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Premissas para o êxito do teletrabalho numa abordagem multidisciplinar: diálogos entre direito e ontopsicologia. / Premises for successful tele-work in a multidisciplinary approach: dialogues between law and ontopsychology

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761

Premissas para o êxito do teletrabalho numa abordagem multidisciplinar:

diálogos entre direito e ontopsicologia.

Premises for successful tele-work in a multidisciplinary approach:

dialogues between law and ontopsychology

DOI:10.34117/bjdv6n4-301

Recebimento dos originais: 23/03/2020 Aceitação para publicação: 23/04/2020

Rosane Leal da Silva

Doutora em Direito pela UFSC. Instituição: Antonio Meneghetti Faculdade E-mail: rosanelealdasilva@email.faculdadeam.edu.br

RESUMO

Este artigo propõe um diálogo entre o Direito e a Ontopsicologia ao tratar do teletrabalho como uma nova possibilidade de atuação na chamada organização virtual das empresas. O tema é abordado a partir do método dialético, que oportuniza o contraste entre vantagens e riscos do teletrabalho. Sustenta-se que essa nova modalidade pode se constituir em oportunidade interessante para as empresas, sobretudo aquelas que detêm um verdadeiro líder à frente de sua gestão, não só por reduzir custos operacionais e fazer frente a eventuais crises e dificuldades empresariais, como também por oferecer interessante experiência de protagonismo “pelo” e “ao” trabalho para quem o executa. Sua adoção depende, no entanto, da análise percuciente a ser feita pelo gestor da organização empresarial, que deve conhecer profundamente as habilidades de cada membro de sua equipe, revelando-se capaz de identificar aqueles trabalhadores que possuem as condições subjetivas e objetivas para empreender essa experiência. Conclui-se que o êxito da adoção dessa modalidade de trabalho será mais facilmente obtido se o gestor empresarial aliar conhecimentos das ciências jurídicas e ontopsicológicas, o que lhe permitirá identificar aquelas personalidades que serão funcionais ao sistema empresarial e desempenharão as tarefas online pautando-se na confiança mútua e boa-fé objetiva, essenciais para o bom desenvolvimento da relação jurídica contratual.

Palavras-chave: Autonomia do trabalhador. Boa-fé objetiva. Diálogos entre Direito e

Ontopsicologia. Formação multidisciplinar do empresário. Teletrabalho.

ABSTRACT

This article proposes a dialogue between Law and Ontopsychology when dealing with teleworking as a new possibility of acting in the so-called virtual organization of companies. The theme is approached from the dialectical method, which provides the contrast between the advantages and risks of teleworking. It is sustained that this new modality can be an interesting opportunity for companies, especially those that have a true leader at the head of their management, not only by reducing operating costs and facing possible crises and business

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761 difficulties, but also by offering interesting experience of protagonism “for” and “to” work for those who perform it. Its adoption depends, however, on the thorough analysis to be made by the manager of the business organization, who must know deeply the skills of each member of his team, revealing himself capable of identifying those workers who have the subjective and objective conditions to undertake this experience. It is concluded that the successful adoption of this type of work will be more easily obtained if the business manager combines knowledge from the legal and ontopsychological sciences, which will allow him to identify those personalities that will be functional to the business system and perform the online tasks based on mutual trust and objective good faith, essential for the proper development of the contractual legal relationship.

Keywords: Worker autonomy. Objective good faith. Dialogues between Law and

Ontopsychology. Multidisciplinary training of the entrepreneur. Teleworking.

1 INTRODUÇÃO

O desenvolvimento tecnológico implementou novas oportunidades econômicas, o que ocorre tanto pelas transações online que movimentam o comércio eletrônico quanto pela implementação de novas formas de trabalho. Dentre as novas modalidades de trabalho encontra-se o teletrabalho, assim definido como a forma de realização de atividades laborais mediadas pelo uso das tecnologias da informação e comunicação (TIC).

