O PATRIMÔNIO ARQUIVISTÍCO: ACERVOS PRIVADOS E INTERESSE PÚBLICO
CAMARGO, Célia Reis*. MOLINA, Talita dos Santos**.
Resumo:
O estudo sobre a utilização de fontes privadas no Brasil vem desde o início da década de 1970. No entanto, a lei brasileira que considera alguns arquivos privados de interesse público tem somente dezenove anos (1991). Deste modo, este artigo procura discutir a importância destes arquivos considerados de interesse público e social para o governo brasileiro e, conseqüentemente, qual o tipo de cuidado que o governo está oferecendo a estes documentos decretados na Legislação Arquivística Brasileira - CONARQ como de interesse público e social.
Palavras-chave: Arquivo Privado, Legislação Arquivística, Patrimônio documental. Abstract:
The study about the utilization of privy fountain in Brazil come since the beginning of decade of 1970. As it were the law brazileira about consider some archives privates of interest public have only nineteen years (1991). So on, this article search to discuss the importance theses archives considered of interest public and social from the govern brazileiro and consequently what type of careful of govern it propose the its documents decree in Legislation Archive Brazileira – CONARQ how of interest public and social.
Key-words: Particular Archive, Recording of Legislation, Documental Patrimony.
A proposta de trabalho aqui apresentada é um desdobramento da pesquisa de Iniciação Científica realizada durante o ano de 2009, financiada pela Fapesp. Nele foi discutida a questão dos arquivos pessoais como objeto de pesquisa e como fonte para a pesquisa histórica. Analisamos o acervo documental de Clóvis Moura (1925 – 2003) para produzir o inventário do arquivo e o catálogo preliminar da produção intelectual de seu titular, apresentando, na conclusão da pesquisa, um perfil do arquivo e de seu teor informativo a partir destes instrumentos.
Do mesmo modo, este artigo pretende dar continuidade aos nossos estudos sobre os arquivos no universo da pesquisa historiográfica. No entanto, teremos como foco principal os arquivos particulares. Nossa análise está voltada para os arquivos privados declarados de interesse público pelo CONARQ – Conselho Nacional de Arquivos, mecanismo que, na esfera dos arquivos, equivale ao tombamento de bens culturais realizados pelos órgãos de proteção ao patrimônio cultural.
Na década de 1930 com o surgimento da Escola dos Annales, os documentos privados começaram a ganhar importância como fonte de pesquisa histórica, principalmente no que se refere aos acervos pessoais, como os diários e a correspondência e os demais documentos acumulados por um indivíduo. Nesse mesmo período, no Brasil, no ano de 1937, Getúlio Vargas assina o Decreto Lei nº 25, que organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional. A partir daí, diversos atos legais foram elaborados no intuito de guardar e preservar a memória nacional.
A Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991, que dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados e dá outras providências, institucionaliza tais arquivos como integrantes da identidade nacional brasileira. Deste modo, até este início do ano de 2010, vários arquivos privados foram considerados de interesse público para a memória da nação brasileira.
Dessa forma, vemos que entre os pesquisadores os arquivos privados têm inspirado cada vez mais os trabalhos acadêmicos, o que tem motivado a publicação freqüente de instrumentos de pesquisa que possibilitam acesso a seus conteúdos. Dentre os arquivos privados, os arquivos pessoais são os mais procurados, considerando o lugar que as histórias pessoais e intelectuais têm ocupado na pesquisa social e historiográfica, aprofundando diversas reflexões sobre o indivíduo na História. Bellotto assim define sua importância e potencialidade:
O caminho dos arquivos é aberto aos historiadores, aos sociólogos, aos antropólogos, aos arquivistas, aos literatos, aos detetives, aos policiais, aos juristas, aos educadores, aos médicos, aos psicólogos, aos psicanalistas, aos jornalistas, e a outros que, pelas características de sua atuação profissional, têm maiores condições e oportunidades de realizar essa espécie de viagem ao interior do pensamento de uma pessoa, e a razão de ser de ações e atitudes suas, das quais, de outro modo, só se conheceria a finalização. (BELLOTTO, 1998, p. 201)
Dessa forma, a partir da bibliografia pesquisada e dos levantamentos sobre a preservação, conservação e organização dos arquivos privados, nesta comunicação pretendemos elucidar qual o objetivo e princípios para a consolidação de uma política de governo inserida no campo mais amplo da conservação do patrimônio arquivístico brasileiro. Segundo Bellotto, temos a necessidade de levantar o perfil desses arquivos e divulgá-lo, pois, segundo ela, “Os arquivos privados ainda são, no Brasil, uma questão de “causa”, ainda necessitam que se levantem bandeiras”.
Pretendemos nessa comunicação debater as seguintes questões:
• O papel e a importância de tais arquivos no universo do patrimônio arquivístico nacional.
