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A PROVA ILÍCITA E O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL

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A PROVA ILÍCITA E O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL

José C irilo de Vargas"

RESUMO

O processo penal brasileiro, de fe itio te o rica m e nte acusatório, c o n c e d e às p a rte s a m p la lib e rd a d e de p ro v a . P o r e x ig ê n c ia c o n s titu c io n a l, o m eio de sua obtenção deve ser lícito . D entre as v á r ia s c o rr e n te s , firm o u -s e no S u p re m o T rib u n a l F e d e ra l o e n te n d im e n to de que a prova obtida por m eio ilícito , bem com o as q u e d e la d e riv a re m , não s e rã o c o n s id e ra d a s p ara e fe ito de c o n d e n a ç ã o . Num a q u e b ra do siste m a e s trita m e n te a c u s a tó rio , p e rm ite -se ao ju iz a in ic ia tiv a p robatória, desde que seja em busca da verdade real.

ABSTRACT

The B razilian C rim in a l P rocedure, o f th e o ry th ic a lly accusatory shape, gives to the parties large freedom to produce evidence. Due to c o n s titu tio n a l dem and, its w ay o f obtaining m ust be legal. A m ong all the d o c trin a ire in te rp re ta tio n s , it has been firm e d a position in the

F ederal Suprem e C ourt th a t the evidence obtained by illic it methods, as w e ll as the e v id e n c e o rig in a te d fro m th a t one, s h a ll not be considered fo r conviction. In a change o f the strict accusatory system , the ju d g e is allow ed to look fo r evidence, since it is in search o f the real tru th .

A palavra prova se origina de probatio, significando verificação, exam e, co n firm a çã o, re conhecim ento, etc., dando origem ao verbo probare. J u rid ic a m e n te , representa os atos e os m eios usados pelas partes e pelo órgão ju d ic ia l para se ch e g a r à verdade dos fa to s alegados. É, portanto, form a de d em onstrar uma verdade.

C onfirm a ou indica que um fato existe ou existiu; de que form a existiu ou existe, visando ao convencim ento do ju iz neste ou naquele

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sentido. Natural, pois, que as partes busquem provar o que fo r de seu interesse.

C onclui-se do art. 155 do CPP que são a d m issíve is no ju ízo penal todos os meios de prova perm itidos na lei c ivil, já o mesmo não sucedendo quanto ao seu objeto, isto é, quanto àquilo sobre que ela pode versar. As restrições estabelecidas na lei civ il não se aplicam ao juízo penal, a não ser aquelas relacionadas ao estado das pessoas. Na dúvida quanto à idade ou ao estado civ il do réu, por exem plo, só se admite a prova docum ental.

A lim itação à prova refere-se apenas às legalm ente proibidas ou moralmente ilícitas, tendo vigência entre nós o princípio da verdade real. A quilo que resultar dessa am pla atividade probatória é que será livrem ente apreciado pelo ju iz, na form ação de seu convencim ento.

Sua produção é direito das partes e faculdade do juiz, no tempo e no modo estabelecidos em lei. A C onstituição, adotando as regras do devido processo, não apenas assegura ao cidadão acusado o direito de defender-se; antes, a defesa se impõe, como conditio sine qua da punição crim inal.

Certos Autores falam em “apuração da verdade histórica” ou em “reconstrução h istó rica ” , e o fazem com razão. De fato, a lei não diz a respeito de que o ju iz form ará sua convicção, mas resulta evidente: será re la tivo aos fatos, ta l como se deram . Daí, sua reconstrução histórica, pela palavra do réu e da vítim a , das testem unhas, pela perícia, pelos documentos, etc. Pouco importa que o cidadão, abrindo mão da defesa, adm ita como procedente uma acusação, ou que o acusador acolha uma afirm ação do acusado como verdadeira.

A transigência das partes, nesse aspecto, não autoriza o ju iz a concordar com elas. A pesar da convergência, deve ele pesquisar e descobrir a verdade, ao contrário do que acontece nas demandas civis. Nestas, se o cidadão, demandado por certa quantia, afirm ar falsamente já te r pago metade da d ívid a , e o autor a ce ita r a alegação, não cabe

ao ju iz averiguar a veracidade do alegado.

No ju íz o crim inal, não im porta a confissão do fato im putado, nem que o acusado aceite a im putação sem lhe opor, por exem plo, uma causa de exclusão da ilicitu d e ou da culpabilidade. Incumbe ao

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.José C irilo de Vargas

julg a d o r buscar a prova de tudo quanto possa levá-lo a inteirar-se dos fatos. É absolutam ente irrelevante o caráter incontroverso do fato. A regra, de que os fatos afirm ados por uma parte e aceitos pela outra não carecem de prova, não se aplica ao processo penal.

Num tipo de procedim ento estritam ente acusatório, a prova poderia ser considerada mera dem onstração das alegações das p artes. T eorica m e n te , não é dado ao ju iz in te rv ir na a tiv id a d e probatória e tornar letra morta a garantia do contraditório.

