HC nº 0022223-88.2013.8.19.0000 (8ª CCrim) - ACÓRDÃO – Des. Claudio Tavares de Oliveira Junior fl. 1 OITAVA CÂMARA CRIMINAL
HABEAS CORPUS Nº 0067818-13.2013.8.19.0000
IMPETRANTE: JULIAN VINICIUS DE ALBUQUERQUE REIS E SILVA PACIENTE: ROGÉRIO DE SOUZA FERREIRA
AUTORIDADE IMPETRADA: JUÍZO DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL ADJUNTO CRIMINAL DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA DA MULHER DA COMARCA DE QUEIMADOS
RELATOR: Desembargador CLAUDIO TAVARES DE OLIVEIRA JUNIOR.
HABEAS CORPUS. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA.
PRISÃO
PREVENTIVA
DO
PACIENTE.
MANUTENÇÃO.
CONSTRANGIMENTO
ILEGAL NÃO CARACTERIZADO. ORDEM
DENEGADA.
Inadmissibilidade de dilação probatória, em
sede de ação constitucional de habeas corpus,
sob pena de supressão de instância.
Presença dos requisitos autorizadores do art.
312, do Código de Processo Penal.
Decisão judicial devidamente fundamentada,
decretando a prisão preventiva do paciente.
Vítima que busca, junto ao Poder Judiciário, a
proteção que lhe é garantida por Lei, a fim de
resguardar a sua integridade física e psicológica.
Paciente
que,
por
sua
vez,
já
havia
protagonizado episódios anteriores de agressão
doméstica, em desfavor da mesma vítima, que,
finalmente, socorreu-se do Poder Judiciário,
tendo a autoridade judicial decretado-lhe a
prisão, como medida extrema, mas única que se
mostra eficaz, nas circunstâncias do caso
concreto.
A Lei 12.403/2011 alterou a redação do artigo
313, III, do CPP, admitindo a decretação da
prisão preventiva se o crime envolver violência
doméstica.
Ordem denegada
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Habeas
Corpus nº 0067818-13.2013.8.19.0000, em que figura como
impetrante o causídico Julian Vinicius de Albuquerque Reis e
Silva, como paciente Rogério de Souza Ferreira e como
autoridade impetrada o Juízo de Direito do Juizado Especial
Adjunto Criminal da Violência Doméstica da Mulher da Comarca
de Queimados, ACORDAM os Desembargadores que compõem
a Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do
Rio de Janeiro, por unanimidade, em denegar a ordem, nos
termos do voto do Relator.
RELATÓRIO
Cuida a hipótese de habeas corpus, com pedido de
liminar, impetrado em favor de Rogério de Souza Ferreira,
alegando que o paciente sofre constrangimento ilegal no Juízo de
origem. Narra que o mesmo foi preso por ter supostamente
praticado o crime de lesão corporal contra sua ex-companheira
(artigo 129, § 9º, do CP), Requer a revogação da prisão
preventiva decretada, alegando que várias outras medidas
protetivas poderiam ter sido impostas pela autoridade impetrada,
a teor do art. 22, da Lei 11.340/2006.
Informações do Juízo impetrado (e-doc 00013),
aduzindo que a prisão preventiva do paciente fundamentou-se na
necessidade de se garantir a ordem pública e de se resguardar a
instrução criminal, além de se amparar na garantia da segurança
da vítima. Destaca que, além da presença dos requisitos
autorizadores, há o histórico de crimes envolvendo violência
praticados pelo paciente em desfavor da mesma vítima,
protagonizando, claramente, a hipótese prevista no art. 313, III,
do CPP.
Decisão desta Relatoria indeferindo o pedido de
liminar (e-doc 00017).
Parecer do Ministério Público, da lavra da procuradora
de justiça Leila Machado Costa, opinando pela denegação da
ordem (e-doc 00019).
Petição ajuizada pelo impetrante sustentando a
desnecessidade da prisão preventiva e a ausência de medidas
protetivas previamente impostas ao paciente.
É o Relatório.
