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Bruxas e demônios no Arcebispado de Braga: A Visitação Inquisitorial de 1565 Juliana Torres Rodrigues Pereira 1

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Academic year: 2021

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Bruxas e demônios no Arcebispado de Braga: A Visitação Inquisitorial de 1565

Juliana Torres Rodrigues Pereira1

RESUMO: Este trabalho pretende apresentar uma análise das denúncias de bruxaria e culto ao demônio feitas à Visitação Inquisitorial ao Arcebispado de Braga de 1565, relacionando-as à ação pastoral de D. Frei Bartolomeu dos Mártires.

Palavras-chave: bruxaria, Inquisição, Bartolomeu dos Mártires.

ABSTRACT: This paper intends to present a study about the reports of witchcraft and worship of the devil to the Inquisitorial visit to Braga’s Archbishopric in 1565, connecting them to the action of Brother Bartolomeu dos Mártires.

Keywords: witchcraft, Inquisition, Bartolomeu dos Mártires

Pretendemos esboçar neste trabalho algumas questões relativas à pesquisa em desenvolvimento a respeito das práticas descritas como rituais de bruxaria e culto ao demônio nos livros da Visitação da Inquisição ao Arcebispado de Braga em 15652,

O número de denúncias de crimes de rituais de bruxaria e culto ao demônio, em comparação com os números de visitações a outros arcebispados portugueses nesse mesmo período, permitiu a constatação de uma especificidade do caso bracarense no Portugal quinhentista entre os primeiros anos de funcionamento do Tribunal do Santo Ofício lusitano.

A ordem da visitação partiu do próprio Inquisidor Geral,3 e não foi diretamente relacionada ao Tribunal de Coimbra, que tinha jurisdição sobre o Arcebispado de Braga (MEA, 1997:89). Pela própria extensão do Arcebispado, a visita se concentrou em apenas três pontos: a cidade de Braga, a Vila do Conde e Viana do Foz de Lima. Os pontos escolhidos não são muito distantes entre si, e localizam-se próximos ao litoral.

A visita teve início pela cidade de Braga, em 14 de janeiro de 1565, permanecendo aí até aproximadamente o dia 13 de março. Em seguida, a visita seguiu para Viana do Foz de Lima, sendo o édito de fé nesta cidade publicado em 25 de março. Nesta localidade, a estada dos visitadores foi mais curta, permanecendo até o dia 18 de abril. Já em 23 do mesmo mês,

1 Mestranda pelo Programa de Pós Graduação em História Social – PPGHIS/UFRJ. Pesquisa financiada pelo CNPq.

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Liuro da visitação que se [a Inquisição] fez na Cydade de Braga e seu Arcebispado [1565]. Porto: Arquivo

Histórico Dominicano Português-Movimento Bartolomeano, 1974.

3Inquisidor-Geral era a autoridade máxima da Inquisição. Na época da visita analisada, o Inquisidor-Geral em Portugal era o Cardeal D. Henrique, também regente do trono, durante a minoridade de D.Sebastião.

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teve início a visitação da Vila do Conde, permanecendo em atividade até o dia 1o. de maio. Obviamente, o maior volume de denúncias em Braga e o tempo de permanência dos visitadores nesta cidade, muito maior que nas outras, estão intimamente ligados.

O perfil sociológico dos denunciados nas três regiões visitadas pode ser traçado com base nas informações reunidas nas denúncias e confissões.

Em vinte e um delitos de magia e bruxaria, houve dezenove denunciantes (dentre estas, duas confissões) e quatorze denunciadas. Treze dessas denúncias ocorreram em Braga, seis em Viana do Foz de Lima e duas na Vila do Conde. Não é possível determinar com exatidão quantas denunciadas tinham moradia em cada um desses distritos já que há casos de uma mesma denunciada em mais deles, o que indica a circulação destas pela região.

O traço que imediatamente impressiona é a quase onipresença do sexo feminino, tanto entre denunciantes quanto entre denunciadas. Há apenas um indivíduo do sexo masculino dentre os denunciantes; de resto, só há registros de mulheres. Aqui o estereótipo do gênero feminino como representante massivo do fenômeno da bruxaria encontra alguma solidez.

Segundo Stuart Clark (CLARK, 2006: 155), geralmente a associação entre o gênero feminino e o fenômeno da bruxaria é pensada em termos das condições sociais em que as mulheres viviam na época, quando na verdade deveriam ser considerados os traços comuns entre a idéia de bruxaria e as características atribuídas ao comportamento feminino.

A ligação entre feminino e bruxaria não deve ser pensada como conseqüência do grande número de mulheres que não chegavam a contrair matrimônio, da marginalização econômica e social que a sociedade patriarcal européia por vezes impunha às mulheres, ou até mesmo como rótulo imposto pelas comunidades para lidar com essa marginalização. Tais problemas vividos pelas mulheres da época tinham infinitos desdobramentos que não a transformação destas em feiticeiras. Mesmo que a acusação fosse uma saída encontrada para lidar com as mulheres consideradas como fora dos padrões sociais, esta poderia ser relativa a qualquer outro tipo de delito que não o de bruxaria. É necessário pensar então quais as características do fenômeno da bruxaria que estão ligadas de maneira direta à idéia que se fazia do feminino para que se possa compreender essa ligação.

