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Terra e trabalho: permanência de uma política pública na Fazenda Mundo Novo, em Caicó-RN

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA. Terra e trabalho: Permanência de uma política pública na Fazenda Mundo Novo, em Caicó-RN. Jossylúcio Jardell de Araújo. Orientador:. Prof°. Dr. Anieres Barbosa da Silva (PPPGE/ CCHLA/ UFRN). Natal-RN, setembro de 2008.

(2) Jossylúcio Jardell de Araújo. Terra e trabalho: permanência de uma política pública na Fazenda Mundo Novo, em Caicó-RN. Dissertação apresentada como requisito para a obtenção do título de Mestre junto ao Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, na área de concentração “Dinâmica e Reestruturação do Território”, sob a orientação do Prof. Dr. Anieres Barbosa da Silva.. Natal-RN, 29 de setembro de 2008..

(3) Catalogação da Publicação na Fonte. Universidade Federal do Rio Grande do Norte.. Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA). Araújo, Jossylúcio Jardell de. Terra e trabalho: permanência de uma política pública na Fazenda Mundo Novo, em Caicó-RN. / Jossylúcio Jardell de Araújo. - Natal, RN, 2008. 152 f. : il. Orientador: Prof. Dr. Anieres Barbosa da Silva. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia. 1. Política pública – Dissertação. 2. Agricultura – Fazenda Mundo Novo, em Caicó-RN – Dissertação. Dissertação. 5. Espaço – Produção e recriação – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. II. Barbosa da (Orient.). III. Título.. RN/BSE-CCHLA 911.3:32. Dissertação. 3. 4. Vazantes – Dissertação. I. Silva, Anieres. CDU.

(4) Aprovada em, 29 de setembro de 2008.

(5) Agradecimentos Registro e destaco os meus sinceros agradecimentos ao Profº. Dr. Anieres Barbosa da Silva, por ter aceitado o desafio da orientação; a Banca Examinadora; aos incentivos financeiros institucionalizados pelo CNPq; aos familiares e amigos; aos professores do Centro de Ensino Superior do Seridó – CERES; aos professores do Programa de Pós Graduação e Pesquisa em Geografia; bem como, àqueles professores com quem assisti aulas do Centro de Ciência Exatas e da Terra – CCET/ UFRN; aos funcionários que fazem parte da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte S/A – EMPARN;. e de modo especial, aos diversos vazanteiros que integram a. cartografia rural na/da Fazenda Mundo Novo. Por isso, a todos, meu mais profundo, OBRIGADO!.

(6) RESUMO. Este estudo versa sobre o Projeto Vazantes, como um caso de permanência da política de acesso às terras úmidas a montante do açude Mundo Novo, em Caicó-RN. Compreende aspectos sociais e econômicos dos vazanteiros, que, em suas experiências com a terra, recriam estruturas, formas e funções. Teoricamente, o trabalho está fundamentado nas idéias miltonianas (1986, 1988, 1996, 1997) sobre a produção e reprodução do espaço, este visto como sistema de ações que está articulado às políticas públicas e às realizações solidárias, na medida em que a produção, nas vazantes, ocorre praticamente sem investimentos tecnológicos, assistência técnica e crédito rural. No tocante aos. procedimentos. da. pesquisa,. realizamos. entrevistas. e. aplicamos. questionários com vazanteiros como também fizemos registros fotográficos e pesquisas em fontes documentais da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte S/A (EMPARN), do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Caicó (STRC), em jornais e revistas, assim como em outras fontes de informação relacionadas ao objeto do estudo. Tais procedimentos, aliados aos referenciais teórico-metodológico, nos auxiliaram na compreensão das relações que se processam na Fazenda Mundo Novo, tendo em vista que o espaço produzido pelos agentes envolvidos (EMPARN e vazanteiros) compõe uma estrutura de poder que envolve múltiplos interesses, na medida em que a terra e o trabalho são apropriados como mecanismos dialetizantes.. Palavras-chave: Agricultura; Fazenda Mundo Novo – Caicó; Política Pública; Vazantes; Produção e Recriação do Espaço..

(7) ABSTRACT. This is study about the Project Vazantes, as a case of stay policy on access to land upstream of the weir humid New World, in Caicó-RN. It includes social and economic aspects of vazanteiros, that in their experiences with the land, recreate structures, forms and functions. Theoretically, the work is based on the ideas miltonianas (1986, 1988, 1996, 1997) on the production and reproduction of space, as seen this system of actions that is articulated to the public policies and the achievements solidarity, to the extent that production, in vazantes there is virtually no technology investment, technical assistance and rural credit. Regarding the search procedures, we conducted interviews and questionnaires with vazanteiros applied but did photographic records and research into documentary sources Agricultural Research Company's Rio Grande do Norte S / A (EMPARN), the Union of Rural Workers of Caicó (STRC ), In newspapers and magazines, as well as other sources of information related to the object of study. Such procedures, coupled with theoretical and methodological benchmarks, helped in the understanding of the relationship that takes place in the New World Farm, in order that space produced by actors (EMPARN and vazanteiros) comprises a structure of power that involves multiple interests in extent that land and labor are appropriate mechanisms as dialetizantes.. Key-words: Agriculture; Finance New World – Caicó-RN; Public Policy; Vazantes; Production and recreation of the area..

(8) LISTAS. Páginas. LISTA DE FIGURAS. Fotografia 1: Pista de acesso a Fazenda Mundo Novo, sentido Caicó-Jucurutu. A direita, parte frontal da EMPAN ......................................... 12 Fotografias 2, 3, 4, 5: Ensaios da UEPAE de Caicó em campo aberto ......... 57 Fotografia 6: Dependências da EMPARN (antiga UEPAE de Caicó)............. 58 Fotografias 7, 8 e 9: placas que informam os núcleos de produção da EMPARN ..................................................................................................... 72 Fotografias 10 e 11: Estrutura onde ficam confinados os bovinos da EMPARN ..................................................................................................... 74 Fotografias 12 e 13: Diminuição do nível d’água do açude: constituinte de novas vazantes ......................................................................................... 103 Fotografia 14: Marco fronteiriço entre as vazantes ...................................... 104 Fotografias 15 e 16: Vazante no Riacho do Fechado .................................. 111 Fotografias 17 e 18: “Habitações” improvisadas construídas nos lotes pelos vazanteiros ........................................................................................... 112 Fotografia 19: Inseticidas mais utilizados nas vazantes ............................... 120. LISTA DE FLUXOGRAMA. Fluxograma 01: Modelo institucional da EMPARN ......................................... 60.