Na p rática, porém , d irig e o processo como quer. Com as inform ações policiais e o interrogatório, já forma seu convencim ento. A p re se n ça do d e fe n s o r e do fu n c io n á rio do MP passa a se r formalidade. Aliás, do ponto de vista legal, o pedido do MP é genérico. No cotidiano forense, o ju iz considera o funcionário do MP um ajudante ou auxiliar. Com freqüência, vê-se o ju iz dizendo “meu prom otor não me dá problem a” ou “agora me mandaram um bom prom otor” , como se tal funcionário não tivesse inquéritos a exam inar e processos a fiscalizar, além de outras atividades especificadas em lei.

É alarmante a constância de devolução de autos de inquérito já com denúncia para, nesta, o MP in clu ir outras pessoas. Denunciar, ou não, está-se tornando cada vez mais uma decisão do ju iz . Há pouco a tu a m o s num a d em anda na ju s tiç a fe d e ra l em que os funcionários do MP tinham papel quase decorativo.

A um exame superficial da realidade brasileira constatam os a enormidade de prerrogativas do ju iz na área criminal: a) pode prender e so lta r na fase policial, independente de solicitação;b) uma pessoa “su sp e ita ” de certos crim es (m ais de uma dúzia, especificados em lei) pode ser presa a pedido do delegado e fic a r à disposição deste por dois meses; vencidos os quais, basta o ju iz querer para ser decretada a prisão preventiva, cuja duração é indefinida; c) com um sim ples auto de prisão em flagrante form a seu convencim ento sobre a “hediondez” de um fato, para efeito de im pedir a concessão de certos benefícios (o conceito de crim e hediondo é uma dessas raríssim as pérolas descobertas e introduzidas em nosso sistem a penal pelos m ovim entos da lei e da ordem, responsáveis pela inacreditável cifra de dois m ilhões de encarceram entos nos Estados Unidos. Em breve,

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terem os tam bém nosso “G ulag” tro p ica l); d) em relação às prisões cautelares não vige o contraditório; e) oferecida a denúncia, o ju iz pode d e v o lv e r os autos e “s u g e rir” a inclusão de outras pessoas; de regra, o funcionário do MP aceita a sugestão; f) instaurada a ação, o ju iz pode novamente prender ou soltar, independente de manifestação do MP; g) quem prim eiro ouve a testem unha, esgotantem ente, é o ju iz , tenha sido arrolada pela acusação ou pela defesa, podendo

in d e fe rir perguntas das partes; h) para o ju iz , não há número ou oportunidade processual para ouvir pessoas; i) sempre de ofício, pode d eterm inar a realização de q uaisquer perícias ou renová-las, e bem assim m andar ju n ta r docum entos; j) o MP pode pedir a absolvição e o ju iz condenar, e vice-versa; k) a denúncia é por lesão leve e o réu é condenado por lesão grave ou gravíssima; l)pode condenar a uma pena agravada por circunstância não constante da denúncia; m) o réu é denunciado por sedução e condenado por estupro (nova definição ju ríd ic a do fa to ); n) se o réu, em lib e rd a d e , é co n d e n a d o ou

pronunciado, e o ju iz deseja sua prisão, telefona à polícia mandando prender, antes de p u b lica r a sentença e p o ss ib ilita r a fuga (esse expediente é corriqueiro na ju stiça crim in a l); o) o réu só pode apelar em liberdade se o ju iz quiser; p) o preso, cum prindo pena, só pode tra b a lh a r lavando latrinas do fórum ou varrendo ruas da cidade se o ju iz “consentir no p riv ilé g io ” .

A lg u é m , com m ais te m p o e p e n d o re s, p o d e ria c o n tin u a r desfiando esse novelo enorme de iniqüidades. Será que tantas coisas absurdam ente estranhas e negadoras de nossa condição humana podem ser feitas e xclusivam ente em fa v o r do princípio da verdade real? Não se sabe. O certo é que um conjunto de disp o sitivo s legais, estabelecidos no correr do tem po e das necessidades de um código de processo, nascido anacrônico e fascista, outorgou ao ju iz crim inal essa form idável soma de poderes, que, antes, e em qualquer parte do mundo, ja m a is lhe fora concedida. A questão que se coloca aos juristas, de que ramo do Direito seja, é se tal situação pode prosperar

num País dem ocrático e com pretensões à m odernidade. Um quadro como esse, traçado a vôo de pássaro, permite afirm ar que um bacharel em D ireito, apenas com um concurso e um ato a d m in istra tivo de nomeação, passa a dispor de poderes com paráveis aos de um ditador da era moderna, que sempre deve contas ao grupo que o sustenta no

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.José C irilo de Vargas

Poder e aos organism os internacionais. As decisões ju d icia is, ao contrário, estão sujeitas apenas a um controle de feição interna, feito por colegas com a prevalência do natural espírito corporativista. Na

condição de contribuintes e responsáveis pela folha de

salários desses servidores do público, devem os re fle tir sobre se o atual sistem a de distrib u içã o de ju stiça é o adequado, ou se, ao contrário, é-de ser revisto, com a adoção de coisa melhor.

A C onstituição d e lim ita o papel reservado ao Ju d iciá rio , à Advocacia, à Defensoria Pública, ao MP e à Polícia judiciária, aderindo ao sistem a de processo acusatório. A Polícia incumbe a apuração das infrações penais, a advocacia é tida como profissão liberal, enquanto que a P rom otoria e a Defensoria constituem os órgãos executivos de acusação e de defesa. Ao Judiciário, a função histórica de decidir.

