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Data do documento 14 de março de 1996

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Processo 0095852 Data do documento 14 de março de 1996 Relator Silva Pereira

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Nulidade processual > Sucessão de leis no tempo > Doença > Arrendatário

SUMÁRIO

I - A arguição de nulidade só é admissível quando a infracção processual não está ao abrigo de qualquer despacho judicial, porque, se há um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou a omissão de um acto ou de uma formalidade, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas sim o recurso.

II - Havendo sucessão de leis no tempo, a lei que se aplica à resolução do arrendamento é a vigente ao tempo dos factos alegados como integrando a causa de resolução desse contrato.

III - A doença do arrendatário, para ser impeditiva da eficácia resolutiva da falta de residência permanente, tem de revestir-se da inviabilidade e insuperabilidade que caracterizam o caso de força maior, e não pode ser crónica de modo a tornar o impedimento definitivo, pelo que o inquilino tem de provar, além da doença, a transitoriedade desta, convencendo que pode e quer regressar à casa arrendada.

TEXTO INTEGRAL

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

I - No Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, em acção de despejo distribuída ao 17 Juízo, (J) demandou (D), pedindo que este seja condenado a despejar imediatamente o 3 andar direito do prédio (Z), em Lisboa, porquanto sendo ele arrendatário do andar referido, destinado a habitação, há muito mais de um ano ali não come, não dorme e não recebe os seus amigos.

Após vicissitudes que ora irrelevam, o R., que é inabilitado, veio a ser citado na pessoa do seu curador, (L). Defendendo-se, concluíu pela improcedência da acção, para o que, em resumo, excepcionou a caducidade do direito de accionar com base na falta de residência permanente e alegou ainda que a falta de residência no arrendado se deve ao facto de, por doença, ter sido internado em estabelecimento de saúde, mas agora, embora subsistam os motivos de saúde que o levaram a ausentar-se, já pode habitar com estabilidade o andar e aí reinstalar o centro da sua vida.

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Respondeu o A., concluindo pela improcedência das excepções.

O processo foi saneado e condensado, tendo o R. reclamado, sem êxito, da especificação e do questionário.

No momento próprio o R. requereu a prestação do depoimento pessoal do A. e de sua mulher, (M), a cada um dos quesitos, ou, não sendo admitida a audição desta como parte e como testemunha, a notificação da mesma para depor a todos os quesitos, tendo sido proferido despacho que indeferiu o requerido quanto à mulher do A., por ela não ser parte e não poder depor como testemunha, e admitiu o depoimento pessoal do A., limitado aos factos pessoais ou de que ele devesse ter conhecimento, contidos nos quesitos 1 a 3. Deste despacho interpôs o R. dois recursos, um, a fls. 122, na parte em que se exclui que o A. seja ouvido ao quesito 10 e outro, a fls. 123, na parte em que se indefere o depoimento da mulher do A., sendo os recursos recebidos como agravos e com subida diferida.

O R., que requereu também exame médico à sua pessoa, requereu depois a não admissão dos quesitos 1, 2 - a) e 2 - b) apresentados pelo A., o que foi indeferido.

Tal indeferimento motivou novo recurso do R., interposto a fls. 136, também este admitido como agravo, a subir diferidamente.

Interpôs ainda o R. dois recursos, um, não admitido, do despacho que marcou dia e hora para o julgamento, e outro, a fls. 194, do despacho que deu sem efeito o exame médico requerido, que, tal como os três anteriores admitidos, foi recebido como agravo e com subida diferida.

Realizada a audiência de julgamento perante juiz singular, foi depois proferida a sentença que, julgando improcedentes as excepções e procedente a acção, decretou o despejo.

Da sentença apelou o R., tendo, nas suas alegações, respeitantes aos indicados primeiro, terceiro e quarto recursos de agravo, bem como à apelação, formulado as seguintes conclusões:

1 - O quesito 10 era susceptível de ser objecto de depoimento de parte pelo A., visto que conhecia pessoalmente parte dos factos, pelo que uma vez requerido, deveria ter sido permitido;

2 - O despacho recorrido, porque não o permitiu, violou os arts. 553 n. 3 e 554 do Código de Processo Civil, doravante designado por CPC, e porque a irregularidade é susceptível de influenciar a decisão da causa deve-se anular todo o processado desde então, nos termos do artigo 201 do CPC.

Quanto ao terceiro agravo, interposto a fls. 136.

1 - Não se formou qualquer caso julgado sobre a admissão dos quesitos do A. para o arbitramento, pelo que foram violados os artigos 678 e 517 do CPC;

2 - Nem se decidiu até à sentença a admissão ou não desse quesito, sendo questão que ficou por decidir; 3 - À excepção do último, os quesitos do A. não deverão ser admitidos, sob pena de violação radicada nos artigos 137, 138, 264 n. 2 e 650 n. 1, para além dos artigos 511 n. 1 e 513, este, nesse aspecto, confirmado pelo artigo 575, pelo que o despacho recorrido deve ser revogado.

Quanto ao quarto agravo, interposto a fls. 194.

1 - O R. faltou uma única vez ao exame e do seu não comparecimento não resultou para ninguém alguma consequência negativa ou prejuízo de difícil reparação ou irreparável;

2 - Ao faltar, o R. requereu nova data para o exame, cujo resultado seria o mesmo, e o Tribunal não tinha fixado data limite para a consumação da diligência;

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3 - O R. declarou apenas que não desejava comparecer ao exame marcado para aquele dia, naquele local, propor um modus faciendi distinto e legítimo, nunca se recusando submeter-se ao exame;

4 - O R., conforme se prova dos autos, é inabilitado para dispor ou administrar os seus bens, não tem capacidade jurídica para que os seus actos e declarações de vontade tenham relevância jurídica bastante para interferir na administração dos seus bens, e, não podendo administrar o seu património, não pode minimamente administrar o processo judicial em qualquer das suas vicissitudes susceptíveis de se repercutir no seu património, como seria o caso das declarações do R. com o sentido (errado) que o Tribunal a quo lhe pretende atribuir;

5 - Ao seu acto de não deslocação ao exame qualquer que ele seja e ao que quer que tenha sido declarado por ele, não pode ser reconhecida qualquer relevância como o Tribunal a quo lhe reconheceu, sobretudo relevância em função do próprio conteúdo da vontade;

6 - A fls. 177, numa devida interpretação unitária, não se nega, antes se confirma a vontade de pedir o exame, sendo frequente o IML fazer exames externos;

7 - A falta ao exame deveu-se a justo impedimento, por razões de saúde, que devia ser respeitada, oportunamente invocado, o que devia permitir nova ocasião para a diligência que o despacho recorrido negou, já que seria absurdo que a lei previsse que, independentemente dos motivos da falta, esta implicaria sempre a eliminação do arbitramento;

8 - Perante um obstáculo à realização da justiça

(o A. também tinha direito ao arbitramento), o Tribunal não deve desistir, mas removê-lo, nos termos do artigo 263 do CPC, pelo que, tendo em conta a saúde do R., devia-se tê-lo forçado a ser examinado, marcando-se nova data;

9 - O artigo 600 n. 3 do CPC faz relevar a inconveniência da deslocação e o n. 2 do mesmo preceito não impõe que os exames se façam no IML, mas apenas pelo IML, tendo-se provado inconveniência na deslocação;

10 - Havia caso julgado no despacho que ordenava o exame, não tendo o Tribunal poder jurisdicional para voltar atrás;

11 - Falta de poder mais manifesta dado que, ao abrigo do artigo 571 do CPC, só se a parte contrária anuir é que se pode decidir a anulação do arbitramento;

12 - Uma parte requerente do arbitramento como o réu não pode desistir dele sem consentimento da outra parte, e o despacho recorrido, ao decidir, dispensando esse consentimento, julgou contra o citado artigo 571;

13 - A tese subjacente ao despacho recorrido implicaria que, contra lei expressa, a requerente do arbitramento pudesse afinal provocar a sua não realização contra a vontade da parte contrária;

14 - O despacho recorrido imputa ao R. actos ou factos que este não praticou ou declarou, ou que declarou com um sentido absolutamente diverso, pelo que o arbitramento devia-se ter realizado na modalidade requerida pelo R.;

15 - Deve ser revogado o despacho e todo o processado posterior, uma vez que a irregularidade até interfere com a prova testemunhal sobre esses quesitos, fazendo-a render e adquirir novos sentidos sobre um novo cenário de prova já sustentada por peritos, sendo susceptível de influir não só no exame e decisão

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da causa - artigo 201 do CPC - , como também na apreciação do depoimento das testemunhas. Quanto à apelação.

