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O SEXO DAS COMPETÊNCIAS" E A DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO i

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O“SEXODASCOMPETÊNCIAS"EADIVISÃOSOCIALDO TRABALHOi

Raquel QUIRINO Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Educação na Faculdade de Educação/UFMG FERNANDO FIDALGO Orientador, Professor do Programa de Pós-graduação em Educação na Faculdade de Educação/UFMG e Bolsista CNPq.

RESUMO:Problematizações sobre a divisão sexual do trabalho e a lógica das competências no setor produtivo são apresentados neste trabalho. O aprofundamento da reflexão teórica de diversos autores da categoria de análise "relações sociais de sexo" propostas por Hirata (1995;

2002) e Kergoat (1992) e da categoria "competência" presente nos estudos de pesquisadores franceses e brasileiros, como Zarifian (2001); Ropé & Tanguy (1997); Küenzer (2002); Fidalgo (2003), e outros, com a aproximação da realidade empírica numa abordagem qualitativa da análise dos dados, orientam este estudo. Procura-se contribuir para ampliar e aprofundar a compreensão sobre as relações sociais de sexos no mundo do trabalho, no contexto do modelo de competência, através de um estudo que visa a identificação e a análise das competências da mulher em profissões socialmente consideradas masculinas e dos conflitos inerentes a este processo. O setor de mineração de minério de ferro foi escolhido como campo para a parte empírica devido a grande importância econômica e social que este segmento vem assumindo nos últimos anos no Brasil e no mundo e também devido a carência de pesquisas sobre as atividades de trabalho neste setor, principalmente sobre a divisão sexual do trabalho.

PALAVRAS-CHAVE: Divisão sexual do trabalho; Lógica das competências; Trabalho da mulher.

1. Introdução

No setor produtivo as profissões que exigem força e trabalhos pesados, realizados em ambientes inóspitos, sujos e insalubres e em revezamento de turnos geralmente são associadas à estereótipos masculinos os quais "requerem coragem e

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determinação, enquanto que a feminilidade é associada ao trabalho leve, fácil, limpo, que exige paciência e minúcia." (HIRATA, 1995, p.43).

No entanto, ao adotar novas formas de organização e gestão do trabalho, com processos seletivos, descrições de cargos e avaliações de desempenho pautados pela lógica das competências, um fenômeno em crescimento no mundo do trabalho é a tendência de empresas elegerem e supervalorizarem algumas competências em detrimento de outras, atribuí-las diferentemente à mulher e ao homem (como se fosse um processo natural) e, por esta razão, contratar inúmeras mulheres para cargos, até então, historicamente ocupados apenas por homens.

A partir desta assertiva um dos problemas a serem investigados é se se pode considerar as competências sexuadas e imputá-las às mulheres e aos homens de maneira natural e diferenciada. Para isto, propõe-se identificar e analisar quais são, como foram desenvolvidas e em que medida as "competências da mulher" estão sendo requeridas e valorizadas pelo capital - promovendo assim, a sua crescente inserção em funções socialmente consideradas masculinas; quais competências estão sendo realmente produzidas e utilizadas por estas mulheres nas situações de trabalho e os conflitos vivenciados por elas neste processo de prescrição, construção, desenvolvimento e utilização de competências.

As competências necessárias e requeridas para as funções e para as atividades de trabalho são prescritas pelas organizações na descrição de cargos, nas "tarefas-padrão", nos planos de operação/manutenção e em outras normas e procedimentos. No entanto, no momento em que o trabalho está sendo realizado, mesmo levando-se em consideração o que está prescrito, a trabalhadora precisa sempre se adaptar no momento de ação de trabalho, utilizando e desenvolvendo novos saberes diante de acontecimentos não previstos.

Promover este diálogo entre o prescrito e o real contribui para identificar e compreender as competências da mulher nas situações de trabalho e, ao desvendar a complexidade destas competências pode-se alterar a prescrição aproximando-a mais do real. E, principalmente, ao desmistificar o "sexo das competências", é possível reduzir, não só as diferenças entre o prescrito e o real, mas também, entre a valorização do trabalho do homem e da mulher.