O sistema processual acusatório é o mais antigo, embora quase s e m p re s u b s titu íd o p e lo in q u is itó r io , c o m o a c o n te c e u nas perseguições prom ovidas pela Igreja de Roma. Mesmo em países de processo penal avançado, não existe um procedim ento acusatório puro, isento da in te rve n çã o do ju lg a d o r. Basta v e r a realidade brasileira.

Sua principal característica é a tangente separação do acusador e do ju lg a d o r. Em seus prim órdios, a legitim ação para in ic ia r o procedim ento era exclusividade do lesado ou de seu cônjuge.

M odernam ente, a Coroa criou o MP, e, com o tem po, seus funcionários foram designados tam bém para a persecução penal em nome do Rei. Cumpria-se o objetivo de distinguir entre quem acusava e quem ju lg a v a . E fe tiva va -se a clássica expressão “actus trium personarum ” : o acusador, o réu e o juiz. Teoricamente, quem julgava era d istin to de quem inicia va e prosseguia na acusação. Os atos exe cu tivo s de acusar se igualavam aos de defesa, estabelecido o c o n tra d itó rio . Em sua pureza, cabe ao E xe cu tivo , que iniciou a acusação, dar seguim ento à mesma, até sentença. Entretanto, como vimos, o juiz, quase sempre, mostra ser o mais interessado na punição. O Estado, como tem os escrito e falado há mais de três décadas, não pode te r mais interesse em condenar do que em absolver um cidadão acusado.

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O código de Processo estabeleceu que a prova da alegação incum birá a quem a fizer; mas, sempre em nome da verdade real, o ju iz pode determ inar, de ofício, a realização de d ilig ê n cia s antes de p ro fe rir sentença. A questão do ônus da prova não assum e as d im ensões do processo c iv il, pois o ju iz d isp õ e de fa cu ld a d e s instrutórias capazes de s u p rir a inércia ou o descaso das partes. A prerrogativa ju d ic ia l é tão grande que se uma das partes arrolar testem unha tardiam ente, o ju iz pode ouvi-la, como se, ad absurdum, fosse sua.

Por isso essa faculdade, e as dem ais, devem ser exercitadas com prudência e cautela, e som ente naqueles casos extraordinários de dúvida intransponível, impedindo a formação de seu convencimento racional. Nesse ponto vale a pena lem brar o conhecim ento doutrinário e a experiência de ju iz de F rederico Marques: “se ele se entregar à instrução da causa com o ardor de um d e te tive d ilig e n te , estará quebrada a garantia da defesa plena e com prom etida toda a estrutura acusatória do processo penal... O magistrado (sic) tem de m anter-se sereno, im parcial, com edido e superposto ao litíg io , para decidi-lo com estrita exação de tudo quanto deve im perar na excelsa função de d ize r o d ire ito e dar a cada um o que é seu. P ensar que o ju iz precise descer à arena das investigações, como se fosse um policial à procura de pistas e v e s tíg io s , seria te n ta r a ressu rre içã o das devassas, do procedim ento in q u is itiv o e cria r o risco e perigo de decisões pa rcia is e apaixonadas, com grande prejuízo, sobretudo, para o d ire ito de d e fe sa ” (E lem entos de D ireito Processual penal, II. 2a ed., revista e atualizada por Eduardo Reale Ferrari. Campinas, M illenium , 2.000, p. 343).

Um extenso rol de situações perm issivas de iniciativa probatória do ju iz no processo penal brasileiro é citado, por exem plo, em dois excelentes trabalhos de: a) Marco A ntonio de Barros. A busca da verdade no processo penal. SP, RT, 2002; e b) Marcos A lexandre Coelho Z illi. A in icia tiva instrutória do ju iz no processo penal. SP, RT, 2.003. Na L ite ra tu ra com parada e já um pouco m ais antiga, os clássicos V incenzo M anzini (Trattato, 4 tom os, Torino, U te t,1.967), G. Leone (Tratado, 3 tomos, trad de Santiago Sentis Melendo, Buenos Aires, Ejea, 1963) e Figueiredo Dias (D ireito Processual penal, 1o

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José C irilo de Vargas

v o l., C oim bra, C oim bra E ditora, 1974). M ais rece n te m e n te , na Alem anha, Claus Roxin (S trafverfahrensrecht, 25a edição da obra iniciada por Eduard Kern, München, Beck, 1.998, e “Strafprozesrecht” - Prüfe dein W issen— 15. Aufl., München, Beck, 1997). Na Espanha, em pormenores, Francisco Munoz Conde - Búsqueda de la verdad en el proceso penal, Buenos Aires, Hammurabi, 2.000.

Há quem pretenda, como Pietro Nuvolone, distinguir prova ilícita de prova ilegítim a. Quando é feita violando norma de caráter material é ilícita. Se produzida com infringência de norma processual, considera ele como ilegítim a (Referência de Ada G rinover na coletânea “O P rocesso em sua unidade, II” , Rio, F orense, 1984, p. 171). É absolutam ente desprovida de serventia a opinião do escritor italiano. M elhor seria o emprego da expressão “prova proibida” . Para reputar- se “ilíc ita ” , tanto faz ser obtida violando regra do código penal, do código de processo civ il ou da Constituição.

