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Ensino de Leitura III: A importância da interação adulto-criança no processo de ensino/aprendizagem

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Academic year: 2021

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Ensino de Leitura III:

A importância da interação adulto-criança no processo

de ensino/aprendizagem

No artigo anterior (Ensino de Leitura II), mostramos que a professora Ariane Zanelli havia começado a leitura de uma das histórias do livro Príncipes e Princesas, Sapos e Lagartos - histórias modernas de tempos antigos, de Flávio de Souza e ilustração de Paulo Ricardo Dantas. Ela lia para seus alunos a história “O príncipe desencantado”.

Durante a leitura, a professora fazia perguntas para o grupo, perguntas estas que disparavam antecipações sobre o enredo, sobre sentimentos de personagens, sobre a organização da narrativa. Como ouvintes, os alunos puderam, provocados pelas questões colocadas, expressar a dialogia interior e a compreensão ativa que se dava durante o escutar a história.

No momento seguinte, que agora abordaremos, a professora lê a parte final da mesma história: “A princesa caiu imediatamente em sono profundo, e dizem que até hoje está lá adormecida. Parece que a notícia se espalhou, e os príncipes passam correndo pela frente do castelo onde ela dorme, assobiando e olhando para o outro lado.”

Após a leitura, a professora coloca algumas questões aos alunos. Eles verbalizam suas dúvidas e dão explicações. Enfim se colocam em relação a este final, mostrando o que entenderam a história. Vejam.

A1: Só não entendi um pouco esse final. P: Quem entendeu e pode explicá?

A2: É que... a notícia se espalhou tanto qué pra princesa não pegá príncipe na marra. Ele passa do outro lado, olhando pro outro lado.

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A3: Entendi! Sou encantado por aquela mulher... sô desencantado...odeio...

A4: Achava ela bonita, achô que ela era legal... Mas... sai daí!

A5: Não entendi uma coisa. O que que tem a vê... Porque a história chama o “Príncipe Desencantado”?

P: Por que, gente, desencantado?

A6: Porque tava encantado quando ele ia dá o beijo nela e quando ela acordô, ele viu que ela... ela era...

A7: Muito chata... metida... mimada.

Um aluno coloca que não havia entendido o final. A professora não responde; elabora uma pergunta para o grupo a partir desta colocação. Outro aluno diz, também, que não havia entendido o porquê da história se chamar “O Príncipe Desencantado”. A professora devolve a pergunta para o grupo: “Por que, gente, desencantado?”. Ou seja, ela continua trabalhando, basicamente, com um tipo de assistência aos alunos: pergunta/resposta (andaime vertical).

Nesse terceiro momento, encontramos a professora conversando sobre o final da história. Pudemos observar um diálogo entre os participantes empíricos e, também, destes com o autor da mesma – ausente fisicamente, mas presente por meio de seu texto. A leitura como dialogia é vivenciada em todos os momentos da atividade.

Na sequência, a professora Ariane Zanelli propõe mais atividades, agora com a leitura da segunda história do mesmo livro, "O sapo que foi e voltou", continuando a fazer perguntas para o grupo, perguntas estas que disparam antecipações sobre o possível enredo da nova história, sua organização e sobre sentimentos de seus personagens.

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“Era uma vez um sapo que morava sozinho numa lagoa que parecia rasa, mas era profunda e escura. Esse sapo não nasceu nessa lagoa porque ele era um príncipe transformado por uma bruxa (...) A bruxa (...) cantou uma música encantadora e PLIC, PLOC, PLUFT! O príncipe virou sapo e ficou morando naquela lagoa que você já sabe como era.”

P: (interrompe o fluxo narrativo e coloca uma questão) Aqui, ó: “Você já sabe

como era”. O autor/narrador tá falando com quem?

A1: Com o leitor. P: Com o leitor, né?

A professora, com sua pergunta, chama a atenção dos alunos para o fato de que há uma fala, no texto, dirigida explicitamente para os leitores. Ela centra a atenção dos alunos para esta marca textual e para a interlocução que esta estabelece. Neste caso, a professora marca, através de sua pergunta (“O autor/narrador está falando com quem?”), um recurso discursivo usado pelo escritor: “que você já sabe como era”. Os alunos que escutaram a história até aquele momento, já tinham ouvido a descrição da lagoa: “lagoa que parecia rasa, mas era profunda e escura”. A professora simetriza sua fala subsequente com a resposta dada pelos alunos, fortalecendo-a como adequada (Como o leitor, né?). Pensamos que tal postura, além de evidenciar o dialogismo do texto escrito, leva os alunos a usarem também esse recurso em suas narrativas, o que procuraremos observar em uma posterior análise dos textos.

Além disso, ela procura evidenciar, como veremos no fragmento abaixo, uma outra antecipação feita pelo escritor desta história. Vejam.

(Leitura, pela professora) “Muitos anos depois, ele ainda estava lá, coaxando,

infeliz e pensando nas coisas que deixou de fazer por não ser mais um príncipe. Até que um dia ele cansou de coaxar infelizmente (...) e resolveu dar um mergulho na lagoa, que era daquele jeito, lembra?”

A1: (em resposta à voz do narrador da história) Lembro...

(Continuação da leitura pela professora) “E não é que o bicho achou três pepitas de ouro lá no fundo? ‘Ulalá’, pensou ele, ‘estou feito! É agora que eu deixo esta lagoa para sempre!’ Dito e feito. Segurando uma das pepitas, com as outras dentro do bolso...”

