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Mudança e Lógicas Institucionais: Panorama e Proposta de Conciliação Entre Três Diferentes Abordagens Institucionalistas

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Mudança e Lógicas Institucionais: Panorama e Proposta de Conciliação Entre Três Diferentes Abordagens Institucionalistas

Autoria: Mayla Cristina Costa, Cristiane Marques de Mello Resumo

Nas últimas décadas, institucionalistas têm levantado questões sobre “como” e “por que” as instituições se modificam. A explicação sobre o processo de mudança institucional possui ainda um conjunto de concepções conflituosas, pressupostos divergentes e vozes discordantes (Scott, 2008). Mahoney e Thelen (2010) afirmam que as três abordagens dominantes da teoria institucional, sociológica, racional e histórica, apontam problemas na explicação sobre a mudança institucional. Nosso principal objetivo é suscitar a discussão acerca das principais correntes que explicam a mudança institucional, e contribuir por meio de uma proposta de conciliação entre as abordagens do institucionalismo sociológico, histórico e racional, com ênfase em lógicas institucionais.

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1 Introdução

Ao longo dos últimos 20 anos, institucionalistas têm questionado “como” e “por que” as instituições mudam. É enfatizado por alguns autores que a literatura existente acerca de como podemos compreender instituições e o processo de mudança institucional, possui ainda um conjunto de concepções conflituosas, pressupostos divergentes e vozes discordantes (Scott, 2008). A explicação da mudança institucional tem sido ressaltada pelas três abordagens dominantes da teoria institucional identificadas por Hall e Taylor (1996), quais sejam: institucionalismo sociológico, perspectiva da escolha racional e institucionalismo histórico. No entanto, as três abordagens ainda carregam problemas. A partir disso, em busca de uma resolução, alguns autores sugerem o estabelecimento de uma terceira fase da teoria institucional, marcada essencialmente pela unificação dessas abordagens (Campbell, 2004; Mahoney & Thelen, 2010; Thorton, Ocasio & Lounsbury, 2012).

Para Mahoney e Thelen (2010), os institucionalistas da abordagem de escolha racional têm reconhecido a longo tempo a importância da compreensão da mudança de equilíbrio, mas suas análises geralmente envolvem mais estatística comparativa do que uma abordagem dinâmica. Essa abordagem marca uma filiação a metodologia científica da teoria econômica, baseada no pressuposto da epistemologia de Imre Lakatos, opera predominantemente sobre pressuposições reducionistas da realidade, pressupostamente racionais utilitárias, e também esquematizadas a partir de modelos baseados nessas presunções. As críticas dirigidas a ela pelos problem-driven theorists (Shapiro, 2002) são de que a maior dificuldade desta abordagem está relacionada à visão das instituições como coordenação de mecanismos que sustentam particular equilíbrio (Shepsle, 1998; Calvert, 1995; Levi, 1997). Para Mahoney e Thelen (2010, p.6) a conclusão desta perspectiva é que “as mudanças institucionais devem ter uma origem exógena”.

Por outro lado, institucionalistas históricos consideram as instituições primeiramente como legados políticos de concretas lutas históricas, adotando assim uma visão de poder político de instituições que enfatiza os efeitos distributivos, e a persistência institucional em termos do aumento de retorno de poder. Na explicação da mudança, os institucionalistas históricos frequentemente chamam atenção para conjunturas críticas, geralmente entendidas como períodos de contingência durante as restrições na ação que são elevadas ou facilitadas (Capoccia & Kelemen, 2007). As explicações de mudança com foco em tais episódios são algumas vezes também relacionadas a argumentos sobre o relativo peso da agência versus estrutura em várias fases. Katznelson (2003) considera que as instituições são mais restritivas nos períodos de estabilidade política, mas argumenta que conjunturas críticas possibilitam oportunidades para os agentes históricos alterarem a trajetória de desenvolvimento.

Dessa forma, os institucionalistas históricos tendem a cair em um modelo de mudança descontínua em que períodos duradouros são periodicamente pontuados por momentos de agência e de escolha. Esses argumentos levam assim à concepção da mudança como envolvendo o colapso de um conjunto de instituições e sua substituição. Mahoney e Thelen (2010) consideram que o que eles não provêem é um modelo geral de mudança que compreenda ambas as fontes endógenas e exógenas de mudança.

Na perspectiva sociológica, a mudança institucional, conforme sugerem Garud, Jain e Kumaraswamy (2002), ocorre no momento em que uma lógica institucional alternativa substitui a lógica prevalecente. Outros estudos, como por exemplo o de Purdy e Gray (2009), demonstam que lógicas múltiplas podem permanecer dentro de um campo, sugerindo uma análise multinível para melhor compreensão.

Campbell (2004) considera que o problema na explicação da mudança decorre da falta de especificação da variável dependente, ou seja, na compreensão do tipo de alteração a ser

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estudada. Para o autor, as dimensões relevantes da mudança e os períodos do estudo precisam ser especificados. Ele argumenta que o problema dos mecanismos explicativos da mudança é a falta de especificação dos processos que representam relações causais entre variáveis. Na sua visão, os mecanismos responsáveis por explicar como as estruturas normativas e cognitivas afetam o comportamento são pobremente especificados pelos estudos institucionalistas. Assim, para o autor o problema principal na compreensão da mudança é a incapacidade de os pesquisadores definirem claramente o que a mudança institucional é, pois a teoria não deixa claro quais são os mecanismos responsáveis pela sua ocorrência, e não explica adequadamente como "ideias", que não sejam auto-interesses, afetam a mudança institucional.