(9) LISTA DE MAPAS E CARTOGRAMA. Mapa 1 – Localização geográfica da Fazenda Mundo Novo........................... 13 Mapa 2: Localização da Coordenadoria de Pesquisa e Desenvolvimento Seridó/Sertão; e a Base Experimental Mundo Novo ....................................... 73 Mapa 3: Municípios do Rio Grande do Norte atendidos pelo Projeto Cultivo de Vazantes em Mutirão .......................................................... 88 Cartograma 1: Localização das primeiras vazantes no açude Mundo Novo .. 91. LISTA DE GRÁFICOS. Gráfico 1:. Ordem de moradia dos beneficiados com as vazantes distribuídas pelo STRC,em 1988 ....................................... Gráfico 2:. Evolução do número de vazantes na Fazenda Mundo Novo, por sexo ................................................................... Gráfico 3:. 102. Maneira como foi informado a distribuição de vazantes no Mundo Novo ................................................. Gráfico 4:. 92. 105. Natureza das atividades econômicas desenvolvidas pelos trabalhadores antes de se tornar vazanteiros........... 106. Gráfico 5:. Número de pessoas, por famílias ...................................... 107. Gráfico 6:. Renda familiar mensal aproximada dos vazanteiros......... 108. Gráfico 7:. Quantidade de módulos por vazanteiros ........................... 109. Gráfico 8:. Principais tipos de cultivo realizado nas vazantes.............. 113. Gráfico 9:. Destino da produção .......................................................... 116. Gráfico 10:. Situação dos vazanteiros, do ponto de vista previdenciário e da contribuição sindical ........................... 116. Gráfico 11:. Quantidade de anos que o agricultor é vazanteiro ............ 117. Gráfico 12:. Situação cadastral do vazanteiro ....................................... 118. Gráfico 13:. Relacionamento com os técnicos e pesquisadores da EMPARN ........................................................................... 121.

(10) LISTA DE QUADROS Quadro 01: Número de experimentos com algodoeiro mocó conduzidos pela Estação Experimental do Seridó no período compreendido de 1924 a 1974 ....................................................................... 53 Quadro 2: Evolução dos resultados na produção e serviços da EMPARN (1995 – 2005).................................................................................. 62 Quadro 3: Produtos e estimativa de produção do Projeto Cultivo de Vazantes em Mutirão nos municípios do Rio Grande do Norte (1987) .......... 89. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS BB – Banco do Brasil BNB – Banco do Nordeste do Brasil S. A. BNCC – Banco Nacional de Crédito Cooperativo CCET – Centro de Ciência Exatas e da Terra CCHLA – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes CDM – Companhia de Desenvolvimento Mineral CERES – Centro de Ensino Superior do Seridó COMPATER – Comissão Nacional de Pesquisa Agropecuária e de Assistência Técnica e Extensão Rural. CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura CPPA – Centro Profissionalizante em Produção Animal DNOCS – Departamento de Obras Contra as Secas EEA – Estação Experimental do Algodão EES – Estação Experimental do Seridó EMATER RN – Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Norte EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EMBRATER – Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural.

(11) EMPARN – Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte S/A ESALQ – Escola Superior de Agricultura Luis de Queiroz FAO – Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação. FETAG RN – Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte FGD – Fundação Guimarães Duque FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço IFOCS – Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INSS – Instituto Nacional do Seguro Social IOCS – Inspetoria de Obras Contra as Secas ITERN – Instituto de Terras do Rio Grande do Norte LATV – Laboratório de Análise de Tecidos Vegetais LTE – Laboratório de Transferência de Embriões MA – Ministério da Agricultura PCVM – Projeto Cultivo de Vazantes em Mutirão PDCAC – Projeto de Desenvolvimento de Criação de Aves Caipiras PND – Plano Nacional de Desenvolvimento POATER – 81 – Programa Anual de Assistência Técnica e Extensão Rural POLONORDESTE – Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas do Nordeste PROJETO SERTANEJO – Programa Especial de Apoio ao Desenvolvimento da Região Semi-Árida do Nordeste RURALNORTE – Projeto/ organismos que o Rio Grande do Norte executará a política preconizada pelo POLONORDESTE. SAPE – Secretária de Estado da Agricultura, da Pecuária e da Pesca SFA – Serviço Federal do Algodão SIBRATER – Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão Rural SINAPA – Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária SSA – Superintendência do Serviço do Algodão STRC - Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Município de Caicó UEPAE – Unidade de Execução de Pesquisas Agropecuária Estadual UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

(12) SUMÁRIO. Páginas. INTRODUÇÃO.................................................................................................. 12 I. Caracterização do recorte espacial e Objetivos da pesquisa................... 12 II. Explicitação do problema e da justificativa .............................................. 16 III. Procedimentos teórico-metodologico ..................................................... 19 IV. Estrutura do trabalho e dificuldades encontradas ................................... 22 PRIMEIRO CAPÍTULO..................................................................................... 24 1. TRAVESSIA TEÓRICA PELAS VEREDAS DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO NA FAZENDA MUNDO NOVO ................................................. 25 1.1. 1.2.. O espaço rural e os processos produtivos como sistemas de objetos e ações ................................................................................ 27 Política pública: ações do processo produtivo na Fazenda Mundo Novo ................................................................................................ 34. SEGUNDO CAPÍTULO.................................................................................... 40 2. A PRODUÇÃO DO ESPAÇO NA FAZENDA MUNDO NOVO ................. 41 2.1. 2.2.. Breve histórico do processo produtivo.............................................. 42 Articulações do sistema produtivo das/nas Estações Experimentais .................................................................................. 50. TERCEIRO CAPÍTULO.................................................................................... 66 3. VAZANTES DO AÇUDE MUNDO NOVO: CARACTERIZAÇÃO E ANTECEDENTES HISTÓRICOS ............................................................... 67 3.1. 3.2. 3.3. 3.4. 3.5. 3.6.. Políticas públicas na Fazenda Mundo Novo .................................... 68 O processo produtivo nas várzeas úmidas....................................... 71 Vazantes: um campo de articulações políticas ................................ 77 A mobilização do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Caicó para viabilizar o uso das vazantes................................................... 82 As ações do Estado na implementação do Projeto Cultivo de Vazantes em Mutirão ....................................................................... 85 A terra e os conflitos na distribuição das vazantes .......................... 90.

(13) QUARTO CAPÍTULO....................................................................................... 99 4. VAZANTES DO MUNDO NOVO: UMA REFLEXÃO CONTEMPORÂNEA ............................................................................... 100 4.1. 4.2. 4.3. I) II). Vazanteiros: uma trajetória reflexiva acerca dos caminhos seguidos ........................................................................................ 101 Aspectos sociais e econômicos que integralizam o dia-a-dia dos vazanteiros do Mundo Novo .......................................................... 105 No rastro da ligação sindical: uma prática agrícola e suas implicações sociais ........................................................................ 115 Sementes, treinamentos e o combate às pragas .......................... 119 Grau de satisfação: os vazanteiros envolvidos no processo de produção ................................................................................... 121. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...........................................................................123 REFERÊNCIAS ............................................................................................. 127. APÊNDICES .................................................................................................. 134 ANEXOS ........................................................................................................ 147.

(14) INTRODUÇÃO. várzeas. A temática desta dissertação – Terra e trabalho: permanência de uma política pública na Fazenda Mundo Novo, em Caicó-RN – deriva de um campo de problematizações sobre uma política de acesso às terras úmidas a montante do açude Mundo Novo – o Projeto Vazantes –, para a produção agrícola de gêneros de subsistência familiar (feijão, milho, batata-doce, etc.) e de forragens para a pecuária (bovinos, caprinos, eqüinos e ovinos), operacionalizada por agricultores denominados localmente de vazanteiros.. I. Caracterização do recorte espacial e Objetivos da pesquisa. As várzeas do açude Mundo Novo, base empírica de nossa análise, são uma fração significativa da estrutura da fazenda homônima, localizada no espaço rural do município de Caicó-RN (Mapa 01), acerca de 8 km da sede municipal, com acesso asfaltado pela margem direita da RN-118, seguindo o itinerário Caicó-Jucurutu, conforme pode ser visto na fotografia a seguir.. Fotografia 1: Acesso à Fazenda Mundo Novo, sentido Caicó-Jucurutu. À direita, parte frontal da EMPARN.. Fonte: Jossylúcio Jardell de Araújo (maio de 2008)..

