Composta pelas partes anteriores do cérebro (lobo frontal).
Responsável por receber, proces sar e armazenar as inforrnacóes. Compéiese das partes posteriores do cérebro (lobo parietal, occipital e tempora ll.
Responsável por regular o tónus cortical, a vigilia e os estados mentais. É composta pela for ma9ao reticular e pelo tronco encefálico.
UNIDADE 1 UNIDADE 11 UNIDADE 111
O que rege esse dinamismo cerebral é
a integracáo entre unidades cerebrais fun-
cionais (Tab. 1.1). Luria (1981) elaborou a teoría do sistema funcional, fazendo urna revisáo dos termos "funcao" "Iocalizacáo" e
. . . o estudo dos distúrbios cognitivos e emocionais, bern corno o estudo dos distúrbios de personalidade provocados por lesóes do cérebro, que é o órgáo do pensamento e, portanto, a sede da consciencia.
esquerdo. Embora tais pacientes nao apre-
sentassem alteracóes na fala expressiva, as lesóes resultavam na perda da capacidade de compreendé-la (Benedet, 1986).
A neuropsicologia, assirn, é de fato re-
conhecida nos meados do século XX, com os trabalhos de Alexander Romanovich Lu-
ria, que desenvolveu diversas técnicas para estudar o comportamento dos individuos acometidos por lesoes cerebrais (Crawford, Parker, & McKinlay, 1994).
Para Luria (1981), o sistema nervoso central, além da organizacao em rede, parti-
cipa de forma ativa na regulacáo das funcóes superiores (percepcáo, memória, gnosias,
praxias), visto que essas funcóes se orga- nizam como sistemas complexos, resulta- do de urna acáo e interacáo dinámica de
di
versas regíóes cerebrais interligadas entre si. Autores mais recentes, como Gil (2002, p.l ), definem a neuropsicologia como
TABELA 1.1
Unidades cerebraís funcionais
Franz Josef Gall (século XIX) estabe-
leceu a díferenca entre a substancia bran-
ca e a cinzenta, descrevendo a ligacao dos quadros de afasia com lesóes de lobo fron-
tal. Gall identificou 27 faculdades humanas relacionadas a áreas cerebrais, criando, as-
sim, a teoría geral da localizacáo cerebral,
ou frenología (Brett, 1953).
Embora os conceitos localizacionistas tenham perdurado por todo o século XIX, em 1820, Flourens contradiz as concepcóes de Gall, ressaltando que o cérebro funcionava como um todo e nao dependia de urna única
regí
á
o
ou área específica (Walsh, 1994).As conceituacóes de Flourens acer-
ca do funcionamento cerebral integra-
do podem ser consideradas como o início das concepcóes associacionistas, que dis-
correm sobre urna organizacáo cerebral hierarquicamente organizada e interati-
va. Paul Broca, na metade do século XIX, descreve o quadro clínico de um paciente que apresentava perda da capacidade da fa- la em funcáo de urna lesáo na regiáo fron- tal do hemisfério esquerdo, corroborando a dificuldade em pronunciar palavras, em-
bora mantivesse preservada a compreen-
sao dos significados. As descrícóes de Bro-
ca sobre os centros cerebrais da linguagem foram observadas paralelamente por Wer-
nicke, que, urna década mais tarde, apre-
sentou casos de pacientes com lesóes no terco posterior do giro temporal superior
Fonle: Luria (1981).
• Baseandose na observacáo de urna rnudanca de
comportamento da pessoa, sem urna etiologia
identificável
• A pessoa nao tem fatores de risco conhecidos para lesáo cerebral
• O diagnóstico é considerado
a partir da exclusáo de outros diag nósticos
• Sao pessoas sem história neuroló gica ou psiquiátrica
• Nestes quadros, as rnudancas de comportamento podem ser síntomas de urna determinada pato logia
• E ndocri nopati as • Alteracóes
metabólicas • Doencas renais • Entre outras • Doencas
• Traumatismos eran i encefálicos • Hidrocefalia
• Doenca de Alzheimer • Doenca de Parkinson • Esclerose múltipla
PESSOAS COM LESAO PESSOAS COM FATOR DE RISCO SUSPEITA DE DOEN~A OU CEREBRAL CONHECIDA PARA LESAO OU DISFUN~AO CEREBRAL TRAUMATISMO CEREBRAL
TABELA 1.2
Principais quadros que sugerem a necessidade de avalia~ao neuropsicológica
cundário, sem que esta possa ser detectada por meio de exarnes clínicos, urna vez que o tecido cortical nao está comprometido.