Na visão de Thornton, Ocasio e Lounsbury (2012), são necessárias duas considerações acerca do relacionamento entre os conceitos de lógica institucional, agência e mudança. A primeira é a de que lógica institucional e prática são questões que devem ser consideradas em dualidade. Ou seja, as práticas adotadas em determinado campo social não são somente refletidas a partir das lógicas institucionais, elas são também ações tangíveis que podem vir a ocasionar mudanças ou alterações nas próprias lógicas. A segunda consideração feita pelos autores é a de que as lógicas institucionais são também responsáveis pela formação da identidade, seja ela individual, coletiva ou organizacional. Importante considerar ainda que, para estes autores, práticas são consideradas como conjuntos de atividades que apresentam significação social, e por isso, abarcam sentido coerente e estabilidade em determinado contexto.

Assim, a abordagem de lógica institucional têm sido considerada responsável por alterar a atenção dos pesquisadores do institucionalismo organizacional para aspectos antes não considerados. O foco em lógicas institucionais concorrentes, conforme aponta com Lounsbury (2007, p. 289), redirecionou os estudos da área, que “antes enfatizavam o conceito de isomorfismo e segregação das forças institucionais e técnicas”, e passaram a enfatizar a compreensão de como o conflito entre múltiplas lógicas institucionais serve de suporte para a mudança.

Posto isto, nosso principal objetivo é suscitar a discussão acerca das principais correntes que explicam a mudança institucional, e contribuir por meio de uma proposta de conciliação entre as abordagens do institucionalismo sociológico, histórico e racional, com ênfase em lógicas institucionais. Tendo em vista que um ensaio teórico pressupõe uma tentativa e iniciativa de gerar reflexão e avanço, propomos ainda, de modo secundário, reflexões acerca do conceito de lógica institucional e das possibilidades de estudos organizacionais relacionados a mesma, mais especificamente no que se refere ao processo de mudança. Esperamos, dessa forma, contribuir para uma análise mais focal e estreita sobre o tema proposto.

2 A estabilidade e a dinamicidade: similaridades e diferenças entre as abordagens institucionais

O conceito de instituições foi considerado ambíguo durante muitos anos nos estudos institucionalistas e ainda hoje alguns pesquisadores das vertentes sociológica, histórica e racional o tratam de forma equivocada. De acordo com Greenwood, Oliver, Sahlin, e Suddaby (2008) a ambiguidade em parte foi resultante da ênfase dos estudos precursores na análise de instituições governamentais. Assim, uma parte dos pesquisadores tratam instituições como modelos que tornam-se prescrições culturais e outros as tratam como agências regulatórias da economia política. A respeito dessa ambiguidade, Greenwood et al. (2008) afirmam que frameworks regulatórios só podem ser considerados instituições “se é demonstrado

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claramente que esssas instituições são constituídas por normas e valores sociais dados como certos (taken for granted) e se esses valores são explicitamente identificados” (p. 12).

Apesar dos equívocos observados nas três abordagens, é antigo o consenso entre elas de que instituições são padrões relativamente duráveis da prática social (Hughes, 1936), e a estabilidade é realizada por um complexo conjunto de restrições que incluem regras formais e informais, de tal modo que “os desvios do padrão sejam neutralizados de forma regulada, por controles repetidamente ativados, socialmente construídos – isso é, por um conjunto de recompensas e sanções” (Jepperson, 1991, p. 145). Embora Zucker (1977), representante precursora do novo institucionalismo sociológico, tenha argumentado que quanto maior o grau de institucionalização menor será a necessidade de controle e sanção, pois os atores passam a compartilhar do pressuposto de que não há uma alternativa às ações disponíveis no contexto institucional.

Nos últimos anos, tem sido compartilhada pelas três abordagens a ideia de que instituições são composições de “elementos culturais-cognitivos, normativos e regulativos que juntamente com atividades e recursos associados, fornecem estabilidade e significado à vida social” (Scott, 2001, p. 48). Analisar a estabilidade, enfatiza North (1990), contribui para melhorar a compreensão da natureza do processo incremental de mudança. Este autor, um dos principais representantes da abordagem racional, afirma que a mudança institucional gradual se dá através de um contínuo ajuste marginal e não é possível entender as escolhas de hoje sem traçar a evolução incremental das instituições. As rotinas, costumes, tradições e convenções são termos comumente usados para observar a persistência de restrições informais (normas de comportamento), e é a interação complexa de regras formais e restrições informais, juntamente com a forma como são aplicados, que molda a vida diária das pessoas e proprorciona a direção para as atividades que dominam a vida das mesmas (North, 1990).

A tabela abaixo adaptado de Campbell (2004), apresenta as similaridades e diferenças referentes as abordagens institucionalistas racional, organizacional (base sociológica) e histórica.