O Teletrabalho tem inúmeras vantagens, tanto para o empregador, quanto para o empregado ao permitir a inserção no mercado laboral daqueles que possuem alguma dificuldade de mobilidade, bem como por minimizar distâncias, o que se revela especialmente importante nos grandes centros urbanos. Sua realização, no entanto, exige um novo tipo de protagonismo responsável ao trabalho, já que o trabalhador exerce as suas atividades desde a sua casa ou outro centro de trabalho distante do espaço físico da empresa, o que exige que tenha autonomia, responsabilidade e disciplina com cumprimento de suas tarefas. Essas características sugerem que talvez nem todos os membros da equipe tenham o perfil desejado ao teletrabalho, constatação que demandará acuidade e conhecimento por parte do gestor institucional para não confiar esta condição a quem não detenha as condições adequadas para tanto.

Esta eleição, no entanto, exige que o gestor empresarial tenha mais do que preparo técnico jurídico para superar os novos desafios dessa modalidade demandando, sobretudo, conhecimento sobre as ferramentas adequadas para liderar as empresas em tempos de mobilidade e crise. Para tanto, aliar o Direito e a Ontopsicologia pode constituir, conforme

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761 sustentado neste trabalho, em rica oportunidade de realizar escolhas acertadas e produtivas tanto para o empregado quanto para a organização empresarial.

É sobre esta temática que versa o presente artigo, cujo objetivo é discutir a importância do papel do líder na gestão empresarial, pois é dele a missão de, com base em sua intuição e na visão ecossistêmica da empresa, identificar trabalhadores que detenham o perfil desejado. Por outro lado e no outro vértice da relação jurídica contratual, é preciso que o trabalhador assuma uma nova postura pautada no protagonismo responsável, o que só é possível a partir da compreensão do seu próprio projeto de natureza, clareza sem a qual não conseguirá contribuir para o êxito do projeto empresarial. Apesar de parecer simples, o movimento em torno do teletrabalho divide opiniões e sua adoção exitosa envolve o cotejo de inúmeras variáveis, positivas e de potencialidades de desenvolvimento pessoal e empresarial e, por outro lado, de riscos para o empreendimento e para o teletrabalhador. Diante disso, optou-se por utilizar o método de abordagem dialético, apontando benefícios e eventuais riscos que podem se apresentar aos atores da relação de emprego em razão da adoção do teletrabalho para, ao final, refletir sobre eventuais estratégias que podem contribuir para o sucesso dessa modalidade, o que é feito pela técnica de pesquisa bibliográfica, colocando-se em diálogo as contribuições dos autores da área jurídica com os ensinamentos da Ontopsicologia. Esta escolha se deve ao fato de esta última ciência ter potencial para dar um grande contributo aos administradores e juristas para a compreensão e melhor solução dos conflitos, o que se deve ao fato de instigar o sujeito a identificar aquilo que funciona para si e para seu projeto pessoal de vida e, ao desenvolver as habilidades e capacidades pessoais, ou seja, ser e saber, tornar-se globalmente apto para fazer, contribuindo para o crescimento e positivo desenvolvimento dos sistemas, assim entendido o sistema familiar, empresarial, societário e estatal, tanto no âmbito local quanto global.

2 O TELETRABALHO E SUAS VANTAGENS.

O crescente uso das tecnologias da informação e comunicação produziu repercussões no mercado de trabalho, o que se dá tanto pela transformação de muitos ofícios, com a exigência do domínio de uso de tecnologias e de uma nova expertise, quanto pela extinção de determinados postos de trabalho, cuja atuação humana é substituída pelo uso de máquinas e dispositivos eletrônicos.

