• Nenhum resultado encontrado

O PAPEL DO SONO NO CONTROLE GLICÊMICO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM DIABETES MELLITUS TIPO 1: REVISÃO DE LITERATURA

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O PAPEL DO SONO NO CONTROLE GLICÊMICO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM DIABETES MELLITUS TIPO 1: REVISÃO DE LITERATURA"

Copied!
9
0
0

Texto

(1)

O PAPEL DO SONO NO CONTROLE GLICÊMICO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM DIABETES MELLITUS TIPO 1: REVISÃO DE LITERATURA

The role of sleep in the glycemic control of children and adolescents with type 1 diabetes mellitus: literature review

Ricardo Gullit Ribeiro1*, Gabriela Araujo Moreira1, Roddie Moraes Neto1, Suzana Nesi França2

RESUMO

Objetivo: Revisar a literatura a respeito das características de sono de crianças e adolescentes com diabetes mellitus tipo 1 (DM1) e avaliar a relação entre o sono e o controle da doença. Fonte de dados: Revisão de literatura realizada nas bases de dados Pubmed, Cochrane, Lilacs e Embase. Os descritores “type 1 diabetes mellitus 1 AND sleep” e “Diabetes Mellitus Tipo 1 E sono” foram utilizados com filtro de pesquisa para 0-18 anos. A busca não foi limitada pela data da publicação, idioma ou desenho de estudo. Após análise da literatura, 8 estudos foram incluídos na revisão. Síntese dos dados: A qualidade do sono foi associada com redução da hemoglobina glicada, parâmetro fundamental no controle da doença. Notou-se alta prevalência de curta duração do sono, embora quando questionados os pacientes tenderam a referir uma boa qualidade do sono. Apesar das evidências serem controversas, não existem dados suficientes para assegurar o efeito do sono no número de aferições da glicemia capilar, além do impacto do jet lag social, cronotipo e duração do sono no controle glicêmico. Conclusões: A revisão da literatura demonstrou a relação entre a qualidade do sono e o controle metabólico em crianças e adolescentes com DM1. A abordagem da higiene do sono mostra-se importante como parte do tratamento destes pacientes, além da necessidade de realização de mais estudos que avaliem este tema na população pediátrica.

Palavras-chave: Diabetes Mellitus Tipo 1; Sono; Glicemia.

ABSTRACT

Objective: To review literature regarding sleep characteristics of children and adolescents with type 1 diabetes mellitus (T1DM) and evaluate the relationship between sleep and disease control. Data source: Systematic review performed on the databases Pubmed, Cochrane, Lilacs and Embase. The descriptors “type 1 diabetes mellitus 1 AND sleep” and “Diabetes Mellitus tipo 1 E sono” were used with a search filter for 0-18 years of age. Search was not limited by the date of publication, language or study design. After analyzing the literature, 8 studies were included in the review. Data synthesis: Sleep quality was associated with a reduction in glycated hemoglobin, a fundamental parameter of disease control A high prevalence of short sleep duration was noted, although patients reported good sleep quality. With divergent evidence, there is insufficient data to relate the effect of sleep on the number of capillary blood glucose measurements, in addition to the impact of social jet lag, chronotype and sleep duration on glycemic control. Conclusions: Literature review demonstrate the relationship between sleep quality and metabolic control in children and adolescentes with T1DM. The approach to sleep hygiene is shown to be important as part of the treatment of these patients, in addition to carrying out further studies to evaluate this topic in the pediatric population.

Keywords: Diabetes Mellitus; Type 1; Sleep; Blood Glucose.

Recebido em: 20 de Janeiro de 2021 | Aceito em: 5 de Abril de 2021.

* Autor correspondente: Ricardo Gullit Ribeiro E-mail: ricardogullit@hotmail.com

1 Universidade Federal do Paraná, Curso de Medicina, Curitiba - PR, Brasil.

2 Universidade Federal do Paraná, Departamento de pediatria, Curitiba - PR, Brasil.

Como citar este artigo:

Ribeiro RG, Moreira GA, Moraes Neto R, França SN. O papel do sono no controle glicêmico de crianças e adolescentes com diabetes mellitus tipo 1:

(2)

endócrina causada pela deficiência da síntese de insulina pelo pâncreas, cursando com hiperglicemia crônica.