Em linguagem alguma existe diferença entre prova ilícita e prova ilegítim a. Maria Helena Diniz explica que ilegítim o “é aquilo que não dispõe de requisitos exigidos por lei para que possa ser reconhecido ju rid ica m e n te ou produzir efeitos jurídicos; ilícito ; ilegal; contrário à

le i” (D icionário Jurídico, v. 2. SP, Saraiva, 1.998, p. 758).

A b rim o s esse a rtig o m e n cio n a n d o a lib e rd a d e de p rova assegurada às partes, com a ressalva de que seja obtida por meio lícito. Sempre é bom lembrar o erro judiciário da Comarca de Araguari, conhecido como o “caso dos irmãos N aves” , em que os dois infelizes não suportaram os suplícios impostos pela polícia militar, comandada por um “enérgumo delegado especial” (expressão de Nelson Hungria, relator de recurso no Supremo, do processo de revisão) e confessaram a prática de um hom icídio que jam ais existiu.

Em palestra proferida antes da prom ulgação da C onstituição, a profa. Ada G rinover, na passagem em que exam inava a eventual eficácia da prova ilícita, declarou: “Nota-se, nesse ponto, um grande dissenso doutrinário e uma profunda divergência jurisprudencial, nos

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d ive rso s sistem as processuais. Seria p o ssíve l, pergunta-se , a fa sta r de um processo prova re le va n te e e fica z, prova que poderia le v a r à d e scoberta da ve rd a d e no processo penal, pelo só fa to de ser ela c olhida com in frin g ê n cia à norm a m a te ria l? Ou, ao co n trá rio , essa prova deveria ser produzida e valorada, apenas punindo-se, pelo ilícito penal, civil ou adm inistrativo com etido quem a tivesse obtido de form a ilíc ita ? É essa a dú vid a que se coloca d o u trin a ria m e n te e à qual os autores têm respondido das m ais d ive rsa s m a n e ira s” (O processo em sua unidade, II, c it., p. 172).

Sobre a questão no rm a lm e n te são referidas quatro tendências: a prim e ira é no se n tid o de se a d m itir a prova ilíc ita e apenas pu n ir o responsável pelo ato c o m e tid o ; a segunda é pela in a d m is s ib ilid a d e , tendo por fundam ento a unidade da ordem ju ríd ica (ilícito em um setor do D ire ito , ilíc ito em todos). Uma te rc e ira corrente, d e s e n v o lv id a in ic ia lm e n te pela ju ris p ru d ê n c ia dos E stados Unidos, da A lem anha e da Itália, é tam bém pela in a d m issib ilida d e , reportando-se aos valores c o n s titu c io n a is e aos d ire ito s fu n d a m e n ta is do cid a d ão . A quarta te n d ê n cia sustenta a in a d m is s ib ilid a d e , com atenuações, baseando- se no c h a m a d o c rité rio da ra z o a b ilid a d e ou p ro p o rc io n a lid a d e : re co n h e ce -se a in c o n s titu c io n a lid a d e e a co n se q ü e n te in e fic á c ia da prova colhida. Contudo, a proibição de adm iti-la é abrandada, quando fo r a ú n ic a a s e r p ro d u z id a , v is a n d o a tu te la r o u tro s v a lo re s fu n d a m e n ta is . Essa te n d ê n c ia é de larga a p lic a ç ã o nos E stados Unidos.

Na A le m a n h a , a n te s da re u n ific a ç ã o , a ju ris p ru d ê n c ia da R epública Federal p ro scre via do processo penal pro va s d e co rre nte s de interceptação telefônica ilícita, cartas perdidas ou extraviadas, etc., m as a ce ita n d o , e xc e p c io n a lm e n te , o c rité rio da ra zo a b ilid a d e . A pós a re u n ific a ç ã o , co n tin u a m em v ig o r as m edidas de p roteção ju ríd ic a contra in te rve n çõ e s processuais penais nos d ire ito s fu n d a m e n ta is. O que se d iscu te na d o u trin a e na ju ris p ru d ê n c ia é a in te rv e n ç ã o já efetivada.

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.José C irilo de V argas

S carance Fernandes observa ser “interessante m encionar duas h ip ó te se s co n cre ta s (sic) que m ostram a necessidade de se a d m itir critério de proporcionalidade. Em determ inado caso, para im pedir fuga de presos considerados perigosos de e stabelecim ento penite n ciá rio , v io lo u -s e a corre sp o nd ê n cia desses presos, d escobrindo-se que, no plano de fuga, constava o seqüestro de um ju iz de d ire ito quando to d o s e sta ria m reunidos em a u diência em de te rm in ad a com arca do Estado de São Paulo. Como a violação de correspondência é vedada pela C onstituição Federal (art. 5o, XII), a aplicação rigorosa da norma c o n s titu c io n a l im p e d iria que pudessem ser usadas com o provas as cartas interceptadas, pois, sendo obtidas por meio ilíc ito consistente em afronta à referida vedação constitucional não seriam adm itidas... São o c o rrê n c ia s com o e ssa s que im p u ls io n a m a d o u trin a e a ju ris p ru d ê n c ia a a d m itir exceções à regra c o n s titu c io n a l..."(J u s tiç a

penal n. 4. C o ordenação de Jaques de C am argo P enteado. SP, RT, 1997, p. 51).

