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ST 22 Socialidades e movimentos: pessoas, palavras e objetos em circulação

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Academic year: 2021

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37º Encontro Anual da ANPOCS

ST 22 – Socialidades e movimentos: pessoas, palavras e objetos em circulação O cultivo dos comuns: produção, parentesco e vizinhança em um povoado haitiano Rodrigo Charafeddine Bulamah

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O cultivo dos comuns: produção, parentesco e vizinhança em um povoado haitiano 1

Rodrigo Charafeddine Bulamah (PPGAS – IFCH/ UNICAMP)

Introdução

Os estudos sobre parentesco e família no Caribe concentraram-se historicamente no modo de organização em grupos domésticos. Por razões diversas que vão da falta de regras evidentes no estabelecimento de relações familiares (M. G. Smith, 1962: 7) à ênfase na relação entre classes sociais, status e família (Raymond Smith, 1996), tais estudos concentraram-se no par unidade de produção-unidade de reprodução, revelando a centralidade dessas instituições no cotidiano de camponeses caribenhos e em seus modos de organização social.

No Haiti, a literatura especializada descreve os grupos domésticos formados por casas organizadas ao redor de um terreiro, que, em crioulo haitiano, recebe o nome de lakou e dá nome ao conjunto casas-terreiro. Das diversas características do lakou haitiano, alguns autores enfatizaram particularmente a presença de traços africanos nas formas de organização socio-cultural (Herskovits, 2007 [1937]); a relação entre o ciclo de vida de um camponês e o grupo doméstico (Bastien, 1951); a importância da autoridade paterna e das relações de vizinhança (R. Métraux, 1951) e a centralidade do lakou nas práticas mágicas e na cosmologia (Romain, 1959).

Além dessas características, a relação entre política, economia e parentesco é constantemente destacada nesses estudos, concentrando-se particularmente na inadequação ou fragilidade do lakou frente ao avanço da modernidade e do capitalismo, expressas em fatores como as crescentes crises econômicas, a desvalorização do trabalho, a pressão sobre a terra e o avanço das políticas predatórias do Estado (Trouillot, 1989). São constantes as referências à percepção e à memória dos camponeses sobre os tempos em que os lakou eram numerosos, época na qual todos se ajudavam e ouvia-se aos montes o som dos tambores que acompanhavam os mutirões da vizinhança. Por tais razões, a existência dos grupos domésticos haitianos é retrata como estando sempre por um fio, sem possibilidade de se

1 Este texto é parte do trabalho O cultivo dos comuns: parentesco e práticas sociais em Milot, Haiti, dissertação de mestrado em antropologia social orientada pelo Prof. Dr. Omar Ribeiro Thomaz, com apoio da FAPESP e defendida em março de 2013 na Unicamp.

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perpetuar no tempo, não restando ao camponês nada além da busca por profissionalização e o êxodo rural (Bastien, 1951: 155; Anglade, 1982: 88).

Contudo, a análise detida dessas etnografias permite entrever o modo como o parentesco é estabelecido numa dinâmica que envolve tanto a centralidade dos grupos domésticos como outros parâmetros de relacionalidade e “aparentamento” (relatedness; ver Carsten, 2000). Nesse ponto, a fim de compreender o modo como o grupo doméstico se estrutura e se altera ao longo do tempo, proponho deslocar a atenção para os modos como o parentesco haitiano é atravessado por relações que mesclam princípios de descendência, compartilhamento de substâncias, circulação de trabalho, comensalidade e agência de espíritos de culto ancestral.2

O objetivo deste texto é refletir a partir da proposta de que fluxos e coisas participam em dinâmicas de fixidez e mobilidade, criando pertença, parentesco e unidades sociais, sob um princípio de trocas e circulações. Pretende-se assim tratar das dimensões sociais do lakou enquanto processuais, enfatizando o modo como a experiência de pessoas em interação com esses fluxos criam parâmetros locais de semelhança e diferença. Para tanto, me debruçarei sobre algumas observações etnográficas realizadas durante minha estadia no povoado (abitasyon) de Samson,3 retomando também a análise de

outros autores, com o intuito de entender o parentesco haitiano em sentido amplo.

Lakou: conformação interna e formação da vizinhança

Em Samson, há um poço d'água localizado ao fim de um trecho acidentado de estrada de chão. Ele representa a parte coletiva e central daquele povoado e é o entroncamento das rotas e atalhos que ligam as casas e as roças, a parte alta e a parte baixa do povoado, que levam aos mercados, ao centro da comuna e a outros povoados da região. Logo de madrugada começam a se formar as filas de mulheres e

2 Sobre tais temáticas, ver, por exemplo, Serge Larose (1975), Ira Lowenthal (1987), Drexel Woodson (1990) e Karen Richman (2005).

3 Abitasyon ou bitasyon, derivado de habitation (termo francês para a plantation colonial), é a menor unidade político administrativa das áreas rurais do Haiti. Um conjunto de povoados (abitasyon) forma as sessões rurais (seksyon riral), que, por sua vez se subordinam econômica e administrativamente a núcleos de povoamento mais densos, denominados comunas (komunn). As maiores unidades territoriais do país são os departamentos, formados por comunas e seções rurais. Samson pertence à seção rural de Perches du Bonnet, ligada, por sua vez, à comuna de Milot, cidade do departamento do norte, cuja capital é Cabo Haitiano. Ver mapas ao final do texto, na sessão de anexos.

A grafia em crioulo haitiano (kreyòl) aqui empregada segue a ortografia desenvolvida pelo Institut Pédagoque National (IPN), oficializada pelo governo haitiano em 1979.

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jovens esperando sua vez para encherem os baldes d'água que levarão às suas casas, dispostas às margens dos caminhos e ao redor do poço. Separados por cercas vivas espinhosas, estão os conjuntos de casas e terreiros que formam o povoado de Samson. São 13 arranjos, localmente denominados lakou.

Do francês la cour, terreiro ou pátio, o lakou pode ser definido enquanto o espaço de terra conectando uma série de casas, mas que metonimicamente significa também o grupo doméstico, sociológica e espacialmente. Dependendo do tamanho e de sua história, cada unidade possui um conjunto variável de roças (jaden), pastos e pomares de árvores frutíferas nos quais as pessoas de um lakou são envolvidas em diferentes formas de trabalho. Uma pessoa de um lakou pode ainda dedicar-se a pequenos serviços temporários fora do espaço doméstico, pelos quais recebe o pagamento por uma jornada, como nas usinas de cana-de-açúcar, na extração de cal e rochas em minas ou em construções. Além disso, muitos grupos domésticos de Samson possuem ao menos uma pessoa que mora ou viaja periodicamente a países como a República Dominicana para trabalhar no corte de cana-de-açúcar e na construção civil. Tal movimento é sintetizado como uma forma de “buscar a vida” (cheche lavi), entendido localmente como a procura por “meios de vida”.4 Como me disse certa vez um morador de

Samson, “An Ayiti, nou nan tout” (no Haiti, se faz de tudo). A percepção dos camponeses revela um mundo de imensa precariedade, no qual a vida é repleta de dificuldades e incertezas.