Caracteriza-se tipicamente por poliúria, polidipsia, polifagia e emagrecimento, além de estar associado a uma série de complicações crônicas como insuficiência renal, retinopatia e aumento do risco cardiovascular. Frente a isso, um adequado controle da glicemia plasmática – que é o grande pilar do tratamento da doença – é de fundamental importância para melhorar o prognóstico dos pacientes.1,2

Nesse cenário de múltiplas complicações, estudos recentes sugerem que pacientes com DM1 possuem várias alterações nos padrões arquiteturais do sono, como no tempo total, tempo médio, eficiência, porcentagem de estágios do sono e padrões respiratórios.2,3 Além disso, discute-se na literatura o papel do sono no controle da doença, sendo demonstrado por alguns trabalhos pior controle glicêmico, menor adesão ao tratamento e mais complicações agudas e crônicas em pacientes com pior qualidade do sono.2

Os autores utilizaram o Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (PSQI) para avaliar as características subjetivas de qualidade e duração do sono. O PSQI é uma medida de autorrelato, composta por 19 itens agrupados em sete componentes, e cada componente produz uma pontuação de 0 a 3, com 3 indicando má qualidade do sono.

As pontuações estão associadas a medidas objetivas do sono, como a polissonografia.4,5

O manejo da glicemia no paciente com DM1 é avaliado principalmente através da hemoglobina glicada (HbA1c), a qual reflete uma glicemia média ao longo de aproximadamente 3 meses. Além de ser a principal ferramenta para avaliar o controle glicêmico, tem forte valor preditivo para complicações do diabetes. A American Diabetes Association (ADA) recomenda que a HbA1c seja realizada rotineiramente em todos os pacientes com diabetes na avaliação inicial e como parte do tratamento contínuo. 6

As vias fisiológicas que correlacionam o sono e a homeostase da glicemia não estão completamente compreendidas. Sugere-se que o descontrole glicêmico em indivíduos com DM1 pela restrição de sono, assim como em indivíduos hígidos, ocorra devido à elevação do cortisol plasmático e da ativação do sistema nervoso simpático.3,7,8

Os estudos que avaliaram as correlações entre pior qualidade do sono com pior controle glicêmico, menor adesão e mais complicações são escassos, com pequenas e heterogêneas amostras e baixa validade externa para população pediátrica.

Frente a isso, o objetivo deste trabalho foi, por meio de uma revisão sistemática da literatura médica, reunir informações a respeito das características de sono de pacientes pediátricos com DM1 e avaliar qual é a relação

da qualidade do sono no DM1, compondo mais um pilar do tratamento complexo e multiprofissional desta doença.

MÉTODOS

A revisão sistemática foi realizada nas bases de dados Pubmed, Cochrane, Lilacs e Embase. Os descritores utilizados foram extraídos do Medical Subject Headings (MeSH) e dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e utilizados com a seguinte sistematização: “diabetes mellitus type 1 AND sleep” e “Diabetes Mellitus Tipo 1 E sono”, com filtro de pesquisa para 0-18 anos. A busca não foi limitada pela data da publicação, idioma ou desenho de estudo.

Por meio da busca nas bases de dados, realizou-se inicialmente uma triagem, na qual foram incluídos para análise os estudos cujos títulos permeavam os temas sono e DM1. Os artigos selecionados nessa primeira fase tiveram seus resumos lidos na íntegra, sendo selecionados os trabalhos cuja amostra fosse composta exclusivamente por crianças ou adolescentes e que abordavam características do sono de pacientes com DM1 e sua influência para o controle glicêmico dos pacientes. Foram excluídos os estudos realizados com adultos e aqueles que utilizavam parâmetros da qualidade do sono para avaliar a validade de novas modalidades terapêuticas. Após isso, os artigos selecionados foram lidos na íntegra e aqueles que não se adequavam a proposta foram excluídos. Todas as fases de busca na literatura foram realizadas por dois pesquisadores independentes, sendo um terceiro pesquisador consultado em caso de divergências. O fluxograma da seleção dos estudos pode ser observado na figura 1.

A escala de Downs & Black foi utilizada para avaliar os artigos incluídos na revisão.9 Frente ao baixo número de trabalhos disponíveis na literatura, a pontuação na escala não constituiu um critério na inclusão ou exclusão de estudos da revisão. Aplicada por três pesquisadores independentes, essa escala avalia a forma de relatar os resultados, validade externa e interna do estudo e seu poder estatístico.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A estratégia de busca gerou 51 artigos, dos quais oito (15,7%) foram selecionados para análise de dados de acordo com os critérios preestabelecidos. Na tabela 1 são apresentadas as informações gerais sobre os oito estudos incluídos nesta revisão sistemática: Schnurbein et al., Jaser et al., Kostková et al., Turner et al., Frye et al., McDonough et al., Perfect et al. e Rechenberg et al. As publicações aconteceram de 2012 a 2020, sendo duas delas com delineamento transversal e multicêntrico, outras duas

(3)

transversais e monocêntricas, uma transversal e retrospectiva monocêntrica, duas coortes e um caso-controle.