A inteligência artificial e todas as novas possibilidades do uso de tecnologia para o mundo do trabalho produzem uma verdadeira revolução no capitalismo cognitivo, como

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761 destacam Rosenfield e Alves (2015), a partir da qual inúmeras oportunidades se apresentam para as empresas e para os obreiros. Dentre essas oportunidades, o teletrabalho pode ser visto tanto como uma possibilidade real de sobrevivência de muitas empresas em tempos de emergência sanitária global, quanto como estratégia de incremento e crescimento das empresas, pois permite que a organização tenha ao seu dispor trabalhadores dotados de mais alta formação e talentos, que podem trabalhar independentemente da parte do mundo onde estiverem sediados.

Tal modalidade reduz custos empresariais e permite que a empresa se notabilize com novos serviços e produtos, concedendo-lhe vantagens competitivas num mercado cada vez mais globalizado. Para o trabalhador também emergem vantagens, pois reduz o tempo de seu deslocamento físico até a sede da empresa, bem como permite que ele siga ativo mesmo quando não pode, por restrições governamentais ou sanitárias, dirigir-se até a sede física da empresa. A utilização das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) permite que os trabalhadores sigam conectados e produtivos e que a organização empresarial implemente novas frentes de atuação, estratégias empresariais que podem ser essenciais para suportar tempos de crise e até mesmo para estabelecer novos canais de atuação, como e-commerce ou

e-learning para as instituições de ensino. Esta facilidade diminui os custos e despesas de

transporte, bem como reduz os custos operacionais da própria empresa, que além de ter a sua disposição recursos humanos que podem ser altamente sofisticados, não precisará dispor de espaço físico que comporte tantos empregados, com consequente diminuição de gastos com equipamentos, água, luz e até mesmo acesso à internet.

Outro aspecto importante está relacionado com a possibilidade de inserção no mercado de trabalho de pessoas com alguma dificuldade de mobilidade ou até mesmo com deficiência física, diminuindo-se as barreiras que muitas vezes impedem que as pessoas com deficiência se insiram de forma produtiva no mercado formal de trabalho, o que se revela positivo tanto sob o aspecto individual quanto social, pois a autonomia financeira desse sujeito retirará da sociedade e do Estado eventuais custos com a sua manutenção.

Segundo os doutrinadores que pesquisam o tema, dentre eles Fincato (2011), o teletrabalho também permite que o empregado ou teletrabalhador concilie eventuais vicissitudes de sua vida pessoal com o trabalho, o que poderá ser feito a partir da organização de cronograma das tarefas designadas pela empresa contratante. Aposta, portanto, na autonomia do trabalhador e impõe uma importante modificação nos processos produtivos, segundo uma tendência apontada por Mello (2011, p. 27):

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Outra característica peculiar das organizações virtuais, é a tendência de estimular uma parcela de seus funcionários a utilizarem os mecanismos de teletrabalho como forma de reduzir a presença física nos escritórios ou outras dependências físicas da organização. É evidente que, isto só é possível, quando os instrumentos e ferramentas necessárias para realizar o trabalho possam ser deslocados para outros locais, inclusive, para a residência do funcionário.

Como se percebe, a adoção dessa modalidade exige equipamentos, pessoas preparadas e com habilidades para desenvolver tarefas mediadas pelas tecnologias, que serão desempenhadas a partir de outros espaços distintos daqueles onde está sediada a empresa. Sua adoção evita investimento em patrimônio imobilizado nas empresas, como instalações físicas, constituindo-se em opção para as organizações empresariais, especialmente em períodos de crise.

Manuel Castells (2003, p. 53) também destaca o potencial da Internet para transformar as relações empresariais, o que pode acontecer por mudanças em sua administração e em seu processo de produção e distribuição de produtos e serviços, atingindo também a relação de quem detém os meios de produção e seus trabalhadores. É preciso estar ciente, no entanto, que o uso das tecnologias tanto pode conduzir ao incremento dos negócios e ao surgimento de inúmeras empresas que operam com sucesso, dentro e fora do ambiente virtual, quanto pode aprofundar os problemas já existentes.