VOTO
Denego a ordem.
Antes de tudo, convém afirmar que a ação
constitucional de habeas corpus não admite dilação probatória,
sob pena de supressão de instância.
Ao que dispõe o art. 5º, da Lei 11.340/06, configura
violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou
omissão baseada no gênero, que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
patrimonial, (I) no âmbito da unidade doméstica, (II) da família ou
(III) em qualquer relação íntima de afeto . A condição peculiar da
mulher (vítima) prevista no art. 4º, da Lei Especial, está
perfeitamente delineada com o fim social a que se destina a
legislação em comento. A Lei Maria da Penha é um exemplo de
implementação para a tutela do gênero feminino, justificando-se
pela situação de vulnerabilidade e hipossuficiência em que se
encontram as mulheres vítimas da violência doméstica e familiar.
A alegação da impetrante é no sentido de que o
acusado estaria sofrendo constrangimento ilegal, vez que não
haveria motivos que justificassem a manutenção de sua custódia
cautelar.
Entendo que razão não lhe assiste, na medida em que
estão presentes os requisitos autorizadores do art. 312, do Código
de Processo Penal.
Na bem fundamentada decisão que decretou a prisão
preventiva do réu, asseverou o ilustre Juízo a quo:
“O art. 310, com sua nova redação, determina que ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I – relaxar a prisão ilegal; ou II – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.
Fixadas essas premissas, observo que no caso dos autos o acusado foi preso em flagrante delito por suposta prática dos crimes previstos no art. 140, 147 e 129, § 9º, do CP, na forma da Lei 11.340/06.
Concluídas as investigações preliminares, há indícios suficientes da materialidade e da autoria delitiva, conforme se pode constatar das peças técnicas.
Por seu turno, o art. 313, III do CPP dispõe que a prisão preventiva será admitida para garantir a execução das medidas protetivas de urgência se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher.
Compulsando-se detidamente os autos, verifica-se que, de fato, assiste razão ao Parquet, sendo imperiosa a decretação da prisão preventiva do autor do fato, uma vez que estão presentes os requisitos previstos no artigo 313, III, do Código de Processo Penal.
Certo é que o réu já havia protagonizado episódio anterior de agressão em desfavor da mesma vítima, que se socorreu do Poder Judiciário em busca de medidas protetivas, conforme revelam os autos de nº 74999-58.2013.8.19.0067.
Permitir a continuidade desse cenário é trazer total descrédito às decisões judiciais, a ensejar novos episódios de agressão em desfavor da vítima, o que além de inadmissível é deveras temerário.
É de se destacar, ainda, a postura do autor do fato, que insiste em investir violentamente em desfavor da vítima, protagonizando reiteradas e inadmissíveis cenas de horror
familiar, revelando, em consonância com o seu
comportamento reiterado, que não pretende resignar-se à instrução e possíveis penalidades que venham a lhe ser impostas.
Noutro giro, além de se resguardar a integridade da vítima, a prisão é necessária para a garantia da ordem pública, devendo ser assegurada a credibilidade do Poder Judiciário, cumprindo assim o processo penal como forma de controle social.
Por fim, as medidas cautelares alternativas à prisão, previstas no ar. 319, incisos I a IX do CPP se mostram inadequadas e insuficientes para o caso, não sendo a prisão desproporcional ao crime, nos termos do art. 282, inciso I e II do CPP, a contrario sensu. Ressalto, por oportuno, que as circunstâncias do fato afastam a possibilidade de aplicação de qualquer outra medida que não seja a prisão.
Assim, por estarem presentes os requisitos autorizadores, com base nos artigos 312 e 313, III do CPP, DECRETO a prisão preventiva do autor do fato ROGERIO DE SOUSA PEREIRA”
(Anexo I e-doc 00003). – os grifos não são do original
Ao que se nota, a vítima busca, junto ao Poder
Judiciário, a proteção que lhe é garantida por Lei, a fim de
resguardar a sua integridade física e psicológica. O paciente, por
sua vez, já havia protagonizado episódios anteriores de agressão
em desfavor da mesma vítima, que, finalmente, socorreu-se do
Poder Judiciário, tendo a autoridade judicial decretado-lhe a
prisão, como medida extrema, mas única que se mostra eficaz,
nas circunstâncias do caso concreto.