Nos meses que morei em Samson (entre feveiro e abril de 2012), fiquei hospedado na casa de Madanm Andre Vincent, cujo nome de solteira é Marie-Rose Simeon,5 uma mulher de 46 anos, casada

e mãe de dois filhos e quatro filhas. Sempre que conversávamos sobre sua vida naquele povoado, Mme Andre costumava definir-se como uma “pessoa infeliz e pobre” (moun malerè), tomando como exemplo a quantidade imensa de afilhados que possuía e suas responsabilidades para com eles. Era ela quem cuidava de todo o lakou, pensando no que seria plantado nas roças, cobrando a ida de seus filhos à escola, organizando e chamando vizinhos para os mutirões em certas épocas de preparo da terra, cultivo e colheita, separando os alimentos para o consumo interno e para enviar aos vizinhos e indo aos

4 Tal experiência comum de deslocamento espacial, pondera Richman (2005), “é resumida, em crioulo haitiano, como a alienação da 'vida' em relação 'meios de vida'. A 'vida' (vi ou lavi) está dentro, mas os 'meios de vida' (lavi) estão fora.”

Salvo quando indicado, as traduções que seguem são de minha autoria.

5 Os pronomes de tratamento Madanm (para mulheres, lit. Senhora) e Mesye (para homens, lit. Senhor) são utilizados para se referir, direta ou indiretamente, a pessoas mais velhas. Numa união conjugal, a mulher assume o nome e o sobrenome do marido, agregando o pronome de tratamento Madanm.

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mercados para fazer comércio.

A adequação do conceito de grupo doméstico para traduzir o lakou se revela pela sua realização enquanto uma unidade de produção e consumo, algo comprovado por duas observações etnográficas. A primeira delas diz respeito ao fato de que lakou é a principal referência de pertencimento de uma pessoa dentro do povoado e tal conexão se realiza por meio de práticas que acontecem numa conjunção entre rituais e processos cumulativos de produção dessa forma de aparentamento. A segunda característica se faz pela observação de que cada unidade possui seu próprio conjunto de terras e roças, cuja produção e consumo são usualmente geridos por mulheres, e sobre o qual trabalham coletivamente os diferentes parentes do lakou.

Através do trabalho, um grupo de pessoas agrupa o que foi produzido coletivamente e, por meio da comensalidade e da cooperação, estabelece uma coerência interna: são pessoas em comum, conectadas por laços de parentesco e ligadas à terra. É isso que Marshall Sahlins definiu como uma das atividades centrais no modo de produção doméstico (2004 [1974]), no qual a separação e a distribuição da produção em conjuntos a serem consumidos por pessoas específicas, em um ritual diário de comensalidade, é “a atividade constituinte do grupo” (: 94). Nesse movimento de produção/ distribuição/ consumo, o grupo doméstico se estabelece como um grupo específico e uma unidade econômica distinta de seus pares.6

Os momentos em que se consome algo produzido pelos parentes do grupo doméstico e o próprio ato de consumo são importantes para o desenvolvimento de crianças, mas são também ações e situações cruciais na vida social e familiar dos camponeses. Por um lado, distribuição e comensalidade colocam à disposição dos membros do lakou o que foi produzido e adquirido pela família, estabelecendo os limites do próprio grupo doméstico. Por outro, quando levamos em conta a frequência das trocas de alimentos e dos rituais de comensalidade entre os lakou, há alí um fator de conexão entre unidades econômicas delimitadas. É o princípio de mediação próprio à reciprocidade, que, por mais solidário que seja, só consegue operar entre grupos distintos (Sahlins, 2004 [1974]: 94).

Tal princípio é notado etnograficamente por Rémy Bastien, em sua monografia realizada na

6 Em seu trabalho sobre a moral e as práticas camponesas em Milot, J.-B. Romain assim descreve tal dinâmica (1959: 18): “Um pátio [i.e., lakou] se opõe ao pátio vizinho […] De fato, cada um deles é composto por uma família com membros solidários e no qual a solidariedade resulta de hábitos comuns, de um culto comum, da submissão à autoridade comum que é aquela do ancião.”

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região sul do Haiti. Segundo o autor, “‘[c]omer junto’ ou ‘não comer junto’, expressa o estado das relações entre duas casas vizinhas, aparentadas ou não. A obrigação, como há de se pensar, é mais forte em um laku. A cortesia é importantíssima; é uma regra que de casa a casa de mando o que se cozinha.” (Bastien, 1951: 44). Essa divisão está presente também em Samson. Em uma conversa sobre o apadrinhamento e as relações entre comadres, uma moradora do povoado, madrinha de quatro crianças, assim resumiu: “Quando somos comadres, nós comemos juntas, nos ajudamos, sentamos na casa uma da outra. Quando falta algo, nós damos” (Lè nou konmè, nou manje ansanm, nou mete tèt ansanm, yonn chita kay lòt. Lè li pa gen, nou ba li). Ou ainda, como explicou Madanm Andre, “quando batizamos alguém, nos tornamos parentes” (lè nou baptize, nou vin fanmi).

Contudo, antes de “expressar o estado das relações entre casas vizinhas”, como definiu Bastien, as trocas, a cooperação e a comensalidade são atividades centrais na construção de formas de aparentamento locais. Explico melhor. Se é notável que o compadrio revela a possibilidade de que laços de parentesco se construam a partir de performances e ritos, nos quais as pessoas “se tornam fanmi (parentes)”, tais relações implicam em uma participação na troca de alimentos e de trabalho, que, dependendo de sua constância ou ausência, divide as pessoas entre aquelas com quem “se come junto” (manje ansanm) – amigos, parentes e vizinhos – e aquelas com quem “não se come junto” (pa manje ansanm) – pessoas a serem evitadas, inimigas e suspeitas do uso de feitiçaria –.7

Entre os camponeses, de fato, não há um cerimonial elaborado que envolva etiquetas e normas sociais à mesa e nem um horário específico para se compartilhar uma refeição entre parentes e vizinhos: costuma-se comer rápido, sem muita cerimônia ou conversa e sem a reserva de lugares específicos para as refeições.8 Mais importante do que preparar os alimentos e comer junto, “separar” 7 Tal divisão aparece em relatos sobre enfeitiçamento presentes em trabalhos como o de Paul Farmer (1988), no qual, uma interlocutora lhe conta um caso em que foi enfeitiçada por alguém que acreditava ser uma “amiga próxima”, pois conviviam e compartilhavam alimentos. Reproduzo aqui a fala de Madanm Kado ao antropólogo (Farmer, 1988: 71, grifos meus):

