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A PNAD como instrumento de trabalho para o estudo de situação do menor no Brasil

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Academic year: 2021

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A PNAD COMO INSTRUMENTO DE TRABALHO PARA O ESTUDO DE SITUAÇÃO DO MENOR NO BRASIL

Rosa Ribeiro** 1. INTRODUÇÃO

Não é recente no Brasil a preocupação com a chamada "questão do menor". Desde a de3cada de 40 o Estado vem tentando traçar e implementar uma política de atuação voltada para o atendimento a infância e à juventude das camadas mais pobres da população. Na década de 70, o agravamento das desigualdades sociais, aumentando os níveis de pobreza desses segmentos mais desfavorecidos, voltou a recolocar a questão em diversos níveis. Em 1976, a preocupação com os altos índices de inflação encontrados entre os menores pobres teve como conseqüência a criação, na Câmara dos Deputados, da Comissão Parlamentar de Inquérito CPI do Menor -encarregada de investigar a situação daquele grupo. 0 resultado desse trabalho é o documento "A Realidade Brasileira do Menor" onde se encontram estimativas do numero de menores carentes e de abandonados que passaram a constituir um parâmetro para o dimensionamento do problema. Nesta mesma época, surge a Pastoral do Menor, revelando a preocupação da Igreja com a questão; tem início em São Paulo o Movimento de Defesa do Menor; é aprovado o novo Código de Menores em 1979 e o UNICEF amplia sua ação no Brasil(1)

A crise econômica que se abateu sobre o Pais no início da década de 80 acelerando os níveis de pauperização de grande parcela de população faz com que se retome velhas questões sobre a situação do menor no Brasil. Discute-se amplamente o impacto da crise sobre a situação de infância em seus mais diversos aspectos: a mortalidade infantil, a desnutrição, a marginalidade e a delinqüência, o acesso ao sistema escolar e o trabalho do menor. Ao mesmo tempo, de um lado, criam-se na área governamental novos programas e, de outro, proliferam as ações desenvolvidas por entidades de caráter associativo, comunitário, ou religioso que visam atender a população carente em geral e ao menor especificamente.

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Toda essa preocupação com os problemas que envolvem a infância e a adolescência das camadas mais pobres da população, fazendo com que a questão do menor seja reconhecida como um problema social sobre o qual é preciso intervir, levou a um grande aumento de produção de estudos e pesquisas sobre o tema. Em um balanço sobre a produção de trabalhos nessa área a partir dos anos 60 Alvim e Valladares, 1987, identificaram 212 títulos incluindo artigos em revistas especializadas, livros, publicações oficiais, relatórios de pesquisa, teses e comunicações em congressos. Desse conjunto, 48 ou seja 23% fazem parte de produção oficial ou seja foram realizados ou patrocinados pela FUNABEM, Ministério do Trabalho, IPEA/IPLAN, IBGE e UNICEF visando obter subsídios para formular políticas e desenvolver ações voltadas para o atendimento ao menor carente. Pouco mais da metade dessas publicações tem como tema central as características sócio-eco-nômicas das crianças pobres, o trabalho do menor e a questão de educação. Quase todos esses trabalhos utilizam, senão exclusivamente, pelo menos de uma forma predominante, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD - obtidos através de tabulações especiais, como base para suas análises. De fato, a PNAD, enquanto levantamento estatístico oficial, desenhado com o objetivo de fornecer subsídios para acompanhar o desenvolvimento sócio-econômico do País, constitui a principal fonte de informações sobre a população de 0 a 17 anos.

Embora limitada a investigação de alguns temas, como não poderia deixar de ser, por razoes impostas por seus objetivos e sua metodologia, a

PNAD levanta um conjunto extremamente precioso de informações.(2) Através

do seu Corpo Básico isto é um questionário permanente, com periodicidade anual, investiga:

a) características de habitação entre as quais se destacam por seu interesse aquelas que dizem respeito as condições de infra-estrutura de saneamento - água e esgoto, indicadores importantes nos estudos de mortalidade infantil;

b)características dos moradores: sexo, idade, condição na família e no domicílio, alfabetização, nível de instrução (grau de série freqüentadas, condição de atividade, rendimento;

c) características de mão-de-obra: ocupação exercida, setor de ati-vidade, posição na ocupação, carteira de trabalho assinada, rendimento, horas trabalhadas por semana, vinculação a previdência, procura de trabalho, trabalho anterior, características do ultimo trabalho remunerado, características do ultimo

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Com tais informações tem-se pelo menos uma visão geral da situação do menor a medida em que é possível responder a algumas perguntas fundamentais sobre ele.

Em que tipo de estrutura familiar e domiciliar vivem as crianças e adolescentes?

Qual a sua situação no que se refere ao trabalho e a freqüência a escola?

Qual o seu nível de adequarão, atraso e absenteísmo em relação ao sistema escolar?

De que forma as crianças e adolescentes de mais de 10 anos trabalham? (setor de atividade, ocupação exercida, posição na ocupação). Em que condições trabalham? (horas trabalhadas, rendimento, carteira de trabalho assinada).

Em que proporção o rendimento obtido pela criança e pelo adolescente contribui para o conjunto do orçamento familiar?

Esse elenco de informações é tão mais importante na medida em que a pesquisa é de abrangência nacional, com exclusão da área rural da Região Norte, e que o esquema de amostragem permite a desagregação até o nível de unidade da federação e região metropolitana. Por outro lado, a periodicidade anual garante a possibilidade de acompanhamento contínuo de situação sócio-econômico do menor.

O trabalho com estas informações apresenta, no entanto, alguns problemas que podem ser englobados em dois níveis. 0 primeiro se refere aos problemas de conceituação e classificação; e o segundo diz respeito a divulgação das informações.

Alguns conceitos merecem especial atenção nesse sentido. Examinemos inicialmente os conceitos de família e condição na família, de fundamental importância na análise das condições de vida de criança e do adolescente, na medida em que estas são definidas pelas características das famílias a que pertencem.

O IBGE define, para efeito de suas pesquisas, entre elas as PNADs, família como sendo "o conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica ou normas de convivência que vivessem na mesma unidade domiciliar e, também, pessoa que vivesse só em uma unidade domiciliar".