A
avaliacáo
é realizada por testes or- ganizados em baterías que fornecem infor-macóes diagnósticas e permitem confirmar - ou nao - as hipóteses iniciais sobre o pa-
ciente. A partir dos resultados do exame neuropsicológico é
poss
í
vel
delimitar quaisfuncóes
cerebrais estáo afetadas e quais es-tao preservadas (Groth-Marnat, 2000). Nesse contexto, a análise neuropsi- cológica fornece urna lente através da qual podem ser observadas a natureza e a
dina
mica dos processos cognitivos e afetívo- -emocíonais em sua relacáo com o cére-
bro. Ainda segundo Lezak e colaboradores (2006), o processo de investigacáo neuro-
psicológica engloba a funcáo cerebral infe-
rida a partir da manifestacáo do cornpor-
tarnento.
As
principais rnanifestacóes cornpor-tarnentais que sugerem a necessidade de urna avaliacáo neuropsicológica podem ser organizadas em tres grupos distintos (Tab.
1.2).
NEUROPSICOLOGIA FORENSE •
19
"síntoma" O termo "funcao" foi substituí-
do por "sistema funcional", que se refere a um conjunto de áreas que trabalham juntas para desempenhar um objetivo final.
As contribuicées de Luria (1981) acerca das tres unidades funcionais nao só
representaram um modelo para o enten-
dimento do funcionamento cerebral co- mo também colaborararn para o desenvol-
vimento de mecanismos de avaliacáo das possíveis
disfuncóes
cerebrais. Entre os ins- trumentos para investigar tais alteracóes, destaca-se aavaliacáo
neuropsicológica. Segundo Lezak, Howieson e Loring (2006), essa técnica é urna importante ferramentapara a compreensáo da relacáo entre cére- bro e comportamento e das consequéncías psicossociais de urna
poss
í
vel les
á
o
ou dis-funcáo cerebral.
A avaliacáo neuropsicológica tem co- mo objetivo estudar a
expressáo
dasdis
funcóes cerebrais sobre o comportamento,
podendo essas
disfunc
ó
es
resultar de le-sóes
ou doencas degenerativas, ou ligar-se a quadros psiquiátricos e doencas que tém a disfuncáo neurológica como resultado se-A crescente violencia urbana e o afastamen- to do trabalho por doencas incapacitantes, por exemplo, tém exigido cada vez mais a participacáo do psicólogo no esclarecer dos fatos. Responder a questóes relacionadas a saúde mental e a justíca requer da psicolo- gía urna cornpreensáo multifatorial de to- dos os processos envolvidos.
O desenvolvimento da psiquiatría e da psicología contribuiu de forma intensa pa- ra que os
órgáos
da justica utilizem conhe- cimentos especializados no quediz respeito
aos processos que regem a vida humana, a saúde psíquica e, nas duas últimas décadas, a neuropsicologia ( Gierowski, 2006).De acordo com o
Online Etymology
Dictionary,
da American PsychologicalAs
sociation (c2011-2013), a palavra "forense" vem do latimforum
,
que faz alusáo ao Fo- rum Romano, a praca principal onde eram realizados os julgamentos do Império. Tra- dicionalmente, o uso do termo "forense" denota a interseccáo entre a ciencia (medi- cina, antropología, psicología) e o sistema jurídico.Urna das primeiras ideias de psico- logía forense surge no fim de 1800, com o psicólogo alernáo Hugo Münsterberg, considerado por muitos o precursor da psicología forense. Münsterberg argu- mentava que a psicología deveria ser apli- cada a lei. Entretanto, apenas em 2001 a APA reconheceu a psicología forense co- mo urna especializacáo no ámbito do es- tudo da psicología. Seu crescimento se dá sobretudo por pesquisar e dissecar o corn- portamento humano diretamente ligado aos crimes seríais. No tocante a neuropsi- cologia forense, a história é mais recente (Hom, 2003).
