Sistemas Legais de Insolvˆ
encia, Incentivos e
Mercado de Cr´
edito: uma abordagem institucional
Ana Carla Ad˜ao Costa
PET-Economia: Peri´odico
Ana Carla Ad˜
ao Costa
Economista do Banco Central do Brasil.
Introdu¸c˜
ao
O estudo trata do sistema legal de resolu¸c˜ao de insolvˆencias e
seus impactos sobre o mercado de cr´edito banc´ario.
Sistemas legais de insolvˆencia corporativas interferem na
decis˜ao dos bancos e tomadores de empr´estimo, tendo
capacidade de minimizar problemas informacionais no mercado de cr´edito, alinhar incentivos, aumentar a eficiˆencia e, assim,
expandir o volume de empr´estimos e reduzir de seu pre¸co.
Tal regulamenta¸c˜ao, apesar de gerar o aumento da eficiˆencia
m´edia pela elimina¸c˜ao de empresas ineficiˆentes, deve levar em
conta o potencial de revers˜ao do estado de endividamento e
Introdu¸c˜
ao
A eficiˆencia das institui¸c˜oes legais nesse campo possibilitaria o aumento da disponibilidade de recursos financeiros para investimento e crescimento da economia.
Analisa-se em que medida diferentes caracter´ısticas das leis de
Orienta¸c˜
ao Pr´
o-Credor
Promove mercados de cr´edito e melhora as percep¸c˜oes de
risco dos emprestadores, por meio da diminui¸c˜ao das
incertezas quanto `a possibilidade de recupera¸c˜ao dos recursos emprestados.
Diminui estados de natureza em que os pagamentos n˜ao s˜ao
feitos.
Entretanto, essa orienta¸c˜ao prejudica a qualidade de sele¸c˜ao ex-ante e o monitoramento ex-post.
Diminui¸c˜ao do interesse dos credores em se engajarem em
processos de sele¸c˜ao e monitoramento e piora da divis˜ao de
risco, com a transferˆencia de renda, pelos devedores, dos
estados de falˆencia para os de pr´e-falˆencia, se voltando para investimentos de alto risco, por exemplo.
Orienta¸c˜
ao Pr´
o-Credor
Postura que deve ser adotada para pa´ıses nos quais o mercado de cr´edito ´e menos avan¸cado e a avers˜ao `a falencia n˜ao est´a arraigada.
Nesse contexto, evita que as leis de insolvˆencia sejam usadas
para maximizar ganhos individuais. ´
EUA
Prote¸c˜ao aos cr´editos com garantia real (quando o pr´oprio
devedor, ou algu´em por ele, destina todo ou parte do seu
patrimˆonio para assegurar o cumprimento da obriga¸c˜ao
contra´ıda).
Participa¸c˜ao ativa de credores nos processos de recupera¸c˜ao via comitˆe de credores.
Cortes de falˆencias julgam os casos e o executivo acompanha
os processos, por meio do Executive Office of the United States of America.
Inglaterra
Credores com garantia real protegidos.
Na recupera¸c˜ao formal, a gest˜ao passa do devedor para um
administrador judicial.
Os credores tem participa¸c˜ao direta nos processos.
Utiliza¸c˜ao de estruturas extra-judiciais.
Orienta¸c˜
ao Pr´
o-Devedor
Encolhimento do Mercado de cr´edito - maior restri¸c˜ao em
volumes e maior rigidez em pre¸co.
Incentivam a constru¸c˜ao de uma ind´ustria de falˆencia.
Voltada para lugares onde a cultura de cr´edito est´a mais
avan¸cada, visto que os ganhos marginais de se aumentar os
direitos dos credores s˜ao limitados.
Fran¸ca
Indica¸c˜ao de um credor como supervisor do processo, mas, em
geral, se transfere pouco poder ao credor.
Processos de recupera¸c˜ao e reorganiza¸c˜oes volunt´arias n˜ao
podem ser solicitados por credores, j´a os de insolvˆencia sao
iniciados por credores ou devedores.
Per´ıodo de observa¸c˜ao: juiz escolhe administrador que faz
levantamento dos neg´ocios do devedor e apresenta planos de
reestrutura¸c˜ao.
Modelo Matem´
atico
Banco - principal; tomador de empr´estimo - agente; n´ıvel de
risco - informa¸c˜ao privada do agente.
Probabilidade de ocorrˆencia do estado bom de natureza se
reduz quanto maior for o risco.
A partir dos modelos matem´aticos apresentados sobre o
ambiente credit´ıcio e a utilidade do agente, conclui-se que: Se a puni¸c˜ao estabelecida pela realiza¸c˜ao do estado ruim de natureza for muito alta, n˜ao compensar´a ao agente pegar empr´estimo.