S abe-se que S ca ra n ce é bacharel aposentado do MP, onde p re su m id a m e n te exe rcia as funções norm ais de a cusador público. No c o n te x to do D ire ito C om parado, dos d o cum entos in te rn a cio n a is de lib e rd a d e s c iv is e das grandes obras d o u trin á ria s , sua opin iã o é ir r e le v a n te . M o s tra a p e n a s a id e n tid a d e id e o ló g ic a e n tre os fu n c io n á rio s do MP e os a tiv is ta s dos m o vim e n to s da lei e da ordem esp a lha d o s pelo País.

E em nada co la b ora com o a p rim o ra m e n to das lib e rd a d e s p ú b lic a s to m a r p o r base re m o ta s h ip ó te s e s p a ra ju s t if ic a r o e n d u re cim e n to penal ou a d m itir exceções a regras c o n s titu c io n a is duram ente conquistadas. No exemplo referido, tudo ainda estava numa fase em que, na sala de aula, o professor ensina: “cogitationis poenam nem o p a titu r” . E o fu ro r c a rc e rá rio já fa la v a em uso de ca rta s inte rce p ta d a s ilegalm ente. Em ação penal pelo crim e de “ pensar” em seqüestro? É a mentalidade da Inquisição, quando se queimavam vivas m eninas guerreiras.

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S o b re o c r ité r io da p r o p o r c io n a lid a d e , d u a s e x c e le n te s d isse rta çõ e s de m estrado: de Suzana de Toledo Barros (O P rin cíp io da p ro p o rcio n a lid a d e e o co n tro le de c o n s titu c io n a lid a d e das leis re stritiva s de d ire ito s fu n d a m e n ta is. B rasília, B rasília Ju ríd ica , 2000) e de M a riâ n g e la G a m a de M a g a lh ã e s G o m e s (O p rin c íp io da p ro porcionalidade no D ire ito penal. SP, RT, 2003).

A fo rm a çã o do liv re c o n ve n cim e n to deve situ a r-se dentro de parâm etros lícito s e éticos, que afastem a possibilidade de o ju lg a d o r dar crédito, por exem plo, a uma confissão e xtra ju d ic ia l, mas que não d iscrepa do co njunto pro b a tó rio . A inda quando assim seja, quando a co n fissã o se co n c ilia com os d e m a is e le m e n to s de prova co lh id o s em ju íz o , som os de p a re ce r que co n fissã o não houve.

F re d e ric o M arques, tra ta n d o da pesquisa da ve rd a d e real, pondera que “a to rtu ra , as b ru ta lid a d e s e todo atentado v io le n to à integridade corporal devem ser banidos da investigação e da instrução” (E le m e n to s de D ire ito processual penal, II. C am pinas, M ille n n iu m , 2 0 0 3 , p. 3 5 3 ) . A p e n a s a t í t u lo de e s c la r e c im e n to e de co m p le m e n ta çã o : o CP espanhol de 1995 co nsiderou a to rtu ra um d e lito com um contra a integridade m oral, prevendo prisão de até seis anos (a ltís s im a para os padrões e u ropeus) m ais in a b ilita ç ã o para a função pública por doze anos, para o fu n cio n á rio que to rtu ra r visando o b te r co n fissã o ou in fo rm a çã o. A la rg o u-se a in c rim in a ç ã o anterior, para abranger qua isqu e r situações, m esm o quando não seja no curso de p ro ce d im e n to ju d ic ia l ou p o licia l.

A C F/88 d e te rm in o u ser in a d m is s ív e is as provas o b tid a s por m e io s ilíc ito s . A u to ra in te le c tu a l do d is p o s itiv o , A da G rin o v e r e scla re ce : “a p ro va d o o p ro je to de te x to c o n s titu c io n a l, o pró p rio m a n d a m e n to da L e i M a io r o b rig a o le g is la d o r a d is c ip lin a r m in u cio sa m e n te a m a té ria . R epetim os, assim , em m atéria penal, as reco m e n da çõ e s que a nosso v e r d e ve ria m se r obse rva d a s pela lei, que deveria regular: a) a previsão de infrações penais que ju s tific a m a a u to riza çã o ju d ic ia l da in te rce p ta çã o te le fô n ic a ; b) a re striçã o da escuta aos casos em que h o u v e r fo rte s razões de co n v e n c im e n to quanto à in s u fic iê n c ia de su sp e ita s; c) os re q u isito s fo rm a is de que deve re ve stir-se a a u to riza çã o , in clu in d o sem pre a sua prorrogação, por igual p e ríodo; e) a in d ica çã o dos órgãos ou pessoas que podem

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Jo sé C irilo de V argas

e fe tu a r a operação técnica autorizada; f) a obrigatoriedade de lavrar- se auto c irc u n s ta n c ia d o da d ilig ê n cia , ainda quando esta não surta e fe ito ; g) a ciê n cia da d ilig ê n cia ao indiciado ou acusado e a seu defensor, tão logo se possa dar, sem prejuízo para as investigações, com a escuta da conversação gravada e a possibilidade de a defesa, por sua vez, g ra v a r a conversa interceptada; h) a d e stru içã o dos trechos considerados im pertinentes ou irrelevantes para o processo” (In te rc e p ta ç õ e s te le fô n ic a s e g ravações cla n d estin a s no processo penal, in N ovas tendências do direito processual. Rio, Forense, 1990, pp 81-82).