Nesta revisão sistemática, 515 crianças e 718 adolescentes foram estudados, com idade variando de 2 a 21 anos, e somente quatro artigos especificaram o número de participantes do sexo feminino e masculino. Houve uma grande variação no tamanho da amostra utilizada pelos estudos. Dentre eles, quatro contaram com um pequeno valor amostral, inferior a 50 participantes.

Sono e hemoglobina glicada

As variáveis do sono, como duração e qualidade, foram analisadas como possíveis influenciadoras no controle

glicêmico, nesse caso, por meio da análise da hemoglobina glicada (HbA1c). A literatura é controversa com relação a esse tema para crianças e adolescentes, porém, evidências emergentes sugerem uma associação potencial entre o sono e o manejo do DM1.10 Schnurbein et al. obtiveram em seu estudo uma associação entre a qualidade do sono e a HbA1c, sendo que a influência do sono pode ser mais forte em indivíduos do sexo masculino.8 A análise do estudo mostrou que um ponto a mais na qualidade do sono, portanto, melhor sono, associa-se com um decréscimo de 0,7% na HbA1c. Corroborando essa hipótese, Jaser et al., em um estudo no qual as informações foram obtidas pelos relatos dos pais, descreveram que crianças com Figura 1. Diagrama de fluxo da literatura consultada.

(4)

AutoresTítuloTipo de EstudoAmostraResultadosEsco Perfect et al. (2012)Sleep, glucose, and daytime functioning in youth with type 1 diabetes Caso-controle40 adolescentes com DM1 e média de idade de 13,49 ± 2,09 anos e 40 adolescentes saudáveis com média de idade de 13,52 ± 1,91 ano Sonolência e/ou maus hábitos de sono foram correlacionados com pior qualidade de vida, humor deprimido, notas mais baixas e escores de leitura padronizados mais baixos. Os achados relacionados à arquitetura do sono incluíram associações entre ondas lentas do sono reduzidas e HbA1c mais alta, pior qualidade de vida e sonolência.

18 Turner et al. (2016)Variations in Daily Sleep Quality and Type 1 Diabetes Management in Late Adolescents

Coorte247 adolescentes com DM1. Média de idade de 17,76 ± 0,39 anos.

Maior qualidade média do sono foi associada a menos falhas de autorregulação e menor risco de glicemia elevada. Falhas de autorregulação foram associadas a menos verificações da glicemia e maior risco de glicemia elevada. A frequência diária das verificações de glicemia não foi relacionada as variáveis de percepção do sono. Aqueles que relataram sono de melhor qualidade também relataram menos falhas de autorregulação diárias. Os adolescentes que tiveram melhor qualidade do sono correram menor risco de ter glicemia diária elevada.

17 McDonough et al. (2017)Sleep duration and its impact on adherence in adolescents with type 1 diabetes mellitus

Coorte45 adolescentes de 12 a 18 anos, com DM1 por pelo menos 6 meses, em terapia com bomba de insulina (20 meninas e 25 meninos)

A duração do sono foi comparada com a frequência do dia seguinte da automonitorização sanguínea de glicose e a frequência do bolus diário de insulina. Foram encontradas associações entre a duração do sono, automonitorização sanguínea de glicose e frequências de bolus de insulina. Especificamente, um aumento de 15 e 20 minutos no sono foi associado a uma verificação adicional diária de medida de glicemia capilar e a um bolus de insulina adicional realizado pelo paciente.

17 Jaser et al. (2017)Sleep in children with type 1 diabetes and their parents in the T1D Exchange

Transversal e multicêntrico515 pais de crianças de 2 a 12 anos com DM1 há mais de 1 ano

Houve maior frequência de uso de bomba de insulina, de monitor contínuo de glicemia e HbA1c mais baixa entre os pacientes que responderam ao questionário. A duração média de sono por noite variou conforme a idade dos pacientes, mas 20% tinham duração abaixo do recomendado. 67% dos pacientes preenchiam critérios para sono de má qualidade. As crianças com má qualidade do sono tinham HbA1c maior que as com sono bom. A frequência de medição da glicemia não foi associada com qualidade do sono. As crianças com sono ruim tinham mais hipoglicemia nos últimos 3 meses, assim como cetoacidose diabética. O tipo de insulina não foi associada com qualidade do sono da criança. O uso de monitor contínuo de glicemia também não teve associação com a qualidade do sono.