Mister salientar que a Lei 12.403/2011 alterou a
redação do artigo 313, III, do CPP, admitindo a decretação da
prisão preventiva se o crime envolver violência doméstica.
Na hipótese em apreço, a Defesa requereu a
imposição de medidas protetivas, tendo o Magistrado a quo
manifestado sua plena concordância com a Promotoria de
Justiça, indeferindo o pleito defensivo. Manteve-se, assim, a
prisão do paciente, a despeito da ausência de decretação anterior
de medidas protetivas.
Sobre o tema, há diversos julgados deste Egrégio
Tribunal de Justiça:
“Habeas Corpus. Paciente denunciado por infração aos artigos 129, §9º, e 148, §1º, n/f do art. 69, todos do Código Penal. Alega o impetrante o constrangimento ilegal praticado pelo Juízo coator, sustentando a existência de erro de fundamentação para a decretação da prisão preventiva do paciente, bem como sua desnecessidade. Afirma ainda, ser o paciente primário e possuir residência fixa e que não há risco na garantia da ordem pública visto que a vítima não mais reside na residência do casal. Requer a revogação da prisão preventiva e a concessão da liberdade provisória. Informa o referido Juízo, que o paciente foi preso em flagrante em 22/01/2013. Segundo as informações prestadas o Ministério Público opinou pela conversão da prisão em flagrante em preventiva, tendo o juízo deferido o pedido. Consta ainda que, o juízo aguarda a apresentação da defesa preliminar, considerando que ainda não houve a manifestação da defesa, apesar de regularmente publicado o despacho pelo cartório. Justificada e indispensável a mantença da custódia como garantia da ordem pública e para assegurar a aplicação da lei penal, por tratar-se de crime praticado com grave ameaça ou violência à pessoa. Ausência de comprovação do alegado constrangimento. As condições pessoais apresentadas pela defesa por si sós não são suficientes para garantir a liberdade do paciente. A Lei 12.403/2011 alterou a redação do artigo 313, III, do CPP admitindo a decretação da prisão preventiva se
o crime envolver violência doméstica, como no caso em tela. Presentes os requisitos previstos nos artigos 312 do Código de Processo Penal. Ausência do constrangimento ilegal apontado. Ordem denegada”. (HABEAS CORPUS
0007122-11.2013.8.19.0000 - DES. SUELY LOPES MAGALHAES - Julgamento: 14/03/2013 - OITAVA CAMARA CRIMINAL) – Os grifos não são do original
“HABEAS CORPUS. LEI MARIA DA PENHA. DECRETAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INOCORRÊNCIA. A decretação da prisão preventiva torna superada a discussão sobre a ilegalidade da prisão em flagrante, além de se encontrar, devidamente, fundamentada na garantia da ordem pública, na plenitude da instrução criminal e na aplicação da lei penal, especialmente, ao consignar a gravidade do fato e a possibilidade de ser a ofendida ameaçada pelo paciente, sendo, ainda, indispensável à proteção física e psíquica da vítima, razões que justificam a sua manutenção, nos termos dos artigos 312 e 313, III, ambos do Código de Processo Penal. Afasta-se, assim, a alegação defensiva, de ter a decisão se baseado em circunstâncias hipotéticas, devendo ser registrada a extensão das lesões sofridas pela vítima e as ameaças proferidas pelo paciente. ORDEM DENEGADA”. (HABEAS CORPUS 0046458-56.2012.8.19.0000 – Relatora DES. DENISE VACCARI MACHADO PAES - Julgamento: 11/10/2012 - QUINTA CAMARA CRIMINAL)