Quase oito anos depois da vigência da C onstituição, foi editada a lei, reclam ada pela professora e regulam entadora da segunda parte do inciso XII do art. 5o. Até então, invocava-se o art. 57 do código b ra s ile iro de te le co m u n ica çõ e s para ser expedida auto riza çã o da interceptação.

Sobre o assunto, foram lem bradas algumas súmulas das mesas de processo penal da Faculdade de D ire ito da USP. Como exem plo: número 48: “Denominam -se ilícitas as provas colhidas com infringência a n o rm a s e p rin c íp io s de d ire ito m a te ria l” , e n úm ero 49: “são processualm ente inadm issíveis as provas ilícitas que infringem normas e p rin c íp io s c o n s titu c io n a is , ainda qua n d o fo re m re le v a n te s e p e rtirie n te s, e m esm o sem com inação processual e xp re ssa ” .

Parece que d e fin itiv o mesmo foi o habeas corpus 69.912-0-RS, relatado por S epúlveda Pertence. O ju lgam ento pelo Pleno com eçou em m arço de I993 e foi seguidam ente adiado por pedidos de vista , a té d e z e m b ro d a q u e le a n o . P u b lic a ç ã o em m a rç o de 1 9 9 4 , a n te rio rm e n te , p o rtanto, à edição da lei regulam entadora do inciso XII do art. 5o.

T ra ta v a -s e de uma condenação por trá fic o de e n torpecente, confirm ada pelo tribunal gaúcho, com um voto vencido determ inando a e x c lu s ã o dos a u to s da tra n s c riç ã o de g ra v a ç õ e s o riu n d a s de in te rc e p ta ç ã o te le fô n ic a , a que a p o lícia procedera, com p ré via a u to riza çã o ju d ic ia l.

Em p rim e iro e segundo graus de ju ris d iç ã o consid ero u -se que a CF recepcionara o art. 57 do código brasileiro de telecom unicações.

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Um dos co ndenados im p e tro u ordem de habeas corpus ao STJ, que d e clin o u de sua c o m p e tê n cia para o S uprem o. A ordem im petrada insistiu na tese de que o inciso XII não era a u to -a p lic á v e l, d e p e n d e n d o de re g u la m e n ta ç ã o , já que a C o n s titu iç ã o a p e n a s a u to riza ra a le g isla çã o o rd in á ria re g u la m e n ta r a m a té ria . E nquanto não h ouvesse lei re g u la m e n ta d o ra , a “g ra m p e a ç ã o ” de a p arelho telefônico era vedada. Pediu-se a concessão da ordem para determ inar a a n ulação do processo e o d e se n tra n h a m e n to da prova d e c o rre nte da interceptação.

S ep ú lve d a re q u isito u os autos p rin c ip a is e v e rific o u que a d ilig ê n c ia que resultou na apreensão da d roga e nas prisões em fla g ra n te foi precedida por vá rio s m eses de in ve stig açã o com escuta te le fô n ic a , sem pre a u to riza d a pelo ju iz . O MP da U nião opinou pela ile g itim id a d e da quebra de sigilo, naquela situação; ao mesmo tem po, era pela não concessão da ordem , ao fu n d a m e n to de que a sentença condenatória não se fu ndava e xclu siva m e n te na prova ilícita.

Em seu voto, S e p ú lve d a con sid ero u que a C o n s titu iç ã o não re c e p c io n a ra o art. 57 do có d ig o de te le c o m u n ic a ç õ e s , e que a in a d m is s ib ilid a d e da p ro va co lh id a ilic ita m e n te já se firm a ra no S uprem o, antes da C F/88. D esprezando o ponto nodal do parecer do MP (re ctiu s, a sentença não se baseara e x c lu s iv a m e n te na prova ilíc ita ), a firm o u o M in istro , in ve rb is: “ Dada essa patente relação g e n é tica entre os re su lta d o s da in te rce p ta çã o te le fô n ic a e as provas subsequentem ente colhidas, não é possível apegar-se a essas últim as - fru to s da o p e ra ç ã o ilíc ita in ic ia l — , sem , de fa to , e m p re s ta r relevância probatória à escuta ve d a d a ” .

S e p ú lve d a e n ca m p a va m ais uma ve z a te o ria dos “fru to s da á rv o r e e n v e n e n a d a ” , c o m o d e c o r r ê n c ia ló g ic a do p r in c íp io c o n stitu cio n a l de que estam os tratando. Se o com eço é ilícito , ilíc ita s serão as decorrências. De árvore envenenada não nasce fruta saudável.

Desse m odo, co n ce d e u a ordem para a n u la r o p rocesso, in clu in d o o in q u é rito e a prisão em fla g ra n te . Foi acom panhado por Resek, lim a r G alvão, M arco A u ré lio e C elso de M ello, que levantou a questão da proporcionalidade. Quanto à ilicitude da prova, Carlos Mário p ô s -s e de a c o rd o com S e p ú lv e d a , m as in d e fe ria a o rd e m , ao

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Jo s é C irilo de V argas

fu n d a m e n to de que a condenação não se baseara e xclu s iv a m e n te nela, adotando, no particular, o parecer do MP.

