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Educação especial e deficiencia mental : da extração do saber ao exercicio do poder

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(1)

CENTRO DE

CIENCIAS

DA

EDUCAÇÃO

_

PROG1w\z1A

DE PÓS-GRADUAÇÃO

EM

EDUCAÇÃO

CURSO DE

MESTRADO

EM

EDUCAÇÃO

.

~

EDUCACAO

ESPECIAL

E

DEFICIÊNCIA

MENTALá

DA

EXTRAÇÃO DO

SABER

AO

EXERCÍCIO

DO

PODER

Dissertação submetida ao Colegiado*

do Curso

de

Mestrado

em

Educação

do

Centro de

Ciências

da Educação

em

cumprimento

parcial

'para a obtenção

do

título de Mestre

em

Educação. `

MARIA

ELISABETE

ARCHER

TOMASINI

z

FLORIANÓPOLIS

(2)

UNIUERÉIDÊUE FEDERQL

DE

SANTÊ CÊTÊRINA

ÚENTRO

DE

CIÊNCIQS

EHUCÉCÃU

PROGRÊMÉ

DE

PóS~GRàUUêCãU

EH

EHUCACÃO

EURÊO

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DU

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ao

.Colegiado

do

Curfio

de

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Em

Educacão

du

Centru

de

Ciênciaâ

da

Educacão

em

cumprimento parcial

para

a

obtenção

do

título

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Em

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H.bb+~Márfiü'fiurš1iQ

de

Aguiar Teixeira

ífiuplfinteš

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.

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- .

Màfllà ELIsâBETE êRcHER Tufiàslul

Florianóbolifi, Santa Catarina

(3)

A

Betty e Selvino, parceiros desta "viagem",

que

comigo

traçaram as rotas, impedindo

que

o

"barco'f

ficasse à deriva.

Aos meus

filhos

André

e Daniel, companheiros pela vida afora.

(4)

` 5 ff.

Í

I 0 «Qu .Il~.- ^-z;:›_«=_ -_ . .~".` .-z _ .W .¬ ru. f¿ 1- «I .\¬.`. \r 1 v ._‹-‹.__'* _.. , §,: z..--:.\.z f-¿'~ P; ; › z¡¿›;. _l›_¡:m~- .I :-';“_i; «_ ~‹ ._z,_ ¬..‹.. ; aff' š 11': _ ' ..~ z. , .z:'-r;'_'.".-._ . Y. ".-1* Í El L.: f' 1-- ‹. < z› H `- -- ¬-...Q _; › _ né - › L., -«. ._, _; . _-.'.... .› 4 ,. . » Y. _. › .V _ ___..`., ., ‹_«.Uz ` 'ff 1 ‹'~;:>z› ' w I' 9! ' .'<=¬'_ ".- \ . ..;~. \ W.-.. ~ '

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'~-«_`»

-, wzáxú.

(5)

verdade a ser dita e a ser vista,

uma

verdade talvez adormecida,

mas

que

no

entanto está

somente

à espera de nosso olhar para aparecer, à espera

de

nossa

mão

para ser desvelada.

A

nós cabe achar a

boa

perspectiva,

o

ângulo correto, os instrumentos necessários, pois de qualquer maneira ela

está presente aqui e

em

todo lugar'.

Mas

achamos também,

e de

forma

tão

profundamente

arraigada

na

nossa civilização, esta idéia

que

repugna â

ciência e â filosofia:

que

'a verdade,

como

o

relâmpago,

não

nos espera

onde temos

a paciência de emboscá-la e a habilidade de suipreendê-la,

mas

que

tem

instantes propícios, lugares privilegiados,

não

só para sair

da

sombra

como

para realmente se produzir.

Se

existe

uma

geografia

da

verdade, esta é a dos espaços

onde

reside, e

não

simplesmente a

dos

lugares

onde

nos colocamos para

melhor

observa-la.

Sua

cronologia é a das

conjunções

que

lhe

permitem

se produzir

como

um

acontecimento, e

não

a

dos

momentos

que

devem

ser aproveitados para percebê-la,

como

por

entre duas nuvens.

Poderíamos

encontrar

na

nossa história toda

uma

"tecnologia" desta verdade: levantamento

de

suas localizações, calendário

de suas ocasiões, saber dos rituais

no

meio

dos quais se

produz"

(6)

ABSTRACT

This research deals With the relationships Within institutions of Special Education; it

focuses specifically the cross-relationship

between

professionals and mentally handicapped

individuals. It underscores those aspects

Which

are related to

knowledge

production

and

power

relationships as something created

and

transmitted

by

the very participators

of

institutional dynamics.

_ It then studies both discipline

and

disciplining character

by which

Special Education

canies

on

its practices,

which by

means

of

strategies, techniques and specialized

methods

strires for the transformation

of

the mentally handicapped, i.e., their integrations into- the

mainstream

of

society..

The

study points out the

commonly

recurring practices

among

institutions

of

Special

Education; although

one

of these institutions

was

given as an example,

none

of

them

was

intended as a point

of

reference.

The

day-to-day institutional aspects referred to in the research are analyzed using

M.

Foucault's

Works

as a

main

framework, in his approaches to

the individuals as object

of

knowledge and

subject

of

the

power

networks. This very power, exercised in

goveming

others, imposes

on

them

a set

of

special

mechanisms

that shape their behavior

and

bring about a modified individuality - one has to bear in

mind

that in Foucault's

view

"govemment"

does not refer only to political structures or State

management,

it refers as welll to dealing

(7)

O

presente trabalho realiza

um

estudo das relações

no

interior das instituições

de

Educação

Especial, tendo

como

eixo de .visibilidade a intersecção entre os proñssionais

especializados e os indivíduos portadores de deficiëncia mental.