“Eu tive nove crianças e perdi duas. Aquele que morreu quando tinha 11 dias de idade, parece ter sido pela ação de uma pessoa ruim (move moun) que causou mal ao bebê [lit. 'induziu-o em tentação' (o feto)] enquanto eu ainda estava grávida. Ela me deu algo, mas eu não sabia o que era: eu pensei que ela era minha amiga próxima! Ela cozinhava para mim, eu cozinhava para ela... ela sempre estava na minha casa. E então ela me deu um pouco de joumon [abóbora haitiana] na mesma semana em que eu dei à luz... No sétimo dia [pós-parto], as coisas começaram a desandar... Eu achava que o bebê estava resistindo à amamentação. Ele ainda não estava doente, mas estava quase. Quando acordei cedo na manhã seguinte, a boca dele estava fechada (machwa-l te sere).. Quando ele alcançou o sétimo dia, às quatro da manhã – na mesma hora em que ele se sentiu doente – ele morreu. E quando ele morreu, um pouco de joumon saiu da boca dele, exatamente como aquele que eu havia comido.”

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178-(separe) a comida é a atividade principal dos rituais de comensalidade, exercida normalmente por uma mulher mais velha e de prestígio dentro da hierarquia do grupo doméstico. Tal como destaca Karen Richman (2005: 162, grifos no original):

“[S]er uma 'pessoa' (mounn), um membro de um grupo doméstico, é ter a sua porção

separada em relação àquelas pertencentes a outros membros da mesma unidade.

Através de trocas diárias de pratos de comida entre grupos domésticos, cada 'pessoa' estabelece, com isso, uma relação com essas outras unidades de 'pessoas'.”9

Deve-se sempre que possível separar e enviar uma parte da comida aos parentes, ou ainda, levar em conta a chegada inesperada de um vizinho, de um afilhado ou de algum outro parente. A continuidade nas trocas é o que define uma pessoa como fanmi no sentido amplo: fortalecem-se laços de mutualidade e participa-se da sociabilidade dentro do lakou e entre os grupos. Nisso, comida pode ser retribuída com auxílio mútuo, trabalho pode ser a recompensa por hospitalidade, em uma constante produção dos grupos domésticos e da vizinhança (vwazinaj).

Fanmi: sangue, terra e espíritos

Em uma outra escala, atravessando a própria delimitação do grupo doméstico, estão os grupos de descendência que correspondem à noção local de fanmi. Este termo polissêmico define graus de proximidade relacional e, dependendo da situação em que é empregado, fanmi pode falar de parentes consanguíneos, de compadres, de vizinhos e até mesmo de uma humanidade comum (Lowenthal, 1987: 188; Marcelin, 2012). A acepção que podemos traduzir como “família” é definida pelo compartilhamento de elementos e relações que compõem a eritaj (“herança”) e são transmitidos por linhas cognáticas.

Enquanto autores como Serge Larose (1975), definem as unidades de descendência enquanto “cognáticas”, Lowenthal (1987: 192) opta pelo termo “ambilinear”, pois enfatiza o diferenciação entre

180) destacam a ausência, em crioulo haitiano, de um termo para definir “refeição” enquanto um momento específico da vida social. O termo manje pode ser traduzido pelo verbo “comer” ou pelos substantivos “comida” e “alimento”.

9 Karen McCarthy Brown nota algo similar quando descreve o modo como Mama Lola, a sacerdotiza vodou do Brooklyn que dá nome ao seu livro, lhe apresentava pessoas classificando-as como os que comiam e os que não comiam em sua casa. Mama Lola assim resume: "Você come com as pessoas, você sempre tem comida. Você como sozinho, você não tem nada.” (apud Brown, 2001 [1991]: 43).

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as linhas de transmissão de eritaj que se fundem em uma pessoa e se distribuem de modo diverso entre os parentes co-laterais (germanos e primos). Ademais, tal como nota Lowenthal (: 198), “[n]enhuma forma de adoção, convívio ou sustento de qualquer tipo pode proporcionar a participação em uma eritaj.” Nisso, é estabelecida uma clara diferenciação entre o pertencimento a um lakou e a participação em um grupo de descendência (fanmi).

A eritaj é formada por três elementos principais: o “sangue” (san), a terra (tè) e os espíritos linhageiros (jany e lwa)10. Como definiu um jovem morador de Samson: “o lakou pode se separar, a

família não”. O que se nota é que uma mesma “família” pode estar dividida entre diferentes grupos domésticos, participando do conjunto de trocas da vizinhança enquanto unidades particulares, mas atravessadas por fluxos diversos.

O “sangue”, naquele contexto, carrega consigo um conjunto de relações constituintes do parentesco, não sendo particularmente restrito a fenômenos fisiológicos nem pertencendo unicamente aos genitores imediatos. Através da herança cognática desse componente, o corpo é produzido e relações são transmitidas, conectando antepassados, espíritos e parentes vivos a um novo ser. A materialidade envolvida no sangue estabelece uma corporalidade comum que implica, como sugere Maurice Bloch, “que o que acontece com os membros de um grupo doméstico está, em certa medida, também acontecendo contigo...” (1992: 72). Tal característica é central na definição do parentesco como uma multiplicidade de participações intersubjetivas, algo que Marshall Sahlins definiu como mutualidade do ser (2013).

A terra, por sua vez, abriga um poder ancestral, particularmente os espaços sagrados denominados demambre. Nela estão enterrados os mortos e a cada novo nascimento, o cordão umbilical de um recém-nascido é enterrado e sobre ele planta-se uma árvore frutífera (ver Bastien, 1951: 38). É nessa terra onde são cultivados os alimentos para a nutrição da família (atividade central na construção do parentesco), para as trocas entre vizinhos e para o comércio nos mercados da região. Preza-se por uma proximidade dos terrenos de parentes, mesmo vivendo em grupos domésticos distintos, de tal modo a facilitar o trabalho coletivo nas roças e a circulação da produção.

Com relação aos espíritos, denominados jany ou lwa, eles fazem parte de um conjunto de

10 O alfabeto crioulo haitiano é composto por 14 vogais e semivogais, entre elas o an |ã|, o y |j| ou |i| e o w |w|. A pronúncia de jany é próxima a jã-i, em português, e, para lwa, o som aproximado é o de loa.