Tabela 1

Similaridades e Diferenças na Nova Escolha Racional, Organizacional e Institucionalismo Histórico Similaridades Escolha Racional

(institucionalismo econômico)

Organizacional (de base sociológica)

Histórico

Padrões de Mudança favorecidos

Pontuado Equilíbrio Pontuado Equilíbrio Pontuado Equilíbrio

Evolução Evolução Evolução

Evolução Pontuada Evolução Pontuada

Conceitos causais

favorecidos Dependente da trajetória Dependente da trajetória Dependente da trajetória

Baseados no feedback, retornos crescentes e escolha

dentro de restrições (ou constrangimentos)

institucionais

Baseado em restrições e aspectos constitutivos das

instituições

Baseados no feedback, o aprendizado, e escolha

dentro de restrições institucionais

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Com base na informação de

contágio, feedback e imitação miméticos, normativos e Baseado nos processos coercitivos

Baseado nos processos coercitivo e de e

aprendizado

Papel de ideias Crescimento: estruturas cognitivas, crenças e normas

constrangem os atores (e tornam as instituições

ineficientes)

Substancial: estruturas normativas e cognitivas

tomadas como certas (taken-for-granted) restringem (e habilitam) atores. Crescimento: paradigmas políticos e crenças em princípios restringem atores. Diferenças

Raízes teóricas Economia Neoclássica

Fenomenologia, etnometodologia e psicologia cognitiva Economia política marxista e weberiana Definição de instituição

Regras formais e informais e procedimentos de conformidade; equilíbrio

estratégico

Regras formais e estruturas culturais tomadas como certas (taken-for-granted), esquema cognitivo e reprodução de processo rotinizado Procedimentos e regras formais e informais

Nível de análise Trocas micro-analíticas Campos organizacionais e populações

Economia política nacional macro-analítica

Teoria da ação Lógica da instrumentalidade Lógica de apropriação (ou adequação)

Lógica da

instrumentalidade e adequação

Teoria da restrição Ação é restringida por regras, tais como direitos e constituições de propriedade, e

racionalidade limitada

Ação é restringida por cultura, esquema e rotina

Ação é restringida por regras e procedimentos, paradigmas cognitivos e crenças em princípios Fonte: Adaptado de Campbell, J. L. (2004). Institutional change and globalization (p. 11). Princeton: Princeton University Press.

Sob a perspectiva do institucionalismo histórico, Mahoney e Thelen (2010) de maneira similar, argumentam que a mudança institucional ocorre “quando problemas na interpretação das regras e execução abre espaço para os atores implementarem as regras existentes de uma novas maneiras” (p. 4), ou seja, por meio de ambiguidades.

Mahoney e Thelen (2010) consideram ainda que as instituições são cheias de tensões porque elas inevitavelmente incitam considerações sobre recursos e invariavelmente possuem conseqüências distributivas. Dessa forma, o poder de um grupo ou coalizão relativa a outros pode ser tão grande que atores dominantes são capazes de desenhar instituições que claramente correspondem a suas preferências institucionais bem-definidas. Mas os resultados institucionais não necessitam refletir os objetivos de qualquer grupo particular; ele pode ser o resultado não intencional de conflitos entre grupos ou o resultado de compromissos ambíguos entre atores que podem suceder um significado institucional até se eles diferirem em metas substantivas (Schickler, 2001; Palier, 2005).

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institucionais. Sob a perspectiva do institucionalismo histórico há um elemento dinâmico, onde instituições representam compromissos ou acordos relativamente duráveis embora ainda controvertidas na base a dinâmica de coalizão, são, portanto, sempre vulneráveis a mudanças. Sendo assim, mudança e estabilidade são indissociáveis, de tal forma que os que se beneficiam dos arranjos existentes possam ter preferência para a continuidade, assegurando que a continuidade exija mobilização política como suporte, assim como esforços ativos para a resolução de ambigüidades a seu favor (Thelen, 2004).

A mudança, como explica North (1990) sob o institucionalismo racional, consiste tipicamente em ajustes marginais ao complexo de regras, normas e medidas de controle que constituem o quadro institucional. North (1990) considera que o processo de reforço das instituições existentes, prevê uma lógica. Nesse modelo, os atores se familiarizam com as instituições por meio de um processo de aculturação e reforçam as instituições existentes através de um processo de reprodução. O sistema tem uma lógica específica que é reforçada pelas relações entre os diferentes elementos, tais como as instituições (in) formais, as estruturas de governança pública e privada e os mapas mentais compartilhados. Sobre o processo de mudança institucional, as variáveis incidem sobre três vetores, quais sejam cultura, tecnologia e Estado, incluindo ainda outros dois relacionados aos atores: desejo de melhorar a eficiência, e desejo de proteger seus próprios interesses.

Por fim, para pesquisadores da abordagem sociológica, a mudança institucional ocorre quando uma lógica institucional alternativa substitui a lógica prevalecente (Garud et al, 2002), dentro de um contexto espaciotemporal. As lógicas institucionais são construídas socialmente (Friedland & Alford, 1991; Thornton, 2002; Shipilov, Greve & Rowley, 2010), definem normas, valores e crenças que estruturam a cognição dos atores nas organizações e proporcionam uma compreensão coletiva de como interesses estratégicos e decisões são formuladas (Thornton, 2002; Shipilov et al, 2010). Tais lógicas podem ser melhor compreendidas dentro de um contexto histórico (Thornton, 2002) espaciotemporal, de práticas materiais e simbólicas que constituem os princípios institucionais (Scott, 2008).

Neste sentido, estudos têm demonstrado que algumas práticas institucionais e estrutura imbricam diferentes atores que possuem diferentes backgrounds, resultando assim em diferentes atribuições de significados e efeitos institucionais, possibilitando a mudança por meio de diferentes mecanismos (Thornton, Ocasio & Lounsbury, 2012). Consideramos que, não necessariamente restringindo lógicas institucionais como propulsora da mudança por meio de ambiguidades de regras, mas, é por meio das múltiplas racionalidades em jogo no contexto institucional que surge a possibilidade de bricolagem entre as lógicas institucionais vigentes e por ventura, a mudança institucional. Assim, apresentamos na próxima seção, o conceito e os constituintes de lógicas institucionais.