ênfase àqueles aspectos

que dizem

respeito à

produção do

saber e às relações

de poder

como

algo construído e

veiculado pelos próprios participantes da dinâmica institucional.

Analisa

o

caráter disciplinar e disciplinador

com

que.a

Educação

Especial desenvolve

suas práticas, as quais, através de estratégias, tecnologias e

métodos

especializados,

buscam

a

transformação dos deficientes mentais de

modo

a torna-los

membros

aptos ao convívio e à

sua aceitação

na

sociedade.

O

estudo procura destacar aquelas práticas que, de

uma

forma ou de

outra, se

generalizaram entre as instituições

de Educação

Especial e, ainda que

uma

dessas instituições tenha sido

tomada

como

ponto de referência,

não

visa referir-se a

nenhuma

delas

em

particular. '

Os

aspectos

do

cotidiano institucional, aqui apontados, são analisados tendo

como

referencial teórico principal as obras de

Michel

Foucault, nas suas abordagens sobre

o

indivíduo enquanto objeto de saber e alvo de redes de poder;

poder

este que

no

governo

dos

outros - para Foucault governo

não

se refere

unicamente às estruturas políticas

ou

à gestão

do

Estado,

mas

designa

também

o

modo

de a conduta

de

indivíduos

ou

de grupos - os

submete

a

um

conjunto de

mecanismos

singulares

que

dirigem suas condutas,

produzindo

(8)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

... .. 1

1 -

CONSIDERAÇÕES

TEÓRICAS

OU

DE

COMO

BALIZAR

O

vôo

... ._ 13

2 -

NORIVIALIDADE E

DEFICIÊNCIA:

O

PROCESSO DE

EXCLUSÃO

... ._

24

2.1 -

Normas

sociais: o poder

da

norma

... ..

24

2.2 - Deficiência: diferença e

discriminação social ... ..

30

2.3 - Estigma e identidade' social

do

deficiente

mental ... _.

35

3 --

A

OFICIALIZAÇÃO

DA

DEFICIÊNCIA

MENTAL

OU

DE

COMO

PINTAR

PÁSSAROS

... ... ._-_ ...

._

43

3.1 7

O

ritual dos exames: da avaliação ao diagnóstico

... ..

46

3.2 - Plano terapêutico e

prognósticos: dos

caminhos da

ortopedia à profetização

de resultados ...

..

60

4 -

A

EDUCAÇÃO

DOS

INDIVÍDUOS DEFICIENTES

1\/IENTAIS

OU

A

ARTE

DE

PREVENIR

OU

CORRIGIR

SUAS

ANORMALIDADES

... ._

67

'4.l -

Educação

Especial:

interpretando algumas de suas práticas cotidianas ... ..

70

ALGUMAS

CONSIDERAÇÕES

A

PROPÓSITO

DE

CONTINUAR

O

vôo

sv

REFERÊNCIAS

BIBLIOGRÁFICAS

... ..

100

(9)

Este trabalho

pode

ser considerado um_ ensaio, elaborado sob muitas inquietações e insatisfações

que

me

conduziram na

busca de

uma

reflexão sobre a

Educação

Especiall,

que

não

aquela

que

nos faz prisioneiros

da

técnica.

Não

tenho a pretensão

de

achar

que

estou trazendo algo

nunca

visto,

mas

gostaria

que

a provisoiiedade

do pensamento

e as inquietações

que

me

conduzem

na

busca -

não

de coisas prontas, receitas, modelos,

mas

de

entendimento, de maior clareza e visibilidade das minúcias

do

cotidiano -

ficassem

aqui

evidenciadas e

marcassem

um

espaço

de

reflexão. ' '

Não

tenho a pretensão

de

envolver

em

minhas

análises todos os aspectos

que

são

característicos

do

fenômeno

da Educação

Especial e

oferecerum

estudo total e

acabado

desta

realidade,

na

multiplicidade de seus aspectos e propriedades.

Por

isto

fiz

um

recorte desta

realidade,

não perdendo

de vista

que o

objeto estudado faz parte de

um

determinado todo,

que

o

circunda, e

que

esse todo, ainda

que não

percebido explicitamente, é a luz

que

1A

e ressão

XP

_

"Educação

_ _ Especial" refere-se a todo aquele conjunto de servi 903 , Pf°8T amas,

procedimentos, instituições

que

se destinam

ao

atendimento de indivíduos portadores

de

deficiência mental, física, auditiva e visual e múltiplas deficiências.

1 _

(10)

2

ilumina e revela

o

objeto singular.

O

recorte se limitará a urna reflexão sobre o cotidiano

da

Educação

Especial, nas suas práticas

com

aqueles individuos considerados portadores de

deficiência mentalz.

Não

um

refletir por refletir,

mas

-

quem

sabe? -

um

começo

de

mudanças.

E

por falar

em

mudanças, neste sentido, Guattari (1987) nos propõe a "revolução molecular", pois para ele as revoluções

devem

ser pensadas e

dizem

respeito ao cotidiano dos

indivíduos, grupos, classes, etnias e gêneros. Importa, pois, "renovar interrogações,

abrindo

perspectivas insuspeitadas e atraindo

o

olhar sobre aquilo

que

nem

se via

porque

estava

diante

do

nariz" (Wolff, 1984, p.123). ' `

_ _

A

experiência individual passada

me

proporcionou

um

conhecimento a respeito

do

objeto estudado, quando, por

um

período de 13 anos vivi a prática

da Educação

Especial,

numa

instituição especializada.

Assim

acumulei

uma

série

de

dados,

de

impressões, de

experiências, de fragmentos,

que

conítituem matéria prima desse estudo.