A decisão empresarial pelo teletrabalho, no entanto, deve ser bastante ponderada pelos gestores empresariais sobressaindo-se, neste processo, a visão de liderança. Este preparo por parte do administrador e empresário não se dá ao acaso e não resulta apenas de formação meramente técnica, pois ainda que sejam imprescindíveis os conhecimentos de Administração e Direito eles não são suficientes, devendo ser complementados por outros aportes que darão uma formação humanista, a exemplo das contribuições da Ontopsicologia.

Segundo Meneghetti (2014, p. 11), a Ontopsicologia “significa estudo dos comportamentos psíquicos em primeira causalidade, incluída a compreensão do ser, estudar psicologia segundo as coordenadas do real, ou intencionalidade da ação-vida, ou ação-ser”. Trata-se de uma área do conhecimento que se constitui na psicologia do ser e aborda os conhecimentos que são essenciais para compreender a pessoa – fato existencial e histórico. Para desenvolver sua teoria pautou-se em importante elemento, considerada identidade elementar, denominada em si ôntico. Para o autor,

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O Em si ôntico (princípio formal inteligente do seu humano, ou seja, o núcleo ou forma da unidade da ação homem) é o critério operativo e certificante que garante a exatidão do conhecimento tanto no campo científico quanto em âmbito existencial e, em particular, consente o êxito econômico. (MENEGHETTI, 2014, p. 12).

Dotado desses conhecimentos, o gestor poderá não somente identificar quem tem perfil adequado para atuar em sua organização, como também para exercer o teletrabalho, já que a “Ontopsicologia privilegia a psicologia da autorrealização entendida como responsabilização, formalizando a capacidade do Eu em coincidência com a intencionalidade do Em Si ôntico”. (MENEGHETTI, 2014, p. 14). Oferecerá, portanto, o instrumental para que o gestor trabalhe de forma eficiente com sua equipe, saiba identificar os valores individuais de cada um, verificando os níveis de responsabilização pessoal e para com a organização, o que permitirá construir um organograma que designe o teletrabalho para quem, efetivamente, tenha autonomia e competência para tal.

A adoção do teletrabalho, longe de ser um modismo ou uma mera alternativa de sobrevivência para as empresas em tempos de restrição de mobilidade, deve se constituir em oportunidade de crescimento pessoal e empresarial, com ganho econômico para ambos os lados da relação jurídica.

Portanto, a adoção do teletrabalho não se trata de uma aventura, mas de escolha que deve ser realizada pautada na intuição do gestor e em conhecimentos multidisciplinares, colocando em diálogo a Administração, o Direito e a Ontopsicologia. Como destacado por Meneghetti (2011, p.97), quem está à frente de uma empresa, para ser líder deve ter intuição da eficiência que deve buscar no escopo econômico. Para o autor, “A intuição e a capacidade de conhecer as conexões simples, as relações diretas dos conjuntos para um escopo”, entendendo seu escopo como algo determinante, o objetivo para o qual devem convergir todas as atividades e esforços da empresa. Partindo dessas lições pode-se afirmar que este empresário, ao ter desenvolvido esta intuição, terá condições de examinar com eficiência todas as variáveis que envolvem a adoção do teletrabalho e, por seu feeling, poderá identificar aqueles profissionais dotados de talento, preparo técnico e autonomia suficientes para trabalhar a partir dessa modalidade. Esta eleição não deve ter como fundamento questões carismáticas e sim pautar-se no conhecimento sobre o perfil dos membros de sua equipe para pautar-selecionar aqueles que, tendo identificado seu projeto próprio, sabem extrair o seu máximo potencial para também

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761 colocá-lo a serviço da organização empresarial. Isso significa saber que nem todos os empregados ou colaboradores se sairão bem nesta experiência remota e que aqueles que tiverem mais ciência do seu projeto pessoal conseguirão dar melhor contributo para o alcance dos objetivos empresariais, resultado que independerá de estarem ou não laborando no espaço físico e sob a vigilância direta do superior hierárquico.