A NEUROPSICOLOGIA FORENSE
Esses apontamentos convergem com as notificacóes de vários autores quanto a ampliacáo da aplicacáo da avaliacáo neu- ropsicológíca nos últimos anos, relaciona- dos principalmente ao córtex pré-frontal e as funcóes executivas (Müller, Baker, & Yeung, 2013).
Para Müller e colaboradores (2013), a relevancia do estudo do córtex pré-fron- tal se dá em
funcao
de ele ocupar cerca de um terco da massa total do córtex, além de manter relacóes múltiplas majoritariamen- te recíprocas com inúmeras outras estrutu- ras encefálicas, como conex6es com regióes de associacáo dos córtices parietal, tempo- ral e occipital, bem como com diversas es- truturas subcorticais, em especial o tálamo, além de conter as únicas representacóes corticais de inforrnacóes provenientes do sistema límbico.Os instrumentos neuropsicológicos, portanto, se configuram como ferramentas cujo objetivo é avaliar um conjunto de ha- bilidades e competencias cognitivas como atencáo, memória, linguagem, funcóes exe- cutivas, aprendizagem, praxia construtiva e potencial intelectual, seja no contexto clíni- co, seja no forense.
Func;ao
~
1
Inputreceptiva Memória e
~ Armazenamento
aprendizagem das i ntorrnacñes Pensamento
1
~
das i ntormacñes ProcessamentoFunc;oes
~
1
Output executivasDe c.erta maneira, com base em
Lezak
e colaboradores (2006), os déficits cognitivos podem ocorrer em quatro diferentes funcóes:20 •
SERAFIM & SAFFI (ORGS.)Na área forense, a
avaliac
á
o
neuro- psicológica se insere na fase pericial. A pala - vra "pericia" vem do latimperior
,
que quer dizer experimentar, saber por experiencia. Consiste em aporte especializado que pres- supóe um conhecimento técnico/científico específico que contribua no esclarecimento de algum ponto considerado imprescindí- vel para o procedimento processual.De maneira geral, a perícia conver- ge da compreensáo psicológica e neuropsi- cológica de um caso para responder a urna questáo legal expressa pelo juiz ou por ou- tro agente (jurídico ou participante do ca- so), fundamentada nos quesitos elaborados pelo agente solicitante, cabendo ao psicó- logo perito investigar urna ampla faixa do funcionamento mental do indivíduo sub- metido
a
perícia (o periciando).Por pericia entende-se, na prática, a aplicacáo dos métodos e técnicas da ínves-
tigac
á
o
psicológica e neuropsicológica com a finalidade de subsidiar urna acáo judicial toda vez que se instalarem dúvidas relativasa
"saúde" psicológica do periciando. Dito de outro modo, seu resultado final é levar conhecimento técnico ao juiz, produzindo prava paraauxiliá
-
Io
em seu livre conven- cimento, bem como fornecer ao processo a documentacáo técnica do fato, o que é feíto via documentos legais - no caso em apreco, o laudo (Serafim & Saffi, 2012).Ressalta-se que o procedimento da pe- rícia <leve ser fundamentado nos quesitos ela- borados pelo agente jurídico
(j
uiz,
promotor, procurador, delegado, advogado ), cabendo ao perito investigar urna amplafaixa
de fun cionamento mental do individuo envolvido em as:ao judicial de qualquer natureza (civil, trabalhista, criminal, etc.), por meio do exa- me de sua personalidade e de suas funcóes cognitivas (Serafim & Saffi, 2012).NEUROPSICOLOGIA FORENSE •
21
O campo da neuropsicologia forense
é relativamente novo, entretanto está evo- luindo de maneira crescente e rápida. Ape- sar de já haver vários programas de treina- mento formal, requisitos de licenciamento ou organízacóes profissionais dedicadas es- pecificamente
a
neuropsicologia forense tanto nos Estados Unidos como na Euro- pa, ainda há a necessidade de maior padro- nizacáo dessa prática, bem como de textos de referencia (Hom, 2003).Ainda de acordo com Hom (2003), o termo "neuropsicologia forense" represen- ta urna subespecialidade da neuropsicolo- gia clínica, que diretarnente aplica práticas e principios neuropsicológicos a questóes que dizem respeito as dúvidas jurídicas e
a
tomada dedecis
á
o.