Por essa definição constituem famílias não só as pessoas que vivem sós como também todo conjunto de até cinco pessoas sem laços de pa-rentesco, situações que não correspondem aos conceitos utilizados pela antropologia e pela sociologia para as quais um dos elementos básicos na constituição da família é a existência de laços de afinidade e/ou consangüinidade. (3) Embora a definição seja essa, é possível distinguir as

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famílias no sentido sociológico das "não famílias" através da construção de uma tipologia de unidades domésticas baseada nas relações de consangüinidade (filhos e parentes). Dados obtidos através de tabulações especiais em que se utiliza esta tipologia mostram que, em 1986, 93,3% das unidades domésticas no Brasil eram constituídas por famílias no sentido sociológico e que 99,9% das pessoas de 0 a 18 anos viviam neste tipo de família. Esse dado se confirma quando se sabe que 98,7% das pessoas de 0 a 18 anos estão na categoria de filhos, cônjuges e outros parentes.

Duas outras observações aparecem quando se trata de condição na família. A primeira, é a impossibilidade de distinguir os filhos biológicos do casal, dos filhos adotivos e de criação, o mesmo ocorrendo em relação aos filhos só do chefe ou de sua cônjuge. Embora possa-se dizer que os filhos adotivos e de criação sejam numericamente pouco significativos, seria necessário poder identificá-los para saber, por exemplo, em que tipo de família ocorre a adoção e se esse fenômeno está se difundindo ou não.

De outro lado, a falta de detalhamento quanto a condição de filiação empobrece a análise de estrutura familiar quando se sabe que, sobretudo nas duas ultimas décadas, a família passou por grandes mudanças que afetaram suas formas de organização.

A outra fragilidade encontrada na definição desses conceitos diz respeito a impossibilidade de relacionar, para toda a população, as ca-racterísticas das crianças e adolescentes com as de sua mãe. Isto porque a condição na família é definida em relação ao chefe. Por isso, quando se deseja estabelecer a relação entre alguma característica da mãe com seu filho costuma-se trabalhar com as mulheres chefes e cônjuges, embora se saiba que nem sempre o filho do chefe seja também de seu cônjuge. Essa probabilidade, no entanto, não é muito grande, uma vez que se verificou através do Suplemento da PNAD 85 sobre a situação do menor nas regiões metropolitanas que apenas 4,4% de população de 0 a 17 anos não vive no mesmo domicílio que sua mãe.

No que se refere a participação das crianças e adolescentes nas ati-vidades econômicas as informações levantadas pela PNAD sobre mão-de-obra fornecem informações específicas sobre o trabalho do menor mas não permitem que se tenha um quadro muito completo da diversidade dessas atividades.

O primeiro problema com o qual se depara o pesquisador é relativo aos conceitos de PEA e de trabalho utilizados por aquela pesquisa. A definição de PEA limita em 10 anos a idade mínima para que a pessoa seja considerada como força de trabalho disponível. No entanto, sabe-se que muitas crianças com menos de 10 anos trabalham, mas, pela definição, ficam fora da pesquisa. Por outro lado, investigações de caráter qualitativo apontam para

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uma grande diversidade de atividades realizadas por crianças e jovens, através das quais obtêm ganhos em espécie ou em mercadorias que são, muitas vezes, fundamentais para garantir sua própria sobrevivência e/ou complementar o orçamento de suas famílias. Tais atividades se caracterizam por sua intermitência, pela ausência de vínculo de emprego e pela flexibilidade quanto aos tipos de serviços ou tarefas realizados. Desse modo, apreender o exercício de tais atividades através da utilização do conceito de trabalho tal como definido pela PNAD, que ainda prescreve um certo grau de intensidade (15 horas semanais) e sua ocorrência num período restrito de tempo (a semana de referencia) leva a dificuldades não só de captação do fenômeno, mas também das nuances que caracterizam o desempenho de atividades remuneradas ou não nestas faixas de idade.

Soma-se a essa inadequação na forma de inquirir, a própria representação do que seja "trabalho" interiorizada pelos informantes que freqüentemente se ajustam a conceituarão dominante de trabalho, di-ficultando, por conseguinte, a detectação de várias formas de serviços ou tarefas que, a rigor, são as maneiras possíveis e apropriadas de os menores trabalharem. Daí a necessidade de um instrumental muito mais sutil e adequado para dar conta dessa realidade no sentido de que não seja indevidamente subestimada.

As dificuldades acima descritas se apresentam de forma mais aguda quanto mais baixo é o grupo de idade do menor. 0 caráter das atividades realizadas pelos menores na faixa de até 13 anos, por ser mais instável -demanda maior sutileza na sua apreensão. Já a partir de 14 anos, quando o menor pode ter vínculo empregatício e carteira de trabalho assinada, o trabalho realizado possivelmente assume aspectos mais formalizados e, portanto, mais próximo do caráter do trabalho adulto. Assim, apesar do conceito de PEA abranger a população acima de 10 anos, pode-se dizer sem grande margem de erro que, na verdade, é a partir dos 14 anos que o trabalho do menor pode ser apreendido de forma mais adequada utilizando-se tal conceituação.

Dentro do elenco limitado de questões investigadas pela PNAD e que contribuem para o estudo das condições de vida do menor no Brasil as principais questões metodológicas foram expostas. Resta uma observação quanto as limitações dos itens destinados a investigar a freqüência a escola e o nível de instrução das pessoas de mais de 5 anos de idade. Nesta parte do corpo básico da PNAD constata-se que os dados levantados dão conta do grau de alfabetização da população, do seu n nível de escolaridade e índice de escolarização. Ora em um país onde cerca de 42% da população de 0 a 18 anos, como mostram os dados relativos a 1986, vive em situação de pobreza, ou seja, tem uma renda mensal familiar per capita de 1/2 salário

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mínimo e, onde 17,5% da população de 7 a 14 aos, período de escolaridade obrigatória, não freqüenta escola, sendo que 10,3% nunca freqüentou, essas informações são precárias para a compreensão e a intervenção na situação educacional do menor. Seria fundamental saber, pelo menos, em que proporção a população está sendo atendida pela rede pública e particular de ensino e quais os motivos que levam a que uma parcela dessa população não freqüente ou tenha deixado de freqüentar escola.

No que se refere a divulgarão das informações levantadas pelo corpo básico discriminados por idade, a PNAD da década de 80 é extremamente pobre. Apenas cinco tabelas divulgadas nas publicações oficiais dos resultados das PNADs apresentam informações por classes de idade. Estas tabelas indicam:

a) a estrutura de população por idade, sexo e situação de domicilio; b) a condição de alfabetização;

c) a condição de atividade;

d) a posse da carteira de trabalho assinada; e) a contribuição a previdência social.