P aulo B rossard discordou de S epúlveda, alegando que a “g ra v id a d e ” do crim e ju s tific a v a a quebra da p rivacidade (o velho e c o n s e r v a d o r e s ta n c ie ir o não le v o u em c o n ta o c r it é r io da proporcionalidade, sobre o qual, em seu voto, já dissertara com brilho Celso de Mello, homem de letras e conhecido curador da Constituição).

Na sessão do dia 30-6-93, in d e fe rira m o pedido B rossard, C a rlo s V eloso, S idney Sanches, O cta vio G alloti, Néri da S ilve ira e M oreira A lve s. Esses seis ju iz e s , com vo to s m a jo ritá rio s, deixaram de considerar contam inadas as provas derivadas da prova ilícita.

O p a c ie n te , e n tão, im p e tro u ação de se gurança, em que, revelando que um funcionário do MP, filho de Néri da S ilveira, atuara no caso com o acusador, pretendia que se alterasse o re su lta d o do ju lg a m e n to . C arlos M ário, como relator, não conheceu da segurança,

mas, le va n do em conta o im pedim ento alegado, concedeu habeas corpus de ofício, para anular o julgam ento anterior, de que participara N éri da S ilv e ira (É estra n h á ve l que S ilv e ira , conhecendo os autos, estivesse pa rticip a n d o de ju lg a m e n to em que o filh o já o ficia ra como prom otor. E stranhável tam bém que a relação de parentesco só fosse co n h e cid a na ação de segurança e por in ic ia tiv a do P aciente. E se este se calasse? Por sorte, ainda existem advogados em B ra sília ...).

F in a lm e n te , em 16 de dezem bro, im pedido Néri da S ilv e ira , o S uprem o, por m a io ria , concedeu a ordem , para an u lar o processo a partir da prisão em flagrante (publicado no DJU de 25-3-94). Prevaleceu a te o ria dos fru to s da árvore envenenada, que ficou m ais fo rta le c id a pela a p osentadoria de Brossard e a nom eação de M aurício C orreia.

A p a rtir desse habeas corpus, firm o u -se no S uprem o e no STJ o se guinte: a) se a prova foi obtida por m eio ilíc ito , não pode ser consid erada na d e r cisão da causa; b) deve ser desentranhada dos autos; c) a d e núncia ou queixa baseada e xclu siva m e n te em prova ilíc ita d eve ser re je ita d a ; d) o vício contam ina: se as dem ais provas forem decorrentes daquela obtida ilegalm ente, tem -se a contam inação to ta l do co n ju nto prob a tó rio (um a p a rticu la rid a d e : m esm o havendo

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nos autos prova ilíc ita , pode p ro sp e rar sentença co n d e n a tó ria , se lançada com base em pro va s não co n ta m in a d a s. P a rece-nos ju s to equilíbrio).

Levando-se em conta o p rin cíp io da p ro p o rcio n a lid a d e , tem -se a d m itid o a prova ilíc ita , quando o o b je tiv o é p ro v a r a in o cê ncia do acusado. A ce ita -se o s a c rifíc io da regra c o n s titu c io n a l em b e n e fíc io da realização da ju s tiç a . D izem Ada G rin o ve r e outros: “Não d eixa de ser, em últim a análise, m anifestação do princípio da proporcionalidade a posição p ra tic a m e n te unânim e que reconhece a p o s s ib ilid a d e de u tiliza çã o , no processo penal, da prova fa v o rá v e l ao acusado, ainda que colhida com in frin g ê n c ia a d ire ito s fu n d a m e n ta is seus ou de te rce iro s. Trata-se de aplicação do princípio da proporcionalidade, na ótica do d ire ito de defesa, tam bém in fo rm a d o pelo p rin cíp io do fa v o r rei. A lém disso, quando a prova, a p a re n te m e n te ilíc ita , fo r colhida pelo p róprio acusado, te m -se e n tendido que a ilic itu d e é e lim in a d a por causas legais, como a legítim a defesa, que exclui a antijuridicidade” (As n u lid a d e s no processo penal. SP, RT, 1992, p. 11). No m esm o sentido ju iz e s e d o u trin a d o re s que preferem v e r um crim inoso à solta a um in ocente preso, c u m p rin d o pena.

São numerosas as possibilidades de obtenção de prova por meio ilícito. A prática dos tribunais vai individualizando situações. O TACRIM- SP, pelo vo to de S érgio P itom bo, negou v a lia à prova re su lta n te de entrada em casa alheia sem as fo rm a lid a d e s legais ou fora dos casos a d m itid o s em le i. No caso ju lg a d o , fa lto u , se g u n d o o sa u d o so P itom bo, o d e vid o processo legal sem o pontual procedim ento, ainda que na prim e ira fase da persecução penal (RT 725: 575).