3 Lógicas Institucionais

Embora o significado implícito no termo ‘lógica institucional’ já estivesse sendo tratado por vários autores de diferentes áreas das ciências sociais (por exemplo, Pierre Bourdieu, 1977) – a ideia somente se notabilizou na área de estudos institucionalistas a partir do texto seminal de Friedland e Alford (1991). Uma das grandes contribuições que a ideia traz para o campo é o fato de que, a partir dela, os autores propuseram o desenvolvimento de uma abordagem não funcionalista e não determinista da sociedade.

Para atingir esse objetivo, Friedland e Alford (1991, p. 232), como um primeiro passo, propuseram a reconceituação do termo ‘instituição’, da seguinte maneira: “as both supraorganizational patterns of activity through which humans conduct their material life in time and space, and symbolic system through which they categorize that activity and infuse it

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with meaning”.

Neste sentido, os autores argumentam que, para compreendermos os indíviduos e as organizações, é necessário situá-los na sociedade; esta instância, por sua vez, deve ser compreendida como um sistema interinstitucional, composto por instituições contraditórias e dinâmicas. A mútua interferência entre diferentes lógicas institucionais disponíveis no contexto de interação societária seria, em grande medida, responsável pelo comportamento dos atores sociais, e a mudança, por sua vez, poderia ser compreendida a partir da análise sistemática das contradições sentidas em nível individual e social. Por conta disso, os autores argumentam que “a oposição não se dá entre a racionalidade ou não dos atores, mas entre diferentes ordens transracionais” (Friedland e Alford, 1991, p. 234).

Embora Friedland e Alford já tivessem introduzido o conceito de lógica institucional anteriormente por meio da análise da contradição entre crenças e práticas do capitalismo, estado burocrático e democracia política (Alford & Friedland, 1985), foi somente no texto seminal de 1991 que outros pesquisadores passaram a dar mais atenção ao conceito e a desenvolver esquemas analíticos e pesquisas empíricas acerca da ideia de lógica institucional.

Na concepção de alguns revisionistas desta abordagem, as primeiras pesquisas empíricas da vertente de lógica institucional enfatizaram a dominância de uma lógica no ambiente institucional e a substituição em diferentes períodos históricos de uma lógica por outra (Scott, Mendel & Pollack 1997, Thorthon & Ocasio, 1999; Thornton, 2002). Dessa maneira, os primeiros estudos orientaram sua análise em termos de eras representativas das lógicas institucionais dominantes no campo. E, com o objetivo de propor ideias e conceitos úteis na identificação de estruturas e processos que operam no campo organizacional, os autores de tais estudos afirmaram que os conceitos de lógicas institucionais e estruturas de governança ainda precisavam ser melhores desenvolvidos para permitir sua adequada operacionalização.

Por esse motivo, Scott, Mendel e Pollack (1997) em seu estudo acerca da evolução de um campo organizacional na área médica, incorporaram em sua análise da lógica institucional o princípio de “dualidade” do conceito, descrevendo como lógica não somente os sistemas de distinções interrelacionados (regras, valores e normas), mas também as práticas relacionadas (rituais, rotinas e soluções estratégicas), utilizadas pelos participantes do campo. Os autores concluíram que, no campo estudado por eles, a mudança da lógica profissional para a lógica de mercado impactou de maneira considerável na ordem vigente neste campo organizacional em particular.

No entanto, como ressaltam Thorton, Ocasio e Lonsbury (2012), o conceito ainda carece de melhor definição e suporte analítico, de tal forma que lhe permita operacioná-lo empiricamente. Entretanto, essa limitação não impediu que os estudos de lógica institucional se propagassem nos últimos anos. A esse respeito, Thornton (2008) chegou a considerá-lo uma espécie de conceito ultra-utilizado e, por consequência disso, mal interpretado.

Assim, desde o estudo de Friedland e Alford (1991), a ideia de lógica Institucional tem sido conceituada de diferentes maneiras. Para os proponentes, “lógicas institucionais são sistemas simbólicos, maneiras de ordenar a realidade, tornando assim a experiência no tempo e espaço significante” (Friedland and Alford, 1991, p. 243). As indústrias e outros campos organizacionais podem possuir suas lógicas próprias, desde que se considere que elas são hierárquicas na forma e imbricadas com as cinco instituições societais centrais do capitalismo Ocidental apresentadas por eles (Friedland and Alford, 1991).

Na concepção de Thorton e Ocasio (2008), a abordagem da lógica institucional compartilha com os estudos fundantes do neo-institucionalismo de Meyer e Rowan (1977), Zucker (1977) e DiMaggio & Powell (1988, 1991) a preocupação está em como a cultura e a

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cognição influenciam as estruturas organizacionais. No entanto, difere de maneira significativa destes quando passa a enfatizar a relação entre lógicas institucionais, indivíduos e organizações com o objetivo de compreender a variação existente no ambiente, no lugar de enfatizar o isomorfismo.