1 - A sentença padece dos vícios resultantes de não ter sido observado o que se alega nos agravos;

2 - O depoimento de parte do A. não foi escrito, ao contrário do que impõe o artigo 563 n. 1 do CPC, irregularidade que é susceptível de fazer relevar a sua prova de modo diferente para os efeitos das respostas aos quesitos e é susceptível de ter prejudicado os direitos processuais do R. para fazer valer essa prova, quer nas respostas aos quesitos, quer na sentença, quer no recurso, para fazer aplicar o artigo 712 do CPC, havendo, assim, que repetir o julgamento quanto aos quesitos sobre que o A. deva depor;

3 - A resposta ao quesito 1 é lacunar, porque o que é susceptível de prova são factos concretos e "alguns" não é um facto concreto, o facto concreto são pessoas concretas identificáveis, padecendo a sentença do vício que resulta de assentar numa prova irregular;

4 - A resposta ao quesito 1 foi dada sem tomar em consideração o depoimento de uma testemunha a fls. 150 e 151, assim viciando decisivamente a matéria julgada provada e a própria sentença, havendo, por isso, de produzir-se novamente a prova testemunhal sobre os 3 primeiros quesitos e, desta vez, considerar-se a referida prova;

5 - Há contradição insanável entre as respostas aos quesitos 1 e 2, já que ao quesito 2 deu-se como provado que o A. sabia que os alienantes sabiam de certo facto, quando ao quesito 1 se não deu por provado que os alienantes sabiam do facto, havendo necessidade de repetição da prova quanto aos dois quesitos em causa, a menos que o Tribunal ad quem, no pressuposto de que a não prova do quesito 1 não implica a prova do contrário e a resposta ao quesito 2 implica a prova quesito 1, no uso da faculdade do artigo 712 do CPC dê por provado o quesito 1 e decida a questão a favor do R.;

6 - A sentença declarou a necessidade de o R. provar que a doença causou a desabitação permanente, mas o R. declarou sempre que a doença em estado não agravado não impede a sua residência no locado, não tendo, por isso, de provar o contrário do que invoca;

7 - Como é óbvio, só releva para obstar ao despejo por falta de residência permanente a doença na medida em que impeça o inquilino de residir no locado, e daí que seja irrelevante a cronicidade ou não da doença, mas sim o carácter temporário do impedimento resultante da doença;

8 - O impedimento do R. em habitar com carácter permanente no locado consistiu no estado agravado doença, e iniciando-se o impedimento antes de 1985 e prolongando-se até data indeterminada de 1989, provada ficou a reversibilidade e o carácter temporário do impedimento, pelo que, decidindo e pressupondo o contrário, a sentença é ilegal;

9 - É indiferente o carácter mais ou menos duradouro do impedimento desde que seja temporário;

10 - No despacho que decidiu a reclamação contra a especificação e o questionário, o Tribunal a quo impediu a formulação do quesito em que se pretendia fazer prova directa da causalidade entre o impedimento resultante do agravamento da doença e a falta de residência permanente, em termos que aquele tivesse implicado a sua saída de casa com carácter permanente;

11 - Tal como impediu um quesito em que, provando que enquanto doente habitou a casa, o R. deixaria provado que a doença em estado não agravado não obsta à residência permanente assim podendo a doença ser crónica e obstar ao desejo;

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12 - Não poderia, pois, a sentença vir, como veio, a exigir a prova daquilo que o próprio Tribunal não deixou quesitar, para que a defesa do R. fosse procedente;

13 - Haverá que formular os dois respectivos quesitos reclamados, seguindo-se os ulteriores termos processuais, porque todo o processado desde a não formulação desses dois quesitos está viciado de irregularidade que é susceptível de influir na decisão e exame da causa - artigo 201 do CPC;

14 - Com a prova feita aos quesitos 4 a 7 demonstra-se a relação directa entre a situação de necessidade de internamento correspondente ao agravamento da doença, apurado entre antes de 1985 e 1989, e a desabitação permanente, de modo que não havendo essa situação forçosamente o R. pode voltar a habitar, mas a sentença não respeitou a prova feita e as regras processuais;

15 - Para decidir a procedência da defesa do R. em função das conclusões 10 e 11, a sentença não podia ter acusado a falta de prova que antes o Tribunal frustrou e devia ter reconhecido como provada a causalidade, pelo que desrespeitou as regras processuais e a prova produzida;

16 - O tribunal não podia ter, sem mais, pressuposto a doença do R. como definitiva e crónica, porque não o é, nem processualmente será admissível pressupô-lo, nem, evidentemente, poderia ter pressuposto e relevado a doença para lá da exclusiva medida em que constitua impedimento à habitação permanente, pelo que a sentença extravasou o que foi provado e alegado;

17 - Provou-se que o impedimento de residência permanente, constituído pelo agravamento da doença com tratamentos que não podiam ser prestados em casa, subsistiu até data indeterminada de 1989 e que, portanto, foi temporário, mas, se os autos não o revelassem, o R. oportunamente reclamou para que se formulasse um novo quesito, justamente para determinar directamente se poderia ter possibilidade de no futuro regressar e residir no locado, o que, tendo-lhe sido negado, não poderia ser motivo de improcedência da sua defesa, pelo que cumpre repor a dupla ilegalidade;

18 - há que formular novo quesito para se produzir prova sobre se o impedimento do R. residir é temporário, estando viciado todo o processado posteriormente à irregularidade de não formulação dos quesitos na medida em que influenciou e era susceptível de influenciar a decisão da causa;

19 - Era ónus do R. alegar e provar a excepção do impedimento em resultado da doença apenas para o período de falta de residência em causa, e era ónus do A. determinar qual este período em que imputava ao R. a falta de residência permanente;

20 - O A. colocou em causa um período sem termo inicial certo "desde há muito mais de um ano" sobre a data da petição inicial, e, claro, que o R. não tinha que se defender para o período desde o início da sua vida, bastando-lhe defender-se para um período que não seja mais do que razoável ou o necessariamente resulta da causa de pedir e do pedido;

21 - O ónus de o A. determinar esse período com um termo inicial certo não tem de sobrecarregar o R., porque a indefinição que criou é uma limitação do A., o que implica que a defesa a uma das situações abrangidas plausíveis deve ser bastante;

22 - A defesa do R., que incidiu para o período pelo menos até 1984 "algum tempo antes de 1985", cobriu perfeitamente o que razoavelmente se poderia entender por "desde há muito mais de um ano" sobre 1988, e, no mínimo, decerto satisfez a defesa quanto pelo menos uma das situações possíveis abrangidas por aquela expressão, situações que o A. não limitou, e por isso se tem de aceitar aquela defesa como

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suficiente, já que o A. não pode invocar que algum tempo antes de 1985 não é desde há muito mais do que um ano;

23 - Seja porque se baseia em factualidade que não foi provada com observância das regras processuais, seja porque muita factualidade não foi devidamente objecto de prova, seja por vícios lógicos ou de direito no que pressupôs e no que se fundamentou, a sentença é consequência e encerra as várias violações de lei concluídas nesta apelação e nos agravos;

24 - Torna-se inevitável anular todo o processado após a resposta do A. à reclamação do R. contra a especificação e o questionário, se não for entendido poder o R. ser já absolvido.

