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CONSTRUÇÃO DAS FUNÇÕES EXPONENCIAIS

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Academic year: 2021

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CONSTRUÇÃO DAS FUNÇÕES EXPONENCIAIS

VINÍCIUS MORELLI

1. Introdução

Neste texto, vamos construir a função exponencial de basea, onde aé um número real estritamente positivo e diferente de1. Na realidade, faremos apenas o caso a >1; o caso 0< a <1 pode ser construído de forma análoga ou, de modo mais simples, obtido através da propriedade

ax= 1

a −x

,∀x∈R.

Começamos recordando as denições de potência com expoente natural, inteiro e racional. No decorrer deste texto, assumiremos semprea >1.

2. Preliminares Denimos inicialmente

a0= 1.

Em seguida, dado n∈N, denimos recursivamente

an+1=an·a.

Denimos também

a−n= 1 an e, paran≥1,

an1 = √n a.

Note que potências com expoente inteiro já estão denidas. Finalmente, dado r ∈ Q, podemos escrever r = mn, ondem∈Zen∈N, n≥1, e denir

ar=amn = √n am.

É simples provar, a partir destas denições, as propriedades operatórias usuais de potências. Também é fácil provar que sen∈N, n≥1, então an>1ea1n >1. Recordamos ainda quear>0, para todor∈Q.

Vamos precisar estudar o limite lim

n→+∞a1n. Isso será feito nos lemas a seguir.

Lema 1. Set >0, então lim

n→+∞(1 +t)n= +∞. Demonstração. Pelo Teorema do Binômio,

(1 +t)n=

n

X

j=0

n j

tj.

Para todon≥1, a soma acima possuin+ 1termos positivos e, portanto, é maior ou igual à soma dos dois primeiros termos:

n

X

j=0

n j

tj

1

X

j=0

n j

tj= n

0

+ n

1

t= 1 +nt.

Como lim

n→+∞(1 +nt) = +∞, concluímos que lim

n→+∞(1 +t)n = +∞.

Lema 2. lim

n→+∞an1 = 1.

1

(2)

Demonstração. Vamos usar a denição de limite de sequência. Fixado ε > 0, desejamos encontrar um número naturalN ≥1tal que

n≥N =⇒ |a1n−1|< ε.

Pelo Lema 1, sabemos que existeN ≥1 satisfazendo

n≥N =⇒ (1 +ε)n> a.

Isto implica que

1 +ε > a1n, ou seja,

an1 −1< ε.

Por outro lado, sabemos que

a >1 =⇒ an1 >1 =⇒ an1 −1>0.

Combinando estas desigualdades, obtemos

|a1n−1|< ε,∀n≥N,

como queríamos.

3. Construção da função exponencial

Recordamos, na seção anterior, a denição de potências com expoente racional. Podemos considerar, então, a funçãof :Q→Rdada por

f(q) =aq,∀q∈Q.

Nosso objetivo, agora, é construir uma extensão contínua def, denida emR. A construção é feita em etapas:

Proposição 3. A função f(r) =ar é estritamente crescente em Q, isto é, ser, s∈Q, s < r, então as< ar. Demonstração. Sejamr, s∈Qtais ques < r. Escrevendor= pq es= mn, ondep, m∈Zeq, n∈N, q, n≥1, temos

s < r =⇒ m n < p

q =⇒ mq < pn =⇒ pn−mq >0.

ComoN =pn−mqé um número natural estritamente positivo ea >1, sabemos que aN >1. Deste modo, apn−mq>1 =⇒ apn

amq >1 =⇒ apn> amq =⇒ (apn)qn1 >(amq)qn1 =⇒ apq > amn,

isto é,ar> as.

Proposição 4. Dadox∈R, o conjunto

A(x) ={ar:r∈Q, r < x}

é limitado superiormente.

Demonstração. Pela Propriedade Arquimediana, podemos xar um número naturalm tal quem≥x. Ser é um número racional tal quer < x, entãor < m e, pela Proposição 3,

ar< am.

Provamos, portanto, que o conjuntoA(x)é limitado superiormente poram. Convém observar que a denição deA(x)só envolve expoentes racionais!