Profissionais de neuro- psicologia forense sao treinados como neu- ropsicólogos clínicos e, posteriormente, especializam-se naaplícacao
de seus conhe- cimentos e habilidades no ámbito forense.Diferentemente do que acorre na neu- ropsicologia clínica, que define a existen-
cia
ou nao de urna dísfuncáo dasfuncoes
cognitivas, a neuropsicologia forense de- ve responder a urna questáo legal, isto
é,
se determinada dísfuncáo afeta ou nao a ca- pacidade de entendimento e de autodeter- minacáo da pessoa (Hom, 2003).Enquanto na clínica busca-se ajudar o paciente, na assisténcia forense procura- -se descobrir a verdade dos fatos. Destaca- -se, ainda, que a avaliacáo neuropsicológica forense
tarnb
é
m
se distingue da área clíni- ca pelo fato de o solicitante ser urna terceí- ra parte, a cornunicacáo dos resultados se dar entre perito e solicitante, e a avaliacáo ser restrita a quesitos elaborados capazes de responder a determinada questao legal (Se- rafim & Saffi, 2012; Serafirn, Saffi, & Rigo- natti, 2010).Em seu estudo de revisáo, Naudts e Hodgins (2006) consideraram correlatos neurobiológicos e comportarnento antisso-
cial na esquizofrenia. De maneira geral, es-
ses autores concluíram que poucos estudos térn sido realizados e que as amostras nao sao expressivas, o que dificulta a confirma-
yáo de hipóteses.
Analisando as funcóes executivas de 33 pacientes com história de violencia e 49 nao violentos, Fullam e Dolan (2008) nao evidenciaram díferencas significativas entre os grupos no desempenho da tare-
fa neuropsicológica. No entanto, conside-
raram que, quanto menor o quociente de inteligencia (QI), maior a associacáo com a violencia. Esses autores considerarn tam-
bém que a associacáo entre déficits neuro-
psicológicos e violencia em pacientes com esquizofrenia é limitada, e os resultados, in-
consistentes.
Em outro estudo foi investigado o his- tórico de violencia e os aspectos neuropsi-
cológicos de 301 pessoas com relato de pri-
meiro surto psicótico (Hodgins et
al., 2011).
Nesse estudo, 33,9% dos homens e 10% das mullieres tinham um registro de condena- cóes criminais; 19,9°/o dos homens e 4,60/o das mullieres tinham sido condenados por pelo menos um crime violento. Os pacientes infratores apresentaram os menores escores quantoas
vari
á
veis
neuropsicológicas (me-mória de trabalho,
funcóes
executivas e QI). Os autores consideram que intervencóes pontuais nos servicos de saúde para pacien-tes de primeiro surto psicótico podem redu-
zir a ocorréncía, como também a reinciden-
cia, de comportamentos violentos.
Urna segunda vertente de estudos re- ferentes
a
avaliacáo neuropsicológica paraverificacáo
de dano cognitivo em pacien-tes psiquiátricos forenses engloba as conse-
quéncias do transtorno de estresse pós-
-traumático (TEPT) e os pacientes com lesóes cerebrais.
Bastert e Schlafke (2011) avaliaram 125 pacientes com disfuncóes cerebrais orgáni-
Autores como Denney e Sullivan (2008) enfatizam que a utilizacáo da avalia- c;áo neuropsicológica no contexto forense é capaz de colaborar para a compreensáo da conduta humana, seja ela delituosa ou nao, no escopo da participacao das instancias bio-
lógica, psíquica, social e cultural como mo-
duladoras da express
á
o
do comporta.mento. Para isso, duas importantes linhas de estudo tém sido utilizadas. A primeiradiz
respeitoa
avaliacáo neuropsicológica para verificacáo de dano cognitivo em pacientes psiquiátricos forenses. Nestor, Kimble, Berman e Haycock (2002) analisararn 26 condenados por homi-cídio com transtornos mentais, internos de um hospital forense de seguranca máxima, em relacáo a
funcóes
como memória, inte-ligencia, atencáo,
funcóes
executivas e habi-lidades académicas. Os resultados produzi-
ram dois subgrupos distintos: um definido por alta incidencia de psicose e baíxo nivel de psicopatía e um por baixa incidencia de psi- cose e alto nivel de psicopatía - cada subgru-
po correspondendo a diferencas neuropsíco- lógicas distintas em habilidades íntelectuais, dificuldades de aprendizagem e inteligencia social. Apesar dos resultados, os autores res-
saltam a necessidade de estudos com amos-
tras maiores para melhor entendirnento e confiabilidade de medidas neuropsicológicas com essa populacáo.