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entidades que a “família” historicamente serviu. A cada geração, há um conjunto de responsabilidades e cultos a serem atendidos – sobretudo na forma de alimentos –, que, se negligenciados, abrem a possibilidade de que os espíritos causem infortúnios a parentes. A essas relações próprias ao parentesco, Monica Wilson (1964 [1950]) dá o nome de “interdependência mística”. Entre os Nyaskyusa, estudados pela antropóloga, “[c]ondições patológicas diferentes são associadas à negligência de diferentes rituais. Do ponto de vista do parentesco, o fato essencial é que parentes são concebidos como misticamente vinculados pelo simples fato de sua relação.” (: 126, grifos meus). No Haiti, tal vínculo é notável entre pessoas e espíritos de tal modo que não corresponder a essas relações pode colocar em risco a vida de si e de seus parentes.

Esse conjunto de relações de parentesco, separadas entre lakou e fanmi, confere à experiência humana um caráter transpessoal, que supera uma simples ou exclusiva função do indivíduo. Tal como destaca Sahlins, “[s]e parentes são membros uns dos outros, então, dessa maneira e pela extensão desse fato, a experiência é difundida entre eles.” (2013: 44). Nesse sentido, tomando o parentesco como uma dialética entre relações herdadas (fluxos de “sangue”, terras e espíritos) e processos cumulativos e práticos (convívio, comensalidade e participação em um lakou), que opera no estabelecimento de laços de aparentamento entre pessoas e produz uma corporalidade comum, toda ação que vise destruir essa corporalidade e esses laços pode ser entendida como uma forma de “parentesco negativo” (Sahlins, 2013; ver também Munn, 1986).

Optei aqui por centrar-me particularmente nas situações etnográficas em que se pode entrever o papel central de espíritos no parentesco local. Tal estratégia narrativa possibilitará a construção de um percurso que, espero, trará questões mais gerais sobre o modo como o parentesco é localmente concebido. Antes de tratar de algumas situações etnográficos, um deles uma narrativa e outro um caso iniciação à feitiçaria, falarei especificamente de religião e magia em Samson, buscando localizar a posição dos jany e lwa na cosmologia local.

Algumas considerações sobre religião e magia em Samson

A maioria dos moradores de Samson frequenta a Igreja da Fé Apostólica de Milot, uma das várias igrejas pentecostais do centro urbano da região. A memória local do momento de conversão à religião pentecostal varia, alguns dizem-se nascidos (fèt) na Igreja Apostólica, outros falam de uma

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mudança recente. Quando questionei meus interlocutores sobre o motivo da conversão, a resposta não variava muito. Como me confessou uma moradora de Samson, “quando um feiticeiro não consegue te ajudar; você gasta muito dinheiro e nada: é nessa hora que você se converte” (lè bòkò pa ka ede ou, ou depanse anpil kob e anyen: se lè sa yo konvèti). Como Alfred Métraux notou, em seu estudo sobre o vodou, a conversão ao protestantismo não ocorre em busca de uma religião mais pura ou mais acolhedora, mas é motivada por um medo de espíritos e a busca por um “círculo mágico de proteção” (Métraux, 1958: 311-317).

Os espíritos, denominados jany e lwa, são entidades próximas às pessoas, diferentemente de figuras como Deus (Bondye), Jesus (Jezi) e o Espíritos Santo (Sentespri), cuja transcendência os coloca distantes dos dramas cotidianos, apesar de uma noção compartilhada de que nada está fora da providência divina, tal como revela a expressão “se Deus quiser” (si Bondye vle), frequentemente enunciada no vale de Samson.

A divisão interna desses espíritos se faz em “nações” (nanchon), cada uma delas representando um lwa ou jany específico e possuindo ainda subdivisões. A tentativa de catalogá-los é a marca de estudos clássicos sobre práticas mágicas no Haiti, a que alguns autores denominam vodou.11 Contudo, a

instabilidade desses seres revela uma multiplicidade compósita e dinâmica que diferencia nações e subtipos de modo fractal. Isso não implica necessariamente que não seja possível dar-lhes nomes e caracterizá-los. De fato, tais entidades apresentam características antropomórficas e personalizadas, possuem vontades, personalidades e gostos específicos. A variação implica que haja sempre variabilidade, tanto de acordo com a nação e o subtipo, como na associação hereditária a grupos de descendência específicos. Como pondera Murray, “[c]ada família, por exemplo, herda suas próprias Erzulies, seus próprios Dambalas e seus próprios Ogouns” (1980: 301).12 Tal fato é importante quando

se observa em uma cerimônia o cuidado com a separação da comida para cada jany (manje jany), as

11 O termo vodou é controverso e tem sido alvo de debates sobre sua real extensão semântica e seus usos políticos e identitários. Em Samson, como em outras partes do país, vodou refere-se particularmente a um conjunto de danças acompanhadas por músicas e tambores. Para alguns autores, o termo é utilizado para definir uma religião nacional por excelência. Esse é o caso do trabalho clássico de Alfred Métraux (1958). Declaradamente, Métraux entende sua própria obra como um “esboço de síntese”, realizado através da análise de estudos de outros pesquisadores e ensaístas, mas baseado sobretudo naquilo que ele mesmo observou e ouviu em suas viagens ao Haiti. Esse movimento entre o geral e o particular domina a obra, mas é colocado em debate pelo próprio autor no prefácio. Contudo, tanto por ser essa uma tensão que se perde durante o texto, como por leituras posteriores da obra, o vodou tornou-se, para muitos, o termo definidor de um sistema teológico e prático. Sobre isso, ver ainda Hurbon, 2002 [1972]; Murray, 1980; Richman, 2005 e Ramsey, 2011. 12 Ver também Karen M. Brown (2001 [1991]) e Karen Richman (2005).

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cores específicas a eles associados - a ser portada no lenço (mouchwa tèt) da pessoa possuída - e a música a ser tocada para invocá-los.

Jany e lwa vivem em um lugar referido como Ginen ou “embaixo d’água” (anba dlo). Este é o local de origem do antepassado mítico originário, denominado prenmye mèt abitasyon, o primeiro morador/dono do povoado (ou plantation). Ele é o fundador do grupo de descendência e é considerado uma pessoa da Ginen (moun Ginen), o local de onde vieram os negros que, forçadamente desterritorializados durante a expansão colonial européia, povoaram a ilha de São Domingos.13 Além

disso, se seguidos os devidos preceitos rituais, é para ali que vão os mortos da família (lemò).

Em geral, jany e lwa apresentam contradições morais que depassam divisões entre bem e mal, certo e errado. São seres caprichosos, exigentes, mas também solidários e generosos. Seu poder criativo equipara-se ao seu poder destrutivo. Essas características específicas de cada espírito são marcadas também pela importância em se manter com eles um convívio regular na forma de adorações e cultos. Tais entidades participam ativamente do mundo manifestando agência em relações e ciclos de dádiva, na forma de ações frente a demandas por parte das pessoas, e também por meio de cobranças e pedidos. Nesse ponto está a importância em haver alguém que possa mediar de modo privilegiado as relações entre espíritos e parentes, prezando por um bom convívio entre as partes, mantendo aberta a possibilidade de demanda quando necessária e realizando a tradução daquilo que é exigido.