Como o conjuntoA(x)é não-vazio e limitado superiormente, a Propriedade do Supremo garante queA(x)admite supremo. Fica denida, desta forma, a funçãof˜:R→Rdada por

f˜(x) = supA(x).

Em outras palavras, a funçãof˜associa a cada número real xo supremo do conjunto A(x). Vamos mostrar quef˜ é a função que procuramos.

Proposição 5. A função f˜coincide com a exponencial emQ. Mais precisamente, ser∈Q, então f˜(r) =ar.

(3)

Demonstração. Fixemos um número racionalr. Sesé um número racional tal ques < r, temos, pela Proposição 3, queas< ar. Isto signica quear é um limitante superior deA(r). Como o supremo é o menor limitante superior, temos

f˜(r) = supA(r)≤ar.

Mostremos, agora, a desigualdade contrária. Dadoε >0, pelo Lema 2 existe um número naturalN ≥1tal que aN1 −1< ε

ar. Note que

ar−ar−N1 =ar

1−aN1

=ar

1− 1 aN1

=ar aN1 −1 aN1

! .

Agora, comoaN1 >1,

ar−ar−N1 =ar aN1 −1 aN1

!

< ar

aN1 −1

< ar ε ar =ε, ou seja,

ar< ar−N1 +ε.

Observe que r−N1 é um número racional estritamente menor do quer; pela denição do conjuntoA(r), sabemos que

ar−N1 ≤f˜(r).

Combinando estas duas últimas desigualdades, obtemos

ar<f˜(r) +ε.

Comoε >0 foi escolhido arbitrariamente, concluímos que1 ar≤f˜(r)

e a demonstração está completa.

Proposição 6. A função f˜é estritamente crescente em R.

Demonstração. Sejamx, y∈Rtais quex < y. Podemos escolher dois números racionaisr1, r2 tais que x < r1< r2< y.

Note primeiramente que seré um número racional tal quer < x, entãor < r1e, pela Proposição 3,ar< ar1. Isto prova quear1 é um limitante superior deA(x)e, portanto,

f˜(x)≤ar1.

Agora, comor2 é um número racional estritamente menor do quey, já sabemos que ar2 ≤f˜(y).

Aplicando novamente a Proposição 3, temos ainda que ar1 < ar2.

Decorre das desigualdades acima quef˜(x)≤ar1< ar2≤f˜(y). Proposição 7. Para todox∈R, temosf˜(x)>0.

Demonstração. Dado r um número racional tal que r < x, as Proposições 5 e 6 implicam imediatamente que f˜(x)>f˜(r) =ar>0.

Proposição 8. A função f˜é contínua em R.

1Se a desigualdadearf(r)˜ não fosse satisfeita, teríamosar>f˜(r), ou seja,arf˜(r)>0. Tomandoε=arf(r)˜ , o que ocorre?

(4)

Demonstração. Fixado p ∈ R, vamos mostrar, por denição, que f˜é contínua em p. Dado ε > 0, desejamos determinarδ >0tal que

|x−p|< δ =⇒ |f˜(x)−f˜(p)|< ε =⇒ f˜(p)−ε <f˜(x)<f˜(p) +ε.

Observe primeiramente quef˜(p)>0. Pelo Lema 2, existe um número naturalN ≥1 satisfazendo

(1) aN1 −1< ε

2 ˜f(p).

Escolhaδ= N1; vamos mostrar que esteδ faz o serviço. Dadox∈(p−δ, p+δ), temos dois casos a considerar:

1º caso: p−δ < x≤p.

Pela Proposição 6, já sabemos que

f˜(x)≤f˜(p).

Agora, sejasum número racional tal ques < p e denar=s−δ. Note quer também é racional e, além disso, r=s−δ < p−δ < x.

Observe também que

as−ar=as−as−δ =as 1−a−δ

=as

aδ−1 aδ

.