19

Tabela 1. Estudos utilizados na revisão

(5)

Kostková et al. (2018)Short-term metabolic control and sleep in children and adolescents with type 1 diabetes mellitus Transversal e prospectivo monocêntrico

44 crianças com DM1 e 60 controles saudáveis, com idades entre 10 a 19 anos.

Não foram encontradas diferenças significativas no tempo total de sono, eficiência do sono, porcentagem de estágios do sono e parâmetros respiratórios entre DM1 e grupo saudável. Crianças DM1 com controle metabólico de curto prazo ideal tiveram um índice de apneia- hipopneia e índice de excitação respiratória significativamente menores em comparação com crianças com controle de curto prazo subótimo. Não foram observadas diferenças significativas nos parâmetros da arquitetura do sono. Apneia obstrutiva do sono foi diagnosticada em apenas um paciente DM1; nove crianças com DM1 tinham apneia central leve.

17 von Schnurbein et al. (2018)

Sleep and glycemic control in adolescents with type 1 diabetes Transversal e multicêntrico191 pacientes de 12 a 21 anos com DM1, menarca para meninas e G5 de Tanner para meninos

Em análises multivariadas, a qualidade do sono foi significativamente associada com HbA1c. A análise estratificada indicou que essa associação pode ser mais forte em meninos e em crianças com histórico de migração. Em contraste, nem a duração do sono, o débito de sono, o cronotipo, nem o jetlag social foram associados à HbA1c. As análises secundárias mostraram que o jetlag social foi significativamente associado aos níveis de necessidade de insulina. Frye et al. (2019)Diabetes management mediates the association between sleep duration and glycemic control in youth with type 1 diabetes mellitusTransversal e monocêntrico111 pacientes, com idade entre 10 e 16 anos com DM1Meninos e meninas não tiveram diferenças nos resultados do manejo do DM, exceto no número de medidas da glicemia (maior em meninas). Idade teve relação com o número de medidas da glicemia, mas não com a HbA1c. Os pacientes mais velhos têm mais dificuldade para conciliar o sono, dificuldade para manter o sono, sono mais curto e dormem mais tarde. O tempo total de sono foi associado com a medida da HbA1c e frequência de medição da glicemia. A qualidade do sono teve correlação com os valores da HbA1c.

18 Rechenberg et al. (2020)Sleep and Glycemia in Youth With Type 1 Diabetes

Transversal e monocêntrico40 adolescentes com DM1 com média de idade de 13,4±1,9 anos Maior variabilidade do sono está associada a maior estresse, mais sintomas depressivos e pior controle da glicose, evidenciado pela maior média de glicemia e maior pontuação de risco de hiperglicemia.

Continuação....

(6)

Além disso, as crianças com má qualidade do sono eram mais propensas a terem experimentado pelo menos um evento de hipoglicemia grave (4% versus 1%) ou cetoacidose diabética (7% versus 4%). Frye et al. também encontraram relação entre a qualidade do sono e a medida da HbA1c, e também entre a duração total do sono com a actigrafia e a HbA1c.10 Por outro lado, em relação a HbA1c e duração total do sono, Rechenberg et al. não obtiveram relação da duração total com HbA1c ou outra medida de controle glicêmico.5 Uma das explicações para isso pode ser o delineamento do estudo (transversal) e a pequena amostra do estudo (40 participantes).

Qualidade do sono

A qualidade do sono é um parâmetro a ser avaliado em crianças e adolescentes, dado que uma duração insuficiente do sono está associada a um pior desempenho acadêmico, déficits cognitivos e de funções executivas, comprometimento de memória, pior qualidade de vida e pior regulação do peso corporal.5 No estudo transversal multicêntrico de Schnurbein et al., no qual foram avaliados 191 participantes com idade média de 16,5 ± 1,8 anos, a média na Escala de Qualidade de Sono utilizada foi de 21 ± 2,2, o que indica uma boa qualidade de sono, dado que a pontuação varia de 4 a 26. Destaca-se que a boa qualidade de sono no tercil superior refletiu em um melhor controle glicêmico.8 Em contraponto, na amostra de 515 participantes de Jaser et al., identificaram que 67%