O gestor precisa, portanto, ser alguém com capacidade de analisar, definir o escopo e o organograma da realização, mobilizando instrumentos, recursos humanos e materiais para obter os melhores resultados empresariais. Com essas qualidades terá o condições de ponderar sobre a adoção do teletrabalho como uma oportunidade de atuação também em momentos de crise econômica e períodos de restrições, pois até estes eventos se revelam como oportunidades para quem conhece verdadeiramente o seu potencial. Como apontado por Meneghetti (2011, p. 99),

Todos os grandes líderes da economia nasceram da contradição e da falência de outros. No momento de déficit global de pequenas e grandes sociedades de qualquer época, o líder desperta, e com simplicidade compreende o ponto e o constitui em vantagem própria. Do infortúnio majoritário, alguém inventa e estabelece a própria diferença.

Assim, enquanto muitas empresas sucumbem em momentos de crises, aquelas que tiverem à frente de sua gestão um verdadeiro líder poderão investir em novas possibilidades de ação para fazer frente aos infortúnios e um desses instrumentais pode decorrer, de um lado, da formação em Ontopsicologia e, sob o ponto de vista jurídico pode se constituir na adoção do teletrabalho. Para tanto, o gestor líder deve ter capacidade de examinar “o conjunto das partes da empresa, de modo orgânico, no contexto do serviço” e, a partir de sua expertise, deve ser capaz de realizar a leitura do cenário interno e externo em busca de oportunidades de crescimento.

Nesse sentido, convém lembrar que o líder, para Meneghetti (2012, p. 150) é “[...] aquele que sabe servir, que sabe fazer funcionar a harmonia das relações entre os operadores do contexto empresarial ou outro, para que exista o máximo de produção específica ou resultado integral”. Desse conceito é possível extrair que o líder deve ser dotado de três características fundamentais, que são saber servir, saber construir a harmonia das relações e saber produzir o máximo de resultado. Aplicando-se essas lições ao tema objeto deste artigo pode-se afirmar que a opção em favor do teletrabalho só deve ser autorizada se a liderança empresarial perceber

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761 que suas vantagens podem superar eventuais riscos, alcançando-se níveis superiores de resultado e de harmonia nas relações profissionais se comparado ao trabalho presencial.

Esses cuidados se justificam porque o teletrabalho pode se desenvolver sob diversas modalidades, sendo uma delas (e a mais comum) o Home Office, assim entendida como forma de trabalho que se realiza na residência do teletrabalhador. Outra opção é a realização do trabalho desde Telecentros, espaços partilhados por diversos trabalhadores, o que pode ser desautorizado em épocas de restrição de mobilidade, como as enfrentadas em tempos de crises sanitárias e pandemias.

Ao tratar das modalidades de teletrabalho, Gustavo Gauthier (2006, p. 23-34) faz referência às oficinas satélites, espaços onde se reuniriam empregados de uma determinada empresa, realizando desde lá suas tarefas, atividades atualmente facilitadas pelo uso de notebooks, smartphones, Tablets e demais equipamentos. Uma das formas de realizar estas atividades em situações que não autorizam os deslocamentos é por meio de videoconferências e salas virtuais disponíveis em várias plataformas, como o Google Meet e Zoom.

É importante lembrar que na modalidade de teletrabalho é essencial o uso de TIC e é esse instrumental tecnológico que distingue essa modalidade do tradicional trabalho em domicílio, espécie regulada no Brasil desde a adoção da CLT, em 1943. Ao revés, a modalidade ora analisada tem como pressupostos a mediação pelas tecnologias de informação e comunicação e a realização de atividade fora do espaço físico da empresa, seja em domicílio do obreiro ou não, o que é feito com o consentimento formal da empresa, pois essa modalidade é reconhecida pela estrutura organizacional da corporação. Não obstante as vantagens e oportunidades que abre, sua adoção também pode produzir riscos e desvantagens para os atores envolvidos na relação jurídica trabalhista, conforme será visto na sequência.