H´a um valor para tal puni¸c˜ao no qual a solu¸c˜ao ´otima ´e o
pagamento dos empr´estimos em qualquer estado de natureza,
funcionando como um incentivo para que haja adimplemento dos d´ebitos.
Gera a redu¸c˜ao dos pre¸cos e das quantidades de equil´ıbrio, pela eleva¸c˜ao do valor esperado de retorno.
Sistema de Insolvˆ
encia Brasileiro - Decreto Lei 7.661 de
1945
Concordata - desequil´ıbrios financeiros momentˆaneos.
Falˆencia DecretoLei 7.661de1945 - realiza¸c˜ao de ativos da empresa para pagamento de credores.
Processos falimentares desperdi¸cam recursos.
Legisla¸c˜ao acabava desprezando a possibilidade dos ativos
manterem sua fun¸c˜ao social.
Concoradata funciona como um adiamento da falˆencia, por
ser um instrumento r´ıgido, concedido sob a forma de ”favor legal”.
Sistema de Insolvˆ
encia Brasileiro - Decreto Lei 7.661 de
1945
Lei de Falˆencia e leis que regulamentam a Concordata s˜ao
fontes de distor¸c˜oes:
N˜ao maximizam a probabilidade de recupera¸c˜ao da empresa -burocracia excessiva e r´ıgida.
N˜ao maximizam o retorno esperado do ativo - deprecia¸c˜ao do
valor em leil˜oes; burocracia; falta de acompanhamento pelos
credores.
Recebimento de cr´editos trabalhistas pelos administradores.
Incentivam processos falimentares como forma de minimiza¸c˜ao
de preju´ızos individuais.
N˜ao protege cedores com garantia real.
Subordinada `a cr´editos trabalhistas e tribut´arios de forma prejudicial.
Princ´ıpio da Eficiˆ
encia e Orienta¸c˜
ao para Sistemas de
Insolvˆ
encia e Direitos de Credores
Publicado pelo Banco Mundial com a participa¸c˜ao de
especialistas de mais de 75 pa´ıses.
Prote¸c˜ao a demandas de cr´editos com ou sem garantias
vinculadas.
Procurar m´etodos eficazes, baratos e previs´ıveis de execu¸c˜ao e
reconhecimento de cr´editos e garantias, minimizando o tempo
de liquida¸c˜ao dos ativos.
Estrutura¸c˜ao de um sistema de recupera¸c˜ao de empresas com
participa¸c˜ao dos credores, regulamentado com menos
burocracia e custos.
A Nova Lei de Recupera¸c˜
ao de Empresas - Lei n
o11.101
Projeto de Lei 071/2003 que visava substituir o Decreto Leino 7.661, foi sancionado no dia 9 de fevereiro de 2005 na
forma da Lei no 11.101.
Objetivo: abrir possibilidades reais de recupera¸c˜ao das
empresas e manuten¸c˜ao de empregos, viabilizando processos
mais eficientes de liquida¸c˜ao de empresas insolventes, al´em de incentivar a participa¸c˜ao de todos os credores.
Dentre os principais pontos, destacam-se:
Prioridade da venda em bloco da empresa, garantindo a manuten¸c˜ao de valores intang´ıveis, que na base da lei atual se perdem.
Limita¸c˜ao do privil´egio dos cr´editos trabalhistas a 150 sal´arios m´ınimos, evitando expropria¸c˜ao da massa falida por parte de ex-administradores.
A Nova Lei de Recupera¸c˜
ao de Empresas Lei n
o11.101
Elimina¸c˜ao das sucess˜oes trabalhistas e tribut´arias em caso devenda em hasta p´ublica de ativos de empresa falida, evitando
a perda de valor em fun¸c˜ao de passivos ocultos.
O Judici´ario exerce uma fun¸c˜ao de coordena¸c˜ao, dando neutralidade e seguran¸ca jur´ıdica aos procedimentos,
controlando a legalidade e impedindo a pr´atica de fraudes,
mas n˜ao adentra no m´erito das medidas de recupera¸c˜ao.
Busca de um maior equil´ıbrio entre os interesses dos devedores e dos credores, entretanto, continua pendendo para a
orienta¸c˜ao pr´o-devedor.
Invers˜ao na ordem de classifica¸c˜ao, dos cr´editos com garantia real com rela¸c˜ao aos cr´editos tribut´arios.