Com base nestas informações não é possível conhecer minimamente qualquer dos aspectos fundamentais das condições de vida da população de 0 a 17 anos; a situação familiar, os aspectos educacionais e a inserção no mundo do trabalho. Nessa medida, é preciso que o órgão, instituição ou pesquisador interessado no tema tenha acesso a fita que reúne o conjunto das informações da PNAD ou solicite tabulações especiais. Tais procedimentos, no entanto, representam custos elevados ou dispêndio excessivo de tempo, o que dificulta o acesso dos usui3rios as informações.

2. O SISTEMA CONTÍNUO DE ACOMPANHAMENTO DA SITUAÇÃO SÓClO-ECONÔMICA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Em 1979, a comemoração do Ano Internacional da Criança e a necessidade do UNICEF, no momento em que ampliava sua ação no Brasil, de ter maiores subsídios sobre a situação de infância no País levou a realização de um convênio com o IBGE. Dessa forma teve início o trabalho de organização, análise e divulgação das informações já produzidas pelo IBGE, através de suas pesquisas básicas na área social Censo Demográfico, PNAD - que dessem conta do tema em questão. Nesse sentido, foram realizados alguns trabalhos publicados na série Perfil Estatístico de Crianças e Mães no Brasil, que .já conta com seis volumes, onde foram abordados:

1) aspectos sócio-econômicos de uma forma geral, abrangendo: mortalidade infantil; situação familiar, aspectos educacionais, situação de trabalho e rendimento;

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2) aspectos nutricionais utilizando dados de Estudo Nacional de Despesa Familiar - ENDEF;

3) situação de saúde;

4) mortalidade infantil nas áreas urbanas.

A maioria desses trabalhos utilizam dados da PNAD, sejam obtidos do corpo básico ou de seus suplementos especiais, como foi o caso daquele que se refere a situação de saúde. Estes trabalhos foram norteados pela preocupação de traçar um diagn6stico rápido da questão abordada e também divulgar o maior número possível de informações disponíveis para que outros usuários os pudessem utilizar, segundo seus próprios objetivos.

0 reconhecimento crescente de relevância da questão do menor na área da política social e a divulgação daquelas publicações fez com que crescesse substancialmente a demanda de informações sobre o tema junto aos técnicos do IBGE. Além disso, o próprio desenvolvimento do trabalho iniciado anteriormente mostrou a necessidade de se ter um conjunto de informações básicas sobre o menor atualizadas permanentemente. Com esse objetivo foi montado o Sistema Contínuo de Informações sobre a Situação do Menor em elaboração no Departamento de Indicadores Sociais do IBGE. Trata-se do aproveitamento do conjunto de informações levantadas pelo questionário básico da PNAD, tendo em vista atender o objetivo proposto. O que se pretende é fornecer informações básicas sobre o menor, com atualização anual e a maior agilidade possível na divulgação, de modo que esta acompanhe o mais de perto possível a publicação oficial dos resultados do questionário básico da PNAD.

No momento tem-se um total de 26 tabelas com cruzamentos das principais variáveis que permitem responder aquelas perguntas essenciais sobre a condição do menor, quanto a sua situação familiar, de trabalho e freqüência a escola. A primeira parte do trabalho, na verdade, é de recuperação da série histórica das informações selecionadas, a partir de 1981 chegando até 1986, a nível de Brasil, Grandes Regiões, Unidades da Federação e Regiões Metropolitanas. Sobre essa base serão selecionados índices e taxas que sintetizem as informações mais significativas para caracterizar a situação sócio-econômica do menor. Nessa etapa do trabalho, procurar-se-á dar destaque especial a situação do menor carente que representa cerca de 42% da população de 0 a 17 anos e constitui a população alvo de política social em suas diversas manifestações.

Ao longo do processo de construção desse sistema pretende-se fazer uso de outras informações provenientes de pesquisas realizadas pelo próprio IBGE, como a Pesquisa Mensal de Emprego e a Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária, além dos dados produzidos por outros órgãos tais como

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Ministério do Trabalho, Ministério da Educação e Ministério da Saúde. Nesse sentido, já foram dados alguns passos tendo em vista o maior entrosamento com estes órgãos, o conhecimento de seus sistemas estatísticos e a elaboração de uma proposta de trabalho integrado.

3. O MENOR NOS SUPLEMENTOS DAS PNADs

DA DÉCADA DE 80 (4)

Todos os suplementos da PNAD na década de 80 fornecem algum tipo de informação sobre a criança e o adolescente no que se refere ao tema abordado. Dois deles, no entanto, se destacam especialmente: o que levantou o perfil educacional da população, em 1982, e o que investigou a situação do menor nas regiões metropolitanas, em 1985.

No Suplemento de Educação de 1982 as informações mais importantes para o estudo da situação do menor são:

a) a freqüência a creche e ao pré-escolar para crianças de 0 a 6 anos; b) a informação sobre a rede de ensino e o turno freqüentado, a

duração da jornada escolar, o acesso à merenda escolar, o motivo da evasão escolar, o motivo da não freqüência a curso regular e as expectativas de reintegração ao sistema de ensino.

Este suplemento investigou também a condição de atividade e o numero de horas trabalhadas pelas crianças de 7 a 9 anos que declararam ter algum trabalho na semana de referência. No entanto, dados os problemas decorrentes da utilização do conceito de trabalho tal como é definido pela PNAD, como foi visto anteriormente, estas perguntas não tiveram um numero de respostas significativas.

Em 1985, a preocupação com o agravamento das condições de vida das crianças e adolescentes, manifesto inclusive pela SEPLAN, associado à percepção de que as informações levantadas pelo questionário básico da PNAD forneciam possibilidades limitadas para sua compreensão levou a que o tema de investigação do Suplemento Especial fosse a situação do menor.

A primeira dificuldade encontrada foi em relação a definição do segmento que constituiria o objeto da pesquisa, uma vez que o termo menor está impregnado de conotações as mais diversas. Resolveu-se, então, adotar o critério jurídico que considera como tal todas as pessoas com idade inferior a dezoito anos completos. Esse critério, por um lado, seria o mais abrangente e, nessa medida, permitiria também que, posteriormente, ao se utilizar na análise dos dados o recorte de classes de rendimento familiar, fosse possível comparar diferentes aspectos das condições de vida de crianças e adolescentes de segmentos sociais diferenciados.