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O enfoque dos estudos centrado no embate real entre homens e mulheres nas relações de trabalho possibilitará compreender as diferenças de competências que se dão através das relações sociais de produção e, o estudo pelo viés da análise das competências da mulher, justifica-se devido à pouca visibilidade dada ao seu trabalho, tanto em relação à atividade econômica exercida por ela, quanto pela importância da sua contribuição para a esfera produtiva. Também cumpre destacar o perfil diferenciado das atividades de trabalho do homem e da mulher, com vistas a assinalar em que medida as diferenças se transformam em desigualdades. Se a referência é o setor produtivo regido pela gestão da força de trabalho no modelo de competência, a proposta leva ao aprofundamento das causas e das conseqüências da segregação ocupacional da mulher, dos conflitos vivenciados por ela neste processo dialético de valorização e desvalorização de saberes, dos níveis de exigência das empresas e das formas de discriminação às quais é submetida em razão da condição feminina..

É do encontro entre estes eixos temáticos e dos problemas por eles suscitados que nasceu a proposta deste projeto de estudos.

2. O "sexo das competências" no mundo do trabalho

Partindo das propostas de Kergoat (1998) e de Hirata (1995), de substituir o conceito-chave de "força de trabalho" (presente na análise marxista clássica das relações de dominação), pelo conceito de "sujeito sexuado", em uma abordagem qualitativa dos dados de pesquisa, busca-se reconceituar o trabalho a partir da introdução de uma subjetividade atuante, ao mesmo tempo "de classe" e "sexuada", e propor a passagem da primazia do econômico e das relações de exploração à afirmação de um laço indissolúvel entre exploração econômica e opressão sexual.

A partir deste pleno reconhecimento do lugar do indivíduo e da subjetividade no trabalho é possível trabalhar as formas de passagens do fazer ao ser, distinguir as modalidades sexuadas da relação com o espaço, o tempo e a sociabilidade e, por fim, lograr uma transformação das relações sociais, sobretudo no que tange a desmistificar a

"sexualidade das competências" no mundo do trabalho e lograr a igualdade de valorização do trabalho do homem e da mulher.

A princípio, os procedimentos técnicos de coleta e análise de dados envolverá o levantamento bibliográfico já produzido na temática do estudo, bem como um estudo

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documental de documentos produzidos pela empresa, entrevistas com gestores e com mulheres que exercem atividades consideradas masculinas, além de visitas de acompanhamento para a observação direta de suas atividades de trabalho, os quais possibilitarão apreender o objeto de estudo em suas várias dimensões. A observação direta, a escuta dos sujeitos e a análise dos discursos na pesquisa qualitativa será parte importante dos levantamentos a fim de captar e verificar, a partir do exercício da atividade profissional e da percepção de dentro da situação investigada, a dimensão epistemológica da prática profissional destas mulheres.

O segmento industrial de mineração, especificamente o de minério de ferro, foi escolhido como campo para a parte empírica deste estudo, devido à carência de pesquisas sobre as atividades de trabalho neste setor, principalmente sobre a divisão sexual do trabalho.

Carola (2002), verifica que no Brasil alguns trabalhos importantes abordam a atividade mineral na subjetividade dos homens, mas na maior parte das fontes documentais ou oficiais da mineração, a presença dos trabalhadores, homens ou mulheres, é praticamente insignificante, sendo que o mais estranho é a completa invisibilidade das trabalhadoras. O autor cita como exemplo a importante contribuição histórica do livro "Brasil 500 Anos: a construção do Brasil e da América Latina pela mineração", editado pelo CETEM - Centro de Tecnologia Mineral, do Ministério da Ciência e Tecnologia (LINS et al., 2000), que trata principalmente de aspectos tecnológicos, com abordagem marginal dos trabalhadores em geral e sem nenhuma referência às mulheres em particular.

Em seu estudo denominado: "Mulheres na Mineração: Restitutio Quae Sera Tamem", Castilhos & Castro (2006, p.6) constatam que, "em todas as culturas a mineração é vista como um trabalho masculino, por ser duro, insalubre e requerer muita resistência física. Na percepção da sociedade, apenas um ser biologicamente superior poderia suportar essas precárias condições: o homem."

As autoras constatam que na realidade não é só na atualidade que a mulher desempenha algum papel na mineração. Elas sempre estiveram presentes e tiveram papéis importantes na história da exploração mineral, desde o período Neolítico, no ano 4.000 a.C. No entanto, um dos principais entraves que se encontram ao se tentar estudar o papel da mulher na mineração é que esse setor é normalmente percebido como

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masculino e, portanto, na percepção e na memória coletiva a mulher não está presente nele.