A Nova Lei de Recupera¸c˜
ao de Empresas Lei n
o11.101
As empresas de valor presente e caixa positivos s˜ao
consideradas economicamente vi´aveis, sendo poss´ıvel e
adequada sua recupera¸c˜ao nas m˜aos do pr´oprio empres´ario. Para tais, prevˆe a legisla¸c˜ao os institutos da recupera¸c˜ao judicial e recupera¸c˜ao extrajudicial.
J´a as empresas com valor presente negativo, mas com
viabilidade econˆomica, enxerga-se a possibilidade da
preserva¸c˜ao de seus ativos e da atividade, por´em nas m˜aos de
outro empres´ario, com gest˜ao mais eficiente. Prevendo esta
possibilidade a legisla¸c˜ao possibilita, na falˆencia, a venda antecipada dos ativos com prioridade dos estabelecimentos em bloco ou isolados institutos da recupera¸c˜ao extrajudicial.
A Nova Lei de Recupera¸c˜
ao de Empresas Lei n
o11.101
J´a as empresas com valor presente negativo, mas com
viabilidade econˆomica, enxerga-se a possibilidade da
preserva¸c˜ao de seus ativos e da atividade, por´em nas m˜aos de
outro empres´ario, com gest˜ao mais eficiente. Prevendo esta
possibilidade a legisla¸c˜ao possibilita, na falˆencia, a venda antecipada dos ativos com prioridade dos estabelecimentos em
bloco ou isolados institutos da recupera¸c˜ao extrajudicial.
Por fim, para as empresas com valor presente negativo e tamb´em invi´aveis futuramente, prevˆe a legisla¸c˜ao, na falˆencia, na extin¸c˜ao do neg´ocio, mas com uma realiza¸c˜ao o quanto
mais eficiente dos ativos, procurando minimizar ao m´aximo os
A Nova Lei de Recupera¸c˜
ao de Empresas Lei n
o11.101
Princ´ıpios que regem seus institutos, sobretudo aqueles que procuram atender a dupla vis˜ao das legisla¸c˜oes falimentares
modernas, acima referidas: o reconhecimento da fun¸c˜ao social
da empresa, com a viabiliza¸c˜ao da continuidade do neg´ocio, e
a minimiza¸c˜ao de impactos na hip´otese de extin¸c˜ao do neg´ocio e liquida¸c˜ao dos ativos pela falˆencia.
No artigo 47 est˜ao os princ´ıpios que regem a recupera¸c˜ao judicial: a viabiliza¸c˜ao da supera¸c˜ao da crise
econˆomico-financeira do devedor, a manuten¸c˜ao da fonte
produtora, do emprego, dos interesses dos credores, a preserva¸c˜ao da empresa, o reconhecimento de sua fun¸c˜ao social e o est´ımulo `a atividade econˆomica.
A Nova Lei de Recupera¸c˜
ao de Empresas Lei n
o11.101
No artigo 75, est˜ao os princ´ıpios que regem a falˆencia: preserva¸c˜ao e otimiza¸c˜ao da utiliza¸c˜ao produtiva dos ativos,
recursos produtivos e tamb´em os intang´ıveis da empresa, a
Recupera¸c˜
ao Judicial
Amplia¸c˜ao dos ´org˜aos da recupera¸c˜ao, com a institui¸c˜ao da
assembl´eia geral de credores e comitˆe de credores, com
poderes espec´ıficos para a falˆencia e recupera¸c˜ao judicial.Na recupera¸c˜ao judicial e extrajudicial esta orienta¸c˜ao ´e ainda mais evidente, j´a ser˜ao os credores quem decidir˜ao pela
concess˜ao ou n˜ao do benef´ıcio, uma vez ultrapassada a fase
de verifica¸c˜ao, pelo juiz, do preenchimento dos requisitos
m´ınimos legais.
Amplia¸c˜ao das formas de recupera¸c˜ao, expostas apenas a
t´ıtulo exemplificativo no artigo 50 da lei, podendo o devedor prever e instituir qualquer outro meio, desde que aprovado pelos credores.
Recupera¸c˜
ao Judicial
Sujei¸c˜ao de todos os credores, n˜ao s´o os quirograf´arios (o que n˜ao possui direito real de garantia,seus cr´editos est˜ao
representados por t´ıtulos advindos das rela¸c˜oes obrigacionais), `
a recupera¸c˜ao judicial, com exce¸c˜ao do fisco, face ao princ´ıpio
da indisponibilidade do poder p´ublico, e de outros cr´editos
elencados no artigo 49, §§3o e 4o, justamente para manter o
respeito ao direito de propriedade e de garantia.
Possibilidades dos credores apresentarem obje¸c˜ao ao
plano(art. 55)e sugerirem modifica¸c˜oes no plano(art. , §4o).