Contra-alegou o A., defendendo a manutenção das decisões recorridas. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Face ao disposto no artigo 710 n. 1 do CPC, caberá apreciar os agravos pela ordem da sua interposição (com excepção do interposto em segundo lugar que, por falta de alegação, deve ser julgado deserto, nos termos do artigo 690 n. 2 do CPC) e, por fim, no caso de nenhum dos agravos ser provido, haverá, então, que apreciar o recurso de apelação.

II - Antes de entrar na apeciação dos vários recursos, e como que para os expurgar de um mal geral, cabe dizer que todas as invocações que o Recorrente faz do artigo 201 do CPC são de todo em todo desadequadas.

O artigo 201 contem as regras gerais sobre a nulidade dos actos. E, como mostram as respectivas conclusões, em três dos recursos, o recorrente defende a ideia de que as decisões recorridas cometeram irregularidades que influem na decisão da causa, pelo que, nos termos deste artigo 201, deve-se anular todo o processado desde a correspondente decisão.

Conforme ensina J. Alberto dos Reis (in "Comentário ao Código de Processo Civil", 1945, Vol. II, 507), a arguição de nulidade só é admissível quando a infracção processual não está ao abrigo de qualquer despacho judicial, porque se há um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou a omissão de um acto ou de uma formalidade, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas sim o recurso. E daí o velho postulado dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se.

Assim, e concretamente, a exclusão do quesito 10 no depoimento de parte do A., a não eliminação de quesitos apresentados pelo A. para o arbitramento e a não formulação de quesitos no questionário, poderão ser ou não ilegais, mas jamais serão actos a que possa aplicar-se a disciplina das nulidades. Para as invocadas ilegalidades em causa, porque devidamente impugnadas nos recursos interpostos, o regime é o que se segue: quanto aos agravos, conforme o n. 2 do citado artigo 710, se houver infracção, e esta influir na decisão da causa, o recurso será provido, o que tem como consequência a anulação dos actos posteriores ao acto ilegal, que dele dependam absolutamente; e quanto à apelação, nos termos do artigo 712 n. 2 do CPC, o entendimento de que não se formularam quesitos reputados indispensáveis para a boa decisão da causa, implicará a anulação parcial do julgamento (e não a anulação do processado após a resposta à reclamação contra a especificação e o questionário).

III - 1. Primeiro agravo, interposto a fls. 22.

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quesito 10.

Com interesse para a decisão deste agravo, cabe indicar o teor dos quesitos 9 e 10, já que este se subordina ao anterior: no quesito 9 pergunta-se "O que só não acontece ainda por ter sido ocupada pelo senhorio na sequência do despejo efectuado nestes autos?".

O R. requereu o depoimento de parte do A. a todos os quesitos e pelo despacho recorrido foi admitido esse depoimento, mas "limitado aos factos pessoais ou de que deva ter conhecimento (artigo 554 n. 1 do CPC) -quesitos 1 a 3", razão por que o quesito 10 foi implicitamente excluído do depoimento, e é contra essa exclusão que o R. reage.

Efectivamente o artigo 554 n. 1 do CPC dispõe que o depoimento de parte só pode ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento. Na ausência da cominação por falta de comparecimento desaparecida com a Reforma de 1961 (cfr. J. Alberto dos Reis, in "Código de Processo Civil Anotado", 1951, Vol. IV, 87), a norma do artigo 554 n. 1 justifica-se pelo objectivo do depoimento de parte, que é o de provocar a confissão, ou seja, de conseguir que o depoente reconheça a realidade de um facto que lhe é desfavorável. Por isso, o depoimento de parte só tem utilidade quanto aos factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento.

E, como escreveu J. Alberto dos Reis (in op. loc. cit.) ... "Saber se o facto é de molde a dever ser conhecido do depoente, é apreciação confiada ao prudente arbítrio do juiz; este atenderá à natureza do facto e às circunstâncias em que se produziu se deverá considerar-se do conhecimento do depoente." ...

Argumenta o recorrente que o quesito 10 é composto por uma dupla factualidade (a ocupação da casa pelo senhorio e a não instalação nela pelo R., por causa da ocupação), devendo o A. ter conhecimento que o locado foi ocupado por ele na sequência do despejo ordenado nestes autos.

Embora seja indiscutível que o A. tem conhecimento da ocupação da casa, não assiste razão ao agravante. O questionário destina-se a apurar factos controvertidos, e apenas estes devem ser vertidos nos quesitos. E, para que os quesitos sejam inteligíveis e tenham conteúdo, nada obsta a que na sua redacção entrem realidades conhecidas. Por isso, o quesito tem de ser interpretado no seu contexto no questionário e, também, no processo, para que se saiba qual o seu objectivo, qual o facto controvertido que nele se tem em vista.

No caso, o objectivo ou um dos objectivos do quesito 10 não é saber se a casa está ocupada pelo senhorio na sequência do despejo efectuado nestes autos. A ocupação do locado pelo senhorio na sequência do despejo ordenado nestes autos, tem necessariamente de resultar destes mesmos autos, como resulta, designadamente do apenso de execução da sentença que foi anulada no recurso de revisão.

Essa ocupação não é facto controvertido. Antes, trata-se de facto do conhecimento do Tribunal, por virtude das suas funções, não carecendo sequer de prova, como se alcança do artigo 514 n. 2 do CPC.

O que se indaga no quesito 10 vai um pouco além do perguntado no quesito 9, mas, no fundo, a ideia é a mesma: no quesito 9 pergunta-se se o estado de saúde do R. permite (no presente ou em futuro próximo) a instalação no locado, e no quesito 10 pretende-se saber se (no passado próximo, até ao momento da contestação) a falta dessa instalação foi determinada por outro motivo que não o estado de saúde do locatário. Na redacção do quesito 10 menciona-se a ocupação da casa pelo senhorio como ponto de referência, para se entender que o facto a averiguar é o de que o R. só não se instalou na casa por esse

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motivo (que bem podia ser outro, se alegado, o que importa é a referência) e não pelo seu estado de saúde.

Não sendo o estado de saúde do R., na perspectiva de ele se poder instalar no locado, facto de que o A. deva ter conhecimento, o seu depoimento de parte não é admissível.

Por conseguinte, bem se decidiu no despacho recorrido, não mercendo o agravo provimento.

2. Terceiro agravo, interposto a fls. 136. A questão posta neste recurso é a de saber se o despacho que admitiu os quesitos do A. para o arbitramento tem autoridade de caso julgado, em termos de posteriormente não poderem ser eliminados alguns desses quesitos.

Vê-se dos autos que:

- Na oportunidade do artigo 512 do CPC, a fls. 112 a 177, o R. requereu arbitramento, na forma de exame, à sua pessoa, na sequência do que foi proferido despacho a mandar notificar o A. para apresentar os seus quesitos, o que este fez por requerimento a fls. 120;

- Os quesitos do A. são, na parte que ora interessa, do seguinte teor: 1 - Desde bastante tempo antes de 1985 até Fevereiro de 1988 o estado de saúde de (D) impedia-o de viver em sua casa? Se a resposta é afirmativa: 2 a) Esse impedimento manter-se-ia mesmo que estivesse acompanhado por pessoa idónea? b) Em Fevereiro de 1988, considerando o seu estado clínico, seria previsível a cessação desse impedimento?; - A fls. 121, sobre o requerimento do R. a fls.112 a 117, foi proferido despacho que, além do mais, ordenou que se solicitasse ao Instituto de Medicina Legal (IML) a realização do exame requerido;

- A fls. 126 a 132, está outro requerimento do R., a pedir para que não sejam admitidos os quesitos 1, 2-a) e 2-b) apresentados pelo A., com a alegação de que são inúteis, por alheios ao questionário;

- Seguiu-se despacho a mandar notificar a parte contrária, que respondeu a fls. 134, opondo-se à não admissão dos quesitos;

- A fls. 135 foi então proferido despacho sobre o requerimento a fls. 126 a 132 que o indeferiu, com o fundamento de que o ... "Tribunal solicitou já o exame ao IML ... pelo que admitiu já os quesitos formulados, decisão que faz caso julgado formal ...".