(15) Introdução. Fonte: Elaboração do autor, 2008.. 13.

(16) Introdução. 14. Inicialmente, cabe esclarecer alguns pontos acerca do tema e do recorte espacial contemplados por esta pesquisa. Embora estejamos tratando de um espaço denominado de “fazenda”, localizado no setor rural de Caicó e cercado por outros módulos do sistema produtivo rural, é preciso destacar que as características e dinâmicas produtivas engendradas na Fazenda Mundo Novo diferem daquelas existentes em fazendas tradicionais do Seridó Potiguar, as quais são centradas, sobretudo, na criação variada de espécies animais, no cultivo de lavouras sazonais e na presença de uma mão-de-obra contratada – em alguns casos – sem seguridade social, sem informação e à revelia do “mando” e do “desmando” do patrão. Em linhas gerais, as fazendas têm, histórico-culturalmente, uma estrutura que se assemelha à das propriedades tradicionais, com casas, estradas carroçáveis, açudes, plantações, galpões, ambiência de criação, estabelecimento de famílias, etc. Contudo, as feições da Fazenda Mundo Novo destoam das apresentadas por essas propriedades, na medida em que servem de base física e estrutural à Coordenadoria de Pesquisa e Desenvolvimento do Seridó/Sertão, uma das três unidades mantidas e gerenciadas pela Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte S. A. (EMPARN), cuja área de atuação está voltada para o desenvolvimento do agronegócio e da agricultura familiar do estado. Mesmo assim, tanto nas fazendas tradicionais – sejam elas pequenas, grandes ou médias – quanto nas áreas do entorno do açude Mundo Novo, o cultivo de gêneros agrícolas sempre esteve presente no calendário produtivo, aproveitando-se o frescor dos leitos dos rios e açudes. As vazantes, na estrutura e na dinâmica de uma propriedade rural, no semi-árido, representam um oásis verdejante, um arranjo que satisfaz a alma do produtor, e são uma certeza tanto de alimento para a dieta da família como de produtos cultivados que possam ser vendidos em feiras livres. O açude é o lugar onde se inscreve toda a tradição e a dinâmica particular das vazantes, pois permite a renovação de ciclos vegetativos à margem das paredes, no leito, nos baixios e nos espaços limítrofes, que são inundados pela água durante o período chuvoso e vão sendo progressivamente descobertos na medida em que o nível da água vai baixando. Os solos dos açudes são os mais fertilizados pela matéria orgânica depositada nas enchentes e são,.

(17) Introdução. 15. paulatinamente, decantados, ao longo do tempo, renovando-se a cada enchente. O recorte espacial eleito para exame, as várzeas do açude Mundo Novo, constitui-se em um fragmento do real inserido num contexto mais abrangente, o universo rural caicoense. A problemática existente nesse universo não se resume apenas às questões concernentes ao processo produtivo da Fazenda Mundo Novo; existem outros aspectos, ligados a diferentes tendências, sentidos e processos de produção. A Fazenda Mundo Novo é, para a zona rural do município de Caicó, e até para a região do Seridó, um símbolo do pioneirismo da política de açudagem do DNOCS, devido ao fato da construção do primeiro açude ter sido efetivada com recursos públicos e de ter sido esse o primeiro lugar, em nível estadual, onde se instalou a EMBRAPA, no ano de 1972. Foi na tentativa de unir o que há de mais tradicional no sistema produtivo rural – as vazantes e as atividades a elas subjacentes – ao que foi pensado, inicialmente, na implantação das linhas de pesquisa da EMPARN – pacotes tecnológicos que visavam aumentar a produtividade agrícola – para o campo, que optamos por analisar a política de acesso à terra na Fazenda Mundo Novo, bem como a importância econômica e social da produção agrícola nas vazantes para a vida dos agricultores beneficiados por essa política pública, o Projeto de Vazantes. Como objetivos específicos, definimos: analisar as estruturas, formas e funções pelas quais a política de vazantes repercute no cotidiano dos agricultores que produzem nas várzeas do açude Mundo Novo; avaliar a importância da produção agrícola e da força de trabalho dos vazanteiros na organização do espaço na Fazenda do Mundo Novo; explicar as relações de acesso à terra, destacando o papel dos atores sociais envolvidos. no. processo. produtivo;. e. investigar. as. transformações. socioespaciais ocorridas a partir da implementação do Projeto Vazantes na Fazenda Mundo Novo..

(18) Introdução. 16. II Explicitação do problema e da justificativa. O processo de produção espacial no entorno do açude Mundo Novo se insere numa realidade dialética, pois é produto socioeconômico da contradição e da combinação entre o pequeno produtor (vazanteiro) e a política de acesso à terra, que perpassa décadas sem grandes avanços e renovações. Os objetivos dessa política ainda são criar e validar tecnologias adaptadas para a produção nas vazantes. No entanto, o desenvolvimento da linha de pesquisa voltado, para o beneficiamento do pequeno produtor rural operacionalizada nas pela EMPARN apresentou ser precário. Desse modo, entendemos que é pertinente, para fins analíticos, lançarmos mão de alguns questionamentos, que, no conjunto, levam a respostas complementares entre si:. a). Que significação tem a estrutura criada pela EMPARN em relação à posse e ao uso da terra?. b). Que transformações socioespaciais acontecem em virtude da política de acesso à terra na Fazenda Mundo Novo?. c). Quais as implicações socioeconômicas da produção agrícola para os agricultores envolvidos no Projeto Vazantes?. d). Que fatores explicam a permanência do Projeto Vazantes no município de Caicó, quando, em outros municípios do estado, esse projeto foi extinto?. Relacionando-se às questões levantadas, citamos as palavras de Barrios (1986, p. 5), para a compreensão de uma estrutura produtiva que é perversa e combinada. Segundo ele, as vazantes surgem “[...] não como resultado natural da evolução sociocultural da humanidade, mas como produto intencional e não-intencional de uma ordem estabelecida”. Nesse sentido, existem inúmeras possibilidades de estudos sobre a área rural do município de Caicó, um campo fértil para análise, na medida em que são escassas as pesquisas sobre o rural norte-rio-grandense, o que sugere uma secundarização dessa temática, por parte dos estudiosos, uma vez.