Assim, de acordo com a nova vertente da lógica institucional, ao mesmo tempo em que as lógicas moldam a compreensão dos atores daqueles comportamentos considerados significativos, elas também são moldadas e modificadas por estes comportamentos (Thornton & Ocasio, 2008). Nas palavras de Lounsbury (2007), o conceito de lógicas institucionais refere-se a crenças e regras que estruturam a cognição, e guiam a tomada de decisão em um campo organizacional. É assim que elas podem ser compreendidas como guias para as ações sociais e prescrições responsáveis pela capacidade cognitiva dos atores, possibilitando a interpretação da realidade e a compreensão do que constitui a maneira correta de comportar-se (Thornton, 2004; Greenwood et. al, 2011).

Além disso, a ideia de lógica institucional é considerada também pelos seus precursores como um framework metateórico (Thornton, 2008; Thornton, Ocasio & Lounsbury, 2012), pois abarca o potencial para analisar o inter-relacionamento entre indíviduos, organizações e instituições, a partir do sistema societal composto por múltiplas instituições. Ou seja, esta abordagem considera que os atores estão imersos “nas ordens institucionais [societais] da família, religião, estado, mercado, profissões e corporações”, lógicas estas que possuem diferentes racionalidades (Thornton, Ocasio & Lounsbury, 2012, p. 4).

Thornton, Jones e Kury (2005), em seu estudo sobre a mudança organizacional nos campos da contabilidade, da arquitetura e indústria editorial, utilizaram a abordagem da lógica institucional como teoria e método de análise, com o objetivo de compreender a influência do nível societal (entendido pelos autores a partir da dimensão cultural) na cognição e no comportamento estratégico dos atores. Neste estudo, o conteúdo cultural da lógica em análise foi representado por meio de instituições societais delimitadas a partir de tipos ideais. Os autores argumentam que a criação de instituições híbridas pode ser advinda da mútua influência de lógicas de diferentes setores. No artigo, eles propõem ainda que a hibridização ocorre através de pelo menos três mecanismos: o empreendedorismo institucional, a sobreposição estrutural e a sequência de eventos históricos. O resultado da pesquisa revelou que diferentes dimensões são responsáveis por diferentes padrões de mudança, onde foi identificado que, no caso do campo da contabilidade, seguiu-se um modelo de mudança pontuado, enquanto no campo da arquitetura estabeleceu-se um modelo cíclico, e no campo da indústria editorial, o estudo constatou um modelo evolucionário de mudança. Os autores concluíram que a perspectiva da lógica institucional apresenta uma teoria útil para a compreensão da cultura e de suas consequências para a governança das organizações, sem deixar de considerar a importância dos eventos históricos na explicação dos padrões de transformação cultural.

Thornton e Ocasio (2008) apesentam cinco princípios subjacentes a ideia de lógica institucional entendida como uma metateoria, sendo que estes são considerados provedores de insights para melhor desenvolvimento e refinamento desta perspectiva analítica da interação social: o princípio da agência imersa, o princípio da sociedade como sistema interinstitucional, o princípio das fundações material e cultural das instituições, o princípio das instituições como múltiplos níveis e o princípio da contingência histórica.

O princípio de agência imersa considera que, no mesmo momento em que indivíduos e organizações são habilitados para a ação, estes também são restringidos pelas lógicas institucionais prevalecentes. Este princípio é considerado importante por distinguir a

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abordagem de lógicas institucionais de perspectivas baseadas na escolha racional, ou mesmo na visão do determinismo do agente pela estrutura (engendrada nos estudos organizacionais a partir da visão de Parsons (1956) que separa a instituição dos setores econômicos ou técnicos). Assim, a perspectiva da lógica parte do pressuposto de autonomia parcial dos diferentes níveis individual, organizacional e institucional na sociedade. Thornton e Ocasio (2008) argumentam que uma limitação prevalecente em muitos dos estudos de lógicas institucionais diz respeito ao fato de que as pesquisas empíricas tendem a enfatizar um nível de análise sobre outro, ao invés de realizar uma análise integrada dos níveis, identificando efeitos de uns sobre os outros.

O segundo princípio da abordagem de lógica institucional possibilita o estudo da agência e da heterogeneidade a partir da constatação de contradições existentes entre lógicas de diferentes ordens institucionais. Como já foi mencionado, a sociedade compreendida como um sistema interinstitucional possibilita ao mesmo tempo a visão não determinista aos pesquisadores e a consideração de que “constructos chaves de análise organizacional como eficiência, racionalidade, participação e valores não são neutros, mas são eles mesmos moldados pelas lógicas do sistema interinstitucional” (Thornton e Ocasio, 2008, p. 105). Essa premissa reforça a ideia de que a agência e as instituições prevalecentes são recursivas, e que tanto uma quanto outra dimensão são importantes para explicar a natureza dinâmica e perene das estruturas que constituem a sociedade (Giddens, 2003).

O terceiro princípio relaciona-se ao papel da cultura na tomada de decisão e no uso do poder. Assim, ao incorporar o aspecto simbólico e normativo como componentes culturais, a perspectiva enfatiza como o comportamento dos atores é resultante da lógica de conduta apropriada ao invés de um comportamento baseado na análise de consequências. Nesse sentido, a abordagem diferencia-se de concepções que focam a internalização consciente de valores, assim como daquelas perspectivas que enfatizam exclusivamente a dependência de recursos e os interesses políticos. Assim, ainda de acordo com Thornton e Ocasio (2008), as lógicas institucionais implicam uma visão probabilística de aderência a normas dominantes de comportamento, ao invés da visão determinística dos arranjos institucionais.