Nos termos do artigo 672 do CPC, os despachos e as sentenças que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo.

É o que se chama o caso julgado formal, que imprime à decisão carácter de estabilidade, como ensina J. Alberto dos Reis (in "Código de Processo Civil Anotado", 1952, Vol. V, 157). Nas causas que admitem recurso ordinário, o caso julgado formal reduz-se ao fenómeno da preclusão, o que significa que não é lícito à parte vencida provocar a alteração da decisão mediante o uso de recursos ordinários.

Em todo o caso só há que pôr a questão de caso julgado formal quando se esteja perante uma decisão que explicitamente regule questões de carácter processual. É o que a lei quer dizer com "despachos ou sentenças que recaim sobre a relação processual". Não havendo decisão que aprecie em concreto uma dada questão processual e a regule, não se chega sequer a pôr a questão do caso julgado. Uma decisão que possa supor uma outra decisão implícita, só faz caso julgado na parte que

é explícita.

Como se extrai dos ns. 1 e 2 do artigo 572 do CPC, só a parte que requer o exame é obrigada a apresentar os quesitos a que os peritos hão-de responder. É que só com o conhecimento dos quesitos do requerente o

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juiz fica habilitado a julgar a pertinência ou não da diligência requerida. E se o juiz entende que a diligência não é impertinente ou dilatória, o que supõe uma análise dos quesitos do requerente do exame, manda notificar a parte contrária para apresentar os seus quesitos.

Se algum dos quesitos apresentados pelo requerente não versar sobre factos susceptíveis de prova não deve indeferir-se o exame. Nos termos do artigo 575, aplicável mutatis mutandis aos casos em que, nos termos do artigo 600 do CPC, o exame deva ser requisitado a estabelecimentos oficiais, no despacho em que solicite a realização do exame, o juiz declarará não escritos os quesitos que não devem ser respondidos, isso quer sejam apresentados pelo requerente, quer o sejam pela parte contrária.

Assim, o juiz deva providenciar para que os peritos não respondam a quesitos inúteis. Mas, se no despacho que mande solicitar a realização do exame o juiz não se debruçar expressamente sobre os quesitos, apreciando se os mesmos respeitam a matéria do questionário, é legítimo pensar que o juiz implicitamente aprovou os quesitos, como é legítimo pensar que, por distracção ou outro motivo, o juiz não cumpriu esse dever. Então, apenas fica a certeza de que o juiz mandou solicitar o exame, mas não que tenha analisado os quesitos em ordem a declarar não escritos os que não devem ser respondidos. E a estabilidade da decisão não pode abranger a admissão, ainda que implícita, dos quesitos.

No caso em apreço, como decorre dos factos acima decritos, não houve qualquer decisão a admitir expressamente os quesitos do A., embora, sem dúvida, se tenha mandado solicitar ao IML a realização do exame requerido. Só que, como se viu, na falta de uma apreciação expressa dos quesitos, a decisão que manda solicitar o exame não abrange a aprovação dos quesitos pelo juiz.

Deste modo, o agravante tem razão. Nenhuma decisão explícita houve a admitir os quesitos do A., pelo que não há que falar em caso julgado. A decisão havida, e cujo trânsito poderia estar em causa, limitou-se a solicitar ao IML a realização do exame, sem fazer qualquer apreciação aos quesitos apresentados pelo A. Por isso, uma eventual reprovação dos quesitos do A., como o R. requereu, não entraria em contradição com a decisão que mandou solicitar a realização do exame.

No entanto, daqui não se segue que o recurso deva ser provido.

Em primeiro lugar, e admitindo, como mera conjectura, que os quesitos são alheios ao questionário e inúteis, a infracção cometida nenhuma influência pode ter no desfecho da causa. É que a sentença só pode considerar os factos articulados pelas partes, como dispõe o artigo 664 do CPC, aplicável às relações ex vi do artigo 713 n. 2 do mesmo código.

E, em segundo lugar, não havia razões para deferir o requerimento do R. a pedir a não admissão daqueles quesitos.

Os quesitos para os peritos responderem são perguntas concretas relativas a factos do questionário. Não têm necessariamente de coincidir, e em regra não coincidem, com os quesitos do questionário. Melhor dizem Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in "Manual de Processo Civil", 586, nota 1: "Os quesitos podem, obviamente, não incidir de modo directo sobre os factos do questionário, mas sobre factos instrumentais (que permitam, com base nos dados da experiência comum ou dos conhecimentos especializados dos peritos, tirar ilações acerca deles)." ...

No caso, indaga-se no questionário: quesito 4, se bastante tempo antes de 1985, o R. viu agravada subitamente a sua doença; no quesito 5, se foi então internado num estabelecimento de saúde, onde foi

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submetido a permanente e vigoroso controlo médico e paramédico activo, que não podia ser prestado em sua casa, no quesito 6, se o R. permaneceu em tratamento e serviços de saúde até meados de 1989, e no quesito 7, se esses serviços e tratamento não podiam ser prestados na casa arrendada.

Visto que a acção foi proposta em 17/02/1988, os quesitos apresentados pelo A., acima descritos, nada têm de inúteis ou de alheios ao questionário.

Pelo contrário, versam sobre factos instrumentais de inegável interesse para esclarecimento do juiz no julgamento da matéria de facto, nomeadamente para a resposta aos quesitos 4 a 7 do questionário.

Portanto, ainda que se discorde do fundamento invocado no despacho recorrido para se indeferir o requerimento em que o R. pediu a eliminação dos quesitos 1, 2-a) e 2-b) do A., tal requerimento sempre seria de indeferir, pelo que o agravo não pode ser provido.

3. Quarto agravo, interposto a fls. 194.

Neste recurso a questão fundamental é a de saber se o despacho recorrido podia dar sem efeito o exame requerido.

Com interesse apura-se que

- Por sentença de 24/01/1975, da 5 Vara do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, transitada em julgado, (D) foi julgado inabilitado, por anomalia psíquica, para dispor dos seus bens, quer a título gratuito quer oneroso, bem como a administrá- -los, dela resultando que ao curador são atribuídos poderes de admnistração;

- O IML, por ofício junto a fls. 175, informou que o R. devia comparecer em 05/07/1993, pelas 9 horas, no Serviço de Clínica Médico-Legal do mesmo Instituto, a fim de se proceder ao exame solicitado;

- Em requerimento entrado na Secretaria Judicial em 09/07/1993, a fls. 177, informa-se que o R. faltou ao exame marcado ... "por motivo do próprio ter declarado não desejar ser submetido ao exame ... e tal recusa deve ser respeitada" ..., visto ele sofrer de psicose paranoíde, e requere-se que se oficie ao ML para que se proceda a "exame externo", no local onde o R. actualmente se encontra;

- Com esse requerimento é junta uma carta do curador do R., datada de 06/07/1993, dirigida ao seu ilustre Mandatário, em que informa que o R., apesar da sua deslocação ser absolutamente possível, se recusou a deslocar-se ao IML, quer sozinho, quer na companhia do seu curador, o que na opinião do médico deve ser respeitado, lembrando que o R. costuma dizer que se recusa a ir a "Tribunais,

Instituições Militares e de Polícia bem como a Hospitais Psiquiátricos";

- Com o mesmo requerimento foi junto um documento passado por Psiquiatra, em que se atesta que o R. ..."apresenta doença psíquica, nomeadamente psicose paranóide, pelo que a sua recusa a comparecer para exame psiquiátrico ... não deve ser contrariada, antes respeitada por motivos da sua precária saúde e porque, aliás, difícil é coagi-lo a deslocar-se ao Instituto de Medicina Legal ou a qualquer outra instituição de saúde pública."