(19) Introdução. 17. que são inúmeros os estudos sobre a vida urbana. As monografias, teses e dissertações que discorrem sobre o Seridó denunciam essa realidade. Todavia, os trabalhos com o foco de abordagem voltado para entender o movimento próprio do campo, a vida rural, as políticas, as formas de legitimidade que afetam diretamente os moradores rurais são pouco debatidos e minimamente reconhecidos pela esfera acadêmica. Fica, então, registrada a importância desta pesquisa, que reflete acerca do rural. A temática em foco carece de uma verticalização, com vista ao equacionamento de preocupações teórico-metodológicas. bem. como. das. inquietações. do. sujeito-cidadão. mantenedor de relações de convivência com a região onde o recorte espacial do estudo está inserido. Tais circunstâncias levam-nos a entender a Fazenda Mundo Novo como um espaço de pesquisa, mas também de reprodução social. Desse modo, fica patente que, seja numa perspectiva teórico-metodológica seja na perspectiva da cidadania, os diversos contrastes sociais, políticos e econômicos precisam ser evidenciados, de modo a buscarmos respostas satisfatórias a essas inquietações. Nesse. contexto,. para. o. desvelamento. do. problema. de. investigação, seguimos uma postura descritivo-reflexiva capaz de dar conta da análise em pauta. Para subsidiar esse estudo, alguns aspectos teóricos foram ressaltados, analisados e discutidos ao longo do texto. Entre estes, destacamse a produção e a reprodução do espaço, pensado a partir das idéias de Milton Santos (1986, 1988, 1996, 1997), sendo o espaço como sistema de ações e de objetos o suporte conceitual utilizado na construção do estudo. O arcabouço teórico-metodológico adotado parte de uma visão dialética da realidade estudada e se reflete na forma como evidenciamos os conceitos, analisamos os dados, problematizamos a realidade socioespacial dos vazanteiros na Fazenda Mundo Novo. Este trabalho, portanto, é fundamental para se pensarem as transformações. sociais,. políticas. e. econômicas. protagonizadas. na. integralização de um espaço socialmente produzido na Fazenda Mundo Novo, haja vista que a história deixou ensinamentos a serem tomados como exemplos. O trabalho traz novas contribuições para um maior entendimento sobre o rural seridoense, na medida em que o acesso à terra e às políticas públicas é um centro de reflexão profundamente significativo para a.

(20) Introdução. 18. compreensão da agricultura, das relações de poder e dos campos de atuação específicos mediados pelo Estado. Em termos acadêmicos, estamos trazendo uma problemática que não é estranha à ciência geográfica, embora os trabalhos nessa vertente sejam escassos, como já destacamos anteriormente. Discutimos a permanência do homem no campo, mesmo que em tempo parcial, algo que abre margem para se pensar o surgimento de novos arranjos produtivos, com o aparecimento de atores sociais voltados para uma dinâmica espacial, que, embora própria do contexto em evidência, se aproxima de outras experiências similares existentes nos mais variados recôntidos do Rio Grande do Norte. O estudo contribui também para um maior entendimento sobre a institucionalização da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte e o direcionamento de suas linhas de pesquisa e seus programas voltados para o campo. Os pontos elencados até o momento fortalecem e justificam a importância do estudo, vez que o diagnóstico fornecido pela dinâmica das relações de trabalho, do uso da terra, da renda e do tangenciamento do espaço pela ação institucional incitam uma sistemática que fornece uma “radiografia” da condição de vida à qual são subjugadas as famílias dos agricultores do Mundo Novo. No entanto, para compreendermos como o espaço das vazantes, gerenciado pela EMPARN, se organiza e se reproduz, refletindo a intenção do homem sobre a natureza, temos que levar em conta a correlação dos elementos sociais na produção e recriação do espaço. Esse processo ocorre justamente porque, com o passar do tempo, os sistemas de objetos vão ficando cada vez mais artificiais, acompanhando o desenvolvimento técnico-científico e facilitando o convívio humano e a produção do espaço e das mercadorias. Sendo assim, a pesquisa agropecuária e os encaminhamentos que foram dados pelas políticas públicas são colocados aqui como base propulsora para se pensar a realidade do universo rural, que, neste estudo, envolve e compreende a Fazenda Mundo Novo – Caicó (RN). Isso porque o meio rural traz elementos e eventos que conduziram à produção e recriação do espaço, sendo base empírica para a geografia o lugar de morada do homem, um.

(21) Introdução. 19. espaço socialmente produzido, não estanque e com níveis de desenvolvimento variáveis. Portanto, acreditamos que analisar os múltiplos aspectos existentes no âmbito da produção agrícola das vazantes é apostar na compreensão de variáveis importantes que se processam nas dimensões: econômica, política, social e ecológica. Nesse sentido, estamos imbuído do desejo de ampliar os horizontes interpretativos sobre a produção do espaço e, conseqüentemente, sobre as questões que dizem respeito às problemáticas do universo rural na Fazenda Mundo Novo, colocando em evidência um tema não tão usual, que envolve questões atreladas às políticas públicas de acesso à terra, no domínio da produção de gêneros agrícolas.. III Procedimentos teórico-metodologicos. O quadro teórico-metodológico foi organizado de modo a possibilitar uma compreensão e uma leitura do espaço como um processo incessante de investimento, de substituição, de modificação das formas e funções, na esteira do sistema capitalista, que repercute no espaço rural da Fazenda Mundo Novo. Por isso, optamos por sistematizar as ações da pesquisa a partir de leituras bibliográficas concernentes ao tema, coleta de dados, busca de informações em fontes primárias e pesquisa de campo. No engendramento do processo de produção, na fazenda, os sujeitos que o constituem são as ferramentas que o representam e significam. Por isso, foi fundamental lidar (ouvir, ver e conviver) com as pessoas que vivenciaram o movimento de base na efetivação do projeto, à medida que se estabelecia a pressão entre as partes – líderes sindicais, pequenos produtores rurais –, que viram uma oportunidade de reivindicar por terras. Além desses recursos, também lançamos mão da pesquisa em fontes documentais e cartográficas bem como da abordagem quantitativa. A ênfase do estudo distribui-se em torno das relações que possibilitaram a permanência de uma política pública de acesso à terra e da interpretação da realidade socioeconômica dos vazanteiros do açude Mundo Novo. As narrativas e descrições dos entrevistados se congregam às opiniões e.

(22) Introdução. 20. reflexões de teóricos como: Barrios (1986), Corrêa (1988, 1995), Oliveira (1986), Santos (1986, 1988, 1996, 1997), Bursztyin (1984), que elegemos como suporte dessa interpretação e se articulam às constatações empíricas e às opiniões embasadas no contato direto com a realidade regional. Mesmo sendo escassos os documentos oficiais que se referem à precisão dos eventos históricos que marcaram a dinâmica das vazantes do Mundo Novo, tivemos o cuidado de buscar em outras fontes, como jornais e revistas de época, informações específicas acerca da prática de vazantes na Fazenda Mundo Novo. Dentre essas fontes, resgatamos uma matéria escrita por Valle Sobrinho, intitulada “Recordando o açude Mundo Novo”, publicada no jornal A Fôlha, em setembro de 1964, a qual contém informações pertinentes para se pensar a função e a importância desse açude para a população rural e, até mesmo, para a urbana, principalmente em momentos em que a água se torna escassa. Nessa matéria, também foi possível percebermos a existência, já naquela época, da cultura e da prática agrícola com base nas vazantes. Além desse veículo de informação, coletamos de dados nos arquivos do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Caicó (STRC) e consultamos em outras fontes jornalísticas, de modo especial a revista RN Econômico, na qual conseguimos ver a condução das propostas voltadas para o meio rural, que passaram a ganhar dimensões no cenário estadual. É preciso destacar que a coleta de dados e registros escritos arquivados na EMPARN foi fundamental para caracterizarmos a gerência, a condução e os procedimentos iniciais tomados pela empresa no empreendimento da pesquisa agropecuária. Para. essa. caracterização,. também. foi. indispensável. a. sistematização de informações obtidas a partir de ofícios arquivados no STRC. Na realidade, esses ofícios podem ser considerados as únicas fontes a partir das quais se pode historiar o Projeto Vazantes. Elas são emblemáticas para se pensar o período marcado pela institucionalização do projeto, no período de 1986 a 1988. Ademais, o trabalho ancorou-se numa revisão bibliográfica sobre os temas tratados, na qual buscamos subsídios que promovessem uma releitura atualizada da pesquisa agropecuária e da repercussão, no espaço rural da Fazenda Mundo Novo, das ações dela decorrentes..