Recorrentemente, faz-se uso da magia (maji) com finalidades diversas. Há rituais e magias de proteção a recém-nascidos contra figuras malígnas como vampiros e metamorfos (os lougawou), há também magias de cura, de proteção às roças e outras com o objetivo de atrair sorte, prosperidade e amor. Magias com o intuito claro de fazer o mal (mechanste) são também comuns e podem ser feitiços enviados, como as ekspedisyon, ou magias simpáticas, denominadas batri, deixadas no trajeto daquele a quem se objetiva fazer o mal. Nesse sentido, a magia se estrutura enquanto a manipulação de forças que podem ser consideradas benéficas (no caso das magias de cura e proteção) ou maléficas (mechanste ou maji nwa). Tais potencialidades estão disponíveis aos especialistas, denominados manbo (feminino) e oungan ou bòkò (masculino) que trabalham com magia e possuem contato direto com jany e lwa.

13 “Guinée” é o termo utilizado durante o período colonial francês em referência a certas partes de África. Para um morador de Samson, a definição de Ginen não coincide necessariamente com a especificidade geográfica contemporânea. Sobre os diversos usos do termo Ginen no Haiti, ver Beauvoir & Dominique, 2003: pp. 70-72.

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Autores clássicos como Rémy Bastien (1951), Rhoda Métraux (1951) e J.-B. Romain (1959) falam de uma conjunção entre o responsável pelos cultos e conexões com os espíritos da família e a pessoa mais velha viva do lakou, normalmente uma figura masculina de autoridade. Contudo, essa conjunção sofreu alterações em razão do avanço do pentecostalismo nas últimas décadas e de fatores econômicos como migrações e pressão sobre a terra, além de momentos específicos de perseguição a práticas religiosas e culturais, as conhecidas campanhas anti-supersticiosas levadas à cabo pelo governo e por autoridades estrangeiras (cf. Ramsey, 2011). Gradativamente os saberes mágicos e tradicionais autonomizaram-se do espaço familiar, sofrendo uma especialização notada em diferentes regiões do país por autores como Murray (1980: 302), Richman (2005: cap. 6) e Beauvoir & Dominique (2003: 185-6).

Atualmente, em Samson, de fato, a conexão com os espíritos é majoritariamente realizada por especialistas, mas o conhecimento sobre magia é bastante difuso e rituais mágicos são ainda levados à cabo no interior de um lakou. Ao redor da região de Samson, há sete templos religiosos e mágicos, as kay bòkò.14 São nestes lugares onde se realizavam consultas oraculares, denominadas limyè, ou rituais e

magias de cura, tais como chás e banhos de folhas (fèy), além de amarrações amorosas e o envio de feitiços a um inimigo.

Nas kay bòkò são realizadas também festas em homenagem a jany específicos, enquanto retribuições pessoais ou coletivas a um pedido realizado, ou ainda como parte de um calendário de festas. Contudo, manbo e ougan não vivem somente de seu trabalho ritual e mágico. Apesar de receberem retribuições e prestígio pela realização de curas e outras magias, a atividade mágica é, muitas vezes, esporádica. Feiticeiros e feiticeiras são camponeses comuns que trabalham nas roças e nos mercados e participam dos ciclos de reciprocidade locais. Apesar disso, é corrente a noção de que ougan e manbo possuem muito dinheiro.

Nas cerimônias em homenagem a um jany, é comum que durante o decorrer do dia espíritos diferentes possuam o oungan, ou a manbo, alterando a performance cerimonial e abrindo novas formas de interação com esses espiritos (cf. Brown, 2001 [1991]). Além disso, não é só oungan ou manbo a serem possuídos, mas também outros presentes, compondo uma multiplicidade de jany manifestando-se em um mesmo evento (cf. Lowenthal, 1978). Durante o ritual, manifestando-seja ele privado ou uma festa da

14 Na literatura especializada predomina o termo ounfò para designar tais espaços (Métraux, 1953; 1958, Beauvoir & Dominique, 2003). Em Milot, é mais corrente ouvir a designação kay bòkò, literalmente casa do feiticeiro, tanto para templos dirigidos por uma manbo quanto por um ougan.

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vizinhança, pessoas podem ainda realizar consultas aos espíritos, oferecer-lhes presentes e realizar demandas.

Assim, desse conjunto de relações entre pessoas e espíritos, há compromissos regulares a serem correspondidos, tanto quando houver demanda por parte de pessoas, como quando são os espíritos a realizarem algum pedido. Nesse sentido, caso uma ação resulte em uma ofensa aos jany ou caso uma demanda ou recompensa não seja atendida, uma cadeia de infortúnios poderá atormentar a “família”. Em Samson, um episódio lembrado por muitos ilustra essa questão e traz importantes observações sobre o comportamento dos jany, sua relação com a fanmi e seu protagonismo em ações no mundo. Os dois relatos colhidos são de moradores da região, um sendo o de Daniel, 23 anos, e sua mãe, Mandam Andre, uma senhora de 42 anos, em cujo grupo doméstico eu vivi; e o outro de Edys, um jovem amigo de 22 anos. Vamos à narrativa.

As vontades de um jany

Em meados de 2004, uma das famílias de Samson, tomou a decisão de cortar uma árvore que possuíam em um dos terrenos do lakou. Era um carvalho frondoso, com raízes profundas e galhos ultrapassando a copa de outras plantas. A árvore era um badji do grupo de descendência: altar onde eram depositadas comida, aguardente, flores e outros presentes aos espíritos (manje lwa/jany).

Após a morte de um dos membros mais velhos – uma manbo da família –, houve a diminuição gradativa das oferendas e rituais ali realizados. Além disso, já havia algum tempo que boa parte dos parentes se convertera ao pentecostalismo, passando a frequentar a Igreja da Fé Apostólica de Milot, como a maioria dos habitantes de Samson. Esse movimento de conversão implica sempre em uma restrição aos serviços realizados a qualquer tipo de ser, entre jany e lwa, pois, a Igreja associa tais espíritos ao demônio (Satan) e o contato com eles pode resultar em sanções aos que frequentam os cultos pentecostais.

Assim, em 2004, como os rituais haviam diminuído o passo e vislumbrando a possibilidade de obter algum dinheiro, a família decidiu cortar o carvalho e vendê-lo. Nesse ponto, as versões colhidas se desencontram: para Madanm Andre e Daniel, a decisão foi tomada me modo coletivo motivada unicamente por um interesse econômico explícito; já para o jovem, a família foi involuntariamente tomada por uma vizyon, uma espécie de deslumbramento frente à beleza da árvore e a possibilidade de

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lucrar com sua comercialização.