- Na sequência foi proferido o despacho recorrido em que, embora estranhando que o R., que requereu o exame, não queira agora submeter-se a ele, aceita essa manifestação de vontade e declara sem efeito o exame.

Diz o Recorrente que só houve uma falta ao exame e que, ao faltar, requereu nova data para exame, e, de qualquer maneira, sendo ele inabilitado, não pode ser reconhecida relevância à sua vontade, devendo o

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Tribunal remover esse obstáculo e forçar o R. ao exame.

A questão não é do número das faltas ao exame e o requerimento a pedir nova marcação nada tira ou acrescenta. O que houve foi uma recusa a submeter-se a exame, recusa que se apresenta definitiva, e não ocasional em função do lugar onde o exame estava marcado. E, sendo ele o próprio requerente do exame, ainda que, obviamente, por via do Advogado constituído pelo seu curador, ao Tribunal só restava respeitar a vontade dele.

Relativamente à relevância da vontade do R., como inabilitado por anomalia psíquica, cabe referir que dos artigos 152 e 153 do Código Civil, que se passa a designar por CC, não resulta a incapacidade jurídica total do inabilitado.

Com efeito, a inabilitação aplica-se aos indivíduos que se mostrem incapazes de reger convenientemente o seu património. A consequência é um regime de inibição bem mais mitigado do que o das interdições, que, nos termos do artigo 138 do CC, respeitam aos indivíduos que sejam incapazes de governar as suas pessoas ou bens. O inabilitado por anomalia psíquica, que o seja para dispor dos seus bens e para os administrar, tem a sua incapacidade limitada aos actos de disposição e de administração. Na esfera jurídica pessoal, e à parte as proibições previstas nos artigos 1601, alínea b), e 1913 n. 1, alínea b), do CC, os inabilitados por anomalia psíquica têm capacidade jurídica, designadamente podem perfilhar e podem testar, nos termos dos artigos 1850 e 2188 e 2189 do CC.

Quer isto dizer que o inabilitado por anomalia tem vontade juridicamente relevante, embora não possa validamente praticar os actos indicados.

A recusa à submissão de um exame não é um acto de disposição de bens entre vivos ou de administração. Só por via indirecta se chega lá, uma vez que essa recusa pode ter reflexos no resultado da acção, e que se pode entender que na acção de despejo pode perder-se um bem de que o inabilitado não pode dispor. Mas, a verdade é que o curador, por uma razão ou outra, aceitou a recusa do assistido, concordou com ela e não o "forçou" ao exame. E o Tribunal não pode "forçar" o R. ao exame, nem se se vê como o poderia fazer à luz da lei vigente.

Assim, no caso, tornou-se lícito ao R. não querer submeter-se ao exame requerido e não se duvida que deve respeitar-se essa recusa.

Os exames médico-forenses a realizar pelos Institutos de Medicina Legal, em princípio, hão-de ser feitos aí. O espirito do n. 2 do artigo 600 do CPC, surpreende-se na 2 parte deste mesmo preceito, e o exame só não terá lugar nos estabelecimentos oficiais, quando se trate de exame que deva ser presidido pelo juiz, como é o caso do exame previsto no artigo 951 do CPC, a conjugar com o n. 2 da disposição anterior, ou em casos excepcionais.

Mas, o problema aqui não é do local da realização do exame. O problema é de recusa do próprio examinado em submeter-se ao exame, como o requerimento a fls. 177 o diz com toda a clareza. E, salvo o devido respeito, o requerimento do R., a fls. 177, é incongruente porque, depois de informar que o próprio não quer submeter-se a exame, pede que o exame tenha lugar na Casa de Saúde do Senhor da Serra, em Belas. E, se não há incongruência, não se vê, nem o requerimento o diz, como se realizaria o exame contra a vontade do próprio examinado.

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o IML como para outro local. E a contradição entre o pedido de realização do exame e a recusa em submeter-se a ele, equivale à impossibilidade prática da realização do exame.

Argumenta o Recorrente também que o despacho é ilegal porque, a coberto do caso julgado, o Tribunal não podia voltar atrás, embora, reconheça que, por desistência do requerente e com a anuência da outra parte, sempre poderia considerar o exame sem efeito.

No entanto, o despacho recorrido não violou o caso julgado formal pelo despacho que deu seguimento ao pedido de exame. Não voltou atrás, limitou-se a verificar a recusa definitva do R. em submeter-se ao exame, extraindo daí as consequências em ordem a assegurar a continuação do processo.

O pedido de exame foi deferido porque, nos termos do artigo 572 n. 2 do CPC, a diligência não era impertinente ou dilatória. E no despacho recorrido se contrariou o despacho que deu seguimento ao pedido de exame, no sentido de dar o dito por não dito, em virtude de se ter passado a entender que o exame era impertinente ou dilatório, caso este em que, sem dúvida, haveria ofensa do caso julgado.

Embora houvesse um despacho transitado no sentido de se proceder ao exame, proferido com base em certos pressupostos, não querendo o examinado submeter-se ao exame, o Tribunal só podia verificar a recusa do examinando e dar sem efeito o exame solicitado. Não faria sentido que o Tribunal persistisse na realização do exame, quando o examinado, que é dotado de capacidade juridica, ainda que diminuída, e é, afinal, também o requerente, toma uma atitude que o inviabiliza de modo definitivo.

A tese do Recorrente é a de que, com base na autoridade do caso julgado formal, que seria assim absoluta, deferindo o pedido de exame, este teria sempre de se realizar, mesmo que o examinando não o quisesse ou surgissem outras circunstâncias que impossibilitassem a realização do exame. Para além do irrealismo da tese, o despacho recorrido, como se disse, não contradiz o despacho que deu seguimento ao pedido de exame. E, de resto, ainda que fosse o caso de desistência da diligência, nos termos do artigo 571 do CPC, o despacho que verifica essa desistência e a declara também não contradiz o despacho que marcou a diligência.

O Recorrente defende também a ilegalidade do despacho recorrido porque, em conformidade com aquele artigo 571, a parte contrária não deu a sua anuência à desistência.

Só que, no caso, não houve desistência do exame, o que houve, como se disse, foi impossibilidade prática de realizar o exame.

E, ainda que houvesse desistência, traduzida na recusa do examinando em submeter-se ao exame, só o Recorrido podia invocar a ilegalidade da falta da sua anuência, porque então só ele poderia ser havido como vencido. E o Recorrido nada invocou a este respeito.

Deste modo, improcedem as conclusões do Recorrente, e o despacho recorrido, dando sem efeito a realização do exame, não merece censura.

IV - Recurso de apelação.

1. As questões a solucionar são as de saber se o depoimento de parte do A. devia ter sido escrito, se a resposta ao quesito 1 deve ser alterada e se é lacunar, se há contradições nas respostas dadas aos quesitos 1 e 2, se deviam ser formulados quesitos em conformidade com a reclamação contra a especificação e o questionário e se se verificam as excepções peremptórias da caducidade e da doença impossibilitante de o R. residir no arrendado.