(346) preenchiam critérios para sono de má qualidade e 53%

possuíam critério para má qualidade de sono (>5 pontos) no Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (PSQI).11 Utilizando esse último índice, Rechenberg et al., em uma amostra de 40 jovens com idade 13,4 ± 1,9 anos, 32 crianças responderam ao questionário com uma média de 6,9 ± 1,5, o que está acima do corte para má qualidade de sono, além de ter encontrado uma alta prevalência de curta duração do sono (87,5%).5 Turner et al. descreveram uma qualidade média do sono em 3,56 ± 0,78, numa escala em que, ao final de cada dia, os participantes avaliaram a qualidade percebida de seu sono na noite anterior com pontuação variando de 1 (muito mal) a 5 (muito bem).12

Nesse sentido, Frye e colaboradores demonstram que 99,1% dos pacientes tinham quantidade total de sono por dia inferior ao recomendado, com um tempo total de sono de 7,45 ± 0,74 horas.10 Tal achado corrobora a hipótese da pequena quantidade de sono total em pacientes com DM1, como demonstrado por Perfect et al. em 2019, com uma média de tempo total de sono de 6,96 +/- 1,01 horas e vários outros estudos.10

A presente revisão detectou uma alta prevalência de curta duração do sono. Tal achado pode influenciar negativamente o controle da glicemia no paciente com DM1.

faixas etárias diferentes e possuíam desenhos metodológicos muito distintos. É de fundamental importância a elaboração de estudos controlados, uma vez que é crescente na literatura a evidência de que pacientes pediátricos saudáveis possuem alterações no padrão de sono.4

Autogestão do DM1 e sono

Há mais de 40 anos discute-se na literatura o papel da automonitorização da glicemia capilar (GC) por pacientes com DM1, sendo essa medida apontada desde então como um dos pilares do bom controle glicêmico dos pacientes.13 Ao encontro disso, o último consenso da sociedade internacional de diabetes na infância e adolescência aponta que a disponibilidade da automonitorização da glicemia plasmática é fundamental para o bom controle do DM1. 14

A frequência de medidas diárias de glicemia capilar e sua influência sobre o sono de crianças e adolescentes com DM1 foi estudada por cinco autores desta revisão sistemática: Jaser et al., Turner et al., Frye et al., McDonough et al. e Rechenberg et al. O número médio de verificações de glicose no sangue por dia variou entre os estudos, e dentre aqueles que especificaram as mensurações, Jaser et al. encontraram uma verificação média da GC de 7 vezes/

dia, Turner et al. de 3,65 vezes/dia e McDounough et al. de 4,8 ± 2,3 vezes/dia - com apenas 61% dos dias tendo ≥ 4 leituras por dia.11,12,15

Turner et al. afirmam que a redução das falhas na automonitorização é de extrema importância, pois está associada a uma melhor adesão ao tratamento do DM1.12 No entanto, nossa revisão não encontrou uma associação entre a qualidade e duração do sono infanto- juvenil e a frequência de medidas diárias da GC.10–12 Turner et al. oferecem possíveis explicações para o fato, como o comportamento arregimentado de usar os horários das refeições como guia para verificação da GC, o relato de adolescentes associando o mau humor às falhas de autorregulação glicêmica e a má qualidade do sono com o esquecimento em realizar as medidas frequentes da GC.12 Em concordância, Frye et al., apontam que tempo adequado de sono também foi significativamente correlacionado com a porcentagem de tempo gasto no controle do diabetes em auto-relatos e nos relatórios dos pais sobre o monitoramento da CG pelos seus filhos. Frye et al. ainda relacionam, em seu estudo, HbA1c à frequência de monitoramento da CG, demonstrando que para cada hora adicional de sono, HbA1c foi reduzida em 0,33% e os adolescentes se envolveram em quase uma medida adicional da GC (0,88).10

Em análises multivariadas, McDonough et al.

encontraram associações estatisticamente significativas

(7)

entre a duração média do sono de adolescentes, a frequência do monitoramento da GC e a quantidade de bolus de insulina diários. Os autores obtiveram de resultado o aumento de 1,4% na frequência de monitoramento da CG a cada 1 minuto adicional na média do tempo de sono, ou seja, foi relatado que o aumento de 15 a 20 minutos na duração do sono pode se traduzir em um aumento na frequência média diária de monitoramento da GC e na frequência de bolus médio diário de insulina.15 Dessa forma, McDonough et al. sugerem que um sono adequado pode ser uma variável importante a considerar durante o aconselhamento de adolescentes com DM1 em seu autocuidado diário. Frye et al., concordam com o posicionamento de McDonough et al. apoiando que os comportamentos de autogestão desempenham um papel crítico na manutenção do controle do diabetes.10