De todo modo, seja qual for o motivo real, a árvore foi cortada mediante a decisão de uma parte dos parentes. O dinheiro dali tirado foi imenso, “até as raízes foram cerradas tão grande era a árvore!” (menm rasin yo te siye telman pye bwa li te gwo!), afirmou Madanm Andre.15 Avalia-se que a soma

total beirou os 2.500 dólares haitianos (cerca de 12.500,00 gourdes ou US$ 312,50), conseguidos com a venda de placas de madeira para se fazer móveis e construções, e dos galhos e raízes para serem transformados em carvão. O dinheiro obtido foi então dividido entre os membros da família.

Com o passar do tempo, infortúnios foram acontecendo com uma regularidade tal que a suspeita de ser uma razão mágica passou a ser um palpite certeiro. Os infortúnios eram graves: dois parentes, entre os mais dedicados outrora a dar comida ao jany, faleceram e outro começou a ter uma grave infecção urinária. Sempre que este ia ao médico para realizar uma cirurgia, sua pressão sanguínea atingia níveis elevados, impossibilitando a intervenção. “Deram-lhe um cateter e cada vez que ele queria fazer cirurgia, sua pressão subia alto” (Yo te ba li katetè nan lopital e chak fwa li vle fè chiriji, tansyon li monte wo).

Frente à suspeita e à ineficácia dos médicos, a família resolveu então consultar uma manbo. A escolhida foi Lina, parente (kouzin) de Madanm Andre. Durante a consulta oracular (limyè), “o jany Severin Pyè subiu na cabeça de Lina e disse que eles haviam lhe roubado sua casa. Agora, cabia a eles construir uma nova casa para o espírito, caso contrário, o jany faria as raízes da árvore crescerem por todos seus corpos” (Severin Pyè te monte nan tèt Lina, e li di yo te vole kay li. Kounye a se pou yo fè yon kay pou li, sinon l ap fè rasin pye bwa yo pete nan tout kò a yo). A árvore era, na verdade, a moradia do jany Severin Pyè, um dos espíritos que a fanmi venerava há gerações. Perdida sua casa, o jany agora buscava vingança até que sua morada lhe fosse restituída. Além disso, a árvore correspondia a uma casa de 3 andares feita de tijolos. Ao final da consulta, Severin Pyè pediu para a família realizar uma cerimônia (seremoni) plena de comida, na qual o jany apontaria o local para a construção de sua nova casa.

O descontentamento do jany é correntemente entendido como uma “fome” do espírito, causada justamente por uma negligência do grupo de descendência. Quando cortaram a árvore, parentes começaram a morrer ou sofrer enfermidades em episódios seriados, consequência da “fome do jany”.

15 As citações que seguem são também de Madanm Andre. Edys apresentou uma versão menos detalhada, mas que compõe a narrativa geral.

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Sua ação se resume na frase: “O jany começou a comer as pessoas” (Jany li te kòmanse manje moun). As cerimônias em homenagem a tais entidades são denominadas genericamente de “alimentação do espírito” (manje jany) e toda ação do espírito que cause aflição às pessoas é descrita como uma “fome” cujo efeito é a destruição do corpo dos vivos. Como resume Karen Richman, a alimentação “é a metáfora englobante” (2005: 157). Nota-se aqui que o simbolismo e a materialidade da alimentação é central não só nas relações entre pessoas, mas na sociabilidade local como um todo, inclusas aqui as relações com os espíritos.

Assim, durante a cerimônia, realizada nos arredores do local aonde outrora repousava a árvore, havia comida, bebida e música, dispostos e organizados de tal modo a tornar esses prazeres disponíveis ao jany. A movimentação era tamanha que não houve pessoa em Samson, criança ou adulto, que tivesse ficado em casa. Com o avançar das horas e a manutenção de um ânimo entre os presentes, chegou-se a um estado de “calor” denominado chofe, uma alteração sensível que possibilita a manifestação de espíritos por meio de possessões e aparições.16

O jany então surgiu sob a forma de uma cobra: um animal imenso (gwo koulèv) e cheio de brincos (zanno). Sua aparição foi rápida: agarrando uma garrafa de kola (líquido aromático utilizado especialmente em tais cerimônias), dirigiu-se a um buraco, apontando assim o local onde gostaria de ver sua casa montada. Tal sequência de atos representou o estado emocional do jany, que, por ter agarrado a garrafa de bebida, demonstrou com isso estar contente (“Sa vle di li kontan”). O suficiente para tranquilizar as pessoas daquela fanmi e todos de Samson.

Em poucos meses, através da organização de mutirões (konbit) periódicos, contado com a ajuda dos vizinhos, a casa de tijolos estava pronta. A existência de outros dois andares foi negociada em troca de uma divisão da casa em cômodos e da manutenção da limpeza do lugar, algo que até hoje é feito. Em meio a tantas casas de taipa em Samson, aquela é a única feita de tijolos e o contraste é facilmente notado. O terreno onde antes estava a árvore tornou-se um espaço familiar sagrado e inalienável (demambre), com árvores crescendo sem a intervenção da família, pois ninguém ousa trabalhar naquela área nem fazer dali um local de lazer. Madanm Andre, Daniel e Edys afirmaram ainda que os gastos com a construção da casa totalizaram 2.500 dólares haitianos, a mesma soma adquirida com a venda do carvalho onde morava o jany.

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Como já destacado, compromissos e responsabilidades familiares são herdados segundo os mesmos princípios que regem as transmissões de terra e do “sangue”, compondo a eritaj. Assim, como mostra o caso aqui analisado, rupturas no ciclo de compromissos e qualquer atentado contra uma situação dada, no caso, a moradia do jany, pode resultar no desencadeamento de ações fatais contra os parentes, exigindo novas soluções e novos arranjos. A conversão religiosa não implica em uma ruptura ou em uma passagem a uma nova condição social excluída das relações próprias à fanmi.

Um outro caso, este ocorrido no seio da família de Madanm Andre, pode trazer observações importantes sobre as ações dos espíritos e os modos contemporâneos de dar conta de responsabilidades frente a novos arranjos e interesses.

"Uma parte em Deus, uma parte de servidores"

No lakou de Madanm Andre, tanto sua fanmi quanto a de Mesye Andre são grupos que tradicionalmente serviram jany. “Eles eram grande servidores” (Se gran sevitè yo te ye), confiou-me certa vez Madanm Andre. Ela lembra-se bem dos cultos e da importância dos espíritos na história de sua família. Seu pai era um “servidor” (sèvite) localmente conhecido, alguém que dava grandes festas em homenagem aos jany; além dele, seu tio-avô era um importante oungan de Milot e sua irmã mais nova desde pequena demonstrava as qualidades de uma manbo. Contudo, nem toda a família estava implicada diretamente nesses cultos. Madanm Andre possuía uma madrinha (marenn) que, diferente de outros parentes, frequentava uma igreja protestante no burgo de Milot. Foi ela mesma quem levou Madanm Andre às suas primeiras incursões aos mercados da região ensinando-lhe as diferentes modalidades de fazer comércio (fè konmès), a lidar com o dinheiro, com a clientela (kliyan e pratik) e com os modos de compra e venda à crédito.