O quarto princípio enfatiza a capacidade de lógica institucional como metateoria, por possibilitar o desenvolvimento de teorias e pesquisas entre múltiplos níveis de análise, mas também, por permitir a consideração de diferentes mecanismos explicativos, possibilitando, assim, maior precisão e generalização teórica. No entanto, Thorntan e Ocasio (2008, p.106) ressaltam que para “aplicar [a ideia de] lógica institucional como metateoria é crítico que o nível de análise no qual a institucionalização ocorre seja claramente especificado”. Com relação a esse princípio, os autores consideram ainda que muitos pesquisadores passaram a ser imprecisos em suas análises ao inferir que um esquema interpretativo ou lógica de qualquer nível de análise é uma lógica institucional. Eles argumentam que lógicas institucionais provêem legitimitade e um senso de segurança ontológica, representando, desta forma, mais do que simples estratégias ou lógicas de ação.

Por fim, o quinto princípio considerado como pressuposto da abordagem de lógica institucional trata da contingência histórica. De certa forma, este princípio é consistente com a abordagem do institucionalismo organizacional por levar em conta que as forças que atuam sobre o comportamento dos indíviduos e organizações são historicamente contingentes. Assim sendo, o quinto princípio salienta que os estudos de lógica institucional se afastam do a-historicismo comum aos estudos organizacionais (Kieser, 1994), já que o objetivo da análise organizacional não é desenvolver concepções universalistas acerca do comportamento organizacional, mas expressá-los em contextos particulares delimitados por determinado tempo histórico e ambiente cultural (Clark e Rowlinson, 2004).

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Por esse conjunto de fatores, a perspectiva da lógica institucional é considerada responsável por transformar a teoria do institucionalismo organizacional, tendo o potencial de melhor integrar a pesquisa institucional na área das ciências sociais (Thornton, Ocasio e Lounsbury, 2012) por justamente levar em conta de forma integrada os múltiplos aspectos considerados pelas distintas disciplinas em diferentes níveis de análise. De acordo com Lounsbury (2007), quando observadas no nível organizacional, as tomadas de decisões e resoluções de problemas empreendidos pelos indivíduos são delimitadas pelas lógicas institucionais vigentes, isso porque, ao dirigir a atenção dos atores para um rol de alternativas disponíveis, as lógicas institucionais são responsáveis por possibilitar um senso de organização compartilhado de que há um significado coerente atribuído às decisões tomadas, reforçando assim certas identidades e estratégias organizacionais existentes.

Destarte, um pressuposto fundamental da perspectiva é que cada uma das ordens institucionais presentes na sociedade possui diferentes características de ordem material e cultural (Friedland & Alford, 1991), mas não deixam de se integrarem no âmbito microssocial. Por exemplo, tanto a família quanto a religião não são normalmente consideradas como instituições societais relacionadas ao plano econômico, mas estão diretamente envolvidas na produção, distribuição e consumo de bens e serviços (Thornton & Ocasio, 2008). Dessa forma, diante da discussão anteriormente explanada, apresentamos a seguir a proposta de conciliação entre as três abordagens institucionalistas.

4 Proposta de Conciliação entre as três abordagens

Na tentativa de uma maior compreensão das instituições e do processo de institucionalização, Greenwood et al (2008) afirmam que a teoria institucional de base sociológica tem obtido ganhos ao relacionar-se a outras teorias. É importante assim analisar que, embora instituições sejam tomadas como os “aspectos mais duradouros da vida social” (Giddens, 2003, p.28) elas não são isentas de transformação. Instituições são melhor consideradas como sendo, concomitantemente, produto e processo (DiMaggio, 1988), atuando restritivamente ou habilitando as ações, ao passo que são por elas construídas e reconstruídas, num processo recursivo de (des)institucionalização.

Ao mesmo tempo em que atenção é dada aos aspectos simbólicos da vida social, é complementada pela preocupação com as atividades de produção e reprodução desses elementos. Assim, temas como estabilidade e ordem na vida social, ligados às noções de consenso e conformidade, são complementados por outros ligados ao conflito e mudança nas estruturas sociais (Nee, 1998; Scott, 2001, 2008).

Ainda que uma perspectiva institucional dê a atenção intensificada aos aspectos simbólicos da vida social, também se deve atentar para as atividades que as produzem e reproduzem (Scott, 2008). Os atores podem trocar ou substituir suas orientações para a ação, mudando desse modo seus graus de respostas flexíveis, inventivas, e críticas para contextos estruturados (Emirbayer & Mische, 1998).

A construção das relações (e possíveis modificações nelas) advém da ação dos atores, que podem ser motivados, como apontam Meyer e Rowan (2006), por seus próprios interesses, mas também pelos seus valores e convicções culturais que surgem em um contexto de instituições existentes. As instituições que moldam as ações organizacionais estão inseridas em lógicas de ordem superior da sociedade (Friedland & Alford, 1991; Thornton, 2002). Os principais setores institucionais da sociedade, tais como: família, religiões, profissões liberais, Estado, corporação, e mercado fornecem um distinto conjunto de lógicas muitas vezes conflitantes ou complementares que formam a base de conflito e de conformidade institucional (Thornton, 2002).

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O estudo de Purdy e Gray (2009) relatou que em campos emergentes as lógicas conflitantes podem co-existir. Os resultados da pesquisa fornecem evidências da difusão de lógicas contraditórias, mostrando que, em alguns contextos, a difusão pode seguir diferentes mecanismos que permitem múltiplas lógicas permanecerem dentro de um campo e desafiam o pressuposto de que uma única lógica dominante deve prevalecer. O estudo também sugere que a compreensão da institucionalização de lógicas em campos emergentes exige um modelo multinível de forças a favor e contra a institucionalização.