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2. Provam-se os seguintes factos: a) (A) deu de arrendamento a (B), em 24/06/1948, para habitação, e mediante a retribuição mensal de 2500 escudos, o 3 andar direito do prédio (Z), em Lisboa

- A) da especificação; b) Após o falecimento de (B) sucedeu-lhe no referido arrendamento o R. (D) - B), idem; c) Em 06/03/1987 o A. adquiriu, por compra, o prédio referido - C), idem; d) O R. paga actualmente a renda ao A., no valor de 12527 escudos, através de uma administradora predial - D), idem; e) O R. não come, não dorme, não recebe amigos, nem tem instalada e organizada a sua economia doméstica, na casa referida em a), desde há muito mais de um ano, consecutivamente - E), idem; f) O A. sabia que o R. tinha uma quinta nas redondezas de Sintra, aonde por vezes se deslocava

- F), idem; g) Por sentença de 24/01/1975 o R. foi declarado inabilitado por sofrer de esquizofrenia paranóide - G), idem; h) Alguns dos alienantes do prédio, designadamente (E), antes de o venderem ao A., sabiam que o R. passava longos períodos ausente de casa - resposta ao quesito 1; i) O que também era do conhecimento do A. - 2, idem; j) Algum tempo antes de 1985 o R. viu agravada a sua doença - 4, idem; l) A partir daí o R. passou a viver, em regime de internamento, na Casa de Saúde do Senhor da Serra, em Belas, onde era submetido a tratamentos e vigilância médica e paramédica, que não lhe podiam ser prestados em sua casa, e de onde tinha apenas algumas saídas esporádicas - 5, idem; m) Tal situação manteve-se até data não apurada do ano de 1989 - 6 e 7, idem; n) Actualmente o R. tem saídas mais frequentes e prolongadas, dá alguns passeios de taxi, na área da zona de Sintra, e frequenta alguns cafés da área de Queluz, sem qualquer vigilância - 8, idem.

3. Das disposições conjugadas dos artigos 563 e 791 n. 2 do CPC e 356 n. 2 e 358 n. 1 do CC alcança-se que os julgamentos perante o juiz singular o depoimento de parte só tem de ser reduzido a escrito quando não seja prestado na audiência de julgamento e, em qualquer caso, para poder ter força probatória plena, quando seja confessório.

No caso, como se vê da acta da audiência a fls. 338 e 339, o A. prestou o seu depoimento de parte na audiência de julgamento, razão por que só tinha de ser reduzido a escrito se fosse confessório.

Visto que não resulta dos autos que o A. tenha feito alguma declaração confessória no seu depoimento, não tinha este de ser escrito.

De qualquer maneira, se houvesse alguma irregularidade, uma vez que não houve despacho a decidir sobre a não redução a escrito do depoimento do A., tratar-se-ia de nulidade prevista no já falado artigo 201 e de que não pode conhecer-se ex officio, como se alcança do imediato artigo 202. Assim, devia a mesma ter sido arguida nos termos do artigo 205 do CPC, ou seja enquanto não terminou a sessão da audiência em que teve lugar esse depoimento. E, passado o momento sem que tivesse sido arguida, sempre se teria de ter por sanada.

4. O artigo 712 n. 1 do CPC, aplicável aos julgamentos perante o juiz singular ex vi do artigo 792 do mesmo Código, consagra o princípio da imutabilidade das respostas aos quesitos. A Relação só pode alterar as respostas nos casos previstos nas três alíneas daquele artigo 712 n. 1, a saber: a) Se no processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à resposta; b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem uma resposta diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a resposta assentou.

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Diz o Recorrente que na resposta dada ao quesito 1 não tomou em consideração o depoimento de uma testemunha a fls. 150 e 151, estando assim viciada.

Para além desse depoimento prestado por deprecada, das respectivas actas verifica-se que sobre o quesito 1 foram inquiridas na audiência três testemunhas. Como se vê do despacho sobre a matéria de facto, o Tribunal formou a sua convicção com base nos depoimentos de duas testemunhas inquiridas na audiência. E estes depoimentos, porque prestados na audiência, não foram registados, nem tinham de o ser, nos termos do citado artigo 791 n. 2 do CPC.

Por isso, não constando do processo todos os elementos de prova que serviam de base à resposta, não é possível qualquer alteração com fundamento na alínea a) referida.

Por isso, e porque é manifesta a não aplicabilidade ao caso das alíneas b) e c), não pode ser alterada a resposta ao quesito 1.

O recorrente diz ainda que a resposta ao quesito 1 é lacunar porque só os factos concretos são susceptíveis de prova e "alguns" não é um facto concreto.

Pretende-se certamente aludir à obscuridade da resposta, por usar termos vagos, obscuridade essa que, a existir, por força do artigo 712 n. 2, constitui um dos fundamentos de anulação da decisão sobre a matéria de facto.

Contudo, a resposta nada tem de obscura. "Alguns" é um adjectivo que, usado no plural, significa diversos, vários, sugerido indeterminação da quantidade ou da qualidade. No caso, "alguns dos alienantes do prédio" tem o significado bem concreto de mais do que um, entre vários alienantes do prédio, sem quantificação do número que excede a unidade e sem indicação de qualquer qualidade distintiva de algum ou alguns dos alienantes.

O desejável seria a concretização do número certo de alienantes (e respectivas qualidades) que sabiam que o R. passava longos períodos fora de casa, mas as respostas aos quesitos são muitas vezes as possíveis face à prova produzida. E, no caso, a resposta é restritiva relativamente ao quesito (nesta parte e no mais que ora não interessa), demonstrando que a prova não foi convincente no sentido de que os alienantes do prédio, designadamente o comproprietário administrador, sabiam de certo facto, mas, apenas que alguns alienantes do prédio, sem que se provasse o número certo ou a qualidade de administrador de um deles, sabiam do facto.

A resposta ao quesito 1 não é, pois, obscura.

5. Nos termos do sobredito artigo 712 n. 2, as respostas contraditórias implicam também a anulação do julgamento sobre a matéria de facto.

No entanto, uma simples leitura das respostas dadas aos quesitos 1 e 2, que houve o cuidado de identificar na exposição da matéria de facto supra, mostra que não há qualquer contradição nessas respostas.

A resposta ao quesito 1 é restritiva relativamente ao perguntado, ao passo o Tribunal declarou o quesito 2, referido ao 1 e dele dependente, como inteiramente provado. Mas isso não importa contradição entre as respostas. A resposta ao quesito 2 não pode entender-se como referida ao teor do quesito 1 (os alienantes do prédio ao A., designadamente o comproprietário administrador, antes de o venderem ao A. sabiam que o R. bem mais de 2 anos antes de tal venda já não vivia com carácter de permanência no andar despejando), mas, sim, à resposta dada a este mesmo quesito.

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A resposta a um quesito dependente de outro tem de ser interpretada em conjugação com a resposta ao quesito dominante, de forma a que as restrições constantes da resposta ao quesito dominante se apliquem à resposta ao quesito dependente.

Deste modo, a resposta ao quesito 2 só tem conteúdo quando conjugada com a resposta dada ao quesito 1, significando que era do conhecimento do A. apenas aquilo que alguns alienantes sabiam, ou seja, que era do conhecimento do A. que o R. passava longos períodos ausente de casa, que é precisamente o que alguns alienantes sabiam.

Não há, pois, qualquer contradição nas respostas dadas aos quesitos 1 e 2.

6. Nos termos do artigo 511 n. 1 do CPC, na elaboração da especificação e do questionário, o juiz selecciona entre os factos articulados os que interessam à decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.

Havendo reclamações contra a especificação e o questionário, o despacho sobre elas proferido pode, ao abrigo do n. 5 daquele artigo 511, ser impugnado no recurso interposto da decisão final. E, nos termos do já citado artigo 712 n. 2, haja ou não reclamações ou impugnação do despacho que decidiu as reclamações, a Relação pode anular a decisão sobre a matéria de facto, mesmo oficiosamente, quando considere indispensável para a boa decisão da causa a formulação de outros quesitos sobre a matéria que, tendo sido articulada, se mostre controvertida.