Considerando a importância desses conhecimentos, torna-se relevante para este

estudo,

num

primeiro

momento,

um

breve relato de

minha

experiência passada,

de minha

trajetória profissional

na Educação

Especial.

No

período

compreendido

entre

1972

e 1985, exerci

minhas

atividades profissionais

na Fundação

Catarinense de

Educação

Especial, órgão público destinado ao atendimento

terapêutico-educacional de indivíduos portadores de qualquer tipo de deficiência: mental, auditiva, física, visual, deficiências múltiplas e dificuldades gerais e específicas

de

aprendizagem,

em

qualquer idade, de

ambos

os sexos. Essa ` instituição está localizada

no

z.

município

de

São

José -

SC,

e se constitui

em

campo

de

pesquisa e de elaboração

de

novas

metodologias para a educação de indivíduos deficientes;

tem

como

função

também

prestar

2Será adotado neste estudo o conceito de Deficiência

Mental

da Associação

Americana

de

_ Deficiência Mental

(AADM):

"o

retardamento mental refere-se

ao

funcionamento

intelectual geral abaixo

da

média,

que

se origina durante

o

periodo de desenvolvimento e

está associado a prejuízo

no

comportamento

adaptativo" (apud

Assumpção

Júnior, 1991, p.

(11)

orientação psicopedagógica às instituições

de

educação especial

do

interior

do

Estado

de

Santa Catarina.

Abrange

um

conjunto

de

serviços, cujo pressuposto básico é que, através

de

procedimentos especiais, se possa melhorar a vida da população considerada deficiente,

dando-lhe

uma

condição de vida

o

mais

próxima

possível

da

normalidade

(normalização)3, integrando-a à

comunidade

em

que

vive (integração)4.

A

instituição desenvolve trabalhos

de

ação terapêutico-educacional,

munida

de

todo

um

aparato

médico

e psicopedagógico, tido

como

necessário para apropriar-se

da

deficiência

como

objeto

de

estudo,

de conhecimento

e

de

intervenção.

Para cumprir os propósitos estabelecidos, é elaborada toda

uma

tecnologia, desde a

distribuição dos espaços, tempos, movimentos, lugares, até a aplicação

de

técnicas,

que

se

supõe sejam mais eficazes

no

processo

de

normalização e integração

do

indivíduo

considerado deficiente.

Há uma

grande atenção dedicada à ortopedia

do

corpo, sob

o

olhar

controlador, classificador e normalizador

de

toda

uma

equipe de profissionais especializados,

empenhados no

desenvolvimento

máximo

das capacidades desses individuos, das

que

permaneceram

intactas e das

que

sofieram

prejuízos. Foi nesse contexto

que

tive a

oportunidade de ter

minha

experiência profissional.

Não

obstante ter obtido

um

conhecimento geral sobre

o

funcionamento institucional e a população que atendia,

minha

atuação

como

pedagoga

se

deu mais

especificamente

com

aquele grupo de individuos

considerados deficientes mentais, cujo

gau

de

deficiência variava entre severa/moderada e'

3Segundo

Portaria

69/86 -

MEC/CENESP,

normalizar significa "proporcionar

às pessoas

portadoras de deficiência(s)

com

problemas

de

conduta

ou

super dotadas, condições de vida

similares às outras pessoas, dando-lhes possibilidades de

uma

vida tão

normal

quanto

possível" (apud Ferreira, 1989, p.30).

4"Integrar caracteriza

o

processo dinâmico e orgânico, envolvendo

esforços

dos

diferentes

segmentos sociais, para

o

estabelecimento

de

condições

que

possibilitam às pessoas

portadoras

de

deficiências,

com

problemas

de

conduta

ou

super dotadas, tomar-se parte

(12)

4

leve5 e cuja idade cronológica

média

era

compreendida

entre 13 e 15 anos. Este

grupo

pertencia

ao

Centro

de

Preparação para

o

Trabalho,

um

dos setores

da

instituição, cujos

programas

de

ensino tinham

como

objetivo integra-los à

comunidade

através

do

trabalho.

Minha

primeira atividade neste setor foi

como

professora de sala

de

aula,

onde

pennaneci por

um

período de anos, e

pude manter

estreito relacionamento

com

indivíduos

considerados deficientes mentais.

Ao

concluir

o

curso superior

de

Pedagogia, passei a exercer

as funções

de

Orientadora Pedagógica e

minha

incumbência

em

a de prestar

orientação aos professores na elaboração dos programas

de

ensino,

adoção de

técnicas e metodologias especiais.

A

partir desta época, passei a ser

membro

integrante de equipes responsáveis pela elaboração de diagnósticos, ao lado de psicólogos, médicos, terapeutas ocupacionais,

assistentes sociais, entre outros,

quando pude

vivenciar

o

padrão

de

organização e interação

desses profissionais e sua relação

com

o

deficiente mental.

Por

ocupar,

também, por algum

tempo,

o

cargo de direção

do

Centro

de

Preparação para

o

Trabalho, tive a oportunidade

de

conviver

com

aqueles aspectos

que dizem

respeito à administração e às ligações

com

o

aparelho estatal, visto ser a

Fundação

Catarinense de

Educação

Especial

um

órgão ligado

ao

Estado.

Nos

últimos anos de permanência

na

referida instituição, coordenei

um

programa

destinado aos deficientes mentais

de

todas as idades, cujo objetivo era prestar

orientação e

assessoria a todas as instituições

de Educação

Especial

do

Estado de Santa Catarina. Foi

assim que- passei a

tomar

conhecimento

da

dinâmica e

do

funcionamento de outras

instituições que,

no

meu

entender, .apresentavam bastante similaridade entre

si

no

desenvolvimento e nos procedimentos

que

diziam respeito aos programas

de

ensino,

de

integração e reintegração dos indivíduos considerados deficientes.