Já Bentall e Taylor (2006), em estudo de
revisáo,
investigaram as implicacóes do delirio paranoico no contexto neuropsico- lógico com repercussóes forenses. O quadro de paranoia nao tem sido consistentemen- te associado a nenhuma anormalidade neu-ropsicológica especifica. Entretanto, os au-
tores destacam tres aspectos do pensamento paranoico que necessitarn de urna investiga-
crao mais aprofundada: a paranoia que pro-
duz motivacóes e experiencias perceptivas anómalas e distorcáo no raciocinio; a asso-
ciacáo da paranoia com diminuícáo da ca-
pacidade auditiva; e, por fim, a possibilidade de que exista urna forte associacáo negativa entre paranoia e autoestima.
Os conceitos localizacionistas,
a priori,
nao devem ser considerados como ideias ou con-cepcóes simplesmente descartáveis. Open-
samento "localizacionista" possibilitou, ao longo da história, a construcáo das bases da neuropsicologia no campo
das
neurocien-cias, visto que seu debate deu lugar, grada-
tivamente,
a
concepcáo
de urna organizacáo do sistema nervoso central pautada no funcionamento integrado das várias
regi
ó
es
ce-rebrais. Considerar as descricóes de David Hartley, Gall, Flourens, Broca, Wernicke e Luria representa tracar a linha da construcáo
CONSIDERACÜES FINAIS
da capacidade civil, da responsabilidade pe- nal e do risco de violencia. Kloppel (2009) destacou a relac
á
o
entredisfuncóes
neuro-cognitivas e risco de violencia, bem como reincidencia.
Al
é
rn
dos quadros psicóticos,os estudos tém investigado a participacáo de áreas cerebrais específicas com urna va-
riedade de disfuncóes cognitivas e que se apresentam como variáveis de risco para violencia, como disfuncáo dos lobos fron-
tal, orbitofrontal/frontal/frontotemporal e/ ou
regióes
subcorticais do sistema límbico.A
investigacáo
neuropsicológica na área penal se destaca em termos de quan-tidade quando comparada com a inves-
tigac
á
o
da capacidade civil ou aavaliacáo
de risco e se distribuí pelos estudos de cri-minosos sexuais, antissociais e psicopatas
(Greene & Cahill, 2012; Kruger &
Schiffer
,
2011).
Autores como Heilbronner e colabo-
radores (2010) discutem a
diferenca
entre a avaliacáo neuropsicológica clínica e a fo-rense, seja na área penal, seja na civil. Eles escrevem a partir da perspectiva de que o carpo de profissionais de neuropsicologia, em sua maioria, é eminentemente clínico e
com pouca experiencia em matéria penal, o que é preocupante para essa atuacáo.
NEUROPSICOLOGIA FORENSE •
23
cas com urna bateria neuropsicológica para avaliar as funcóes executivas. Os resultados demonstraram que, embora esses pacientes apresentem desempenho cognitivo abai- xo da média quando comparados a pessoas sem disfuncóes orgánicas, as diferencas nao sao tao acentuadas como se esperava. Os autores ainda enfatizam que esses resul- tados sao sugestivos de que tais pacientes possam se beneficiar de programas de rea-
bilitacáo neuropsicológica.