Posto isto, e apenas na perspectiva da defesa há que apreciar se a matéria levada ao questionário é a suficiente ou se, ao invés, se mostra necessária a formulação de outros quesitos para a boa decisão da causa, como defende o Recorrente.

Cabe referir que os factos que integram a causa de pedir são necessariamente anteriores à data da propositura da acção ou contemporâneos desta. Deste modo, tendo a acção sido proposta em 17/02/1988 (ou seja, antes da publicação e entrada em vigor do Regime do Arrendamento Urbano (RAU), aprovado pelo Decreto-Lei n. 321-B/90, de 15 de Outubro), a lei aplicável é o Código Civil (CC), designadamente o disposto nos seus artigos 1093 ns. 1, alínea i), e 2, alínea a), e 1094, este na redacção anterior à dada pela Lei n. 24/89, de 1 de Agosto. Como resulta do artigo 12 ns. 1 e 2, 1 parte, do CC, e assim tem sido entendido pela jurisprudência, havendo sucessão de leis no tempo, a lei que se aplica é a vigente ao tempo dos factos alegados como integrando a causa de resolução do contrato de arrendamento. Acresce que o artigo 2 da Lei n. 24/89 expressamente subtrai a aplicação do artigo 1094, na formulação por ela dada, às acções pendentes na data da sua entrada em vigor (estando a disposição transitória deste artigo 2 ressalvada da revogação do direito anterior, pelo artigo 3 n. 3 do diploma preambular do RAU).

Presente que a causa de pedir nesta acção é a falta de residência permanente do R., na casa arrendada para habitação, importa atentar que a defesa se estrutura em duas excepções peremptórias: caducidade do direito de accionar e doença do arrendatário.

O artigo 1094 do Código Civil dispõe que a acção de resolução deve ser proposta dentro de um ano a contar do conhecimento do facto que lhe serve de fundamento. Esta norma gerou grande controvérsia na doutrina e na jurisprudência, tendo sido mesmo objecto de um assento do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 03/05/1984, in BMJ, 337, 182. A prolação deste assento não esgotou o tema. Assim, Orlando de Carvalho, in "Revista de Legislação e de Jurisprudência", 118, 233, defendeu a interpretação restritiva do

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assento, entre outros, para a hipótese da alínea i) do artigo 1093 n. 1. Encurtando razões, no caso em apreço, o que releva é a partir do conhecimento inicial pelo senhorio da falta de residência permanente do inquilino que se conta o prazo de caducidade.

Os quesitos 1, 2 e 3 destinam-se precisamente a averiguar se o A. ou os anteriores senhorios sabiam "bem mais de 2 anos antes" da aquisição do prédio pelo A. que o R. não tinha residência permanente no arrendado.

Naturalmente que estes quesitos, em termos temporais, vão muito além do necessário para a verificação da caducidade.

Como a acção foi proposta em 17/02/1988, para que a caducidade pudesse operar bastaria que o A. soubesse da situação integradora da causa de pedir mais de um ano da propositura da acção, ou seja, antes de 17/02/1987, e os quesitos 1, 2 e 3 abrangem a época anterior à aquisição do prédio pelo A., já que o perguntado, tal como foi alegado, reporta-se a data anterior a 06/03/1985 (a aquisição do prédio pelo A., recorda-se, ocorreu em 06/03/1987).

No entanto, tal circunstância em nada prejudica a prova da caducidade, porventura por esta ser dificultada em função do lapso de tempo perguntado, porque os quesitos sempre comportariam uma resposta restritiva no aspecto temporal.

Por outro lado, os factos contidos nos artigos 9 e 10 da resposta à contestação nenhum interesse têm para a apreciação da caducidade, segundo as várias soluções plausíveis. Não tinham, por isso, de ser levados ao questionário, como decorre do citado artigo 511 n. 1.

Portanto, quanto à caducidade, os quesitos elaborados são os necessários e suficientes.

Relativamente à doença, trata-se de situação que, impedindo o inquilino de manter a residência na casa arrendada, justifica a falta de residência permanente, por forma a, nos termos do artigo 1093 n. 2, alínea a), do CC, obstar à resolução do contrato. Para que assuma relevância justificativa, a doença tem de revestir-se da inevitabilidade e insuperabilidade que caracterizam o caso de força maior. Além disso, conforme é jurisprudência dominante, a doença não pode ser crónica, de modo a tornar o impedimento definitivo, pelo que o inquilino tem de provar, além da doença, a transitoriedade desta, convencendo que pode e quer regressar à casa arrendada (por todos, os acórdãos da Relação de Coimbra de 26/01/1982, in "Colectânea de Jurisprudência",

VII, 1, 89, e de 23/10/1990, in "Colectânea ...", XV,

4, 81, da Relação de Évora de 21/04/1983, in "Colectânea ...", VII, 2, 297, e da Relação do Porto de 24/07/1986, in "Colectânea ...", XI, 4, 223, aliás, todos citados na douta contra-alegação).

Ao julgamento desta excepção destinam-se os quesitos 4 a 10, ambos inclusive.

Nos quesitos 4, 5, 6 e 7 foi vertida a matéria pertinente à doença. O período de doença visado nesses quesitos é bastante mais amplo do que aquele em que, segundo a petição inicial, se verifica a falta de residência. Essa discrepância deve-se ao facto de os quesitos 4 e seguintes terem sido moldados com base na contestação. Entre parênteses, diga-se que a defesa é modelar, porque, à imprecisão do alegado pelo A., opôs um período de tempo que folgadamente engloba o período da falta de residência permanente. Mas, para efeitos da excepção, a doença relevante é a que coincide com o período de "muito mais de um ano" relativamente à data da propositura da acção, em que o R. esteve internado, permanecendo em

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tratamentos e serviços que não podiam ser prestados na casa arrendada. E tudo o que se passou "muito mais de um ano" antes da propositura da acção é instrumental relativamente à causa de pedir e à excepção.

E os quesitos 8, 9 e 10 contêm factos com a virtualidade de preencherem os requisitos da doença justificativa da falta de residência permanente: reversabilidade ou curabilidade dessa doença e possibilidade de o R. voltar a instalar-se na casa arrendada.

O juiz não tem de incluir no questionário todos os factos alegados, (o que, no caso, não seria tarefa fácil face aos 94 artigos da contestação, em que se incluem os números repetidos). Como se viu, nos termos do citado artigo 511 n. 1, o juiz deve seleccionar entre os factos articulados os que interessam à decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.

Quer dizer, o questionário não deve conter factos sem interesse para a decisão da causa ou factos repetidos, porque articulados várias vezes, embora com redacção diferente.

Uma análise da reclamação do R. contra a especificação e o questionário não deixa dúvidas sobre a desnecessidade da formulação de novos quesitos. Assim: os factos alegados nos artigos 50 e 51 da contestação não têm qualquer interesse, os factos alegados nos artigos 53, 55 e 56 da mesma peça são objecto dos quesitos 4, 5, 6 e 7 (e melhor se verá o artigo 53), os factos articulados no primeiro artigo 81 e no artigo 79 da contestação ou são irrelevantes ou são instrumentais do que foi vertido nos quesitos 8, 9 e 10, os factos articulados no artigo 83 são irrelevantes, o proposto quesito 11 respeita a matéria conclusiva e não alegada (com efeito, niguém alegou que "está excluída a possibilidade do réu ... vir no futuro a estar em condições físicas e de saúde" ... de regressar à casa despejanda, o que se alegou foi precisamente a ideia contrária).

Um dos pontos fortes da alegação do Recorrente é que devia ser formulado um quesito sobre a transitoriedade do impedimento de residir no arrendado. Mas a essa matéria foram formulados dois quesitos, o 9 e 10, aos quais se aludiu a propósito do agravo interposto a fls. 122.