Sua marenn, além de ajudá-la a tornar-se mercadora, foi quem levou-a aos primeiros cultos protestantes na Igreja Apostólica de Milot. Ali, Madanm Andre aprendeu sobre a vida e seus percalços, sobre os destinos dos mortos, sobre como estar próxima a Deus e, sobretudo, como afastar-se de certas responsabilidades herdadas com relação aos espíritos.17 Contudo, desimplicar-se das responsabilidades

que se herda não é algo simples.

17 Ao questionar pessoas sobre se elas serviam jany, uma resposta comum era “mwen pa ladan” (não faço parte disso ou, literalmente, não estou dentro disso), seguida da frase “se nan Bondye mwen ye” (eu estou em Deus).

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No início de 2011, com 15 anos de idade, Milane, filha de Madanm Andre, foi morar com sua marenn na cidade de Cabo Haitiano, capital do departamento do norte, a cerca de 18 km de Samson. Em troca de pequenos serviços domésticos prestados à madrinha, ela passou a frequentar uma boa escola. Tudo corria bem até que Milane começou a ter desmaios recorrentes sem uma razão manifesta. Médicos foram consultados e nenhuma conclusão precisa foi alcançada. Sem saber muito o que fazer, a madrinha retornou a afilhada aos cuidados dos pais.

Mesye e Madanm Andre, por sua vez, levaram Milane à Igreja Apostólica de Milot. Ali, tentaram controlar seus desmaios por meio de rezas e cultos, mas a filha não apresentava melhora e se mostrava resistente a frequentar a igreja. Com a continuidade dos desmaios, Madanm Andre resolveu consultar sua irmã manbo. Algum tempo depois da consulta, a manbo veio à casa de sua irmã com a novidade de que Milane havia sido reclamada (reklame). Era desejo dos jany da família que ela se tornasse uma manbo. Tal fato explicava os desmaios repentinos: eram manifestações desses espíritos. Doravante, a família precisaria juntar dinheiro para pagar a iniciação (demach) de Milane, caso contrário, ela poderia ficar doente, louca ou até morrer.

Os jany herdados bilateralmente dos ancestrais de Mandam e Mesye Andre eram agora de responsabilidade coletiva do lakou. A eles, o grupo doméstico tinha de responder, participando de ciclos de oferendas e demandas, dádivas e obrigações, sendo que a não-observância do culto regular a eles dirigido poderia resultar em uma punição aos membros do lakou. A força dos jany da família supera a decisão individual, ou mesmo coletiva, de rompimento com relação a tais laços. A questão passa a ser quem do lakou levará adiante tais responsabilidades.

Na geração de Madanm Andre, uma de suas irmãs havia sido reclamada e tornou-se uma manbo. Como a continuidade não deve ser interrompida, cabia também à geração seguinte dar conta desses espíritos. Mais do que isso, despreender-se completamente não é algo totalmente desejado. Se não era Madanm Andre a levar à frente tais obrigações, alguém entre seus filhos seria escolhido. Madanm Andre me contou essa história com um tom de seriedade e preocupação, que, entretanto, não me parecia traduzir adequadamente a complexidade da situação. Ao mesmo tempo em que reclamava do dinheiro a ser gasto com a iniciação da filha e de seu descontrole, ela se esforçava para que essa iniciação seguisse bom curso.

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do casal. Madanm Andre conta que desde pequena ela era a filha menos comportada. Ela faltava à escola e pouco ajudava nos afazeres do grupo doméstico. Além disso, ao levar uma bronca, ela caía ao chão inconsciente, assustando Madanm Andre. Esse comportamento assim como uma rebeldia prematura conferiram-lhe a qualificação de moun fou, "pessoa louca", alcunha pela qual é conhecida não só entre parentes, mas também por diversas pessoas da vizinhança e de Milot.

Durante o tempo que vivi em Samson, a postura de Lolit era de notável liberdade. Ela ajudava nas tarefas do lakou, mas o fazia quando lhe conviesse; ela frequentava a escola, mas se atrasava ou pagava para que um moto-boy a levasse. Além disso, seu acesso aos recursos da família era facilitado, pois ela tinha de pagar os gastos de sua iniciação, a qual incluía o pagamento pelos serviços de sua tia manbo que a transmitia os segredos daquelas práticas, além de uma série de oferendas e objetos rituais como comida, bebidas, velas e lenços de cabeça (mouchwa tèt), cada cor representando um jany específico, a começar por treze. Em razão desses gastos, a relação entre mãe e filha era conflituosa e Mandam Andre temia ainda que se não desse dinheiro à filha, esta poderia vir a lhe fazer mal: "O que eu posso fazer? Ela pode me matar se eu não lhe der dinheiro" (Ki sa m pral fè? L ap tchwe m si m pa ba li lajan).

Contudo, essa relação se mostrou gradativamente ambígua. Mandam Andre fornecia o dinheiro e se interessava pelo estágio da iniciação de Lolit. Dado momento, então, questionei Madanm Andre sobre a vantagem de ter um membro do lakou em contato com os jany. Ela pensou um pouco, e, com um tom de resignação, mas admitindo a importância do fato, disse: “É assim a família: uma parte em Deus, uma parte de servidores” (Se sa fanmi: yon pati Bondye, yon pati sèvitè).

Tal situação atraiu minha atenção para o modo como magia e religião se entrelaçam com o parentesco. Acompanhar a iniciação de Lolit me parecia uma oportunidade e tanto. Contudo, meu tempo em campo acabaria antes da previsão do fim de seu ensinamento. Conversando com Lolit sobre sua iniciação, ela sugeriu algumas vezes que o processo seria mais rápido caso ela tivesse acesso a mais recursos, sugerindo que eu lhe ajudasse na empreitada. Me dispus então a contribuir com US$ 40,00, o equivalente a 1600 gourdes (HTG). A quantia, contudo, foi insuficiente para antecipar a finalização do processo.