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Uma vez definido o objeto da pesquisa, colocou-se uma segunda questão: a circunscrição do universo a ser pesquisado. Dadas as limitações existentes quanto ao tamanho do questionário do suplemento, considerou-se mais interessante restringir o âmbito da pesquisa sobre a situação do menor as Regiões Metropolitanas e ao Distrito Federal. Isto porque tinha-se total clareza que o elenco de questões de interesse para investigação da situação do menor na área urbana diferia bastante daquele voltado para a pesquisa na área rural. Assim, a tentativa de captar duas realidades tão diferenciadas poderia ser menos elucidativa.

Por outro lado, 69% dos menores de 0 a 17 anos no País estão nas áreas urbanas onde se concentram os problemas de abandono, trabalho do menor na rua, menores em situação de "risco", necessidade de implantação de serviços de atendimento ao menor carente, seja na faixa de creche, de profissionalização ou de assistência social propriamente dita.

Uma vez resolvidas estas questões passou-se a definir o elenco de temas e questões que seriam abordados através do suplemento. Foram então selecionados os seguintes temas:

1) a situação do menor no grupo doméstico e/ou familiar

2) a guarda de crianças durante o dia, articulada ao acesso a serviços de creche e pré-escola;

3) a inserção das crianças e adolescentes de 7 a 14 anos no sistema escolar e o uso do tempo extra-escolar;

4) a inserção do menor no "mercado de trabalho", o ganho e o uso do dinheiro;

5) a dieta alimentar das crianças e adolescentes de 0 a 14 anos.

A partir do momento em que se passou para operacionalização das questões e desenho do questionário surgiram problemas em vários níveis: técnico, metodológico e conceitual, contornadas na medida do possível ao longo do processo com conseqüentes implicações na reformulação do questionário.

Os problemas de ordem técnica se referem principalmente ao tamanho do questionário com conseqüências sobre o tema para seu preenchimento, e a necessidade de articulação integral entre as questões formuladas para o suplemento e as questões constantes do corpo físico da PNAD. Deles decorrem limitações quanto ao numero, a seleção e a forma de elaboração das perguntas incluídas no suplemento.

As dificuldades metodológicas são, muitas vezes, bem mais difíceis de resolver. Ao elaborar o suplemento do menor foram travadas inúmeras discussões em torno da significância, em termos estatísticos, dos possíveis resultados de algumas questões. Exemplo típico disso é a tentativa de captar

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o "trabalho" do menor de 7 a 9 anos, em relação à qual viu-se que experiências anteriores como no caso do Censo Demográfico de 80 e na PNAD 82 foram frustradas.

A esta questão acresce-se uma outra que é de natureza conceitual e que aparece, como vimos anteriormente, ao usar o conceito de trabalho para captar as atividades realizadas pelas crianças e adolescentes.

O processo de busca de soluções para tais dificuldades, contudo, revelou-se extremamente esclarecedor para a compreensão da enorme distância existente entre a formulação de um conjunto de idéias e questões relevantes acerca de um tema específico e as suas possibilidades de operacionalização dentro de um instrumento desenhado para captar outro conjunto de questões. Além disso levou a conclusão de que:

a) o suplemento sobre o menor, de fato é um instrumento capaz de oferecer informações apenas sobre alguns aspectos da situação das crianças e adolescentes;

b) que nessa medida as limitações do suplemento deveriam ser ne-cessariamente complementadas por "surveys" específicos com amostras dirigidas tentando, por um lado, captar os menores carentes e/ou abandonados nas instituições destinadas a abrigá-los e, por outro, captar o conjunto de as nuanças de situações e condições de vida do menor, impossíveis de serem adequadamente percebidas por uma pesquisa como a PNAD, cuja amostra é construída para dar conta de aspectos mais abrangentes da questão da "mão-de-obra". Em conseqüência dos problemas acima apontados uma das modificações ocorridas na elaborado do question3rio foi a exclusão de parte referente à dieta do menor. Isto ocorreu basicamente porque os dados sobre alimentação da criança em casa deveriam, em termos ideais, ser complementados por informações mais precisas sobre a quantidade de cada um dos alimentos ingeridos bem como por dados antropométricos das crianças. Ambos os tipos de informação são difíceis de serem obtidos através de um instrumento como a PNAD. A mensuração da quantidade de alimentos ingeridos envolve necessariamente a presença do pesquisador, munido de uma balança, na hora de preparação das refeições.

A coleta de dados antropométricos, por outro lado, implicaria não apenas na utilização de fita métrica e balança e o treinamento especial do entrevistador para sua utilização de forma correta, mas também a necessidade de medir e pesar todas as crianças residentes no domicílio o que exigiria voltas sucessivas do entrevistador sempre que não encontrasse todas as crianças moradoras na primeira abordagem.

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pela Polícia, Juizado de Menores), tão freqüentes na vida dos segmentos mais carentes da população e significativas no estudo de suas condições de vida, foram afastadas desde o início do quadro de possibilidades desse levantamento. Isto porque demandavam, a nosso ver, uma maior aproximação entrevistador/entrevistado, bem como um treinamento mais específico, coisas que não seriam possíveis de obter no contexto da realização da PNAD.

Finalmente em sua formulação definitiva o Suplemento do Menor levanta informações sobre as seguintes questões:

a) fecundidade das mulheres de 15 anos e mais: numero de mulheres que tiveram filhos, nascidos vivos e nascidos mortos; numero de filhos nascidos vivos, data de nascimento dos filhos nascidos vivos e numero de filhos vivos; informações essenciais para o cálculo das estimativas de mortalidade infantil esperança de vida;

b) situação do menor no grupo doméstico e familiar.

Complementando a pergunta sobre condição na família e no domicílio que permite compor a estrutura familiar e através dela construir as tipologias de unidades domésticas, tem-se, também através do questionário do suplemento, o numero de filhos adotivos e de criação.

Procurou-se também uma aproximação a questão do abandono perguntando:

- quantos filhos menores de 18 anos não residiam com suas mães?

- as razões pelas quais não residiam;

- com que idade deixaram de residir;

- qual a cor, o sexo e a idade dos que não residiam com as mães;

- com quem residiam.