Diz também o Recorrente que o Tribunal a quo impediu a formulação de um quesito relativo à causalidade entre o impedimento resultante do agravamento da doença e a falta de residência permanente, tal como impediu um quesito provado que enquanto doente habitou na casa; que permitiria a ilação de que a doença em estado não agravado não obsta à residência permanente no locado.

Vejamos cada um destes argumentos:

Na sentença recorrida ponderou-se que não há causalidade entre o agravamento da doença verificado algum tempo antes de 1985 e a falta de residência permanente, já que não se sabe ao certo quando é que o R. deixou de habitar o locado. A ser assim, teria razão o Recorrente, e impunha-se a formulação de um quesito específico sobre a causalidade, baseado no artigo 53 da contestação.

Porém, nesta parte, não se pode concordar com a sentença recorrida. Na verdade, como escreve o Dr. Pais de Sousa (in "Extinção do Arrendamento Urbano",

2 Edição, 292) ... "o inquilino, na respectiva acção de despejo, deve definir a doença invocada com a suficiente clareza, para habilitar o julgador a decidir se essa doença foi realmente o motivo de o arrendatário deixar de viver permanentemente na casa arrendada." ...

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também os quesitos 4, 5, 6 e 7, vindo, aliás, tal causalidade a resultar das respectivas respostas dadas. Com efeito, é perguntado se algum tempo antes de 1985 o R. viu agravada a sua doença e, a partir daí, passou a viver em regime de internamento na Casa de Saúde, onde era submetido a tratamento e vigilância médica e paramédica que não lhe podiam ser prestados em sua casa, situação que se manteve até data não apurada do ano de 1989. E, por outro lado, sabe-se que, conforme o A. alegou, o R. não come, não dorme, etc., na casa arrendada há mais de um ano antes de 17/02/1988, data da propositura da acção. Perante a alegação do A., o que se passou muito mais de um ano antes de 17/02/1988, é inócuo como fundamento de resolução. Dito de outro modo, pouco interessa saber quando é que o R. deixou de habitar no locado, o que releva é a situação de falta de residência permanente no período de tempo referido na petição inicial. E para estabelecer um nexo de causa e efeito entre a doença e a falta de residência permanente, bastaria a possibilidade de os quesitos esclarecerem se, na época alegada pelo A., o R. tinha a sua doença agravada, estando então internado numa Casa de Saúde, sujeito a tratamentos e vigilância que não lhe podiam ser ministrados em casa.

Logo, visto que a causalidade poderia decorrer dos quesitos formulados, e, diversamente do que se entende na sentença recorrida, até decorre das respostas dadas, não havia que levar ao questionário a matéria do artigo 53 da contestação.

O outro argumento do Recorrente não pode colher.

Da matéria especificada e dos quesitos elaborados já resultava que foi a partir do agravamento da doença que o R. passou a viver na Casa de Saúde.

O que aconteceu antes do agravamento da doença irreleva de todo, inclusivamente irreleva para se tirar a ilação de que se ele vivia no arrendado, antes do agravamento da doença, é porque a doença em estado não agravado não obsta à residência permanente no locado. Essa chamada ilação não seria mais do que uma conclusão especulativa, que apresenta uma simples probabilidade, interessando apenas, para se apurar da reversabilidade e da possibilidade de o R. viver no arrendado, o que consta dos quesitos 8, 9 e 10.

Resumindo, para a procedência da excepção em apreço, bastaria a prova dos quesitos 4 a 10, pelo que selecção dos factos levados ao questionário mostra-se criteriosa, não se vendo a necessidade de formular outros quesitos.

7. Em linhas gerais já se traçou o regime da caducidade em matéria de resolução do contrato de arrendamento.

Resta dizer que, aplicando o direito aos factos apurados, acima descritos em 2. h) e i), não se provou que o A., mais de um ano antes de instaurar a presente acção, tinha conhecimento da falta de residência permanente do R. no arrendado.

Portanto, a excepção de caducidade tem fatalmente de improceder.

8. Em 6., supra, também houve oportunidade de apontar o regime da doença como excepção oponível à resolução do contrato de arrendamento.

Importa agora caracterizar a residência permanente.

A falta de residência permanente é fundamento de despejo, nos termos do artigo 1093 n. 1, alínea i), 2 parte, do CC, porque não se compreende a subsistência do arrendamento quando o inquilino não precisa

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da casa e não a utiliza normalmente para residir. Como ensinam a melhor doutrina e jurisprudência (por todos, o Dr. Pais de Sousa, in op. cit., 282 e segs.), residência permanente é a residência habitual, estável e duradoira, não acidental, transitória ou temporária, sendo, portanto, aquela em que o inquilino faz a sua vida normal, onde está organizada a sua economia doméstica, onde come, dorme e recebe as suas visitas. Este fundamento é independente de qualquer medida temporal, bastando que se verifique uma situação de falta de residência permanente para que o mesmo se considere preenchido (a desabitação por mais de um ano, consecutivamente, que se prevê na 1 parte da mencionada alínea i), constitui fundamento distinto do contemplado na 2 parte, sendo o vocábulo desabitado usado com o significado de desocupado).

O regime da doença justificativa do impedimento em residir com permanência no local arrendado não pode abstrair da noção de residência permanente e dos motivos que levaram a lei a consagrar a falta de residência permanente como fundamento da resolução do contrato de arrendamento. Por isso, como já se adiantou, e embora a lei não o diga expressamente, tem-se entendido que o impedimento em residir com permanência deve ser transitório e não definitivo.

No caso, o R. alegou e provou que a falta de residência permanente na casa arrendada é consequência de, em época que abrange a assinalada na petição inicial, ter estado internado numa Casa de Saúde, onde se submeteu a tratamentos que não podiam ser prestados na casa arrendada.

Mas, porque o impedimento deve ser transitório, só se o R. tiver condições de saúde para voltar a residir com permanência na casa arrendada é que se pode ter essa falta de residência como justificada, em ordem a obstar à resolução do contrato de arrendamento. Apenas então se pode considerar que o R. precisa da casa, para a utilizar como residência.

As melhoras do R. ou a situação de doença em estado não agravado, resultam de algum modo da resposta restritiva dada ao quesito 8. Desta resposta verifica-se que actualmente (o que se refere à data da contestação, e não do julgamento, visto tratar-se de facto cuja fonte é a contestação) o R. tem saídas mais frequentes e prolongadas, dá alguns passeios de táxi na área de Sintra e frequenta cafés na zona de Queluz, sem qualquer vigilância.

Mas, das melhoras não se pode extrair a transitoriedade do mal que afecta o R., por forma a que ele possa voltar a residir na casa arrendada.

A isso se destina o quesito 9, que foi declarado não provado, sendo certo que, nos termos do artigo 342 n. 2 do CC, é o R. que está onerado com a prova dos elementos em que se plasma a excepção invocada. Dito de outro modo, só a prova de que o estado de saúde do R. possibilita instalação de novo no arrendado poderia alicerçar um juízo de transitoriedade ou de reversibilidade da doença, e essa prova não se fez. E a conclusão do Recorrente, de que se a doença em estado não agravado permitiu ao R. viver no arrendado, ele pode novamente viver aí porque a doença de que padece já não está em estado agravado, é uma conclusão possível, mas que não é válida, no caso, por falta de apoio fáctico.

9. Improcedem, pois, as conclusões da alegação do Recorrente, o que acarreta a improcedência da apelação.

V - Pelo exposto, julga-se deserto o agravo interposto a fls. 123, nega-se provimento aos agravos interpostos a fls. 122, 136 e 194 e julga-se a apelação improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida, ainda que com motivação algo diversa.

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Custas pelo Recorrente, sem prejuízo do diposto no artigo 6 n. 4 do Código das Custas Judiciais quanto ao agravo ora julgado deserto.

Lisboa, 14 de Março de 1996. Silva Pereira.

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