Bruschini (1994), Segnini (1998) e Nogueira (2004), dentre outros autores, destacam em seus estudos, a expressiva inserção da mulher no mercado de trabalho brasileiro, principalmente no final do século XX. Em uma pesquisa realizada no ano de 2005, Machado, Oliveira & Wajnman, do CEDEPLAR - Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, da Universidade Federal de Minas Gerais , constataram que nos últimos cinqüenta anos, um dos fenômenos que mais chamou atenção foi o crescimento da participação feminina no mercado de trabalho.

A profundidade e a rapidez das mudanças acorridas no mundo do trabalho nos últimos anos é intensa, mas a divisão sexual do trabalho é algo antigo, o que há de novo é o aprofundamento das diferenças de gênero no mercado de trabalho e essas distinções surgem muito mais porque homens e mulheres são tratados como dois grupos isolados do que como indivíduos em separado.

Diversos pesquisadores, tais como Kergoat (1992) e Hirata (1995; 2002) na França, Souza Lobo (1991), Bruschini (1994), Segnini (1998), Pereira (2004), Nogueira (2004), Neves (2004), Pereira & Fidalgo (2007), Oliveira (2007), e outros, no Brasil, têm dedicado seus estudos às questões da divisão sexual do trabalho e da problemática da inserção da força feminina no mercado de trabalho.

Nogueira (2004) constata que dentre todas as metamorfoses que vêm ocorrendo no mundo do trabalho nos últimos tempos, talvez seja a sua "feminização", uma das mais importantes. Ao analisar o processo dialético da crescente inserção da mulher no setor produtivo, a autora observa tratar-se de mais um movimento contraditório dentro da lógica da relação capital-trabalho, pois, se permite avançar no difícil processo de emancipação feminina e, desse modo, minimizar as formas de dominação patriarcal no espaço doméstico, essas transformações também vêm agravando significativamente a precarização da mulher trabalhadora.

Para Oliveira (2007), tratar da temática do trabalho, segundo uma perspectiva de gênero, implica em utilizar a terminologia "trabalho da mulher" e não "trabalho feminino". Tal distinção é crucial para o entendimento das características do trabalho da mulher que engloba, tanto a participação na produção social como o trabalho reprodutivo exercido no espaço privado da família.

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Hirata (2002), reconceitua o trabalho segundo uma perspectiva de gênero ou

"sexo social" permitindo assim, dar conta dos papéis sexuais que são socialmente construídos e do grau em que eles condicionam a participação dos homens e das mulheres nas relações produtivas, como também perceber o seu impacto sobre a divisão sexual do trabalho. Tal impacto se reflete tanto no espaço privado da família como no espaço público do trabalho, por intermédio dos diversos mecanismos de diferenciação e de segregação que existem entre as atividades desempenhadas pelos homens e pelas mulheres, pois, enquanto o sexo é dado pela natureza, o gênero é convencionado pela sociedade.

Numa extensa pesquisa realizada no Japão, França e Brasil, a autora aponta tanto as dimensões econômicas e sociais quanto as sexuais para se compreender a nova divisão internacional do trabalho, com suas inúmeras faces.

Dentre suas descobertas, Hirata (2002) constatou uma extrema diversidade na gestão da força de trabalho quando o olhar tem como referência a dimensão "Norte-Sul"

e a dimensão "gênero". Disso decorre freqüentemente, segundo a autora, uma maior precarização do trabalho das mulheres, recorrentemente em regime de part-time, marcado por maior informalidade, redução salarial, e também pela falta de perspectiva promocional na carreira, restrições na política de formação profissional, mesmo quando o emprego é marcado por estabilidade, como é o caso do emprego público.

Com o olhar atento para essa morfologia, Kergoat (1993), citada por Hirata (2002, p.280), afirma que “(...) embora as modalidades mudem, a verdade é que a divisão sexual do trabalho é sempre estruturada por um princípio hierárquico: o trabalho masculino tem sempre um valor superior ao trabalho feminino".

A divisão sexual do trabalho é, assim, indissociável das relações sociais entre homens e mulheres, que são relações de exploração e de opressão entre duas categorias de sexo socialmente construídas desiguais, hierarquizadas, assimétricas ou antagônicas de exploração e de opressão. A preeminência de um dos componentes dessas relações, seja o componente opressão/dominação de sexo, seja o componente superexploração econômica, constituiu uma das diferenças mais importantes que fragmentaram o campo das pesquisas e dos movimentos feministas, tanto no Norte quanto no Sul. (HIRATA, 2002).