3 RISCOS DERIVADOS DO TELETRABALHO.

Ainda que a ideia de realizar as atividades laborais desde casa possa parecer tentadora, não é todo o trabalhador que tem o perfil ou as condições estruturais necessárias para esta modalidade.

Com efeito, a realização de teletrabalho exige organização pessoal, disciplina e autonomia do empregado, que deve conhecer a missão institucional, compreendendo claramente os objetivos da empresa e como o seu trabalho, em específico, contribui para o cumprimento desses objetivos. Aliado a isso, o trabalhador precisa ter comprometimento para trabalhar com disciplina, cumprindo metas e realizando as tarefas de maneira personalizada e

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761 em respeito aos protocolos de segurança exigidos pela empresa, independentemente da vigilância ostensiva do empregador.

Para que possa executar o teletrabalho a pessoa deve significar verdadeiro capital

humano, tratando-se que alguém que se diferencia por ser evoluído, dotado de inteligência e

potencial para desenvolver-se cada vez mais, usando e controlando habilmente as tecnologias, como sustentado por Meneghetti (2008, p.147). Tais predicados se mostram essenciais, pois o teletrabalhador precisa ter habilidades para usar as tecnologias, dominar os sistemas operacionais que serão utilizados, o que exigirá constante atualização de sua parte, além de ter ética no trato das relações com a empresa e seus clientes/consumidores.

Permitir que o teletrabalho seja atribuído apenas a quem possui este perfil se revela uma sábia decisão do líder empresarial, pois do contrário as consequências poderão ser desastrosas, tanto no que se refere à baixa produtividade, quanto a eventuais riscos para a segurança das informações empresariais, já que uma série de dados pessoais de clientes/consumidores e outros colaboradores poderão ser acessados pelo teletrabalhador. Não se trata de decisão que possa ser tomada de maneira açodada ou sem a existência de fluxos que permitam controlar as operações que serão desenvolvidas pele teletrabalhador.

O gestor, na condição de líder, deve conhecer em profundidade a estrutura da organização empresarial para ver se é pertinente e oportuna a opção pelo teletrabalho, bem como precisa ser perspicaz para reconhecer os trabalhadores que reúnem as condições subjetivas necessárias a assumir tal desafio.

É neste ponto que se sobressai a teoria desenvolvida por Meneghetti (2005 e 2011, p. 100) que identifica na Ontopsicologia uma poderosa chave de desenvolvimento humano e social. Para o autor, a Ontopsicologia pode contribuir para que o gestor empresarial tenha condições de “identificar se os “orgânicos do seu grupo da empresa funcionam ou não”, elegendo àqueles que têm perfil para este desafio. Dentre esses trabalhadores não devem estar aqueles que apenas se limitam a cumprir as próprias rotinas, sem colocar a serviço sua competência e dinâmica para melhorar e aperfeiçoar os fluxos empresariais. Quem tem esse perfil profissional deve laborar desde o ambiente da empresa e atuar sob constante acompanhamento presencial e vigilância, como identificado por Meneghetti (2011, p. 100), quando adverte que “Deve-se, sobretudo vigiar aqueles meticulosos circunspectos que fazem apenas rotina, jamais avanço ou ganho evidente”. Portanto, é preciso mais do que o conhecimento jurídico que informará sobre tarefas, jornadas e os necessários cuidados com dados pessoais e empresariais, mostrando-se essencial aliar formação humanística e liderança

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761 para ter perspicácia na identificação do perfil adequado para determinada atividade, algo que pode ser desenvolvido a partir dos conhecimentos provenientes da Ontopsicologia. A ausência dessa formação multidisciplinar poderá levar o gestor que desconhece sua equipe a uma escolha desastrosa, pois ao trabalhar desde outro espaço físico haverá o risco de o empregado revelar a terceiros ou deixar ao seu alcance importantes informações empresariais que devem permanecer resguardadas da ingerência de pessoas estranhas, o que colocará em risco não só a saúde da empresa e sua confiabilidade no mercado, como poderá significar a perda do próprio posto de trabalho do teletrabalhador desidioso.