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“P: (A professora interrompe a leitura) Ó, fulano! o narrador vai responder para

você. Ele escreve aqui, ó: “É, os sapos têm bolso, sim, que parece que são

rasos, mas são profundos e escuros, como aquela lagoa.”

(...)

O aluno acompanha a história, responsivamente. Está a tal ponto num movimento de compreensão ativa, que responde à pergunta formulada, pelo narrador da história, como se esta fosse enunciada pela própria professora. Ele replica como se estivesse em um diálogo face a face: “Lembro”, “Bolso?". A professora, por seu lado, escutando a pergunta do mesmo (“Bolso?”), aponta que o escritor antecipou esta sua pergunta e deu-lhe a resposta por meio do narrador, ou seja, aponta a reversibilidade responsiva leitor/autor. A professora sublinha a pergunta feita pelo aluno e lê a resposta no livro (“É, os sapos têm bolso, sim

(...)”), apontando, de certa forma, que este é um movimento necessário para

aquele que escreve: antecipar para responder.

“P: Vamos retomar e continuar com a leitura desta história:

“E não é que o bicho achou três pepitas de ouro lá no fundo! (...) Segurando as pepitas, com as outras dentro do bolso... é, os sapos têm bolso sim, que parece que são rasos, mas são profundos e escuros, como aquela lagoa, e lá dentro cabem coisas maiores que os próprios sapos! ... Como era mesmo? Ah! Segurando uma pepita, com as outras no bolso, o sapo (...)”

P: O que aconteceu que está escrito: “Ah! Como era mesmo?” A1: Ah! Ah! Ele (narrador) esqueceu.

A2: Não sabia onde tava. A3: Lembrando!

A narrativa, além de gerar, por meio das perguntas da professora, interlocução, é, também, objeto de conhecimento: Neste caso, o escritor do texto, para dar uma resposta, acaba levando o narrador a fazer uma pequena digressão. Para retomar o fio narrativo usa a expressão: “Como é mesmo?" "Ah!...” Este tipo de recurso (Como era mesmo? Onde eu estava?), usado em muitas histórias infantis, aparece em muitas narrativas de alunos, das quais nos ocuparemos posteriormente. Pensamos que a ênfase dada para tal recurso, leva as crianças a se utilizarem do mesmo quando no papel de produtores de textos.

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Estes alunos, enquanto leitores (ouvintes), no exercício de compreender ativamente, são responsivos e, tal responsividade, aponta o outro, aquele que escreve, como alguém que antecipa perguntas, responde, se preocupa em estruturar seu texto, dá pistas sobre o que vai escrever por meio das titulações, supõe que o leitor tenha certos conhecimentos, entra em relação com este explicitamente, no caso destas histórias.

A professora atua, na maioria das vezes, usando o modelo pergunta/ resposta e modelagem para dar assistência aos alunos. Através deste padrão interativo, pensamos, gera interlocução entre os alunos, proporciona a “expressão para o nós” do diálogo interior, a troca de informações; proporciona a expressão de vozes constitutivas do universo discursivo dos alunos, estimula a compreensão ativa, proporciona a constituição de sentidos e trabalha, pensamos, com uma das condições de produção, dentre outras, da narrativa escrita: a constituição do leitor virtual.

Ao longo da leitura dos dois contos, vimos como os alunos se basearam em seus conhecimentos sobre os contos tradicionais, como se apoiaram nessa experiência, para poder compreender a nova história; como contaram com esse repertório para serem responsivos ao texto. Vimos como o próprio escritor da história contava com essa experiência, com esse conhecimento do leitor, para o entendimento e apreciação de seu conto.

Podemos observar, também, no movimento dialógico estabelecido pela professora, que os alunos não só colocam dúvidas, como fazem perguntas, dão respostas, ou seja, o padrão interativo da professora é, também, utilizado, por eles, em suas interações. Temos perguntas que revelam um querer entender e respostas que indicam a conversa, o diálogo da criança que ouve o conto, com o escritor da história.

A partir das histórias lidas, pudemos notar que se realiza uma conversação em dois níveis: entre os parceiros empíricos, alunos e

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professora, e entre todos os participantes do grupo e o escritor ausente fisicamente, mas presente por seu enunciado escrito.

As perguntas formuladas são, em sua maior parte, da professora ou para a professora, aquela que está mediando um diálogo em ausência e, por isso mesmo, pensamos, está apontando e fazendo da leitura um diálogo. Ela estimula a compreensão ativa dos alunos e aponta o texto escrito como um diálogo entre aquele que escreve e aquele que lê e vice e versa.

Pensamos que, se esse movimento de diálogo, através do texto, está sendo constituído pelos alunos, o mesmo poderá ocorrer quando eles produzirem a sua narrativa escrita. Ou seja, o aluno, a partir de sua vivência como leitor ativo, poderá se orientar, quando escrever, pela figura de um leitor que, como ele, faz perguntas, ouve respostas, tem certos conhecimentos. Como escritor, poderá começar, também, a antecipar questões e a respondê-las com anterioridade; começará a levar em conta certo universo discursivo de seu leitor.

Procuraremos observar, posteriormente, se há, nas narrativas escritas dos alunos, este movimento dialógico, ou seja, se há antecipação e pressuposição em relação a um possível leitor. Procuraremos observar, nestas narrativas, as marcas destes movimentos dialógicos realizados em sala de aula.

Obs.: Para ler o artigo anterior, clique em Ensino de leitura II: Importância das interações professor-aluno no processo

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