(23) Introdução. 21. No que concerne à pesquisa empírica, realizamos registros fotográficos, fizemos entrevistas e aplicamos questionários com vazanteiros envolvidos no projeto (Apêndice 1). Antes de fazermos a coleta total dos dados, no mês de maio de 2008, submetemos o questionário a um teste-piloto, durante o mês de maio de 2007. Esse instrumento se mostrou apto para ser utilizado na coleta dos dados socioeconômicos dos agricultores da Fazenda Mundo Novo, revelando a precariedade das condições de vida e de trabalho dos produtores contemplados com as vazantes. Algumas dificuldades emergiram na trajetória da construção do trabalho, tais como: existência de poucas abordagens acadêmicas sobre o tema; escassez de dados históricos que documentem o processo de acesso à terra na Fazenda Mundo Novo; falta de dados quantitativos sobre os vazanteiros e sobre as formas legais que legitimam o uso da terra; poucas informações que integralizem um perfil mais detalhado dos vazanteiros; além das imensas chuvas que caíram no ano de 2008, fazendo que a capacidade da bacia. hidráulica. do. açude. chegasse. ao. seu. limite. máximo. e,. conseqüentemente, que a área usada pelos vazanteiros ficasse quase totalmente esvaziada. Esse evento nos forçou a rever a amostragem dos vazanteiros a serem entrevistados, a qual estava estipulado inicialmente aglutinar um público de 54 pessoas (cerca de 30%). Com isso, tivemos que nos direcionar à busca desses vazanteiros nos bairros da cidade de Caicó, revendo as estratégias a fim de alcançar uma amostragem considerável, de 42 entrevistados (23,5 %), perspectiva que não invalidou nem comprometeu o desenvolvimento da pesquisa, reafirmando ainda mais a necessidade de desenvolvê-la. A propósito, é conveniente lembrar que, para preservarmos o anonimato dos entrevistados, que tiveram partes de seus depoimentos inseridos nas análises, ao longo do texto, decidimos apresentá-los numa ordem numérica, na seqüência dos algarismos arábicos (1, 2, 3 ...). No entanto a lista com os nomes de todos os entrevistados está disponível no final deste trabalho, independente da numeração (Apêndice 2)..

(24) Introdução. 22. Enfim, os passos téorico-metodológicos que percorremos, no itinerário da elaboração desta dissertação, permitiram a sistematização de dados e informações serem utilizados na elaboração de gráficos, mapas, quadros e tabelas.. IV Estrutura do trabalho. Tomando como base os objetivos propostos neste trabalho e a problemática que ele encerra, o texto está organizado em quatro capítulos, além desta introdução e da parte conclusiva. O primeiro, intitulado Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo, contemplou as questões mais gerais, no plano teórico, no qual a produção do espaço é vista sob a óptica de um sistema de ações articulado ao sistema de objetos. O segundo capítulo, denominado A produção do espaço na Fazenda Mundo Novo, procurou mostrar, com base no percurso histórico, como o espaço foi produzido a partir da política de açudagem, na medida em que essa política pública acionou o desencadeamento de outras ações para a constituição e a (re)criação de toda uma engrenagem, que reproduziu o espaço rural. No terceiro capítulo, nomeado de Vazantes do açude Mundo Novo:. caracterização. e. antecedentes. históricos,. realizamos. uma. contextualização da trajetória que se seguiu na produção das vazantes do açude Mundo Novo. Nesse capítulo, também evidenciamos a perspectiva das políticas públicas, cuja essência se insere na lógica de um plano de desigualdades e de condições precárias na condução do Projeto Vazantes, eleito aqui como objeto de problematização, de reflexão e de abordagem sociodiscursiva. Seguindo os caminhos que edificaram a política de vazantes, elegemos uma base empírica para ver como esse processo é desigual e combinado e como dá margem a reflexões sobre questões relacionadas ao uso da terra e às condições de vida e de trabalho de uma categoria importante na produção agrícola do município de Caicó..

(25) Introdução. 23. Já no quarto capítulo, intitulado As vazantes do Mundo Novo: uma reflexão contemporânea, apresentamos e analisamos. os dados. secundários e as informações obtidas diretamente no campo. Com isso, colocamos em evidência o perfil da real situação dos agricultores e respectivas famílias, os quais buscam nas vazantes do Mundo Novo um lugar para plantar e para reproduzir todo um sistema de relações com a terra. Por fim, nas considerações finais, apresentamos alguns pontos conclusivos,. que. fomos. apreendendo. ao. longo. do. estudo.. Mesmo. reconhecendo que o trabalho intelectual preocupado com a interpretação e/ou explicação de determinadas questões não produz a transformação dos fatos analisados, entendemos que o nosso investimento intelectual é um passo importante na tentativa de apontar caminhos para a resolução de diversas ordens de problemas que permeiam a vida cotidiana das pessoas que utilizam as várzeas do açude Mundo Novo para a reprodução da vida..

(26) PRIMEIRO CAPÍTULO O espaço socialmente construído compreende o conjunto de elementos materiais transformados pelas práticas econômicas, apropriados pelas práticas políticas e construídos em significações pelas práticas cultural-ideológicas. (BARRIOS, 1986, p. 19)..

(27) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 25. 1 TRAVESSIA TEÓRICA PELAS VEREDAS DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO NA FAZENDA MUNDO NOVO. No tocante ao embasamento teórico que norteia o caminho seguido na tessitura da dissertação, procederemos a uma reflexão atinente ao quadro conceitual da pesquisa, em reforço à proposta de avançar com as discussões e interpretações focadas na prática agrícola auferida no domínio das vazantes do açude público localizado na Fazenda Mundo Novo. Serão tecidas considerações acerca da articulação entre o viés empírico e o arcabouço teórico, à luz do legado miltoniano 1 , traduzido sob a óptica do processo de produção e recriação do espaço, este depreendido como produto e condição para se chegar a uma compreensão do evento rural que emerge nas dependências da Fazenda Mundo Novo. Em se tratando de uma investigação científica que busca a contextualização da gênese de um processo de acesso a terras úmidas para o desenvolvimento da agricultura de vazantes, evidenciaram-se imbricações de diversas ordens – social, política e econômica – que tornam a materialização dessa atividade um processo incessante e continuado de recriação das forças produtivas, na perspectiva de inserção de relações que mantêm e modificam o cotidiano. Talvez, devido às práticas utilizadas pela esfera política na tentativa de se manter no poder, as dinâmicas são reinventadas ao ponto de não poderem ser pensadas como uma forma pronta e acabada, uma vez que “[...] o espaço está em evolução permanente. Tal evolução resulta da ação de fatores externos e internos [...]” (SANTOS, 1988, p. 16). Nesse sentido, o espaço serve como suporte para uma atividade agropecuária que tem um passado histórico rico de conteúdo social, envolvido por ações econômicas e políticas, na medida em que a estrutura circunscrita às vazantes remete as dependências do açude Mundo Novo e, por conseguinte, da fazenda. Essa atividade, arquitetada como política institucionalizada no ano de 1987, sob a designação de Projeto Cultivo de Vazantes em Mutirão, vem, ao longo do tempo, desenvolvendo-se com poucas alterações, apresentando elementos que nos permitem caracterizá-la como um evento de permanência.. 1. Interpretação derivada das leituras de Milton Santos (1986, 1988, 1996, 1997)..