De

igual maneira,

pude

observar a dinâmica

de

outras instituições, situadas fora

do

Estado

de

Santa Catarina,

como

5Segundo

a Organização

Mundial da Saúde

(OMS),

os indivíduos considerados

como

portadores

de

deficiência mental estariam distribuidos e classificados de acordo

com

o

seu

(13)

também, embora

de maneira rápida, fora

do

país, por ocasião

de

urna

viagem de

estudos à

República :Federal

da Alemanha.

A

viagem

tinha

como

objetivo conhecer o tipo

de

atendimento educacional-terapêutico prestado naquele país, aos fmdivíduos deficientes

mentais,

na

área

da

profissionalização.

A

convivência

com

as múltiplas faces

do

interior institucional,

ocontato

estreito e

direto

com

seu _cotidiano, tanto

com

a parcela

da

população identificada

como

portadora

de

deficiência,

como

com

o grupo

de profissionais e dirigentes administrativos,

ampliou

sensivelmente

meus

conhecimentos.

Mas

minha

insatisfação era crescente,

em

relação a

um

fazer manifestamente tecnicista, desprovido de

uma

reflexão sobre os inúmeros e

complexos

aspectos nele irnplicados.

Como

participante efetiva

do

cotidiano

institucional,

causava-me

apreensão a

forma

autoritária

como

a educação especial e a própria organização

institucional

eram

conduzidas,

onde

os profissionais especializadosó ditavam as regras e os indivíduos

deficientes obedeciam. Vale lembrar

que

esta

não

era urna constatação

que

se referia a

uma

instituição somente,

mas

à maioria delas, pois as instituições

mantinham

este tipo de relação

com

seus deficientes.

Uma

explicação possivel é a

de

que, sendo

o

saber dos técnicos algo

a

princípio inquestionável e correto, cabe aos portadores de deficiência

cumprirem

com

os

programas educativos, para

que

possam

ser integrados aos nomrais.

Essa relação

em

que

os

que

se

propõem

a terapeutimr e educar

mandam

e os

que

são

terapeutizados e educados

obedecem,

culminava

numa

relação de absoluta desigualdade,

no

exercício de

uma

dorninação por aqueles

que

estão

do

lado

da

normalidade, sobre aqueles que, por

serem

deficientes, estão irremediavelmente sob seu controle,

ficando

sob a tutela a

que

os

submete o

modo

predominante

da

racionalidade ocidental: a

institucionalização, a

captura terapêutica, e

o

silêncio.

ÔA

expressão profissionais especializados refere-se aqui àquele grupo de especialistas-

composto

por psicólogos, pedagogos, médicos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais,

fisioterapeutas, professores e outras especialidades -

que

em

geral

forma o

corpo

técnico

de

(14)

6

Possivelmente

no

decorrer deste estudo alguns fatos

da

"mitificada"

Educação

Especial

possam

ser questionados e

não

seria falta de modéstia dizer ser este

um

ato de

coragem, pois as ideologias revestidas de

um

vocabulário terapêutico

ou

de "salvação" são

muito resistentes à crítica.

“Numa

sociedade científica,

quem

é

que pode

opor-se à saúde

mental?

um

louco" (Szasz, 1976, p.l65).

Sob

a luz de

uma

determinada ótica teórica, pretendo privilegiar a descrição e a

interpretação das práticas

do

cotidiano institucional,

dando

ênfase às relações

que

se

estabelecem entre os profissionais

da

educação especial e os indivíduos considerados

deficientes mentais.

Não

se trata aqui de fazer

um

estudo

do

que

cada instituição

tem de

singular,

mas

de localizar

uma

série deí exemplos, algumas das técnicas essenciais

que

se generalizam facilmente.Descrever essas _técnicas,›

sempre

minuciosas, vai implicar

na demora

sobre

o

detalhe e

na

atenção às

pequenas

coisas. Implica

em

realizar

uma

espécie de "anatomia

politica

do

detalhe" (Foucault, 1989, p.l28) sobre a qual as

instituições especializadas

fundam

suas atividades. '

Para

que

se possa entender

o que

acontece

no

interior institucional é

fundamental

que

o

olhar seja dirigido para

o que

acontece fora dele, pois é a partir

do

paradigma social

estabelecido

ou do

modo

como

se

comporta

a sociedade

em

relação aos deficientes,

que

a

instituição irá determinar seu

modo

de

ação. -

Portanto,

num

primeiro

momento,

me

proponho

a urna reflexão sobre a

ordem

social

que

define, através

da

construção de

uma

determinada normalidade, aqueles

que

dela se

desviam,

ao

mesmo

tempo

em

que, estabelecendo

o que

é anormal,

validade ao conceito

de

Norma

que

institui.

_* _

Importa~desviar a atenção para aqueles pontos

que dizem

respeito ao indivíduo deficiente mental

na

sua relação

com

a sociedade

como

um

todo; dar visibilidade à

(15)

deficiência mental, cuja existência

não

é independente da sociedade

ou

da cultura à qual

pertence. ›

.

A

criação

de

aparatos institucionais

como

recursos para a correção das anormalidades

dos indivíduos, os

gandes

e

pequenos

investimentos educacionais

no

combate

às deficiências

fisicas, mentais e emocionais

parecem

deixar

no campo

da

invisibilidade o fato

de que

a

ordem

social existe unicamente

como

produto

da

atividade

humana.