Estas questões procuram, na medida do possível, captar o numero de menores institucionalizados ou de paradeiro desconhecido ou residindo em outro domicílio e tentam ver a relevância de fatores como "falta de condições financeiras da família" na determinação deste tipo de situação.

Os resultados preliminares mostram que cerca de 4,5% dos filhos menores de 18 anos não residem com suas mães e que é alta a proporção dos que deixaram de residir antes de completarem 2 anos de idade. Essa proporção é mais alta nas Regiões Nordeste e Norte (mais de 40% dos casos), enquanto, no Sul e Sudeste, fica em torno de 30%.

c) guarda da criança de 0 a 6 anos durante o dia articulada ao acesso a serviços de creche e pré-escolar.

O objetivo deste item é captar o grau de cuidados que a família pode dispensar as crianças de 0 a 6 anos.

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Para apreender esta realidade uma questão fundamental se coloca: com quem e onde ficam elas durante o dia e sob que condições? Várias alternativas foram formuladas, desde as esperadas formas de apoio e presença familiar, passando-se pelos recursos de serviços vicinais, remunerados ou não, até o acesso às mais variadas modalidades de creche e ao pré-escolar.

Com isto será possível perceber as estratégias adotadas pelas famílias dos segmentos mais desfavorecidos da população no que se refere à guarda da criança, a delinear situações de maturação precoce, de carência e de um forçoso semi-abandono.

0 cuidado em se investigar, debaixo do r6tulo creche, as diferentes formas sob as quais elas surgem, desde as institucionais até as domiciliares, como as "mães crecherias", visa, de um lado, captar a variedade da oferta destes serviços, e, de outro, o acesso diferencial aos mesmos considerando-se os diversos estratos sócio-econômicos.

Os resultados obtidos indicaram que o percentual de crianças que freqüentava creche ou pré-escolar era em média de 23%. De fato, quase metade delas, 46%, freqüentavam o pré-escolar o que pode ser visto pela idade com que começaram a freqüentar, 4 ou 5 anos. Menos de 10% começaram a freqüentar creche com idade inferior a 2 anos. Mais da metade, 56,7%, freqüenta creche ou pré-escolar particular, sendo que a única Região Metropolitana onde os estabelecimentos públicos é que recebem a maior proporção de crianças, 50,0%, é São Paulo. Em média 80% das crianças que freqüentam creche ou pré-escolar o fazem por um período máximo de 4 horas. Quando não estão na creche, a maioria, 72% das crianças, fica com a mãe ou o pai, 9% com empregada ou babá e 9% na sua pr6pria casa com outras pessoas. Tais dados associados com o numero de horas de maior freqüência ~ creche ou pré-escolar leva a crer que essa freqüência não está majoritariamente associada à condição de atividade das mães. Pretende-se avaliar melhor esta questão através do cruzamento das variáveis freqüência à creche ou pré-escolar, condição de atividade das mulheres e renda familiar percapita ou freqüência à creche, horas de permanência e horas habitual-mente trabalhadas pelas mulheres.

As crianças na faixa de 0 a 6 anos, que não freqüentam creche, isto é, a grande maioria delas, 76%, ficam em maior proporção, 78% em casa com a mãe ou o pai ou em 8% dos casos com outras pessoas, sem pagamento. As respostas indicam ainda que em 70,0% dos casos os pais ou responsáveis fizeram essa opção por achar que não havia necessidade de colocar a criança na creche ou no pré-escolar. O motivo falta de condições financeiras, na média, foi responsável pela não freqüência de 15% das crianças.

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d) a inserção das crianças e adolescentes de 7 a 14 anos no sistema escolar e o uso do tempo fora da escola.

As questões deste item voltadas para a população na faixa de idade de escolarização obrigatória tentam captar em que medida, e de que forma o menor de 7 a 14 anos é atendido pelo sistema escolar.

A realização de um suplemento da PNAD sobre educação, em 1982, e uma breve avaliação de seus resultados mostram que o conjunto de questões desenhado para se captar a realidade educacional do menor na PNAD-85 não apenas é relevante, pois permite comparações entre dois momentos diferentes mas, traz também um conjunto de informações sobre novas questões.

Para os menores que freqüentam escolas procura-se investigar a questão da repetência, os motivos para faltas repetidas a escola, o tipo de escola freqüentada, o numero de horas de permanência na escola, e o turno freqüentado.

Já para os menores nesta faixa de idade, que não freqüentam ou nunca freqüentaram escola, busca-se conhecer os motivos para a não freqüência. Na medida em que esta faixa de idade é aquela de obrigatoriedade escolar, o objetivo desta parte é investigar se a não freqüência está associada a situação econômica da família, a falta de escolas ou ainda a percepção de uma inadequação do sistema escolar ás necessidades da criança ou de sua família.

As questões referentes ao uso do tempo estão voltadas para saber: como é ele organizado no período extra-escolar; que atividades os menores de 7 a 14 anos realizam habitualmente nas horas passadas fora da escola; se colaboram ou não nas tarefas domésticas; se trabalham e se realizam atividades físicas de forma organizada; de que forma se divertem: assistindo televisão? brincando em casa ou na rua? Quanto tempo dispendem, na semana, em cada uma destas possíveis atividades?

Algumas questões foram colocadas quanto as dificuldades de captação adequada do que se pretendia indagar, pela forma e método como estava sendo inquirido. Uma real avaliação do uso do tempo tem sido aferida, em pesquisas de outros países, lançando-se mão de outros recursos como, por exemplo, a anotação detalhada, ao longo da semana, em cadernetas deixadas com as famílias, de todas as atividades de cada criança do domicílio e o tempo com elas dispendido. O questionamento quanto a possível qualidade daquelas informações, levou a se pensar na supressão deste elenco de perguntas em favor da exploração de outros aspectos.

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No entanto, acabou se optando por mante-las na medida em que a intenção, não era exatamente a de se levantar, com rigor, um "orçamento do tempo", mas tentar captar:

- o nível de controle das famílias sobre os menores desta faixa de idade; - em que medida o tempo extra-escolar da criança é mais ou menos

definido e delimitado por atividades pré-estabelecidas, com horários determinados, ou deixadas livres para uma auto-organização;

- em que grau, crianças de classes sociais diversas diferem quanto ao acesso a atividades extra-curriculares, a atividades de lazer orientado ou mesmo quanto a maior ou menor participação nos afazeres domésticos.