Pensando ainda em termos de pro-
cessos
de tratamento de pacientes forenses com retardo mental ou disfuncao cerebral orgánica, Bastert,Schlafke,
Pein, Kupke e Fegert (2012) estudaram 15 pacientes por meio de exames de neuroimagem e avalia-¡¡:ao neuropsicológica. Os resultados suge-
rem mais prejuízos nas capacidades execu- tivas. Além disso, faz-se necessário agrupar os pacientes por tipo de lesáo cerebral, com o objetivo de definir com mais qualidade as acóes de intervencóes,
Por
fim,
Bailie, King, Kinney e Nitch (2012) investigaram o comprometimen-to cognitivo de 260 pacientes internos de um hospital psiquiátrico forense. Os prin- cipais resultados demonstraram que 35,80/o da amostra apresentaram escores abaixo da
m
é
día
em um teste que media a capacidade de repeticáo.Além
disso, 65% dos partici- pantes relataram história de atraso de de-senvolvimento, menos de 12 anos de ensino ou dificuldades de aprendizagem. Metade da amostra relatou ao menos um fator de ris- co neurológico (p. ex., história de trauma- tismo craniano com perda de consciencia). No entanto, os fatores de riscos neurológi- cos, de certa forma, nao influenciaram o de- sempenho no teste de autorrelato para fato-
res de riscos neuropsicológicos. De acordo com Bailie e colaboradores (2012), esses re- sultados corroboram a relevancia dos servi- cos neuropsicológicos em hospitais psiquiá-
tricos forenses como f arma de intervencáo. A segunda linha de estudo engloba a
avaliacáo
neuropsicológica paraverificacáo
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escimento da a
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~o neuropsicológica e suas contr
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buicóe
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para o processo judicial. Sua co
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s
o
lidacáo
e seu reconhec
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mento na prática foren
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constroem por um process
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temporal con-
tínuo fundamentado por meio de estudos,
da pesquisa científica e de urna conduta
humanitár
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A mentira é presenca constante na vida hu- mana.
Há
pesquisas que mostram que .asDETEC~AO DE MENTIRAS USANDO
MÉTODOS DE NEUROCIENCIAS
A cada avance científico, novas ques- toes
bioéticas
e legais surgem para a socie- dade, que ainda se ve perdida <liante da ava- lanche de conhecimento. E, de forma geral, as grandes questóes podem ser divididas em dois grupos de técnicas: aquelas que mo- nitoram a atividade cerebral (como a .neu- roimagem e a genética) e aquelas que ama- nipulam (como a psicofarmacologia e os tratamentos biológicos) (Garland, 2004). Como tudo em ciencia, as técnicas em si nao slio éticas nem antiéticas, mas as consequén- cias legais de seu uso mais moderno ainda precisam ser plenamente compreendidas.Para tratar dessas questóes, em vez de um arrazoado de novidades tecnológicas - que se quedaría desatualizado em pouco tempo-, optamos por nos aprofundar, oes- te capítulo, em dois temas: os noves méto- dos de deteccáo de mentiras e as implica- cóes éticas e legais das formas de ampliar a cognicáo humana. Pretendemos, com isso, revelar urna maneira de raciocinar sobre o tema, que é amplo demais para caber em
um único capítulo.
DAN 1 EL MARTI NS DE BARROS ALINE LAVORATO GAETA GERALDO BUSATTO FILHO
Neurociencias forenses
a humanidade experimentou urna conjun- tura nova de esf orcos na compreensáo do.
funcionamento desse
órgáo,
com cientis- tas e pesquisadores encarando de maneira conjunta o desafio de alcancar urna maior compreensáo do encéfalo como um todo - estrutural e funcionalmente.Já antes
dess
é
período e, mais enfa- ticamente, em décadas mais recentes, di- ferentes campos das neurociencias vém gerando novas informacóes sobre a fisiopa- tologia dos transtornos neuropsiquiátricos e o funcionamento cerebral na normalida- de, abarcando desde a macroscopia cere- bral até mecanismos moleculares.Do ponto de vista da psiquiatría fo- rense, um dos grandes desafios atuais é a mudanca de paradigma trazida por tais avances das neurociencias para o universo jurídico (Barros, 2008).