O

paradoxo consiste

no

fato

do

homem

ser capaz de produzir

um

mundo

que ao

mesmo

tempo

é apresentado

como

algo diferente

de

um

produto

humano

e estranho a si

mesmo

como

se fosse

uma

ordem

supra-social.

Os

indivíduos considerados "anormais" são produto

da

mesma

sociedade

que

os rejeita e que, utilizando-se

do

discurso ideológico terapêutico, leva-os para dentro dos

muros

institucionais.

_, Este estudo

tem

também

a preocupação de refletir sobre

o

Estigma, aquilo

que

marca

os indivíduos deficientes, quase permanentemente.

Em

uma

sociedade

o

individuo considerado deficiente

não tem

virtualmente defesa contra a identidade estigmatizada

que

lhe é atribuída.

É

o

direito absoluto

da

normalidade

sobre a anormalidade, direito transcrito

da

competência sobre a ignorância, da

ordem

se

irnpondo sobre a desordem,

o

desvio.

A

idéia

de

desvio, de

um

modo

ou de

outro, implica a

existência

de

um

comportamento,

que

expressa

uma

conformidade

com

as exigências de

funcionamento

do

sistema social. Divergindo de seu

meio

cultural, invariavelmente,

o

indivíduo, classificado

como

portador

de

deficiência, será visto

como

anormal

em

sua totalidade.

É

o problema

gerado pelo

äiggt.

"Um

indivíduo estigmatizado é

um

individuo

anormal

em

toda a extensão de sua individualidade" (Velho, 1989, p.28).

Interessa-me refletir sobre a

formação da

identidade social

do

portador

de

Deficiência

Mental.

Se

um

conjunto de

comportamentos

vividos

por

todos de maneira semelhante garante sentimentos de segurança e participação,

como

será construída a identidade daquele

(16)

\

I

8

que diverge?

Seu programa

de vida,

do

ponto

de

vista dos normais,

não

é considerado

correto e por isso ele parece

não

adquirir a segurança

de

estar vivendo corretamente.

1

Desde

os primeiros anos .de vida, o indivíduo considerado deficiente vai construindo sua identidade

num

meio

que, de certa forma, lhe é

adverso e

que

reforça a todo

momento

sua diferença e incompetência

em

relação aos ditos normais.

Se

a criança apreende aquilo

que é denominada,

como

será, para

o

deficiente, a apreensão

do

mundo

e de si

mesmo?

Para Berger e

Luckmann,

"a identidade é objetivamente definida

como

localização

em

um

certo

mundo

e só

pode

ser subjetivamente apropriada, juntamente

com

este

mundo.

Dito de outra maneira, todas as identificações realizam-se

em

z

horizontes que implicam

um

mundo

social específico" (1991, p.177).

Considerado incapaz

de

fazer e falar por si

mesmo,

a instituição passa a ser

o

elo

mediador entre ele e a sociedade.

De

uma

fomia

ou

de outra, os indivíduos

em

geral se

inserem

na

sociedade através das instituições. Já se nasce

numa,

a familia, e durante toda a

vida circulamos entre elas.

Com

o

indivíduo considerado deficiente acontece a

mesma

coisa,

só que

na forma

de

maior

e mais .acentuada dependência,

em

condições

menos

acolhedoras.

Segundo Agnes

Heller (1991), as relações

que aparecem na

vida cotidiana

podem

ser

distinguidas

em

dois grupos: as relações baseadas

na

igualdade

e relações baseadas

na

desigualdade.

Ainda segundo

ela, as relações

de

desigualdade

podem

ser relações

de

dependência

(uma

pessoa é dependente

da

outra)

ou

de inferioridade e

superioridade (lugar

que

ocupa na

divisão

do

trabalho).

Suponho

que

os indivíduos, de

uma

maneira geral,

no

decorrer

de

suas vidas,

podem

mudar

seus lugares

na

escala social, altemando posições. Isto

não

parece acontecer

com

os indivíduos considerados deficientes. )

É bem

provável

que

sua posição

sempre

será

de

dependência e

de

inferioridade e,

portanto, de dificuldade, e a partir e por causa disso a instituição se coloca

como

seu porta-

voz

e elo mediador.

Se alguém

pode

se articular

com

a sociedade a partir de

um

certo

(17)

será sua identidade social, se a_,

uma

determinada identidade corresponde

um

lugar

determinado

no

mundo?

_

Num

segundo

momento

desse estudo, pretendo direcionar o eixo

de abordagem

para

os aparelhos diagnósticos e o_ sistema

de exames

que, nas instituições

que

tratam

do

deficiente,

aparecem

como

base sustentadora

de

seus

programas

terapêuticos/educativos.

Os

especialistas trabalham sob a perspectiva de

um

diagnóstico diferencial,

que

funciona

como

uma

espécie

de

marco

norteador

do

processo

de

integração

ou

reintegração dos portadores

de deficiência mental. Eles têm,

comg

fonte

de

seu saber o próprio indivíduo

que têm

como

tarefa educar.

Por

isso levanto a seguinte questão: urna

vez

de posse deste saber, os

profissionais

exercem

um

detemiinado tipo de

poder na

instituição de

Educação

Especial?

Como

o

saber sobre o deficiente é extraído, elaborado e transformado

em

discurso?

Para

Foucault, tanto

o

hospital

como

a escola tornam-se aparelhos de

exame

inintermptos,

que

acompanham

em

todo

o

seu

cumprimento

a operação de "cura" e de ensino.

O

exame,

cercado de suas técnicas, fazendo

do

indivíduo

um

"caso",

também

se constitui

em

alvo

de

minha

abordagem.

Num

terceiro

momento

me

ocuparei

da Educação

Especial

no que

diz respeito

ao

desenvolvimento e à

condução

de algumas

de

suas práticas terapêutico-educacionais.