No contexto em questão, como é comum em regiões onde os recursos são escassos, posições ocupadas no sistema de classe e status são pouco variadas. Há diferenças sócio-econômicas relativas ao

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acesso à terra, à capacidade produtiva dos membros do grupo doméstico e, podemos adicionar, ao fluxo de bens e capital de membros morando no exterior. “É fato que”, como destaca Sidney Mintz (1973: 93), “populações rurais não formam, em lugar algum, uma massa homogênea ou aglomerada, mas são sempre e em toda parte tipificadas por diferenciações internas segundo diversas linhas.” Assim, como pequenas unidades produtivas, os lakou estão sujeitos às variações sazonais, ao mercado, às disputas e alianças locais e às pressões do Estado. No entanto, tais fatores de diferenciação se ligam ao próprio ciclo de desenvolvimento doméstico (Fortes, 1958), de modo que variações são menos estáveis e mais cíclicas.18 Nesse sentido, as famílias possuem, mais ou menos, o mesmo acesso aos mesmos recursos.

Além disso, todos sabem da vida de todos: o que produzem, quantas cabeças de gado possuem, seus ganhos, quanto filhos têm, onde estão e quais lugares, igrejas e mercados frequentam. Toda atividade que possa gerar desconfiança é evitada e toda forma de ascensão econômica não reconhecida socialmente gera uma série de rumores e acusações. A manutenção de uma austeridade econômica é a vertigem dos moradores de Samson e a inveja, fator socialmente relevante, um motor de conflitos e disputas. É bastante atual a observação de Rémy Bastien (1951), para quem “[s]egún las creencias del campesinato, es tan fácil esterilizar un predio, mandar plagas, matar el ganado o la gente, que resulta menos costoso guardarse la amistad del vecino pobre que provocar su odio por avaricia” (: 44-45). Nesse ponto, magia de tipo maléfica (mechanste) pode ser entendida como oposta ao dom, ou melhor, oposta ao parentesco, já que se assume também como uma forma de troca.

Ora, quando se desconfia que a morte ou a doença de alguém, sobretudo a de um jovem, não foi obra da intervenção divina, consultar-se-á feiticeiros da família e da vizinhança à procura de pistas para encontrar os culpados. Aliás, a morte de um jovem dificilmente pode ser atribuída à escolha de Deus (Bondye). Para um morador de Samson, é Bondye quem tira a vida da pessoa, segundo um princípio de que nada escapa à sua vontade, porém, há a convicção clara de que o ato só foi efetivado por obra da maldade dos homens. Para os frequentadores da Igreja Apostólica de Milot, tal justificativa é encontrada na Bíblia, no Salmo 90, versículo 10:

Os dias da nossa vida chegam a setenta anos, e se alguns, pela sua robustez, chegam a

18 À medida que as gerações mais novas avançam no ciclo de vida, seu trabalho vai sendo incorporado às atividades do grupo doméstico. Assim, gradativamente os jovens vão tomando parte nas atividades produtivas em terrenos do lakou, mas também nos ciclos de troca de trabalho nas roças de vizinhos e pessoas do povoado. Caso membros da família migrem em busca de trabalho, esta atividade é também envolta de expectativas com relação às remessas de capital e bens a serem enviados ao lakou. O economista Mats Lundahl (2011) argumenta que no ciclo de vida de um camponês haitiano há uma coincidência entre a idade e o acúmulo de capital e terras, de modo que, com sua morte, esse acúmulo se desfaz em despesas com o enterro e em divisões de herança (: 117).

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oitenta anos, o orgulho deles é canseira e enfado, pois cedo se corta e vamos voando. (Dènye bout nou se swasanndizan. Si nou gen bon sante, na wè katreventan. Men

avantaj nou jwenn nan tou sa se sèlman tray ak mizè. Talè konsa nou fin vini n’al fè wout nou.)19

Encontrados os culpados, a busca por vingança é iniciada, privilegiando-se sempre a morte de alguém cuja posição estrutural no grupo doméstico é similar àquela ocupada pela pessoa assassinada: se era o filho mais velho, morrerá o filho mais velho do outro; se era a filha mais nova, morrerá a filha mais nova do outro. As perdas e os sentimentos daí advindos devem se equilibrar, sem que um grupo doméstico tenha perdido ou sofrido mais que o outro. Mas, como toda troca, o equilíbrio tende a ser sempre dinâmico.

Quero dizer com isso que parentesco e magia de tipo maléfica compartilham um mesmo registro moral e prático, mas agindo em sentidos opostos. Se o convívio, as trocas de comida e trabalho e os fluxos de “sangue” e terras carregam consigo a capacidade conciliatória e produtora de uma corporalidade comum e de laços sociais entre pessoas (são fanmi, pessoas do lakou, vizinhos e “pessoas com quem se come junto”), as magias qualificadas como mechanste ou maji nwa, cujo intuito é expressamente causar aflição e morte, possuem uma força negativa, instaurando guerras familiares na forma de ciclos de vingança. Assim, a magia malévola mais do que em oposição ao parentesco, é uma forma de “parentesco negativo” (Sahlins, 2013: 59), afetando o corpo de pessoas, desagregando internamente as famílias e os grupos domésticos (pela perda de seus membros) e desarticulando as trocas de comida, bens e trabalho entre vizinhos (pela perpetuação da inimizade e da violência entre os grupos domésticos).

Não foi Madanm Andre nem Mesye Andre os que se dedicaram à magia, mas na geração seguinte será um de seus filhos, ou melhor, dois, já que segundo sua irmã manbo, há ainda um outro filho ou filha a ser reclamado. À Lolit e esse outro filho caberá o papel de proteger o grupo doméstico contra possíveis bruxarias prejudiciais, ekspedisyon ou batri, ou, caso seja preciso, vingar a morte de alguém, sem a necessidade de recorrer a um oungan ou manbo externos ao seu lakou, implicando em uma série de despesas econômicas e possíveis sanções por parte da igreja. Como resumiu Daniel, “Lolit pode proteger a casa, caso alguém envie uma magia ou faça algum mal” (Lolit ka pwoteje kay la, si moun voye ekspedisyon ou ap fè mechansite).

19 A versão em crioulo haitiano do trecho aqui reproduzido foi extraído da tradução financiada pela Société Biblique Haïtienne (parte da United Bible Societies), publicada em 1985.

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Além disso, diferente do caso da família que cortara a árvore de seu lakou, Lolit garantirá a continuidade dos serviços aos jany através da tradução de exigências e demandas, mantendo as relações e compromissos com os espíritos do eritaj, evitando possíveis desarmonias entre pessoas e espíritos. Com isso, é possível entender a coerência da frase de Madanm Andre (“É assim a família: uma parte em Deus, uma parte de servidores”), resignada, mas ao mesmo tempo confiante.

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Anexo: mapas

Imagem 1: Mapa das divisões departamentais do Haiti e suas respectivas capitais. Fonte: Rémi Kaupp [GFDL (http://www.gnu.org/copyleft/fdl.html) ou CC-BY-SA-3.0-2.5-2.0-1.0 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0)], via Wikimedia Commons.

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Imagem 2: Mapa da região de Milot. (Elaborado e sistematizado pelo autor; dados de campo de 2011).

Referências

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