O sucesso da adoção do teletrabalho também depende da existência do espaço físico adequado e seguro na casa do trabalhador ou em local adotado para este fim, com disponibilidade de equipamentos com acesso à internet que comportem o uso de programas e aplicativos para acessar o sistema operacional da empresa com segurança e rapidez. Portanto, nem todos os trabalhadores de uma empresa poderão ser alocados nesta modalidade, pois depende do tipo de atividade que realizam na estrutura organizacional empresarial e do cumprimento de requisitos subjetivos e objetivos.

Quando se analisa o tema sob a óptica do trabalhador virtual verifica-se que um dos possíveis problemas a ser superado é possibilidade de o teletrabalho consistir em risco à violação de seus direitos fundamentais, especialmente de sua privacidade, invadida pelos instrumentos e tarefas oriundas da empresa e que chegarão até seu lar (especialmente quando utilizado o home office). Tal fato não pode ser ignorado, pois o ambiente de trabalho e a própria atividade migrarão da empresa para a casa do trabalhador, borrando as linhas demarcatórias que punham fim ao expediente, o que pode prejudicar o seu direito à desconexão e descanso. Essa situação pode ficar ainda mais agravada se a empresa impuser o cumprimento de metas ou atividades cujo cumprimento extrapolem a carga-horária que normalmente seria cumprida pelos trabalhadores que estão na própria sede da empresa.

Caso isso ocorra os prejuízos ao trabalhador serão consideráveis, pois além de eventuais riscos para a sua privacidade, com o seu lar transformado em extensão da empresa, haverá riscos para a saúde física e mental do obreiro pelo eventual excesso de trabalho, ao que se somará a perda de direitos, como o de recebimento pelas horas-extras. Com efeito, o tratamento do trabalho à distância passou por transformações nos últimos anos: primeiro ocorreu mudança imposta pela Lei nº 12.551, de 15 de dezembro de 2011, que havia alterado o art. 6º da CLT à época. A recente reforma trabalhista, ocorrida em 2017 e levada a efeito pela Lei n. 13.467 trouxe questionáveis previsões sobre o tema, especificamente em seu artigo

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761 62, o qual exclui do regime protetivo da CLT os teletrabalhadores, entendendo-se que estes não se encontram sujeitos ao regime de controle de jornada e, por conseguinte, não têm direito ao pagamento de horas-extras, o que por certo se constitui em retrocesso social. Portanto, essa previsão legal exige que o trabalhador tenha muita ciência sobre como ficará sua situação jurídica se optar por essa modalidade, com prévio ajuste sobre os limites das tarefas. Além disso, o ajuste sobre o teletrabalho deve comportar claras previsões sobre quem arcará com os custos referentes à infraestrutura, ou seja, qual ator da relação jurídica suportará as despesas de luz, água, acesso à internet e gastos com equipamentos.

O contraste entre vantagens e desvantagens decorrentes dessa modalidade indica que a opção pela realização de teletrabalho deve ser precedida de estudos técnicos sobre sua viabilidade, o que deve considerar o porte, objetivos e missão assumidos pela organização empresarial que pretende adotá-lo. A decisão cabe ao dirigente da empresa, que deve agir como verdadeiro líder e, nesta condição, não pode se pautar apenas na redução de custos operacionais, tampouco basear-se em eventual necessidade pessoal do trabalhador, que por algum motivo precisa permanecer em casa. O líder empresarial deve estar preparado, portanto, para considerar todas as variáveis, sempre com foco nos objetivos, princípios e missão institucional, mostrando-se alguém dotado de formação multidisciplinar que permita ter ampla visão de presente e, especialmente, capacidade de traçar caminhos de longo prazo para a organização empresarial.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS: APOSTA NA FORMAÇÃO MULTIDISCIPLINAR DO EMPRESÁRIO PARA A ADEQUADA TOMADA DE DECISÃO.