Ao encontro disso, Frye et al. ainda apontaram uma correlação entre a qualidade do sono, medida objetivamente por meio de actigrafia, e a frequência de monitoramento da GC com os comportamentos de gerenciamento de crianças e adolescentes com DM1.10 Quanto aos comportamentos de autogestão do DM1, Turner et al. levantam para discussão o esforço compensatório dos pais de garantir o monitoramento da GC quando seus filhos justificam a falha de autorregulação glicêmica pela falta de vontade e pelo humor. Neste contexto, é reiterado, a importância da verificação de GC como componente chave da gestão do DM1 e é indicado, para futuras pesquisas, a exploração da co-ocorrência de falhas autorregulatórias e os esforços compensatórios dos pais.12

Evidenciou-se também que Jaser et al. afirmam serem os pais os principais responsáveis pelo controle do DM1 em crianças e, por esse motivo, pode ser que as associações entre distúrbios do sono e aderência sejam mais evidentes em indivíduos mais velhos (adolescentes), que se envolvem mais em autogestão. Além disso, neste estudo, a falta de associação entre o uso do monitor contínuo de glicemia e a qualidade do sono dos pais ou da criança revelou que muitos pais expressam interesse em usar monitor contínuo de glicemia como uma forma de reduzir a ansiedade em torno da hipoglicemia noturna e a necessidade de cuidados noturnos.11 O monitor contínuo de glicemia foi bastante explorado no estudo de Rechenberg et al., no qual a maioria dos participantes (97,3%) usou uma bomba de insulina para tratamento e seu próprio monitor contínuo de glicose (70,6%). A intervenção comportamental em que a duração do sono foi estendida por 30 min ao dia levou a uma melhoria de 7,4% nos níveis médios de glicose medidos por monitor contínuo de glicose. Os autores afirmaram que não sabem se estender a duração do sono ao longo do tempo é sustentável, ou qual o impacto a longo prazo nos resultados clínicos da frequência de medidas diárias de GC, e que futuros pesquisadores poderiam esclarecer esta lacuna.5

Parâmetros do sono

Quanto aos parâmetros arquiteturais do sono, como tempo total, tempo médio, eficiência, porcentagem de estágios do sono e padrões respiratórios, Kostková et al.

e Perfect et al. não encontraram diferenças significativas entre crianças e adolescentes com DM1 e o grupo controle de crianças e adolescentes saudáveis.2,3 Nesses dois estudos, observou-se que crianças com DM1 com controle metabólico de curto prazo ideal tiveram índice de apneia- hipopneia (IAH) e índice de excitação respiratória menores quando comparadas a crianças com DM1 com controle de curto prazo subótimo. Outros distúrbios do sono também foram diagnosticados por Kostková et al. em crianças com DM1, como apneia obstrutiva do sono em uma criança e apneia central leve em nove crianças. 3

Jet Lag social e DM1

Os adolescentes, ao levantarem cedo para ir à escola, tendem a acumular dívidas de sono durante a semana e tentar compensá-las no fim de semana. Este desalinhamento circadiano denominado jet lag social foi avaliado por dois estudos incluídos em nossa revisão sistemática. Schnurbein et al. e Frye et al., que denominaram jet lag social a diferença absoluta entre o ponto médio do período de sono nas noites de escola e o ponto médio em noites não escolares.8,10

Em seu estudo com adolescentes portadores de DM1, Schnurbein et al. encontraram um jet lag social médio de 2,5 horas +/- 1,2 hora, que é uma hora maior que o jet lag social observado na população média adulta com trabalho diurno, porém dentro do esperado para a faixa etária em uma amostra de conveniência.8 Frye et al., por sua vez, relatam que seus participantes tinham uma média de hora de dormir em torno das 22h34 (+/- 1,12h) e experimentaram um jet lag social de pouco mais de uma hora, com uma média de 1,12 +/- 0,83 horas.10

Não foi verificado uma associação entre jet lag social, cronotipo, duração do sono e controle glicêmico, uma vez que, os adolescentes com DM1 - em contraste com os adultos - ainda são metabolicamente saudáveis e podem compensar, em certa quantidade, o impacto negativo da restrição do sono e do desalinhamento circadiano.10 Por outro lado, Schnurbein et al. apresentaram uma relação significativa entre jet lag social e necessidades crescentes de insulina, corroborando com a relação apresentada por Frye et al. entre elevados níveis de HbA1c e jet lag social aumentado.8

Dimensões e Qualidade dos Estudos

Em relação às dimensões aplicadas nos estudos, três artigos usaram o actímetro para avaliar a duração do sono de forma objetiva e cinco estudos usaram medidas subjetivas, como questionários e entrevistas. Na tabela 1, também estão

(8)

19 pontos). A média da pontuação dos artigos foi de 17,75, com um desvio padrão de 0,71 ponto.