Interessa-me descrever e analisar as estratégias, as tecnologias, vistas

como

investimentos

no

deficiente mental e

que

buscam

dar-lhe

uma

outra fisionomia, de

modo

a torná-lo

membro

apto ao convívio

com

a sociedade

ou

seu

grupo

social.

.

O

espaço institucional

é organizado, destacando-se a imposição

da

ordem, 'a

eliminação de condutas inadequadas,

o

adestramento

do

corpo e a nonnalização das mentes. Nestes termos,

podemos

afirmar

que

a

Educação

Especial, através de suas instituições, possui

(18)

10

Para

que

os

mecanismos

de correção das diferenças sejam colocados

em

ação,

necessidade de

que

as pluralidades analisadas sejam distribuídas.

Dessa

forma,

como

os deficientes mentais são distribuidos

no

espaço institucional?

Uma

vez que

cada

um

em

particular e todos ao

mesmo

tempo

ocupam

um

lugar

especifico, interessa saber

que

tipo

de

relações se estabelecem entre deficientes e profissionais e

como

são

demarcados

seus territórios. `

A

Educação

Especial, através de suas instituições,

tem

como

objetivo a normalização

e a integração dos indivíduos portadores de deficiências.

O

fato

de

inserir esses indivíduos

nas instituições,

com

o

intuito de normalizar e integrar,

não

estaria de

uma

certa

fomia

segregando-os e estigmatizando-os ainda mais?

Proponho-me

neste trabalho a vislumbrar

aspectos outros

que não

somente aqueles

que colocam

a

Educação

Especial

como

uma

prática neutra, intocável, de valor indiscutível e por isso mitificado. Talvez se perturbe a

acomodada

percepção de que nós, educadores especializados, estamos efetivamente

caminhando no

sentido de estar fazendo

o "bem"

e

somente o "bem"

aos deficientes.

Embora

as questões burocráticas

da

instituição,

na

pessoa de seus administradores, e

as políticas

govemamentais que

as sustentam

não

constituam temas de

minhas

reflexões, seus efeitos

não

são ignorados,

uma

vez

que

permeiam

todo

o

espaço institucional,

do

topo da

pirâmide hierárquica até a base, nos seus detalhes mínimos.

Sabemos

que

os efeitos dessas

políticas se

ramificam,

atingindo todo

o

funcionamento

da

instituição,

onde

profissionais

tentam defender sua pseudo-autonomia

de

ação contra a

ordem

burocrática

que

se impõe,

mas

isto acredito ser

tema de

outros estudos.

Não

farão parte

de minhas

preocupações a discussão de metodologias específicas

referidas a programas- especificos,

nem

de instrumentos especiais de ensino,

ou

a

descrição e

análise

de

testes;

nem mesmo

a interpretação

de alguma

instituição de

Educação

Especial

em

particular, apesar

de

utilizar-me de

uma

delas

como

ponto de partida.

Embora

considerando suas singularidades e especificidades, a deficiência mental será tratada de

fomia

(19)

sem

referência especial a qualquer

um

dos graus

que

a

compõem

ou

a programas de ensino

adequados a cada

um

em

particular. .

Tendo

consciência dos efeitos

benéficos

da

Educação

Especial,

o

trabalho aqui

realizado

não tem

a intenção de cair

na

armadilha

do

certo e

do

errado, de

considerar

que o

que se faz é

bom

ou mau, no

sentido moral

da

palavra, e

nem mesmo

tem o

interesse de

achar "cu1pados".

-'

O

que

pretendo é, à luz de

um

determinado referencial teórico e a partir de

uma

visão

microscópica, dar visibilidade ao aspecto relacional entre aquela população rotulada,

por

meios ditos cientificos

ou

não, e a sociedade, incluindo-se

o

sistema institucional e suas

especificidades.

O

fato

de

ter feito parte da

Educação

Especial

como

um

de seus profissionais

especializados, e por isso integrante

do

processo,

me

coloca

no

interior de

um

universo,

o

qual agora

me

proponho

a analisar. Certamente,

quando

me

referir a

um

determinado

modo

de ação dos profissionais, é ao

meu

próprio fazer

que

estou

me

referindo. Isto

me

coloca

em

confronto permanente,

num

jogo de inclusão - enquanto ator

do

processo - e de exclusão -

enquanto investigadora deste

mesmo

processo,

configurando

um

quadro situacional de

uma

espécie de "fora de" e "dentro de",

que

acaba por

me

exigir

um

esforço permanente,

no

sentido

de

manter suficiente distância

do

objeto de análise e assim poder visualiza-lo

com

uma

relativa isenção

ou

neutralidade. Pretender refletir sobre as relações de

poder que

se

estabelecem

no

interior institucional

não

foi tarefa fácil e acredito que durante todo

o

tempo,

em

que estive colhendo os dados fui alvo de

uma

espécie de rejeição velada.

Minha

inserção

na

instituição enquanto pesquisadora, se

deu

muito rrraisveinfimção dos laços de amizade

que mantenho

com

alguns profissionais

que

atuam

e

com

os quais

convivi, profissionalmente, por

um

longo tempo,

do que

por

uma

preocupação

ou

um

desejo

institucional de ver analisado o seu próprio cotidiano,

ou

de ser colocada

em

cena.

Embora

em

determinado

momento

da elaboração deste ensaio teórico faça uso de

dados empíricos colhidos

na Fundação

Catarinense de'Educação Especial, não se

(20)

12

"estudo

de

caso" desta instituição.

Minha

experiência

na

FCCE

servirá

de

fio

condutor para

análises de caráter mais geral,

bem

como

de

apoio empírico para a elucidação

do

objeto.