Lembrando queas= ˜f(s)<f˜(p)e que a1δ <1, e usando a desigualdade (1), obtemos as−ar<f˜(p) aδ−1

<f(p)˜ ε 2 ˜f(p) = ε

2. Isto prova que

as< ar+ε e, comor < x, 2

as<f˜(x) +ε 2. Comosfoi escolhido arbitrariamente, concluímos que

f˜(p)≤f˜(x) + ε

2 =⇒ f˜(p)−ε <f(x).˜ Provamos, portanto, que

f˜(p)−ε <f˜(x)<f˜(p) neste caso.

2º caso: p < x < p+δ. Já sabemos que

f˜(p)<f˜(x).

Agora, dadorum número racional tal quer < x, sejas=r−δ. Note questambém é racional e s=r−δ < x−δ < p =⇒ f˜(s)<f˜(p).

Observe ainda que

ar−as=as+δ−as=as(aδ−1) = ˜f(s)(aδ−1)<f(p)(a˜ δ−1)<ε 2, onde a última desigualdade é consequência imediata de (1). Assim,

ar< as

2 <f˜(p) + ε 2. Comorfoi escolhido arbitrariamente, temos

f˜(x)≤f˜(p) +ε e, portanto, 2

f˜(p)<f˜(x)<f˜(p) +ε,

como desejado.

(5)

4. Considerações finais

Decorre das proposições acima quef˜é uma função contínua que estendef(r) =araR.2 Chamamosf˜de função exponencial de base ae escrevemos

f˜(x) =ax,∀x∈R.

Pela Proposição 7, a imagem da função exponencial está contida no intervalo aberto(0,+∞). Avançando um pouco mais no curso, teremos condições de provar que a imagem coincide com o intervalo(0,+∞).3

Como a função exponencial de base a > 1 é estritamente crescente e contínua em R, sua inversa também é estritamente crescente e contínua no intervalo(0,+∞). A inversa deax é denominada função logarítmica de base ae denotada porloga. De modo análogo, as funções exponencial e logarítmica de base0< a <1são estritamente decrescentes e contínuas, respectivamente, emRe em(0,+∞).

Encerramos este texto com uma demonstração das propriedades operatórias da função exponencial, que conhe- cíamos apenas para expoentes racionais.

Proposição 9. Dadosa, b >0 ex, y∈R, temos:

(i) ax+y=axay; (ii) a−x=a1x; (iii) (ax)y=axy;

(iv) (ab)x=axbx.

Demonstração. A demonstração será consequência das propriedades operatórias para expoentes racionais e da con- tinuidade da função exponencial. Começamos escolhendo(xn)n∈Ne(yn)n∈Nduas sequências de números racionais tais que

n→+∞lim xn =x e lim

n→+∞yn=y.

A existência de tais sequências decorre da densidade dos racionais. Tente justicar!

(i)Observe que

axn+yn=axnayn,∀n∈N. Como lim

n→+∞(xn+yn) =x+ye a função exponencial é contínua, tomando o limite quandontende a+∞dos dois lados, obtemos

ax+y=axay. (ii)De forma análoga ao item anterior,

a−xn = 1

axn,∀n∈N. Tomando o limite novamente,

a−x= 1 ax. (iii)Sabemos que

(axn)ym =axnym,∀m, n∈N. Fixadom∈N, temos

n→+∞lim axnym =axym e, por outro lado,

n→+∞lim (axn)ym = (ax)ym, pois lim

n→+∞axn =ax e a função h: (0,+∞)→R dada porh(t) =tym é contínua. Como as expressões dentro dos limites coincidem e o limite é único, concluímos que

axym= (ax)ym,∀m∈N. Agora, tomando o limite quandomtende a +∞, obtemos

axy= (ax)y.

2Na realidade,f˜é a única extensão contínua def. Para justicar este fato, mostre primeiro o seguinte: seh1, h2:RRsão duas funções contínuas tais queh1(r) =h2(r), para todo número racional r, entãoh1(x) =h2(x)para todoxR.

3Uma maneira de fazer isso é estudar os limites da função exponencial quandoxtende a+∞e a−∞, e usar o Teorema do Valor Intermediário.

(6)

(iv)Mais uma vez, temos

(ab)xn=axnbxn,∀n∈N. Tomando o limite quando ntende a +∞, obtemos

(ab)x=axbx.

como queríamos.

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