Os resultados preliminares apontam que cerca de 90% das crianças nesta faixa de idade freqüentavam escola, na maior parte das Regiões Metropolitanas. Dessas crianças a grande maioria, 80%, freqüentava escola publica. Cerca de 20% das crianças nesta faixa de idade freqüentando escola começou o 1o grau com atraso, ou seja, com 8 anos ou mais.

Quanto à repetência os dados foram os seguintes: 39% repetiram alguma série do 1.o grau; 66% repetiram a 1a série do 1o grau; 33% repetiram alguma série do 1o grau entre a 1a e a 4a.

O principal motivo para que 10% das crianças não freqüente escola é a falta de condições financeiras, 31,6% dos casos, seguida pela falta de vagas, 17,9%. Quanto a maneira de utilizar o tempo fora da escola os dados mostraram que:

91 % brincam em casa ou na rua; 90% estudam;

87% assistem televisão;

56% ajudam nos afazeres domésticos;

10% têm atividades esportivas ou realizam cursos de extensão cultural; 7% trabalham.

e) a inserção do menor de 5 e 9 anos e de 7 a 14 anos no mundo do trabalho; o ganho e o uso do dinheiro.

As dificuldades apontadas anteriormente, quanto à captação do trabalho do menor a partir da utilização do conceito de trabalho adotado na PNAD, levaram a tentativa de formulação de uma abordagem mais adequada da questão. Apesar da semelhança encontrada no que se refere as características do trabalho para o grupo de menores de 5 e 13 anos de idade, foi necessário, no momento da elaboração das questões, fazer um outro recorte devido ao fato de a população de 10 anos e mais já estar incluída no questionário de mão-de-obra do corpo básico da PNAD, que não podia, no

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momento, ser modificado. Assim foram formulados dois conjuntos de questões: o primeiro referente ao grupo de 5 a 9 anos e o segundo ao grupo de 10 a 17 anos.

Para o primeiro grupo, elaborou-se um conjunto de questões centradas em torno da informação sobre a realização de tarefas ou serviços, termos considerados mais apropriados para classificar as atividades de caráter informal e intermitente realizadas pelos menores. Tais questões procuram dar conta de alguns aspectos relacionados ao exercício dessas atividades tais como: tipo de tarefa ou serviço realizado, sejam afazeres domésticos, sejam atividades econômicas remuneradas ou não, com a especificação sobre o local onde é realizada e o que é efetivamente feito, por exemplo: entrega e transporte de mercadorias, serviços de limpeza, vendas na rua etc.

Procurou-se captar ainda a maneira pela qual o ganho (em dinheiro ou em mercadorias) dessas crianças d destinado a sua própria manutenção e à de sua família: se integrado totalmente ou em parte a um orçamento coletivo a ser gerenciado e redistribuído através de uma autoridade familiar ou se utilizado diretamente para consumo individual.

A intenção inicial ao elaborar o conjunto de questões referentes ao trabalho dos menores de 5 a 9 anos era bem mais ampla. Procura-se, em um primeiro momento, não só identificar as situações de trabalho como também avaliar as condições em que ele se dá: perto ou longe de casa, em que período do dia etc., e que implicações essas condições têm no não retorno a casa todos os dias da semana. No entanto, a questão de representatividade desse grupo na amostra da PNAD, associada as Iimitações relativas ao tamanho do questionário, fizeram com que essas questões fossem, nesse bloco, suprimidas. Tais aspectos, contudo, foram abordados, como veremos adiante, na parte que investiga, de modo complementar, o trabalho das pessoas de 10 a 17 anos.

Como foi mencionado anteriormente, na medida em que a parte relativa a mão-de-obra no Questionário Básico da PNAD inclui a população de 10 a 17 anos de idade, a opção possível foi a de complementar o conjunto de questões ali formuladas para o grupo nessa faixa de idade que estivesse trabalhando na semana de referencia. Assim foram formuladas algumas questões que dessem conta de aspectos não abordados, de modo a permitir uma caracterização um pouco mais completa do trabalho do menor.

Nesse sentido, investiga-se a idade em que esses menores começaram a trabalhar, alguns aspectos complementares para a caracterização das suas condições de trabalho, o retorno ou não a casa depois do trabalho e a utilização do que é percebido, ou seja, em espécie ou em mercadoria.

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Embora tenha se adotado uma outra forma de abordagem da questão do trabalho, pelo menos para o grupo de 5 a 9 anos, os resultados obtidos não foram significativos. Em média, um terço dos menores encontrados realizava alguma tarefa ou serviço, mas, ao detalhar o que era feito, viu-se que 95% deles realizavam tarefas domesticas e apenas 0,1 % ganhava dinheiro fora de casa. Tais dados parecem indicar que a PNAD não é o instrumento mais adequado para captar o trabalho do menor, pelo menos nessa faixa de idade. O que se supõe, como explicação para este fato, é que o fenômeno que se pretende investigar seja muito diluído no conjunto da população e portanto difícil de captar através de uma pesquisa baseada em uma amostra definida para levantar características gerais de mão-de-obra.

Para o grupo de 10 a 17 anos foram obtidos alguns resultados interessantes, por exemplo:

- a idade mais freqüente para começar a trabalhar é entre 14 e 15 o que ocorreu com 36% das pessoas que tinham entre 10 e 17 anos;

- a maior parte dos que trabalham, 44%, se dirige a pé para o local em que realiza sua atividade; o tempo médio do percurso considerando todas as formas de locomoção é de menos de 1 hora para ir e voltar para casa o que indica que, de modo geral, a criança e o adolescente costumam trabalhar próximo à sua casa;

- a grande maioria, 83%, trabalha durante o dia, seja em período integral ou parcial, voltando para dormir em casa todos os dias, 92%;

- entre os que não voltam todos os dias para casa, 8%, a maioria, 69%, fica de 2 a 6 dias fora. O motivo mais freqüente pelo qual ficam fora de casa é o trabalho, 49%. Entre estes, 91 % dorme no local de trabalho que, na maioria dos casos, deve ser a casa do patrão, dado o elevado percentual de empregadas domésticas na faixa de 10 a 17 anos.

A experiência que se teve ao elaborar este suplemento e a análise dos dados da amostra indica que a tradicional PNAD - mão-de-obra não pode ser generalizadamente tomada como um carro-chefe, apto e adequado para conduzir, a contento, qualquer outro tema complementar de investigação.