Os

documentos da

APAE

de

São

Paulo

que

serviram

como

dados ilustrativos,

foram

obtidos

na

FCEE.

Esta instituição,

ao

elaborar e estruturar alguns de seus programas de atendimento, principalmente os profissionalizantes, teve e

tem

como

referência, os programas adotados pela

APAE

de São

Paulo, por isso

em

dados

momentos,

faz uso das

mesmas

fichas.

Ao

mesmo

tempo

que

'para organizar seu plano de

ação, a

FCEE

busca subsídios nas instituições

do

país e fora dele, ela é

também

referência principal para as instituições

do

Estado

de

S._C.

Como

resultado,

não

é

incomum,

observar nestas instituições,

o

uso das

mesmas

estratégias,

procedimentos, metodologia e

fichas

de controle e avaliação, adotadas pela

Fundação

Catarinense

de Educação

Especial. Para a elaboração deste trabalho

foram

utilizados

também

instrumentos

de

coleta de informações,

como

entrevistas diretivas

com

individuos deficientes

mentais, conversas

com

os profissionais, observações

do

cotidiano, procurando perceber a

trajetória dos indivíduos, suas aspirações, suas representações, suas condutas

no

cotidiano

institucional.

Os

programas de ensino, regimentos, regulamentos, fichas de

controle, avaliação, prontuários e tantos outros documentos,

que fazem

parte

da

estrutura

organizacional

da

instituição, serviram

como

ferramentas

que

auxiliaram este estudo.

Na

tentativa de os efeitos dos rótulos, a indicação atual é que

ao

referir-se

aos indivíduos

com

atraso

no

desenvolvimento, se

usem

as expressões: indivíduo portador

de

necessidades especiais

ou

indivíduo portador

de

deficiência mental. Entretanto, para

fins

deste estudo, será

também

a expressão "deficiente mental", por considerar que,

na

prática, as expressões

podem

mudar,

mas

as

formas

de relação e as abordagens

acabam

por

serem as

mesmas

seja qual for a expressão adotada7.

7"Ciertos

eufemismos

buscan tender

una

piadosa cortina verbal sobre

realidades duras:

son

los

eufemismos que

nacen de la

mala

conciencia.

Al

hacerlo,

no ha

solucionado el

problema.

Tan

sólo se

ha

limitado

a

convertirlo

en

menos

apremiante para quien lo

padece

(21)

-J

..

Se

a realidade é

sempre

mais rica

do que o

nosso alcance a nível

do

conhecimento, a

teoria

fundamenta o

olhar

do

sujeito sobre

o

objeto estudado e as formulações

teóricas

orientam a percepção,

regem

a apreensão e a interpretação,

fomecem

critérios

que

relevam

ou

tomam

sem

importância determinados aspectos. Para problematizar e analisar

o

objeto,

parto de

um

corpo teórico

que

me

orienta e

significação ao estudado, e que é muito mais

que

um

"quadro de referência teórica" e revela

uma

posicão,

uma

escolha. Neste sentido a

leitura das obras de

Michel

Foucault trouxe a possibilidade de elucidar mais satisfatoriamente

alguns aspectos

do tema

em

questão. Certamente

não

fiz

uso

somente de

suas análises, pois outros *

autores estão

em

evidência neste estudo.

De uma

certa forma, as preocupações

metodológicas de Foucault

ao

"olhar"

o

objeto

tomaram-se

minhas,

embora

eu não

tenha a

pretensão de dar

cabo

desta tarefa tão

bem

como

ele

o

fez.

Autor

de

uma

obra

que não

se ajustou a

um

projeto unitário, Foucault, partindo

sempre

para algo novo, introduziu problemas concretos e freqüentemente inquietantes acerca

da

criminalidade,

do

sexo,

da

loucura e

da

doença,

na

discussão filosófica acadêmica,

obrigando as pessoas a refletirem

de

maneiranova

sobre essas questões. Cético acerca das

(22)

\

14

questionamento constante

da

'verdade' dos nossos pensamentos e

de nós

mesmos"

(Raychman,

1987, p.106). Filósofo

da

dispersão e da singularidade, opõe-se às

formas de

raciocinio unificadas e atemporais,

suspendendo

a narrativa Cético

em

relação

à existência de

uma

história

da

"sociedade

como

um

todo", diz

que

a luta especiflca foi

"neutralizada"

na

esperança

da

transformação global. Vigiar e

Punir

de Foucault

exemplo

de

uma

análise dispersa

de

uma

espécie

de

preocupação

com

a sociedade

como

um

todo, diz

Raychman.

Em

vez

de se deixar enganar pelos conceitos "macroscópicos”, Foucault apresenta

um

"microscópio" que nos fará penetrar até "o infinitamente

pequeno do

poder político e

encontrar os inúmeros micropoderes e incontáveis minúsculos

mecanismos

disciplinares,

no

interior das instituições e aparelhos

do

Estado". `

.

Se Hegel

trata

de

dar os devidos nexos

às pluralidades, que, sob sua ótica, são

entendidas

como

a articulação 'do

TODO

através

do

pensamento, Foucault se

preocupa

com

a revelação

da

particularidade e

da

contingência de nosso conhecimento e de nossas práticas,

menosprezando, de

uma

certa forma, a razão universal.

Preocupado

com

as minúcias

do

interior

do

conjunto social, Foucault dirige suas

análises para as relações de saber-poder inscritas

no

seio social.

Adota

a tese de

que

as

relações, as estratégias e as tecnologias

do poder que nos

constituem, nos atravessam e

nos

fazem,

vêm

acompanhadas,

permitem

e

produzem

formações

de

saber e

de

verdade

que

são

necessárias para solidificar-se as evidências

como

naturais e tornar-se ao

mesmo

tempo

invisíveis.