De acordo com Greenwood, Raynard, Kodeih, Micelotta e Lounsbury (2011) as organizações confrontam complexidade institucional, por estarem imersas em um ambiente constituído por múltiplas e contraditórias lógicas institucionais, cada uma delas com uma diferente racionalidade. Recentemente, a lógica institucional tem sido definida como um 'framework meta-teórico' capaz de integrar os níveis individual, organizacional e institucional (Thornton et al., 2012).

Partindo dessas considerações e do que já foi discutido até o presente momento, apresentamos na tabela 2, uma proposta de conciliação das três vertentes institucionalistas. A tabela a seguir, tem como base de comparação a tabela 1 apresentada anteriormente.

Tabela 2

Diferenças e Proposta de conciliação entre as perspectivas institucionalistas racional, sociológica e histórica

Diferenças (institucionalismo Escolha Racional econômico)

Organizacional (de base sociológica)

Histórico

(Comparativo) Proposta de Conciliação

Raízes teóricas

Economia

Neoclássica etnometodologia Fenomenologia, e psicologia cognitiva Economia política marxista e weberiana

Por meio da adoção de lógicas institucionais, como meta-teoria, onde

parte-se do pressuposto de que a relação entre agência e estrutura não representa uma relação de dualidade. Mas está mais relacionada a análise do

ator em sua posição historicamente situada. Definição de instituição Regras formais e informais e procedimentos de conformidade; equilíbrio estratégico Regras formais e estruturas culturais tomadas como certas (taken-for-granted), esquema cognitivo e reprodução de processo rotinizado Procedimentos e regras formais e informais

São ao mesmo tempo caminhos supra-organizacionais da atividade, por meio

do qual humanos conduzem sua vida material em tempo e espaço, e sistemas

simbólicos por meio do qual categorizam as suas atividades e proporcionam a elas significado

(Friedland e Alford, 1991). Nível de análise Trocas micro-analíticas Campos organizacionais e populações Economia política nacional macro-analítica

Possibilidades de análise: níveis Micro, Meso e Macro (Individual,

Organizacional, Campos Organizacionais e Societal)

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Teoria da ação Lógica da instrumentalidade Lógica de apropriação (ou adequação) Lógica da instrumentalida de e adequação

Mecanismo de sensemaking para a tomada de decisão. Ação passa a

depender de como indíviduos e organizações estão posicionados e como inflenciam e são influenciados

por múltiplas lógicas institucionais.

Teoria da restrição

Ação é restringida por regras, tais como direitos e constituições de propriedade, e racionalidade limitada Ação é restringida por cultura, esquema e rotina Ação é restringida por regras e procedimentos, paradigmas cognitivos e crenças em princípios

Ação é restringida pela capacidade temporal do sujeito imerso no contexto institucional, de perceber os problemas

e responder a eles.

Quando contrasta-se a visão racionalista de Norton (1990), com a abordagem sociológica, percebe-se em comum a observação de que múltiplas lógicas institucionais existem e competem por pontos de atenção, ressalta-se a importância do exame das arenas institucionais ou contextos relacionais. Thornton (2002), sob perspectiva do institucionalismo organizacional (de base sociológica) enfatiza que por meio de pressões institucionais moderadas, as empresas definem problemas e tornam-se sensíveis a diferentes condições de mercado, determinando que estratégias organizacionais e estruturas são susceptíveis a serem adotadas para resolver seus problemas.

Assim, enfatizamos que o conceito de lógicas institucionais é mais adequado para a compreensão da mudança, por dois motivos:

(1) não reduz a ação dos atores à intencionalidade como a abordagem racionalista e (2) não reduz o processo de mudança às variáveis cultura, tecnologia e Estado, mas possibilita simultaneamente análise dos níveis individuais, organizacionais, campo organizacional, e institucional macro, como o Setor Mundial (Friedland & Alford, 1991; Thornton et al., 2012).

Neste sentido, Thornton e Ocasio (2008) afirmam que a abordagem de lógica institucional é capaz de resolver o problema do ‘agente imerso’ no ambiente institucional ao conceituar a sociedade como um ambiente interinstitucional no qual as lógicas são caracterizadas pela diferenciação cultural, fragmentação e contradição. Assim, os autores focam em três mecanismos para a mudança: empreendedorismo institucional, sobreposição estrutural e sequência de evento histórico.

Ainda, tendo em conta que a perspectiva de lógica institucional sugere que os mecanismos relativamente universais para contestação de status e poder dentro de campos organizacionais são condicionados por instituições prevalecentes (Thornoton e Ocasio, 2008), também é preciso considerar que as lógicas institucionais podem ser responsáveis pela alteração de identidades, assim como identidades também podem ser responsáveis pelas mudanças em lógicas, conforme sugerem Thornon, Ocasio e Lounsbury (2012). Os autores argumentam que mudanças em práticas e identidades organizacionais geralmente ocorrem conjuntamente e que, por isso, ainda se faz necessário uma maior compreensão dos seus efeitos e de como ocorre sua mutualidade com as lógicas institucionais. Assim, os autores consideram também que a compreensão de como e em que extensão mudanças em lógicas estão relacionadas a mudanças em práticas e identidades é uma matéria que ainda exige investigação empírica.