• Compreender a origem e o ideário da legislação que dispõe sobre os arquivos privados, bem como o perfil dos arquivos declarados de interesse público; Em suma, por esta comunicação possuir um caráter interdisciplinar - situando – se entre a História, a Arquivologia e o Patrimônio Arquivístico, a fonte de pesquisa para muitos estudiosos é, também, o objeto de estudo. Portanto, essa análise se revela de suma importância para ser discutida neste Encontro Regional que tem como tema principal “MEMÓRIA E PATRIMONIO”, já que tal assunto se mostra de suma relevância para um entendimento maior dessa questão entre o Patrimônio Cultural e o Patrimônio Arquivistico. Como diz a própria Marly Rodrigues:
Por meio do patrimônio as sociedades criam formas de representação do passado nas quais se justificam valores que fundamentam as relações sociais no presente; ele é um lugar de memória que permite compor imagens que sustentam identidades individuais e coletivas. É, por isso, um campo de disputas simbólicas no qual se refletem as possibilidades de cada segmento social apropriar-se do passado e manter ou conquistar o acesso pleno aos direitos sociais, o que o torna também um lugar de esquecimento, de exclusão, em constante mudança(RODRIGUES, p. 145)1. BIBLIOGRAFIA
ANDERSON, Benedict. Comunidades Imaginadas: Reflexões sobre a origem e difusão do nacionalismo. São Paulo: Cia. das Letras, 2008.
1 RODRIGUES, Marly. Imagens do passado: a instituição do patrimônio em São Paulo: 1969-1987.
ARANTES, Antonio Augusto (org.). Produzindo o Passado: Estratégias de Construção do Patrimônio Cultural. São Paulo: Brasiliense/Secretaria de Estado da Cultura, 1984.
BRASIL. ARQUIVO NACIONAL. CONARQ. Legislação Arquívistica Brasileira. Atualizada em 2009. Publicação Digital.
BELLOTTO, Heloísa Liberalli. Arquivos permanentes: tratamento documental. Rio de Janeiro: FGV, 4º Ed., 2007.
CAMARGO, Célia Reis. A Margem do Patrimônio Cultural. Estudo sobre a rede institucional de preservação do patrimônio histórico no Brasil (1838-1980). Assis, UNESP, 1999. Tese de Doutorado em História.
___________________ [et al]. “Centro de Documentação e Pesquisa Histórica: uma trajetória de décadas”. In: CPDOC 30 anos. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2003, p. 21-44.
CHOAY, François. A Alegoria do Patrimônio. São Paulo: Editora UNESP, 2006.
DICIONÁRIO Brasileiro de Terminologia Arquivística. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2005.
FONSECA, Maria C. L. O Patrimônio em Processo. Trajetória da política federal de preservação no Brasil. Rio de Janeiro, Ed. UFRJ, IPHAN, 2005.oi
GOMES, Angela de Castro. “Nas malhas do feitiço: o historiador e os encantos dos arquivos privados”. In: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v.11, n.21, 1998, p.121-127.
GONÇALVES, José Reginaldo dos Santos. A Retórica da perda: os discursos do patrimônio cultural no Brasil. Rio de Janeiro, UFRJ / SPHAN, 1996.
HEYMANN, Luciana Quillet. Velhos problemas, novos atores: desafio à preservação dos arquivos privados. Rio de Janeiro, CPDOC, 2005.
MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. “Memória e cultura material: documentos pessoais no espaço público”. In: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v.11, n.21, 1998, p.89-103.
NORA, Pierre. Les lieux de mémoire. Paris, Seuil, 1984-1992.
RIBEIRO, Wagner Costa; ZANIRATO, Sílvia Helena. “Patrimônio Cultural: a percepção da natureza como um bem não renovável”. Revista Brasileira da História. São Paulo, vol. 26, nº 51, PP. 251-262.
RODRIGUES, Marly. Imagens do Passado: a instituição do patrimônio em São Paulo, 1969-1987. São Paulo: Ed. UNESP, Imprensa Oficial, CONDEPHAAT, 2000.
SANTOS, Marisa Velloso. O Tecido do Tempo: a idéia de patrimônio cultural no Brasil (1920-1970). Brasília: UNB, 1992. Tese de Doutorado em Antropologia.
SILVA, Zélia Lopes da (Org.). Arquivos, Patrimônio e Memória: trajetória e perspectivas. São Paulo, Ed. UNESP / FAPESP, 1999.
________________________________________________________________________
* Professora Adjunta da Faculdade de Ciências e Letras de Assis e Coordenadora do Centro de Documentação e Memória – CEDEM da Universidade Estadual Paulista – UNESP.
** Graduada em História pela Faculdade de Ciências e Letras de Assis – UNESP, atualmente é professora da rede estadual de São Paulo.