Estabelecimento do stay period (suspens˜ao das a¸c˜oes,
execu¸c˜oes e prescri¸c˜ao contra o devedor pelo prazo de 180 dias).
Recupera¸c˜
ao Judicial
Manuten¸c˜ao da administra¸c˜ao com o devedor, mas sob
fiscaliza¸c˜ao do Comitˆe.
Impossibilidade de retirada de bens de capital no stay period(art. 49, 3o).
Inexistˆencia de sucess˜ao na aliena¸c˜ao de estabelecimento empresarial (art. 60).
Falˆ
encia
Diferencia¸c˜ao de tratamento para as situa¸c˜oes de inviabilidade
financeira absoluta, da viabilidade econˆomica do neg´ocio. O
neg´ocio sob nova administra¸c˜ao pode perdurar, tendo em
vista a marca, o produto, os fundos de empresa, enfim, os intang´ıveis em geral.
Maior participa¸c˜ao dos credores atrav´es da assembl´eia e
comitˆe de credores, opinando diretamente, por exemplo, na
forma de venda dos ativos e agindo na fiscaliza¸c˜ao da gest˜ao da massa pelo administrador judicial.
Manuten¸c˜ao da empresa, preceituando que o fechamento do
estabelecimento ocorrer´a excepcionalmente, apenas nas
Falˆ
encia
preceitua novas formas de aliena¸c˜ao, como o leil˜ao, propostas
e preg˜ao (art. 142); possibilita a venda antecipada dos ativos,
logo ap´os a arrecada¸c˜ao e avalia¸c˜ao, sem necessidade de se
aguardar o fim da fase de sindicˆancia (art. 139); estabelece a
seguinte ordem de preferˆencia na venda dos ativos,
estabelecimentos em bloco, estabelecimentos isolados, bens em bloco, bens isolados (art. 140), possibilitando assim a
manuten¸c˜ao do neg´ocio nas m˜aos de novo empres´ario,
implicando na manuten¸c˜ao do emprego, na otimiza¸c˜ao da
fonte produtora, da fun¸c˜ao social e, ao mesmo tempo, na
consecu¸c˜ao de maiores recursos para a massa; estabelece a
inexistˆencia de sucess˜ao(art. 141, II) pelo adquirente do estabelecimento, excepcionando as regras dos artigos 448 e 10
Falˆ
encia
...estabelece a inexistˆencia de sucess˜ao(art. 141, II) pelo adquirente do estabelecimento, excepcionando as regras dos
artigos 448 e 10 da CLT, 133 do CTN e 1146 do C´odigo Civil;
estabelece que os contratos de trabalho para os empregados que permanecerem na presta¸c˜ao de servi¸cos ap´os a aliena¸c˜ao
do estabelecimento ser˜aonovos (art. 141, §2o).
Modifica a ordem de preferˆencia dos cr´editos, criando o super
privil´egio para os sal´arios atrasados, limita¸c˜ao do privil´egio trabalhista para at´e 150 sal´arios m´ınimos, a preferˆencia da garantia real sobre o fisco, considera¸c˜ao de cr´edito
trabalhistas cedido como quirograf´ario, cr´edito de s´ocio como
subordinado. Tais modifica¸c˜oes visa respeitar os direitos de
Problemas que permanecem
Falta de agilidade na resolu¸c˜ao de processos de execu¸c˜ao de d´ıvidas.
N˜ao reconhecimento de cl´ausulas contratuais pelas cortes.
Concess˜ao de prioridade excessiva ao fisco.
Conclus˜
ao
O sistema de resolu¸c˜ao de insolvˆencia no Brasil vem
impactando negativamente tanto o pre¸co quanto o volume do
cr´edito privado concedido.
Ainda que a lei n˜ao tenha conseguido, eficazmente, instituir
todas as alegadas orienta¸c˜oes e princ´ıpios, ou, ainda que n˜ao
logrado ˆexito em prever satisfatoriamente todas as hip´oteses
da vida, ´e imprescind´ıvel que os operadores do direito:
advogados, minist´erio p´ublico e juizes tenham a consciˆencia desta ratio legis, buscando uma solu¸c˜ao c´elere, eficiente na
busca do melhor atendimento aos anseios econˆomicos e
sociais, quais sejam: A recupera¸c˜ao de empresas vi´aveis, a
maximiza¸c˜ao dos valores a serem recuperados na hip´otese de
Conclus˜
ao
Entretanto, h´a caracter´ısticas institucionais, que v˜ao al´em
desse ˆambito de regulamenta¸c˜ao,as quais podem representar
entraves `a consolida¸c˜ao dos avan¸cos da nova lei e at´e a
perpetua¸c˜ao de distor¸coes antigas como por exemplo a