Conforme visto ao longo deste trabalho, o uso das tecnologias da informação e comunicação produz importantes impactos na economia, redefinindo muitas ações empresariais. Uma dessas mudanças relaciona-se à adoção de modelos empresariais que investem na organização virtual, sendo o teletrabalho uma dessas expressões.

Ao lado de inúmeras vantagens, o teletrabalho exige exame acurado por parte do gestor empresarial, que deve agir como verdadeiro líder, prospectando oportunidades e reduzindo as chances de eventuais resultados negativos. Deve estar preparado para verificar a quem atribuirá esta modalidade, com condições de confirmar se o teletrabalhador reúne condições objetivas e subjetivas para tanto. Quanto a essa última, o perfil do trabalhador deve ser considerado com cuidado, exigindo-se autonomia e protagonismo de sua parte. Tais atributos relacionam-se à capacidade de o trabalhador assumir com zelo e dedicação as tarefas que lhes

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n.4,p.20717-20729 apr. 2020. ISSN 2525-8761 são confiadas, o que se reveste da maior importância já que as atividades serão cumpridas fora do ambiente laboral.

Para o êxito do uso desta nova modalidade de trabalho torna-se essencial que empregadores e trabalhadores pautem-se pelo princípio da confiança, sustentáculo da boa-fé objetiva. Por meio deste princípio, atores da relação jurídica contratual devem comportar-se de forma íntegra, com lealdade, cumprindo com honestidade os ajustes firmados. Tal princípio ancora-se de ética e é uma via de mão dupla, pois o empregador não pode impor ao teletrabalhador carga de trabalho e tarefas incompatíveis com sua jornada de trabalho, especialmente em razão das recentes alterações legislativas trabalhistas, segundo as quais não haverá pagamento de horas-extras ao teletrabalhador. O teletrabalhador, por sua vez, deve cumprir o que foi acordado, não se dispersando do trabalho, tendo autonomia e poder de iniciativa, sendo diligente com dados e informações empresariais sensíveis. O manuseio de informações fora do ambiente empresarial exigirá cuidados redobrados por parte do empregado para que terceiros (também moradores da casa) não tenham acesso desautorizado a esses dados, o que poderia comprometer o desempenho da empresa e inclusive sua relação com clientes/consumidores.

A adoção do teletrabalho pode se constituir em interessante opção na inserção e atuação da empresa na sociedade em rede, além de ser estratégia essencial para vencer períodos de crise ou restrições de mobilidade física de empregados. Seu êxito, no entanto, depende da atuação do líder empresarial, que deve ter formação multidisciplinar que lhe aguce a intuição e lhe confira capacidade de identificar aqueles membros da sua organização dotados de autonomia, responsabilidade e protagonismo para o desempenho das atividades online. Para o êxito da atuação do empresário defende-se recorrer ao diálogo entre Direito e Ontopsicologia, pois a abordagem multidisciplinar poderá contribuir para que este líder alie conhecimentos jurídicos a novas formas de atuar capazes tanto de extrair o máximo de si mesmo quanto incentivar cada trabalhador a realizar de modo otimizado seu próprio projeto de vida para, uma vez atuando de maneira conforme ao seu projeto de natureza, ter condições de dar contribuição positiva e de crescimento também ao sistema empresarial. Para tanto, o gestor deve ter condições de designar ao teletrabalho aqueles que têm condições de efetivamente contribuir com o escopo empresarial, investindo nessa modalidade se houver a suficiente confiança e boa-fé objetiva entre os atores da relação jurídica contratual, conforme sustentado ao longo do trabalho.

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Referências

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