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Complementarmente ao problema da identidade em estudos organizacionais e seu potencial uso na perspectiva de lógicas institucionais, é preciso considerar a questão da diversidade de identidades no contexto organizacional. De acordo com Kodeih (in press) a literatura acerca identidade organizacional tem se deparado ainda com o desafio do entendimento de que as organizações se defrontam com múltiplas identidades. O estudo de Battilana e Dorado (2010) revela que a manutenção e desenvolvimento de organizações híbridas, por exemplo, dependem da criação de uma identidade organizacional comum que funcione como mediadora entre as lógicas que elas combinam. Outros estudos evidenciam também que as lógicas institucionais somente exercem influência nos comportamentos e ações apenas após especifícar a identidade a ser invocada e posicionada (Heimer 1999; Kraatz & Block 2008).

Finalmente, temos que a relação entre identidade e lógicas institucionais se visualiza por meio da dinâmica do poder. Neste ponto, Thornton e Ocasio (2008) afirmam que as lógicas institucionais moldam e criam as relações pelas quais o status e o poder podem ser obtidos, mantidos e perdidos nas organizações. E reforçam que o mecanismo pelo qual as lógicas institucionais moldam a cognição dos indivíduos, é por meio da classificação e categorização social. Dada a institucionalização de categorias, os indivíduos passam a tomar como certo as categorias que identificam um conjunto de valores, práticas e mesmo organizações, tais como as categorias de governança corporativa, recursos humanos e estruturas multidivisionais. Ou seja, essas categorias são socialmente construídas e compartilhadas, no entanto, não são categorias que existem naturalmente, mas sim, institucionalizadas.

As argumentações anteriores reforçam nossa visão de que a mudança institucional (dentre outros temas de estudos organizacionais) teria maior poder de explicação (mas, não apenas único), se fosse investigada e analisada da perspectiva de lógicas institucionais.

6 Considerações Finais

As três abordagens de teoria institucional privilegiam estudos que buscam explicar a mudança e persistência de instituições. O fato é que a mudança é um longo e complexo processo. Para construir um novo "compromisso coletivo" para um novo sistema de valores é exigido uma ação intencional por parte de muitos membros da sociedade. Neste processo, os agentes de mudança institucionais são cruciais (North, 1990). Além do jogo de interesses, conflito e luta pelo poder, a análise da mudança institucional também deve incluir mecanismos de aprendizagem social e experimentação, conforme externalizam Meyer e Rowan (2006). Na abordagem dinâmica da mudança institucional, a análise centra-se na explicação do processo, o que implica uma análise histórica em que está envolvido em tempo real (North, 1990).

Novas lógicas (que pressupõem mudança institucional), conforme ressaltam Purdy e Gray (2009), são transmitidas por empreendedores institucionais, promovendo novas práticas organizacionais, ratificadas pelas instituições existentes. Longe de sugerir uma trajetória linear, os resultados da pesquisa sugerem que os modelos de institucionalização necessitam refletir padrões complexos de movimentos políticos e reações entre os diferentes níveis de ação que compõem estes processos (Purdy & Gray, 2009). Reiteramos, não apenas no que se refere aos modelos de institucionalização, como também aos processos de desinstitucionalização de ações, normas, padrões e práticas organizacionais.

É importante salientar que sobre lógicas institucionais, recentes pesquisas (Greenwood et al., 2011; Purdy & Gray, 2009) tratam de mútiplas lógicas confitantes e complementares que interagem entre si, afastando-se da ideia de lógicas dominantes. Essas lógicas múltiplas podem ser ou não mutuamente incompatíveis. A proposta de lógicas institucionais ainda

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necessita ser empiricamente testada para avaliarmos o pontencial de sua contribuição, na medida em que compreendermos em que extensão essas lógicas impõem desafios e tensões as organizações (Friedland & Alford, 1991; Kraatz & Block, 2008).

Em suma, a partir dos assuntos explicitados e discutidos, consideramos que para entender o processo de mudança institucional é preciso compreender os mecanismos subjacentes aos processos pelos quais modelos institucionais predominantes em um contexto social (país ou organização ou campo) podem ou não surgir em outro. Além disso, faz-se necessário também compreender as estratégias de ação a partir do conceito de práticas e identidade. Assim, somente uma conceituação teórica integradora de perspectivas é capaz de explicitar as condições sob as quais podemos esperar que qualquer um dos dois processos podem ajudar a explicar as diferentes direções que a mudança institucional pode tomar.

Concordamos com Berger e Luckmann (1985), quando afirmam que a sociedade irá exercer influência ao longo de todo o curso do desenvolvimento humano. A importância do contexto histórico já a muito tempo tem sido ressaltada por diferentes perspectivas epistemológicas, quando investigam e tratam os objetos das ciências sociais dentro de um curso de desenvolvimento descortinado pela história.

Consideramos que a temporalidade é um dos fatores complementares com poder explicativo sobre mudança e lógicas institucionais, tendo em vista que os fatores influenciadores são melhores compreendidos a partir de uma análise histórica, ou seja, por meio da observação e análise das alterações institucionais ocorridas ao longo do tempo.

Possivelmente, a realização de outros estudos empíricos (além daqueles que foram mencionados no presente trabalho) sobre conflitos e lógicas institucionais, contribuirá para ampliar e aprofundar a compreensão da mudança institucional (e questões ainda não explicadas), sobretudo, os estudos que privilegiam a perspectiva longitudinal.

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