Em conseqüência dessa limitação mais fundamental e pelo próprio fato da PNAD ser uma pesquisa desenvolvida a partir tão-somente de domicílios, com uma amostragem construída com a finalidade de levantar características gerais da população torna-se imprescindível, para responder as importantes indagações que hoje se formulam e que merecem ser investigadas, que ela seja complementada com outras pesquisas orientadas mais diretamente para captar os fenômenos que se quer estudar, contemplando:

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• a construção de um universo especifico e, portanto, de uma amostragem dirigida;

• a elaboração de um questionário mais apropriado e seqüencialmente mais

articulado, que dê conta de realidades particulares. NOTAS

(1) - Ver a esse respeito A/vim, Maria Rosilene Barbosa e Valladares Lícia do Prado "Infância e Sociedade no Brasil: Uma análise da literatura in A "infância Pobre" no Brasil uma análise da literatura, da ação e das estatísticas - Relatório de Convênio: Fundação FORD/IUPERJ - Rio de Janeiro IUPERJ, 1988.

(2) - Levantamento completo sobre esta questão se encontra em Ribeiro de Souza et alii, Levantamento do Corpo Básico da PNAD e de seus Suplemento:, IBGEIDEISO, Rio de Janeiro, julho de 1986, mimeo.

(3) - Esta discussão 6 desenvolvida por Prado, Regina de Paulo Santos in "Conceito da Família a Domicilio" - Revista Brasileira de Estatística, Rio de Janeiro, 4311701; 275; 299 abr/jun da 1982.

(4) - Esta parte do trabalho se baseou em documento feito em conjunto pela equipe que elaborou o Suplemento da PNAD 85; Castello Branco, Helena; Roballo Ferreira, Lilibepth, Bandeira de Mello, Márcia; Prado, Regina e Ribeiro da Silva, Rosa Maria, Notas sobre o processo da elabora~8o do Suplemento da PNAD-86: Aspectos de situação do menor nas regiões metropolitanas brasileiras. IBGE/DESPO/DEISO, Rio de Janeiro, 1985, Doc. interno.

***

COMENTÁRIO

Felícia Reicher Madeira *

No decorrer deste Seminário acentuou-se com muita freqüência que, por uma série de motivos, a organização e execução dos questioniários dos Suplementos Especiais das PNADs têm sofrido um certo "atropelo" na organização e seleção das questões. A conseqüência mais grave é que, não consultando especialistas da área, alguns itens de importância substancial deixaram de ser considerados, ou, quando considerados, não estariam organizados da forma mais adequada.

__________

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Ao mesmo tempo, uma série de questões inexpressivas e desarticuladas seriam incorporadas, tornando o questionário uma espécie de guarda-chuva que abrigaria diferentes interesses sem manter uma unidade e coerência.

Com relação a PNAD do menor(85), como de certo acredito que ocorra em todas as outras, distorções desta natureza efetivamente existem, mas estão longe de invalidar o dado, tornar este conjunto de informações algo menor ou mesmo dispensáveis.

Concordo com a autora quando em vários momentos ela advoga em favor da importância das PNADs, em geral, e da 85, em especial, dado o destaque político que o tema assumiu, na convicção de que é preciso intervir para minimizar a grave situação de carência e abandono institucional em que vive uma grande parcela de crianças e adolescentes no Brasil.

Na verdade acredito que informações contidas na PNAD do Menor são decisivas para reverter políticas extremamente ideologizadas, politizadas e sobretudo equivocadas nesta i3rea de atendimento social.

De fato, no Brasil, a permanência de enormes desequilíbrios na desigual distribuição da renda, apesar do capitalismo dinâmico, modernizador e incorpoarador de mão-de-obra que prevaleceu ao longo do período autoritário acabou, de certa forma, no início dos anos 80 por priorizar a questão: como as políticas publicas sociais em um governo democrático pode contribuir para resgatar a divida social acumulada?

Para responder a esta questão a estratégia montada pelo governo democrático, vista agora, com algum distanciamento, foi bastante simples.

Inicialmente tratou-se de desenhar um quadro dramático da situação social do País, denunciando os graus de pobreza e miséria da população. A estratégia de intervenção tinha dois focos:

Por um lado, com um tom menos publico e alarmista, foram sendo identificadas as perversões do padrão brasileiro de proteção social, isto é, o perfil que em conjunto foram adquirindo as políticas publicas de corte social. As criticas recaiam sobretudo sobre o padrão de financiamento, o excesso de centralização e a falta de participação da população nos programas de intervenção estatal. Por outro, gerou-se uma tendência muito forte em defesa dos mecanismos alternativos e desburocratizadores da forma de prestação de serviços na área social. Uma idéia que foi ganhando força foi a da organização e distribuição de bens e serviços correndo paralela a máquina burocrática. Esta idéia acabara se alinhando com. as idéias da participação popular, já que faz parte do diagnostico a idéia de que a máquina é emperradora, que consumia por volta de 80% dos recursos em atividades meio e não em atividades fins.

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As políticas alternativas, ou os programas sociais como ficaram mais conhecidos, foram realizados basicamente via convênios e consórcios com prefeituras mas também foi muito forte a ativa participação comunitária de grande parte delas via Igreja Católica e Metodista, sobretudo nos programas de Promoção Social, Habitação e Alimentação. Hoje temos condições de falar com mais segurança que, no início dos anos 80, no rastro do processo de democratização houve claras tentativas de superdimensionar o volume e as condições de pobreza dos chamados setores populares da sociedade. No caso específico de São Paulo, temos mesmo condições de mostrar que esta tendência teve o apoio e o incentivo de alguns setores progressistas da lgreja Católica. As áreas em que a atuação comunitária via convênios e consórcios foi mais representativa foram também as áreas onde a dramaticidade do quadro foi traçada com linhas mais fortes, negras e distorcidas.

A conduta mais comum foi interpretar ou mesmo manipular os dados, tendendo para o sentido alarmista. Outra também comum, consistiu simplesmente em, não apresentar dados cujos resultados contrariam as versões que o pesquisador tem da realidade analisada.

É verdade que a grande maioria dos usuários destas informações desconhece completamente a existência de qualquer tipo de manipulação. Entretanto não foram poucos aqueles que tinham plena consciência dado as informações estatísticas e justificam-na em nome de uma postura que deveria (ainda que fosse manipulando dados e entrando no jogo dos meios de comunicação) deixar clara as mazelas e seqüelas do modelo concentrador de renda que prevaleceu nos vinte anos de regime autoritário.