(28) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 26. As ações empreendidas na trajetória da prática agrícola nas vazantes do Mundo Novo se efetivam na instrumentalização da exploração da área a partir do contrato de parceria agrícola (Anexo 1) que serve como mecanismo de regulamentação e condicionamento do uso e apropriação das vazantes, definindo os agentes como outorgante e outorgado. As partes envolvidas (EMPARN/parceiro outorgante e vazanteiro/parceiro outorgado) estão imersas em um campo de relações desiguais e em patamares diferenciados, uma vez que o outorgante detém os meios de produção, enquanto o outorgado conta apenas com a força de trabalho e o desejo de ter acesso à terra. Por isso, os vazanteiros foram submetidos às determinações impostas pelas relações de poder estabelecidas. Nesse contexto, o processo histórico de produção e recriação do espaço, na Fazenda Mundo Novo, se articula a momentos emblemáticos de intervenções do Estado, a saber: num primeiro momento, a Fazenda Mundo Novo é efetivamente produzida a partir da política de açudagem, encampada pelo governo federal, com a construção de um açude público homônimo, nos idos de 1910. O açude foi apropriado pelas práticas políticas clientelistas das oligarquias locais desde a década de sua construção até ser reincorporado pela tutela do governo, na década de 1970. Num segundo momento, a Fazenda Mundo Novo é alvo das ações implementadas pelo governo do Rio Grande do Norte, a partir do projeto RURALNORTE, que se insere num campo político regional de maior envergadura, o POLONORDESTE. Em nível estadual, as ações do POLONORDESTE possibilitaram as condições de instalação da EMBRAPA, no ano de 1972, o que significou a presença de um órgão responsável pela maior produção, pelo gerenciamento e pela adaptação de tecnologias para o campo. Isso representou uma perspectiva produtiva voltada para a validação de tecnologias para o meio rural de Caicó e de outros 29 municípios inseridos nas microrregiões do Seridó, da Serra de Sant’Ana e do sertão de Angicos, vindo a ser, anos depois (1980) transformada em uma das unidades da EMPARN. O segundo momento se caracterizou por mudanças internas e externas no interior da Fazenda Mundo Novo, conferindo outro sentido ao espaço, ao ponto de se redefinir sua função, na medida em que se promove uma reorganização de sua própria estrutura interna..

(29) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 1.1. 27. O espaço rural e os processos produtivos como sistemas de objetos e ações. A Fazenda Mundo Novo é uma estrutura que se alinha e se lança no jogo de interesses dos grupos nela envolvidos (Estado, políticos locais e STRC), chamando a atenção para o espaço produzido por sujeitos e experiências determinadas nas relações historicamente construídas. Numa primeira investida, poderíamos dizer que o espaço, entendido de forma genérica, é a residência do homem, o lugar onde ele vive e estabelece relações variadas com os outros. O espaço, tido por Santos (1986) como produto e condição da reprodução das relações subjacentes à sociedade, é um conceito que já foi longamente discutido na ciência geográfica. Esse conceito possibilita o entendimento da realidade que condiciona a fazenda e os atores nela inscritos. Isso porque o espaço pode ser entendido “[...] como lócus da reprodução das relações sociais de produção”, como destaca CORRÊA (1995, p. 26), ao se referir ao conceito de espaço apresentado por Lefebvre (1976). De acordo com esse segundo autor,. [...] do espaço não se pode dizer que seja um produto como qualquer outro, um objeto ou uma soma de objetos, uma coisa ou uma coleção de coisas, uma mercadoria ou um conjunto de mercadorias. Não se pode dizer que seja simplesmente um instrumento, o mais importante de todos os instrumentos, o pressuposto de toda produção e de todo o intercâmbio. Estaria essencialmente vinculado com a reprodução das relações (sociais) de produção. (Grifo nosso) (CORRÊA, apud, LEFÉBVRE, 1995, p. 25 – 26).. Depreende-se, então, que todo entendimento acerca do espaço é de natureza social, pois ele está a servir aos homens, que, por meio do trabalho, o organizam segundo suas necessidades e seus interesses. Sobretudo porque, segundo Santos (1996, p. 16), o espaço está inscrito em um “conjunto indissociável de sistemas de objetos e de sistemas de ações”. Nessa perspectiva, os objetos não são tratados como coisas unicamente, como algo natural, mas como coisas materiais ou imateriais produzidas. pelos. homens. para. servirem. de. exemplo. materializável. espacialmente. Essa perspectiva discursiva ocorre porque as relações se.

(30) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 28. efetivam no ordenamento e na organização do espaço/tempo, em que o espaço é tido como um receptáculo que absorve toda a carga de simbologias e signos derivados da sociedade. Sob a óptica de Santos (1996, p. 81),. O espaço é, em todos os tempos, o resultado do casamento indissolúvel entre sistemas de objetos e sistemas de ações. Hoje, graças às técnicas, que realizavam através da matéria a união do espaço e do tempo, tanto esses objetos são artificiais ou, em todo caso plenamente históricas, quanto às ações tendem a ser artificiosamente instrumentalizadas.. No que diz respeito as questões inerentes ao espaço rural, temos a compreensão de que esse espaço é particular, dadas as manifestações que o significam. Mesmo não tendo sofrido tantas modificações, ele apresenta características próprias e está conectado a outros subespaços e realidades, com níveis variados de intensidade e de inserção tecnológica. As. interpretações. contemporaneidade,. seja. ele. tangenciadas urbano. ou. para. rural,. o. muitas. espaço. na. vezes. são. equivocadamente trabalhados como sinônimo de atraso. Faz-se necessário atentar no contexto investigado, atentar para menções voltadas para a persistência de elementos memoráveis construídos em modelos tradicionais, que, em certo momento, não conseguiram mais acompanhar o sistema e este se retraiu. Por isso, o espaço é uma categoria que possibilita uma explicação da realidade e fornece subsídios importantes para entendermos como está organizado e como se processa o cotidiano da sociedade em relação à natureza. Ao elencar as atividades econômicas que deseja desenvolver, a sociedade está, implicitamente, determinando, para o restante dos grupos sociais, que existe uma lógica em nível do processo, assegurando a continuidade dessas atividades mediante os interesses e a viabilidade para elas integrarem um quadro de referências sócio-históricas do sistema. Essa perspectiva discursiva recai no campo da elaboração de um evento com relações que se efetivam no curso do ordenamento e da organização espaço-temporal, em que o espaço é tido como receptáculo que absorve toda a carga de simbologias e signos derivados da sociedade. Portanto, o trabalho humano é metamorfoseado em cada evento histórico e tido.