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De sua pesquisa resulta uma reconceitualização do trabalho, em sua subjetividade ao mesmo tempo sexuada e de classe. O conceito de "relações sociais de sexo/gênero", proposto por Hirata (2002, p.22), aponta para a construção social, cultural e histórica das diferenças entre os sexos.

Os estudos de Pereira (2004) e Pereira & Fidalgo (2007), mostram a divisão sexual do trabalho como uma categoria de análise que possibilita delimitar os lugares sociais atribuídos aos homens e às mulheres, bem como identificar os valores atribuídos a eles e as regras de comportamento decorrentes destes valores no mundo do trabalho.

Considerando as mudanças advindas da reestruturação produtiva e da gestão da força de trabalho pela lógica de competências, na pesquisa realizada em uma fábrica do setor automobilístico no ano de 2004, os autores constatam que as transformações ocorridas por este novo modelo foram bastante significativas para as mulheres, pois tiveram oportunidades de serem inseridas em ocupações de comando e em funções consideradas masculinas.

Nos depoimentos colhidos na pesquisa empírica os autores evidenciam que a necessidade de comprovação dos saberes é maior para as mulheres, principalmente para aquelas que ocupam funções consideradas masculinas e de maior nível hierárquico e afirmam, também que,

(...) algumas competências socialmente atribuídas a elas estão sendo reconhecidas e valorizadas pelas empresas, tais como a capacidade de adaptar-se às mudanças e de realizar várias tarefas, de relações humanas, comunicação, mobilização e engajamento para com os objetivos da empresa e comprometimento." (PEREIRA & FIDALGO, 2007, p.160-161).

Desta forma, na empresa investigada, relatam os autores, as mulheres têm usado como estratégia o aperfeiçoamento das competências consideradas femininas para inserção em cargos de maior escalão e aquelas competências consideradas masculinas - objetividade, competitividade, autonomia etc. para ocupação de cargos socialmente atribuídos aos homens.

Assim, concluem, o que a lógica de competência traz de novo em relação à divisão social de sexos é o reconhecimento, valorização e ressignificação de determinadas competências socialmente atribuídas às mulheres, aquelas adquiridas no trabalho doméstico, exercido no espaço privado.

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Também Segnini (1998, p.178) revela que os espaços privados e as tarefas domésticas passam a ser um elemento qualificador, pois possibilitam à mulher desenvolver habilidades requeridas e valorizadas para a realização do trabalho flexível.

A partir da idéia de flexibilização a "lógica de competências" aponta para uma forma de regulação das relações de trabalho, no final da década de 70 em resposta à crise do modelo taylorista-fordista, que tinha como regra o trabalho prescrito e a separação do trabalho de concepção e de execução. Emergindo a partir do discurso empresarial francês baseai-se na flexibilidade das relações de trabalho e de produção.

Segundo Hirata (2002a) a noção de competência é oriunda do discurso empresarial nos últimos dez anos, na França, e retomada em seguida por economistas e sociólogos. É uma noção ainda bastante imprecisa e decorreu da necessidade de avaliar e classificar conhecimentos e habilidades gestadas a partir das atuais exigências de situações concretas de trabalho, associada, portanto aos novos modelos de produção e gerenciamento, e substitutiva da noção de qualificação ancorada nos postos de trabalho e das classificações profissionais que lhes eram correspondentes.

Para Dugué (1999), a referência às competências é uma resposta às insuficiências do sistema da qualificação face às novas condições. As numerosas análises do modelo da competência têm mostrado como ele responde às transformações dos sistemas de trabalho: os modos de prescrição evoluindo, recorre-se à mobilização psíquica dos trabalhadores e não mais somente aos seus conhecimentos. Além disso, com a reelaboração permanente dos empregos interditando sua codificação, torna-se necessário desatrelar a negociação salarial de todo e qualquer vínculo com postos ou saberes preestabelecidos. O modelo de competência, então, responderia a este duplo problema.

As competências são definidas como "saberes em ação", ou seja, um conjunto de conhecimentos e de maneiras de ser que se combinam harmoniosamente para responder às necessidades de uma dada situação em um dado momento. Enquanto os diplomas validam saberes, as competências remetem a uma mistura de saber e de comportamento que confere um lugar preponderante aos "saber-ser" e ao investimento psicológico.