A fim de aumentar a consciencia públi- ca com relacáo aos beneficios a serem obtidos pela pesquisa sobre o cérebro, o Congresso dos Estados Unidos da Amé- rica designou a década iniciada em 1 ~ de janeiro de 1990 como a "Década do Cérebro". (Project on the Deeade of the Brain, 1990, traducáo nossa)
Desde o momento em que o entáo presi- dente norte-americano George Bush (pai) declarou que
Quando falamos de neurociencias fo- renses na atualidade, urna das tecnologías que vem sendo estudada para a identifica-
yao de mentirosos é a ressonáncía magnéti-
ca funcional (RMf) (Farah et al., 2014), por meio do chamado "efeito BOLD"
(Blood
Oxygenation Level Dependent factors).
Tal efeito vem da constatacáo de que a varia-yao na proporcáo entre hemoglobina com e sem oxigénio é detectável como variacóes
de sinal por meio dos aparelhos de resso-
náncia nuclear magnética; e, urna vez que existe maior necessidade de sangue nas re- gíóes do cérebro que estáo mais ativas, o aumento de flux.o sanguíneo amplia a pro-
porcáo de hemoglobina com oxigénio, per-
mitindo a identificacáo das áreas mais ou menos ativas do encéfalo (Norris, 2006). Os estudos sugerem que existam regióes cerebrais mais importantes para controlar o comportamento, inibindo o impulso na-
tural de contar a verdade, como os
c
ó
rti
-
ces pre-frontal dorsolateral e ventromedial,
o lobo parietal inferior, a ínsula anterior e o córtex frontal medial superior. Esses dados emergem de metanálises de diversas pes-
quisas que buscaram identificar as áreas do cérebro mais ligadas
a
mentira, controlan-do com outras tarefas cognitivas exigindo participacáo das funcoes executivas ( Chrís-
tVan Essen, Watson, Brubaker, & McDer- mott, 2009; Farah, et
al.,
2014). Os resul-tados, evidentemente, nao sao categóricos ao apontar um "lobo da mentira': mas indi-
cam a existencia de
regi
ó
es
que apresenta- ram maior correlacáo como ato de mentir: a memória de trabalho apresentarelacao
com os córtices pré-frontal dorsolateral e parie-tal posterior, enquanto outras áreas, como o córtex pré-frontal ventromedial, a ínsula an-
terior e o córtex cingulado anterior, sao mais ligadas aos diversos desafios cognitivos de controle (Christ, et al., 2009).
O uso da RMf nos tribunais, contudo, pode estar mais longe do que imaginamos. Apesar de já existirem, nos Estados Unidos, empresas especializadas para a venda desse
NEUROPSICOLOGIA FORENSE •
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pessoas chegam a mentir até 80% do tem-po em conversas informais e que a rnaio-
ria mente empelo menos 1 de cada 4 diálo-
gos que durem mais de 10 minutos (Smith,
2005). Embora modificar a verdade como
intuito
de prejudicar alguém e obter vanta-gem seja condenável, o fato é que a maioria dessas mentiras cotidianas serve de llame social, mantendo aparéncias e as relacóes humanas. Desde muito cedo, adquirimos a nocáo de que a mentira para beneficio pró- prio é condenável, mas pode - e <leve - ser tolerada se feita em prol do grupo. Um es- tudo com enancas de 7, 9 e 11 anos colo-
co u-as em situacóes nas quais poderiam mentir ou falar a verdade; no segundo ca- so, contudo, prejudicariam a classe inteira. Os resultados mostraram que, aos 7 anos,
7,2
%
mentiram; aos 9 anos,16,70/o;
e, porfim,
29,7% das criancas de 11 anos decidí- ram mentir pelo grupo (Fu, Evans, Wang, & Lee, 2008). O mesmo estudo mostrou que, assirn como aceitamos melhor a men- tira altruísta, conforme envelhecemos, con-denamos mais a mentira egoísta.
Apesar dessa
func
á
o
social, contudo, as grandes mentiras que ocorrem em pro- cessos judiciais podem ser bastante preju-diciais para a sociedade como um todo, e,
por isso, toda nova tecnología que surge é aventada como urna nova forma de se ten- tar detectar o perjúrio.