Limitações dos Estudos

Os artigos selecionados continham algumas limitações metodológicas. Alguns usaram como fonte de dados questionários e entrevistas, que, embora fossem baseados em parâmetros validados, não incorporaram medidas objetivas de sono e contavam com o recordatório e preenchimento correto dos pacientes aos formulários. Além disso, as informações eram preenchidas pelos pais nos casos de crianças com baixa idade, tornando os dados ainda mais subjetivos. Em contrapartida, os estudos que utilizaram análises objetivas do sono possuíam como limitações o estresse da internação - nos casos onde a polissonografia foi utilizada - que pode afetar o controle glicêmico, e a discrepância entre a percepção da noite de sono em laboratório com a percepção da noite de sono em casa. Além disso, todos os estudos que utilizaram actigrafia o fizeram por curto período de tempo, inferior ao recomendado pela literatura, o que pode afetar a qualidade dos dados. A maior parte dos estudos tinham um delineamento transversal e tiveram que confiar em mensurações únicas e retrospectivas de HbA1c para avaliar controle glicêmico. As análises, de modo geral, foram feitas com uma amostra modesta e, algumas justificaram a não inclusão do estadiamento puberal de Tanner, descrito apenas por Schnurbein et al., pelo pequeno número de participantes.8

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da análise dos estudos que compõem essa revisão sistemática, percebe-se o papel importante do sono no controle metabólico de pacientes com DM1. A qualidade do sono foi associada com redução significativa da HbA1c, ponto fundamental no tratamento da doença. Apesar das evidências serem divergentes, não existem dados suficientes para assegurar o efeito do sono no número de aferições da glicemia capilar, além de afirmar o impacto do jet lag social, cronotipo e duração do sono no controle glicêmico.

Apesar da importância desses fatores, são escassos na literatura os trabalhos que os avaliam. Além disso, as casuísticas são constituídas de pacientes com faixas etárias distintas, utilizando diferentes modos de tratamento e com aferições dos parâmetros de sono e controle glicêmico do modo impreciso. Soma-se a isso o fato de não haver nenhuma casuística brasileira avaliando a influência do sono no controle do DM1 em crianças e adolescentes.

Considerando a complexidade do tratamento da doença, associada a grande importância do bom controle

e controlados, que avaliem os pacientes com medidas objetivas do controle glicêmico e de parâmetros do sono, visando contribuir para a discussão com evidências robustas.

Frente ao exposto, mostra-se importante a abordagem da higiene do sono como parte do tratamento dos pacientes com diabetes mellitus tipo 1.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Katsarou A, Gudbjörnsdottir S, Rawshani A, Dabelea D, Bonifacio E, Anderson BJ, et al. Type 1 diabetes mellitus. Nat Rev Dis Prim [Internet]. 2017 Dec 21;3(1):17016. Available from: http://www.nature.com/articles/nrdp201716

2. Perfect MM. Sleep-related disorders in patients with type 1 diabetes mellitus: current insights. Nat Sci Sleep [Internet].

2020 Feb;Volume 12:101–23. Available from: https://www.

dovepress.com/sleep-related-disorders-in-patients-with- type-1-diabetes-mellitus-curr-peer-reviewed-article-NSS 3. Kostkova M, Durdik P, Ciljakova M, Vojtkova J, Sujanska A,

Pozorciakova K, et al. Short-term metabolic control and sleep in children and adolescents with type 1 diabetes mellitus. J Diabetes Complications [Internet]. 2018 Jun;32(6):580–5. Available from:

https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S1056872717308632 4. Matricciani L, Paquet C, Galland B, Short M, Olds T. Children’s

sleep and health: A meta-review. Sleep Med Rev [Internet].