(31) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 29. como algo natural, apresentado, aos olhos mais desavisados, como uma criação herdada das precedentes, servindo às novas gerações como o predicativo de uma existência manifestada através de processos, formas e funções. Face ao acontecer dessa perspectiva discursiva, Santos (1988, p. 50) fornece subsídios para se interpretarem as formas como o aspecto, na ordem do visível, de uma coisa e/ou o conjunto desses objetos ordenados padronizados, passíveis de serem identificados numa escala temporal. A função indica uma tarefa ou atividade analisada de uma forma, pessoa, instituição ou coisa. As estruturas implicam as inter-relações de todas as partes de um todo; o modo de organização ou construção. Já os processos podem ser definidos como uma ação contínua, desenvolvendo-se em direção a um resultado qualquer, implicando conceitos de tempo (contínuo) e mudanças. O autor salienta que, se tais concepções forem tomadas de maneira isolada, terse-á uma mera circunscrição de um fenômeno ou de um de seus aspectos a uma falsa análise. Linhares e Silva (1999, p.47), comprometidos em fornecer subsídios para o entendimento das questões agrárias, inferem que a intenção de ocupação de um município e o desenvolvimento de atividades se explicam pelo fato de a “[...] terra, para se constituir em efetivo meio de produção de riquezas, necessita do trabalho. De nada adiantava para os interesses dos colonizadores, a terra sem trabalhadores”. Daí existir a necessidade de se organizar a produção do espaço atrelada a uma atividade econômica que justifique o uso e o trabalho na terra. Assim, organizando o espaço segundo seus interesses, o homem foi construindo uma natureza una, a natureza da técnica, criando verdadeiras próteses, ao longo de sua trajetória pela terra, como aponta Santos (1986, p. 199). O espaço rural vai paulatinamente incorporando à paisagem formas, funções e sentidos específicos. Sob o entendimento do espaço como produto de natureza social, como experiência da técnica, é preciso destacar também a abordagem de Corrêa (1995, p. 17). Para esse autor, há uma fissura na geografia tradicional, uma vez que ela não percebeu a correlação e o investimento da técnica, pois os estudos focavam a região e a paisagem..

(32) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 30. Mas o espaço, como campo de ação social, como palco de lutas, passa, paulatinamente, a ganhar relevância nos estudos geográficos, conquistando adeptos e pesquisadores para o paradigma alicerçado na sistematização de uma teoria social crítica. Esta concebe o espaço como uma instância eminentemente social, fundamentando-se no materialismo histórico e dialético, e se constituiu em uma ferramenta importante para o entendimento das relações sociopolíticas que se efetivam no recorte espacial deste estudo. A produção do espaço, na Fazenda Mundo Novo, articula-se a circuitos de disputas, de enfrentamentos, em um processo contínuo que envolve as relações sociais. Com o intuito de ampliar os horizontes interpretativos acerca da produção do espaço e da atuação da sociedade, Santos (1986, p. 122) diz que “[...] O espaço deve ser considerado como um conjunto de relações realizadas através de funções e de formas que se apresentam como testemunhos de uma história escrita por processo do passado e do presente”.. Desse modo, o espaço suscita considerações variadas. Contudo, para efeito deste estudo, admitimos, de acordo com Santos (1986, p. 150), que o espaço de morada do homem é lugar da vida e do trabalho social, metamorfoseando-se em cada evento histórico e apresentando-se ao olho humano como uma criação ou como herança. Assegurando a particularidade e a originalidade, ao ser relacionado com outros dados da vida em sociedade, “[...] o espaço é resultado da ação do homem sobre o próprio espaço, intermediados pelos objetos, naturais e artificiais.” (SANTOS, 1997, p. 71). Com esse entendimento, o espaço atribui a si mesmo característica particular, estando organizado de maneira a servir como produto e/ou como condição de a sociedade reproduzir-se, ao mesmo tempo que comporta valores políticos e econômicos (SANTOS, 1986, p. 122). Fica patente, portanto, que o espaço – estrutural, organizacional e funcional – (e isso se aplica ao recorte espacial em análise), resulta de condições e ações da sociedade ao longo de sua trajetória, com intenções que privilegiam. determinadas. maneiras. de. estruturação. e. organização.. Consideramos que a espacialidade rural consegue unir, em um único mosaico, uma configuração que contém processos caracterizados por mudanças e permanências, no que se refere ao uso do solo, numa escala que pode conectar-se a realidades de dimensões globais, como aponta Trindade Junior.

(33) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 31. (1996, p. 133). Sendo assim, no estudo do espaço rural, os conceitos de forma, função, processo e estrutura devem ser vistos de maneira integrada. Estes são conceitos indispensáveis no estudo da criação e do modelamento do espaço através do tempo, uma vez que o espaço não pode ser reduzido a mero reflexo do modo de produção atual, servindo de feedback, com modos de produção do passado, manifestados pelas formas, resquícios de outrora (SANTOS, 1986, p. 145). Assim, buscando alargar esse entendimento, veremos que as formas são demonstrações das coisas aparentemente visíveis pelo olho humano, em conformidade com um exemplar, ou um arranjo de exemplares, que se revela na aparência de casas, fazendas, cercas, açudes, barragens, roçados, dentre outros objetos, os quais ilustram a materialidade da forma e têm sentido na vida social. Santos (1986) é partidário desse pensamento quando diz que os objetos representam as funções que o capacitam nas materializações acrescidas à natureza, sem as quais a produção é impossível. Desse modo, as formas do presente suplantam uma parcela do passado, uma vez que surgem impregnadas de contornos e intenções historicamente contextualizados. Em outras palavras, se considerarmos a forma em um contexto aleatório, estaremos incorrendo em uma simplória exposição de fenômenos, ou de um dos seus aspectos destes, num dado período do tempo. No entanto, as formas podem facultar outros papéis, dependendo do tempo em voga, sem que levem de imediato a uma extinção das formas anteriores, revivificando pelo movimento da sociedade (TRINDADE Jr., 1996, p. 133-134). O espaço, em qualquer quadro da vida social, é essencialmente uma dinâmica dialética que se assenta nos momentos históricos, em que há modos de fazer diferenciados, apropriações da técnica, bem como o trabalho humano como vivência complexa, exigindo mudanças correspondentes às inovações. “Através das novas técnicas vemos a substituição de uma forma de trabalho por outra, de uma configuração territorial para outra. Por isso, o entendimento do fato geográfico depende tanto do conhecimento dos sistemas técnicos” (SANTOS, 1997, p. 67)..