Os beduínos árabes, por exemplo, re-
solviam conflitos entre as versees de duas testemunhas para um mesmo fato utilizan- do a psicofisiologia: elas tinham que contar suas versees e em seguida lamber um ferro quente. Aquela que queimasse a língua seria a mentirosa, pois a ansiedade faria sua bo- ca secar por medo de ser descoberta (Kleín-
muntz & Szuck, 1984). Contudo, da simples observacáo do comportamento
a
utilizacáo de instrumentos mais sofisticados para re- gistrar alteracóes psicofisiológicas, nenhu-ma técnica ainda se provou suficientemen- te precisa na deteccáo da calúnia (Farah, Hutchinson, Phelps, & Wagner, 2014).
Hoje, existem diversos tipos de recur- sos modificadores da atividade cerebral, e muitos ainda estáo em desenvolvimen- to com o intuito de aprimorar ou recu- perar habilidades preexistentes motoras, cognitivas e afetivas, os quais incluem fár- macos, psicofármacos, substancias naturais
PARADIGMAS PARA MODIFICACAO
DA ATIVIDADE CEREBRAL
É claro que mesmo esses critérios nao sao infaliveis, mas
já
constituem um cami- nho no sentido de incorporar com critério e seguranca os avances das neurociencias nos tribunais.1.
Teste empírico: é mandatório que a téc-nica seja testável, segundo os padrees científicos vigentes.
2
.
Publicacñes científicas: ela já <leve ter sido alvo de publicacao em revistas científicas, passando pelo processo de revisáo por pares.3. Conhecimento das taxas de erro: <leve haver ínformacóes conhecidas sobre níveis de sígnificáncia, graus de certe- za, acurácia e precisáo, etc.
4.
Padronizacáo e controles-para ser uti- lizada, a nova tecnologia <leve já serpa- dronizada e controlável.5. Aceita pela comunidade científica - embora sempre possa haver contro- vérsia, de forma geral, a comunidade científica <leve já reconhecer a técnica. hoje em día, urna padronizacáo de crité- rios para determinar se é ou nao adrnissível urna nova tecnologia nos tribunais, conhe- cida como "Padráo Daubert". Essa norma tem cinco pontos, que buscam cercar a no- va técnica do maior grau de certeza possível antes que as provas produzidas por ela te- nharn efeito legal (Garland, 2004). Os cin- co pontos sao:
servico com fins legais, ainda restam diver- sas dúvidas cercando essas técnicas.
Para exemplliicar com estudos espe- cíficos, em um dos experimentos que ava- liavam o papel da neuroimagem no dis- cernimento de inf ormacóes verdadeiras de falas, 16 voluntários tiveram de avaliar 210 imagens de faces, cada urna durante 4 se- gundos. Urna hora depois, era pedido que vissem 400 fotografiase distinguissem en- tre aquelas que já tinham e que nao tinham visto ( antigas vs. novas). As imagens cere- brais recrutadas nessa atividade erarn ana- lisadas por computador, com um
software
que tentava separar o padráo cerebral ati- vado na situacáo "antiga" e na situacáo "no- va". E, de fato, o programa permitiu distin- guir, apenas com base na regiáo do cérebro ativa, se os voluntários estavam vendo urna face familiar ou nova, abrindo a possibili- dade de objetivamente avaliar as memó- rias dos sujeitos e distinguir memórias ver- dadeiras de histórias inventadas. O grande problema para o uso prático de técnicas co- mo essa, contudo, é o nível de significan- cia. Para a ciencia, o fato de o experimen- to permitir a diferenciacáo correta entre 75 e 950/o das vezes é suficiente para dizer que
a técnica funciona. Isso porque o grau es- tatístico de acerto, maior do que o espera- do pelo acaso, permite afirmar que o estu- do deu certo. Porém, em termos jurídicos, é complicado utilizar com tranquilidade urna "prova" que sabidarnente tem até 25% de chance de estar errada (Rissman, Greely, & Wagner, 2010).
A metanálise de Farah e colaboradores (2014) ainda conclui que, mesmo que con- sigamos superar os desafios técnicos, os de cunho ético permanecem, já que, nos Esta- dos Unidos, as pessoas podem alegar ques- t6es de privacidade, nao se submetendo ao exarne. Questáo semelhante pode ser en- frentada no Brasil, já que ninguém pode ser obrigado a produzir prova contra si mesmo.
Para tentar superar esses obstáculos, a suprema corte norte-americana utiliza,