“HABEAS CORPUS.- ARTIGO 147 E 150, CAPUT (DUAS VEZES), N/F ARTIGO 71, DO CÓDIGO PENAL, COM A INCIDÊNCIA DA CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE PREVISTA NO ARTIGO 61, INCISO II, ALÍNEA f FORMA DO ARTIGO 69, TODOS DO CÓDIGO PENAL.VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. PRISÃO PREVENTIVA.- PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA.- REQUERIMENTO NO SENTIDO DE QUE O III JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA SEJA CONSIDERADO COMO JUÍZO INCOMPETENTE PARA O JULGAMENTO DOS CRIMES EM APRESSO.-. RECONHECIMENTO DA COMPETENCIA DA VARA CRIMINAL
COMUM - INOCORRÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL.- Depreende-se do processado que o réu invadiu a residência de sua irmã, que solicitou que o mesmo se retirasse, não sendo atendida, sendo que nesta oportunidade, o paciente ameaçou de morte seu genitor. Segundo o genitor do paciente, Sr. Jorge Correa da Silva, o réu teria retornado cerca de 30 a 40 minutos depois, mais nervoso e mais alterado, para subtrair aparelhos de TV e DVD, eis que pretendia trocá-los por drogas. O paciente, todavia, não teve sucesso na subtração dos referidos objetos, pois, seu genitor chamou por seu outro filho, Tiago, que conseguiu expulsar o irmão.-. Constatasse que o réu num mesmo dia invadiu por duas vezes a casa da irmã. .-. A Lei Maria da Penha visa tutelar as mulheres em situação de vulnerabilidade e hipossuficiência, vítimas da violência doméstica e familiar. No caso dos autos, os crimes descritos na denúncia ocorreram dentro do âmbito familiar e tendo como uma das vítimas uma mulher, irmã do paciente. Portanto, dentro do contexto apresentado, até o momento, não se pode afirmar, como quer a Defesa, que o paciente não tinha a intenção de submeter a irmã à sua vontade dominadora. Deve-se aguardar o exame das provas, que ainda serão colhidas. Todavia, questões relacionadas ao mérito não tem campo de apreciação em sede de habeas corpus, eis que o exame aprofundado das provas se mostra inadmissível nesta estreita via. .-. A Defesa requereu, ainda, a liberdade provisória do acusado, que foi preso por ocasião do flagrante, tendo sido o pedido indeferido, por decisão prolatada em 14/02/2011 (fls. 85). A decisão está adequadamente fundamentada e demonstra estarem presentes os fundamentos ensejadores da prisão preventiva, devendo, portanto, ser mantida. Dessa forma, não vislumbro constrangimento ilegal a ser sanando. Ordem denegada”.
(HABEAS CORPUS - 0009586-76.2011.8.19.0000 - DES. VALMIR RIBEIRO - Julgamento: 27/04/2011 - OITAVA CAMARA CRIMINAL)
Vale transcrever, também, o seguinte trecho do parecer
ministerial:
“O fumus boni iuris, da mesma forma, encontra-se
configurado, haja vista o disposto no art. 22 da Lei nº 11340/07 que prevê a utilização de tais medidas visando à proteção da mulher, e, ainda, o disposto no artigo 20 da mesma Lei que autoriza a decretação de prisão preventiva
pelo juiz, de ofício, mesmo durante o inquérito policial. A redação do dispositivo é clara:
"Art. 20: Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial." Como se não bastasse, o impetrante não trouxe aos autos nenhum elemento novo, que demonstre a insubsistência dos motivos que ensejaram a custódia do paciente”.
Por fim, ainda não ocorreu, no Juízo de origem,
designação de Audiência de Instrução e Julgamento, de sorte que
a manutenção da prisão se mostra imprescindível, ante o fundado
temor da vítima e de testemunhas que, provavelmente, irão depor
em juízo, sendo certo que a precoce soltura do paciente colocaria
em risco a própria instrução criminal.
Pelas razões expostas, VOTO pela denegação da
ordem.
Rio de Janeiro, 29 de janeiro de 2014.
Desembargador CLAUDIO TAVARES DE OLIVEIRA JUNIOR Relator