Na área da habitação, a inflação dos indicadores das péssimas condições de moradia da população de baixa renda ocorreu especialmente na oscilarão e dimensionamento da caracterização da população moradora em cortiço, dentro da idéia de que a denuncia das favelas já não sensibilizava o suficiente. Apenas para dar uma idéia da disparidade as informações, as cifras apontadas pelo noticiário variaram de 1 milhão (Jornal do Brasil, dezembro 1981; antes do governo democrático) de moradores em cortiços até 4 milhões (Folha da Tarde, 15 de agosto de 1983, após o governo democrático).

Com relação a jovens e crianças de rua (menores) ouvia-se e lia-se que existiam no Brasil 32 milhões, 25 milhões de crianças abandonadas, sem que dispusemos de qualquer base real para sua avaliação. Daí a importância crucial dos dados da natureza da PNAD 85.

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A minha participação por um ano enquanto representante da Fundação Carlos Chagas no Conselho de Representantes do Programa do Menor do Estado de São Paulo, deixou claro que por trás dos discursos inflacionadores de "menores carentes e abandonados" haviam objetivos bem mais concretos e práticos. Órgãos públicos ou organizações da sociedade civil (sobretudo a igreja) procuravam superdimensionar o volume e a carência de sua clientela específica e com isso conseguir canalizar um volume mais expressivo de verbas diretas ou repasses das mesmas. Assim concordo plenamente com

Fúlvia Rosemberg* que participou comigo do Conselho do menor que

"crianças e jovens em 'situação irregular' significam a criação e manutenção de uma estrutura especial, paralela de atendimento, significam dinheiro (salários e convênios), votos, acesso aos meios de comunicação de massa. Crianças e jovens em 'situação irregular' acabam por ser a razão de existir de organismos internacionais e nacionais, públicos e privados. Diz-se, a boca pe-quena, que cada criança que perambula pela Praça da Sé (praça central de São Paulo) é 'atendida' por ou 'serve' a 6 programas diferentes especializados em meninos(as) de rua"

O Conselho de Representantes do Programa do Menor** foi desativado e

seus dois objetivos - uma articulação e integração entre as diferentes políticas públicas para a clientela de crianças e jovens (objetivo proposto por todos os representantes) e um debate político-ideoIógico do tema (proposto por alguns representantes) absolutamente frustrados. Teve entretanto um saldo positivo, o de ter propiciado, pela primeira vez no Estado de São Paulo, uma experiência de convívio entre representantes da sociedade civil, tornando mais nítida as divergências, os impasses e o viés ideológico da questão.

O que foi uma denuncia articulada pelos setores mais progressistas é hoje, mais do que nunca, manipulado de forma populista e clientelista pelos setores mais conservadores dos governos.

É verdade que a preocupação com o atendimento integrado ao adolescente e jovem é um tema novo no País e que está começando a se constituir como objeto de conhecimento. Trata-se também de um objeto de conhecimento bastante

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complexo, na medida que implica de imediato numa necessidade de resposta a necessidade/direitos de pelo menos dois interlocutores freqüentemente em conflito - a população infanto-juvenil e a família - e que por isso apela por uma abordagem interdisciplinar.

A novidade e a complexidade do tema podem explicar a pobreza e o desvio de conhecimento que dispomos - teórica e empírica mas são limitações que podem ser superadas, desde que haja desejo político para tanto.

As informações contidas na PNAD do menor são decisivas para o deslanchar deste processo, já que permitem um diagnóstico bastante diverso do divulgado de forma recorrente e sem base empírica.

É neste sentido que "atropelos", demora ou má interpretação de dados são fatos extremamente lamentáveis. É, por isso, que a inconsistência do discurso do IBGE que ao mesmo tempo apregoa a importância do dado e a retarda por vários anos (argumentando sempre com problemas técnicos que ao final não parecem tão graves) incomoda tanto.

Na página 10, a autora se refere às dificuldades de utilização dos dados em virtude dos altos custos da fita. Segundo experiência recente da Fundação Carlos Chagas e Secretaria do Menor de São Paulo nem isso é verdade.

Tínhamos a verba para pagar a fita, ela foi inicialmente prometida, liberada e depois negada. 0 argumento é que estavam "validando" o dado e a previsão é que não seria liberada até o final do ano.

Tenho agora algumas considerações mais pontuais:

Em relação à questão da creche e da pré-escola, as informações dadas são imprecisas e parcas, veja-se por exemplo dois parágrafos das páginas 19 e 20.

Vamos a eles:

1. CONCEITO DE CRECHE E PRÉ-ESCOLA

Afirma-se que 46% das crianças freqüentavam a pré-escola "o que pode ser visto pela idade com que começaram a freqüentar, 4 ou 5 anos".

Depois se diz que 80% das crianças freqüentam creche ou pré-escolas por u m período máximo de 4 horas.

Ora, o que define uma creche no Brasil não é a faixa etária, mas o horário de freqüência. E, na prática, o que define mesmo é a ligação ins-titucional. No País existe uma superposição de tipos de atendimento e justamente o que aguardávamos dessa pesquisa era a desagregação desse dado!

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2. CONCEITO DE CRECHE OU PRÉ-ESCOLA PARTICULAR

"Particular" inclui entidades não governamentais sem fins lucrativos que recebem repasse de verba oficial? Se inclui, essa informação é extremamente vaga: temos aí criança de classe média e da faixa de menor renda na mesma categoria.

3. MOTIVOS PARA SE COLOCAR UMA CRIANÇA NA CRECHE OU PRE-ESCOLA

A afirmação de que "essa freqüência não está majoritariamente as-sociada à condição de atividade das mães" porque a maioria das crianças as freqüentam em meio-período e ficam em casa no resto do tempo é um pouco temerária. Eu pessoalmente acredito que, em termos de maioria, isso deve ser até verdade. Agora o que acontece é que existem pouquíssimas vagas em estabelecimentos que ficam com a criança período integral e muitas vezes a opção não é opção, mas a alternativa que sobra. Além disso, para a mãe que trabalha, é melhor ter a criança em meio-período numa escolinha do que tê-la em casa o dia todo.

Os motivos mencionados na página 20 são também interessantes. Mas a imprecisão continua; 76% "não freqüentam creche" e em 70% desses casos os pais acham que "não havia necessidade de colocar a criança na creche ou no pré-escolar". Estamos falando de creche ou de pré-escola?

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