Enquanto os diplomas são adquiridos de uma vez por todas, dando à noção de qualificação uma dimensão estabilizadora, a competência, por definição

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"inqualificável", (STROOBANTS, 2002), é da ordem do conjuntural e não pode ser considerada um atributo definitivo.

Para Zarifian (2001) o conceito de competência procura ir além do conceito de qualificação, pois, refere-se à capacidade de a pessoa assumir iniciativas, ir além das atividades prescritas, ser capaz de compreender e dominar novas situações no trabalho, ser responsável e ser reconhecido por isso. Ressalta-se também a valorização dos saberes em ação, a inteligência prática dos/as trabalhadores/as independente de títulos e diplomas; uma maior polivalência do/a trabalhador/a, que lhe permite lidar com diferentes processos e equipamentos, assumir diferentes funções e tornar-se multiqualificado/a. Assim, a competência não se limita, portanto, a um estoque de conhecimentos teóricos e empíricos detidos pelo indivíduo, nem se encontra encapsulado na tarefa.

Em Küenzer (2003, p.1), é possível compreender a categoria competência como, a capacidade de agir, em situações previstas e não previstas, com rapidez e eficiência, articulando conhecimentos tácitos e científicos a experiências de vida e laborais vivenciadas ao longo das histórias de vida, vinculada à idéia de solucionar problemas, mobilizando conhecimentos de forma transdisciplinar a comportamentos e habilidades psicofísicas, e transferindo-os para novas situações; supõe, portanto, a capacidade de atuar mobilizando conhecimentos.

Em seu estudo da arte sobre a lógica de competências, Fidalgo (2003), relata que apesar das reiteradas afirmações de diversos autores sobre as imprecisões conceituais da noção de competências, há várias convergências entre eles, tais como: a competência como capacidade de articulação e mobilização de saberes, conhecimentos, habilidades e atitudes; a exaltação do sentido de eficácia das competências diante dos acontecimentos e, finalmente, o movimento em direção ao processo de individualização e de competição entre os/as trabalhadores/as.

Diante das mudanças técnicas, organizacionais e econômicas ocorridas nos últimos anos, as empresas têm progressivamente substituído o modelo de "qualificação"

pelo de "competências". No entanto, muito mais que a definição do termo, para Schwartz (1998) um dos maiores problemas advindos desta mudança é em relação aos procedimentos de gestão e definição de modelos de avaliação dessas competências. Para o autor, a determinação das competências para o trabalho e o processo de avaliação dessas competências torna-se um paradoxo, pois, na medida em que é um exercício

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necessário é, ao mesmo tempo, uma questão insolúvel. Assim, para se buscar a compreensão da produção de saberes em atividades de trabalho, é preciso considerar todas as experiências acumuladas e a história pessoal dos/as trabalhadores/as, os valores de uso nas relações sociais e as diversas trajetórias de formação dos sujeitos, os conhecimentos acionados nos sistemas produtivos, as tecnologias utilizadas, as formas de organização e os procedimentos escolhidos.

Considerações Finais

A partir do estudo teórico, esta pesquisa visa compreender as categorias

"relações sociais de sexos" e "competência" no contexto do setor produtivo. Na pesquisa empírica, busca-se investigar o crescente interesse das empresas pela contratação de mulheres para "profissões masculinas" e as competências requeridas destas mulheres pelo capital, localizar mulheres que exercem tais profissões socialmente consideradas masculinas, identificar e analisar as competências realmente desenvolvidas e utilizadas por elas nas atividades de trabalho, onde e como foram desenvolvidas. Também a análise dos conflitos vivenciados e as estratégias utilizadas pela mulher no processo de confrontação e avaliação das competências prescritas com o desenvolvimento e utilização de suas competências nas situações de trabalho serão de fundamental importância para os resultados esperados.

Por fim, espera-se com este estudo, contribuir para ampliar e aprofundar a compreensão sobre as relações sociais de sexos no mundo do trabalho, no contexto do modelo de competência, e se a inserção da mulher em profissões masculinas representam um avanço rumo à sua emancipação ou um aumento da precarização e dos preconceitos as quais é submetida no mundo do trabalho pela sua condição feminina.

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i Vinculado ao Grupo de Pesquisa Trabalho, Tecnologia e Educação. Apoio: Fapemig e CNPq.

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