O

poder, sob a ótica

de

Foucault,

põe

em

jogo

relações entre indivíduos

ou

entre

grupos.

O

termo

"poder" designa relações entre indivíduos, através de

um

conjunto

de

ações

que induzem

e se encontram

formando

uma

sucessão. Trata-se de

um

modo

de

ação

de

alguns sobre alguns outros.

Desde

logo Foucault diz

que

não

existe algo

chamado

"O

Poder",

que

é universal e

que

existiria de

forma

massiva

ou

difilsa, concentrado

ou

dist:n'buldo..O

(23)

â liberdade

ou

transferência de direitos. Isto significa

que não

devemos

buscar

o

caráter

próprio das relações de poder

na

violência,

que

atua sobre

um

corpo

ou

coisas,

que

força,

submete, destrói, fecha possibilidades;

nem

na

passividade,

no

consenso

que

implicitamente

se prorroga. Para Foucault

uma

relação

de poder

se art:icula sobre elementos indispensáveis

para

que

seja considerada

uma

relação

de

poder: "que 'o outro' (aquele sobre

o

qual

se

exerce) seja totalmente reconhecido e

que

se

mantenha

até

0

final

como

um

sujeito de ação e

que

se abra, fiente à relação

de

poder, todo

um

campo

de respostas, reações, efeitos e possíveis invenções" (Foucault, l988b, p.14).

Aqui

se inclui

um

elemento

importante: a

liberdade.

"O

poder se exerce unicamente sobre sujeitos livres e

somente na medida

em

que

são livres" (Foucault, l988b, p.l5) - declara Foucault, tantas vezes acusado de

ser

estruturalista, nos seus últimos textos.

Esta liberdade,

segundo

ele, pressupõe

um

enfrentamento de sujeitos individuais

ou

grupos, inscritos

num

campo

de possibilidades,

onde

podem

ocorrer diversas reações,

comportamentos

e condutas.

No

âmago

da

relação de poder se

encontram

a rebeldia

da

liberdade e a obstinação

da

vontade. Para Foucault, as relações de

poder

não

estão acima

da

sociedade: elas estão inscritas e arraigadas

em

todo

o

tecido social,

não

querendo dizer

com

isto

que

existe

um

principio primeiro e fundamental de Poder,

mas

que

existem formas distintas,

onde

as formas

de "govemo"

de uns sobre os outros,

em

uma

sociedade dada, são múltiplas.

Ainda

para

o

referido autor,

em

toda relação de

poder

existem pontos de

resistência, pois toda relação de

poder

implica, pelo

menos

virtualmente,

uma

estratégia

de

luta,

onde mecanismos

são postos'

em

H prática. Questionado quanto ao exercicio

da

resistência, Foucault diz tratar-se

de

uma

demarcação

de posições e

meios

de ação de cada

um,

de possibilidades de resistir e

de

contra-ataque de uns sobre os outros. '

Sobre quais são os sujeitos

que

se

opõem,

Foucault responde:

"O

que

vou

dizer

não

passa de

uma

hipótese: todo

mundo

contra todo

mundo.

Não

dados

de forma

imediata, sujeitos

que

seriam

o

proletariado e a burguesia.

Quem

luta contra

quem?

Nós

lutamos todos

(24)

16

Usando

o

microscópio

como

uma

lente

de

observação e as particularidades

como

material de análise,

nasua

obra Microfísica

do

Poder

(1982), Foucault

impôs

a

si

mesmo

alguns cuidados metodológicos: .

_

1) Captar

o poder

nas extremidades,

onde

ele se ramifica e

se toma

capilar, ultrapassando as regras

do

direito

que

o

organiza e delimita. .

2)

Não

se preocupar

com

quem

tem o

poder,

como

e

porquê

quer dominar,

mas

estudar

como

se

desenvolvem

os processos

de

sujeição

que

sujeitam os corpos, dirigem os

gestos,

regem

os comportamentos.

3)

Não

tomar o

poder

como

exercício de

dominação

de indivíduos sobre indivíduos,

de grupos sobre grupos, pois o poder circula, funciona

em

cadeia e se exerce

em

rede.

Os

indivíduos estão

sempre

em

posição de exercer

o

poder e

sofier

sua ação, são

sempre

centro

de transmissão.

H

4)

Não

tomar

o

poder

como

uma

derivação

do

poder

do

Estado,

onde

a sua

disseminação se daria de

cima

para baixo, estruturando e determinando toda a sociedade.

Partir para a análise

da

maneira

como

os fenômenos, as técnicas e os procedimentos se

deslocam, se

expandem,

se

modificam

e

como

são investidos e anexados

por

fenômenos

mas

globais. instalação de

um

macropoder, para Foucault, é possível mediante

o

enraizamento nos corpos, nos comportamentos, nas relações de poder locais e

não

numa

simples projeção

do poder

central.

5)

Não

usar a

noção de

ideologia

em

oposição virtual a

alguma

coisa

que

seria a verdade. Foucault se preocupa

em

ver os efeitos

da

verdade

que

se

produzem no

interior dos

discursos,

que não

são

em

si

nem

verdadeiros

nem

falsos.

O

poder

para se exercer é obrigado a circular, formar e organizar

um

saber

ou

aparelhos

de

saber.

Em

suas análises sobre

o

poder, Foucault introduziu

o que

chamou

de

'Tier

~".

Segundo

ele,

o

poder

tem

como

alvo 0 corpo,

não

para supliciá-lo,

muülá-lo,

mas

para adestrá-lo, aprimora-lo; daí sua positividade. Ele se exerce

na

escola, nas

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