(34) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 32. Na trama da configuração espacial na Fazenda Mundo Novo, a política despontou como agente preponderante. Com suas conjunturas próprias, ela norteia questões e/ou meios capazes de alterar significativamente estruturas produtivas, culturais e econômicas, a ponto de se tornar o agente ativo de construção da realidade, com a finalidade de não romper o equilíbrio das estruturas locais, demarcando interesses e assumindo um papel central em todo esse processo. Nessa perspectiva, é correto afirmar que a formação espacial significa ser o espaço produzido, ao mesmo tempo que abre brechas para ele mesmo reproduzir-se continuadamente (MOREIRA, 1982, p. 46). Além disso, no âmbito das relações emanadas pelo movimento da sociedade, e estando o espaço a acompanhar esse ritmo, deparamos com características que intercalam traços harmônicos em relações contraditórias, coexistindo espaço e tempo de forma necessária, antagônica e complementar. Ademais, Santos (1997, p. 69) evidencia que “[...] a técnica tem um papel importante, mas não tem existência histórica fora das relações sociais”. A. simples. menção. ao. conceito. de. espaço. lembra. a. inseparabilidade da dimensão sociotemporal, pois o espaço compõe-se como extensão da vida em sociedade. Essa proposição se baseia na inerência do ato de produzir e reproduzir espaço, na característica que o espaço tem de ser continuadamente produzido, de modo a acompanhar os encaminhamentos manifestados pelos agentes diretamente ligados às decisões políticas e econômicas. Eventualmente, no próprio correr do processo de humanização do espaço, reside uma contraposição dialetizada, sendo consideradas duas ordens de natureza, como aponta Santos (1988, p. 71). Num primeiro momento, temos uma natureza pura, mítica, natural ou bruta, raramente encontrando-se, na contemporaneidade, ao alcance do visual, um lugar que não tenha sofrido a ação da sociedade. Para se pensar o nascimento dessa natureza, parte-se do pressuposto de que, quando se direcionam ações visando a aglutinar a primeira natureza – o espaço físico –, passa a ocorrer um processo de produção, criação e reprodução das relações sociais, pelas quais o homem se organiza em classes sociais definidas, para interagir no “meio natural” modificando-o e transformando-o em meios de subsistência. Ou seja,.

(35) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 33. consideramos o espaço produzido da Fazenda Mundo Novo como uma segunda natureza, na qual foram investidas técnicas e ações intencionais que permitem à sociedade lidar com o espaço historicamente construído e explicado pela técnica. Convém evidenciar que, para Santos (1986), há uma maior apreciação e/ou um maior entendimento da segunda natureza: o de que ela (a natureza) encerra um princípio da dialética, na medida em que o espaço tem como fundamento um contínuo de apropriação. O autor diz que há [...] sempre uma primeira natureza prestes a se transformar em segunda; uma depende da outra, porque a natureza segunda não se realiza sem as condições da natureza primeira e a natureza primeira é sempre incompleta e não se perfaz sem que a natureza segunda se realize (SANTOS, 1986, p. 172).. As intervenções feitas na natureza baseiam-se em técnicas emanadas de um processo social de produção e apropriação do espaço geográfico, inserindo-se numa dinâmica que não cessa, de maneira que, continuamente, a natureza do espaço se (re)adpta às aspirações da sociedade. Nesse aspecto, a política é um misto dialético de interesses, necessidades e intenções, que constituem a sociedade e dão forma às relações sociais. Os investimentos políticos são determinantes sociais que perpassam uma estrutura histórica formada e em funcionamento. Agem segundo a adequação de forças e a esquematização de diferentes escalas produtivas, mascarando as realidades. Portanto, o espaço é um meio pelo qual as políticas se manifestam e participam da produção das estruturas, formas e funções que o particularizam. Nesse aspecto, a seguir nos deteremos mais acuradamente aos arranjos políticos operacionalizados na área onde o estudo foi realizado..

(36) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 1.2.. 34. Política pública: ações do processo produtivo na Fazenda Mundo Novo. Uma sociedade alicerçada numa economia conduzida a custo de poucos avanços técnicos e fragilizada pelas intempéries climáticas das secas, com concentração do poder nas mãos da elite local e paulatinamente descapitalizada, pode ser vista, ao longo do tempo, como um terreno favorável para a constituição de um quadro de estagnação ou esmaecimento da atividade produtiva. Neste cenário, torna-se evidente, a necessidade de as elites locais pressionarem a camada dominante e detentora do poder por socorro, em forma de auxílios, que geralmente vem em troca de favores capazes de surtir efeitos paliativos e conseguir estabelecer a manutenção dessas elites, como pode ser entendido a partir da leitura de Bursztyin (1984, p. 20), ao dizer que foi com base em “[...] relações paternalistas da sociedade patriarcal que a estrutura social rural se constituiu”. As secas são um fenômeno natural, antigo e muito freqüente nos sertões nordestinos. Nelas, via de regra (a cada dois anos e meio) 2 , são diligenciadas várias políticas, diversos incentivos e atenções para que não se desintegre a estrutura, que é muito debilitada. As secas continuam a interferir na trajetória dos grupos sociais que dependem diretamente dos recursos naturais para sobreviver. Além disso, a conseqüência direta desse fenômeno induz sucessivos governos (locais, estaduais e regionais), a relações paternalistas. Eles lançam um discurso de combate, com distribuição de alimentos, caminhões-pipas e outros paliativos, que não conseguem criar um ritmo de desenvolvimento socioeconômico substancial. O BOX 1 destaca a veiculação dessa ocorrência na imprensa estadual.. 2. Para Gomes (2001, p. 75-76), a seca é um fenômeno natural, comum às áreas áridas e semiáridas do Nordeste brasileiro, com grandes implicações sociais e econômicas que há mais de trezentos anos surpreende e “pega desprevenidos” os governos dos estados nordestinos, os quais nela encontram mecanismos de manutenção do poder..

(37) Travessia teórica pelas veredas da produção do espaço na Fazenda Mundo Novo. 35. BOX 1 O ALARMANTE ÊXODO RURAL MOSTRA QUE O CAMPO NÃO VAI BEM O êxodo rural vem sendo para o País um problema até agora sem solução. No Rio Grande do Norte a situação se agrava. Aos poucos, o campo vai ficando sem o braço do trabalhador rural que, sem nenhuma assistência social e com salários irrisórios, busca nos centros urbanos uma nova perspectiva de vida. Essa situação gera graves problemas, obrigando o Governo a despesas especiais para evitar uma marginalização acentuada. Quem pode fazer para evitar o êxodo rural? (REVISTA RN ECONOMICO, 1979, p. 62) PERSPECTIVAS DA EMERGÊNCIA A ‘emergência’ foi decretada e mais uma vez o Estado terá seus resultados produtivos comprometidos pela estiagem. De emergência em emergência o Nordeste vai ficando cada vez mais empobrecido e sem perspectivas agrícolas. Espera-se que a orientação da emergência recémdecretada objetive a implantação de uma infra-estrutura capaz de prevenir os efeitos de uma nova estiagem, com ampla constituição de recursos hídricos e orientação técnica aos agricultores (REVISTA RN ECONÔMICO, 1980, p. 24). No mundo rural, acreditamos ter preponderado uma maior emergência de alternativas paliativas, consignadas sob a forma de auxílios e/ou práticas com um fundo de “paternalismo”. Em contrapartida à situação desoladora e incerta, existe a perspectiva de um retorno das atividades institucionais habituais, como expressa o fragmento textual contido no Box 2. BOX 2 [...] No primeiro ano de seca, a EMATER/RN desviou-se de suas atividades específicas e sustentou o desafio da geração da distribuição do dinheiro da Emergência. Pintou o inverno de setenta e nove, o tempo preparou mas a chuva não caiu na medida das necessidades do sofrido homem do campo. Instala-se a seca de 80/81 e, de novo, o órgão solicita pelo governador Lavoisier Maia para assumir a responsabilidade da Emergência é a EMATER/RN. Dessa vez com mais firmeza e segurança na determinação, pois sabe o governador, do ‘Know How’ adquirido nesse tipo de trabalho pela EMATER/RN pronta a arregaçar as mangas ao primeiro chamado à luta, principalmente em função do PROATER-81 – Programação Anual de Assistência Técnica e Extensão Rural. (REVISTA RN ECONÔMICO, 1981, p. 13)..

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