2019 Aug;46:136–50. Available from: https://linkinghub.

elsevier.com/retrieve/pii/S1087079219300188

5. Rechenberg K, Griggs S, Jeon S, Redeker N, Yaggi HK, Grey M.

Sleep and Glycemia in Youth With Type 1 Diabetes. J Pediatr Heal Care [Internet]. 2020 Jul;34(4):315–24. Available from: https://

linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0891524519305528 6. Glycemic Targets: Standards of Medical Care in

Diabetes—2020. Diabetes Care [Internet]. 2020 Jan 20;43(Supplement 1):S66–76. Available from: http://care.

diabetesjournals.org/lookup/doi/10.2337/dc20-S006

7. Stamatakis KA, Punjabi NM. Effects of Sleep Fragmentation on Glucose Metabolism in Normal Subjects. Chest [Internet].

2010 Jan;137(1):95–101. Available from: https://linkinghub.

elsevier.com/retrieve/pii/S0012369210600207

8. von Schnurbein J, Boettcher C, Brandt S, Karges B, Dunstheimer D, Galler A, et al. Sleep and glycemic control in adolescents with type 1 diabetes. Pediatr Diabetes [Internet]. 2018 Feb;19(1):143–

9. Available from: http://doi.wiley.com/10.1111/pedi.12538 9. Downs SH, Black N. The feasibility of creating a checklist

for the assessment of the methodological quality both of randomised and non-randomised studies of health care interventions. J Epidemiol Community Heal [Internet]. 1998 Jun 1;52(6):377–84. Available from: https://jech.bmj.com/

lookup/doi/10.1136/jech.52.6.377

10. Frye SS, Perfect MM, Silva GE. Diabetes management mediates the association between sleep duration and glycemic control in youth with type 1 diabetes mellitus. Sleep Med [Internet]. 2019 Aug;60:132–8. Available from: https://linkinghub.elsevier.com/

retrieve/pii/S1389945718304179

(9)

11. Jaser SS, Foster NC, Nelson BA, Kittelsrud JM, DiMeglio LA, Quinn M, et al. Sleep in children with type 1 diabetes and their parents in the T1D Exchange. Sleep Med [Internet].

2017 Nov;39:108–15. Available from: https://linkinghub.

elsevier.com/retrieve/pii/S1389945717302800

12. Turner SL, Queen TL, Butner J, Wiebe D, Berg CA. Variations in Daily Sleep Quality and Type 1 Diabetes Management in Late Adolescents. J Pediatr Psychol [Internet]. 2016 Jul;41(6):661–

9. Available from: https://academic.oup.com/jpepsy/article- lookup/doi/10.1093/jpepsy/jsw010

13. Walford S, Gale EAM, Allison SP, Tattersall RB. Self-monitoring of blood-glucose. Lancet [Internet]. 1978 Apr;311(8067):732–

5. Available from: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/

pii/S0140673678908553

14. DiMeglio LA, Acerini CL, Codner E, Craig ME, Hofer SE, Pillay K, et al. ISPAD Clinical Practice Consensus Guidelines 2018:

Glycemic control targets and glucose monitoring for children, adolescents, and young adults with diabetes. Pediatr Diabetes [Internet]. 2018 Oct;19:105–14. Available from: http://doi.

wiley.com/10.1111/pedi.12737

15. McDonough RJ, Clements MA, DeLurgio SA, Patton SR. Sleep duration and its impact on adherence in adolescents with type 1 diabetes mellitus. Pediatr Diabetes [Internet]. 2017 Jun;18(4):262–

70. Available from: http://doi.wiley.com/10.1111/pedi.12381

Referências

Documentos relacionados

Com isso o presente trabalho relata a utilização desta técnica para o estudo de duas espécies de Piper, a Piper klotzschianum coletada no Parque Ecológico Serra de Itabaiana

Cultivar BRS 336 [(Chaco 520 x BRS Itaúba) x Delta Opal] has an outstanding fiber quality, high fiber yield, is well-adapted to the climate of the savanna and semi- arid regions

Acredita-se ter havido melhorias reais em setores que tradicionalmente são tidos como geradores de problemas, como é o caso da construção civil, com relação às questões

Primeiro teste, realizado nos dias 03 e 04 de março de 2016, foram utilizados tubos de aço como absorvedores de calor; além disso, no coletor 1 foi colocada uma película

Para a realização do presente estudo, atrelado aos princípios da gestão de estoque, foram utilizadas algumas ferramentas da qualidade: Brainstorming, Matriz GUT,

Este estudo apresenta como tema central a análise sobre os processos de inclusão social de jovens e adultos com deficiência, alunos da APAE , assim, percorrendo

• Mulheres com insuficiência ovariana prematura em uso de terapia hormonal apresentam composição corporal semelhante à de mulheres de mesma idade e IMC e com

Ao término do segundo tempo, iniciamos a roda de conversa do terceiro tempo para somar as pontuações e destacamos que no pilar respeito as duas equipes pontuaram, estando