O TRF paulista, re la to r o ju iz Ney M agno V aladares, anulou ação penal porque a denúncia foi embasada em provas obtidas através de requisição do MP à polícia, sem a necessária autorização ju d ic ia l, de in fo rm a ç õ e s que im p o rta va m em quebra de s ig ilo bancário (RT 745:670). O utra quebra de s ig ilo bancário, sem a u to riza çã o ju d ic ia l, acarretou o tra n ca m e n to de ação penal pela 2a Turm a do 1o TRF, em 2 2 -1 0 -9 7 . N esse ca so , de nada v a le u h a v e r o u tra s p ro v a s da

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Jo sé C irilo de V argas

m a te ria lid a d e do fato, que deram base ao ofe re cim e nto da denúncia (RT 753:710). Observação: nos “cursinhos" preparatórios de candidatos a ingresso na ca rre ira de pro m o to r público, os alunos são le va d os a a c re d ita r que, se a p rovados e nom eados, irão e xe rce r fu n çõ e s de poder ja m a is im aginado. D epois,...

Nas q u estões do sigilo e da produção de prova ilíc ita a CF foi m inudente, m as, com o se sabe, a vida é m ais rica que q u a lq u e r ca su ística legal. A lém disso, como advertem C ernicchiaro e Costa J r., “os lim ite s da proteção legal deverão dispor de certa elasticidade. O homem, enquanto indivíduo que integra a coletividade, precisa acatar as d e lim ita ç õ e s que lhe são im postas pelas exigências da vid a em comum . E as delim itações de sua esfera privada deverão ser toleradas tanto pelas necessidades impostas pelo Estado, quanto pelas esferas pessoais dos d e m a is concidadãos, que poderão c o n flita r com e la ” (D ire ito penal na C o n stitu ição . SP, RT, 1991, p. 202).

N este in ício de te rc e iro m ilênio da era cristã a in tim id a d e das p e s s o a s v e m s o fre n d o c o n s ta n te s a b a lo s . T ra ta -s e de v a lo r co n stitu c io n a lm e n te assegurado contra ação expansiva do poder do Estado. O d ire ito à in vio la b ilid a d e dessa franquia possui, todavia , caráter m eram ente relativo, como acontece com a maioria dos direitos e g a ra n tia s in d iv id u a is . Em fa v o r de uma suposta preponderância va lo ra tiva e ju ríd ico -so cia l do interesse público, a pessoa humana vai tendo devassada sua vida com freqüência cada vez mais preocupante. O prin cíp io da verdade real dom inante no Processo penal, leva à busca, pelo próprio ju iz, de elem entos inform ativos m uitas vezes sem n e ce ssid a d e , s a c rific a n d o o d ire ito à p riv a c id a d e sem q u a lq u e r proporcionalidade ou razoabilidade.

As co m issõ e s parla m e n ta re s de in q u érito , por exem plo, cujos m em bros desejam a todo custo estar d iariam ente na m ídia im pressa e e le trô n ic a , v io la m a priva cid a d e de pessoas notórias e fam osas, quase sem pre com o único o b je tivo de p ro vo ca r e n contros com jo rn a lis ta s e v e íc u lo s de com unicação. Os te xto s legais abrem a p o s sib ilid a d e das devassas, mas visando ao bem público e à defesa social. P raticam ente na mesma proporção editam -se leis perm issivas de v io la ç ã o de fra n q u ia s in d iv id u a is , a e x ig ir da D outrina e dos T rib u n a is um ju sto ponto de e quilíbrio.

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A teoria da proporcionalidade, segundo a profa. Suzana de Toledo Barros, tem assento ju sta m e n te no “contexto n orm ativo no qual estão introduzidos os dire ito s fund a m e n ta is e os m ecanism os de respectiva proteção. Sua aparição se dá a títu lo de g a ra n tia e special, tra d u zid a na e xig ê ncia de que toda in te rve n çã o estatal nessa esfera se dê por n e c e s s id a d e , de fo rm a adequada e na ju s ta m e d id a ” (O p rin c íp io da p ro p o rc io n a lid a d e e o c o n tro le da c o n s titu c io n a lid a d e das le is re s tritiv a s de d ire ito s fu n d a m e n ta is. B rasília, B rasília Ju ríd ica , 2000, p. 93).

O Estado de D ireito não nasceu por acaso. Foi preciso fix a r os poderes e sta ta is e os d ire ito s e g a ra n tia s in d iv id u a is , subm e te n d o todos, Estado e sú d ito s, ao im p é rio da lei. Não há razão para a lei deixar de ser aplicada conform e seja a pessoa que a violou. A igualdade de to d o s em fa ce da ordem ju ríd ic a não pode te r natureza apenas form al. Faz parte de uma sociedade dem ocrática e civilizada a certeza de que as leis não são fe ita s em vão.

E retornam os, para finalizar, à questão da verdade real. A partir da d e n ú n cia ou da q u e ix a , há-de se o b s e rv a r o processo a cu sa tó rio como princípio. Em favor, porém , da verdade real levanta-se a voz de C anuto M endes de A lm eida: “O princípio do co n tra d itó rio não im pede a in ic ia tiv a do ju iz . Não s ig n ific a que, posto o im putado no m esm o n íve l do MP, o ju iz deva p e rm a n ece r p a ssiva m e n te a ssistin d o ao debate. O processo-crim e visa à revelação da verdade real”(P rincípios fu n d a m e n ta is do processo penal. SP, RT, 1973, pp. 106-107).

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