Os tratados demonológicos fazem diversas acusações sobre o gênero feminino, que eram entendidas, de maneira geral, como a fraqueza natural das mulheres, tanto intelectual quanto psicológica: a curiosidade, a tagarelice, a tendência a mentir, o orgulho, a cobiça, a vaidade e a fraqueza da carne (mais forte nelas que nos homens). De todas essas fraquezas

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acabam por ser associadas à conseqüente facilidade de cair em tentação, daí a preferência demoníaca em seduzir as mulheres.

Dentre as quatorze denunciadas, seis não têm o estado civil explicitado na denúncia. Porém, considerando as informações disponíveis a respeito do estado civil das outras oito, há uma predominância das casadas (cinco). Há apenas duas solteiras e uma viúva. O estereótipo da bruxa solteirona ou viúva, excluída socialmente, não encontra lugar aqui.

Considerando-se que uma boa parte das denunciadas a respeito das quais se sabe o estado civil (cinco entre oito) eram casadas e que onze das quatorze tinham um local de moradia fixa declarada (sendo a maioria das denunciadas fixadas em locais de boa circulação populacional), o mito da feiticeira banida (seja pelo isolamento próprio, seja pela imposição dos que vivem a seu redor) do convívio social é aqui devidamente refutado. Até mesmo para que a feiticeira fosse procurada por aqueles que desejavam seus serviços, conseqüência de uma fama que se difunde pela via oral, característica fundamental dessa sociedade portuguesa do período, era necessário um reconhecimento social mínimo (mesmo que não abertamente, já que a prática ia diretamente contra as instituições). Muitos dos relatos indicam existência de contatos, relações de ensinamentos, aprendizados e trocas de favores entre as mulheres consideradas pela comunidade como bruxas, situação que exigia uma inserção destas no meio de convívio populacional. O fato de que sete dentre as quatorze mulheres denunciadas foram declaradas como cristãs-velhas, e apenas uma como cristã-nova reforça a ausência de um isolamento social.

De fato, as ocupações relatadas dessas mulheres eram características de condições sociais simples. O número considerável de tecedeiras e o registro de uma vendedora de pão mostram que essas mulheres eram representantes de uma condição social baixa, ou no máximo média-baixa, de maneira que não há registros de escravas ou pedintes. É interessante pensar que essas mulheres não tiravam seu sustento da bruxaria. Poucas foram as que pediram alguma contribuição financeira, e quando o fizeram, o dinheiro teria sido utilizado na compra de objetos e utensílios que eram utilizados nos rituais.

O número de denúncias de bruxaria, com relação aos outros delitos, é um dado que chama muita atenção. Totalizando 13, 46% do total de delitos denunciados, tal número de denúncias sobre bruxaria pode ser considerado como extremamente expressivo e fora dos padrões normais da época, se comparado ao número de denúncias de bruxaria em outras visitações em período similar.

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Geralmente, o número de denúncias contra os judaizantes é o mais expressivo, compondo normalmente uma quantia que ronda a metade dos casos. A perseguição aos judaizantes constituía o foco da ação inquisitorial em Portugal (BETHENCOURT, 2004; PAIVA, 2002). Já na visita aqui analisada, esse tipo de delito corresponde a apenas 16,66% do total, não ficando muito à frente do número de denúncias sobre bruxaria.

Quando comparados aos números de visitas da Inquisição feitas a outras regiões de Portugal,4 na mesma época, percebe-se que o número de delitos relativos à feitiçaria atingiu nessa visitação um patamar incomum. Como já foi dito anteriormente, foram feitas 21 denúncias sobre bruxaria/magia na visitação aqui analisada, em um total de 156 denúncias, o que corresponde a 13, 46%. A tabela a seguir traz um balanço dos números da visitação.5

DELITOS REGISTRADOS NAS DENÚNCIAS DA VISITAÇÃO AO ARCEBISPADO DE BRAGA - 1565 NÚMERO DE DENÚNCIAS % Judaísmo 26 16,66 Protestantismo 12 7,69 Maometismo - -

Blasfêmias e Palavras escandalosas 26 16,66 Manifestações contra o Dogma 14 8,97

Juízos contra a Igreja 12 7,69

Formulações de conteúdo erótico-sexual 3 1,92

Bigamia 15 9,61

Superstição 1 0,64

Feitiçaria 21 13,46

Contra o Santo Ofício 5 3,20

Diversos 12 7,69

Motivos extravagantes - -

Culpas não definidas 9 5,76

Sodomia 1 0,64

TOTAL 156 100

4 Considerando as diferentes dimensões geográficas e os diferentes níveis de concentração populacional das regiões apontadas para efeito de comparação, os números serão levados em conta pelo percentual que representam dentro do total de denúncias feitas em cada região.

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Uma visita a Lamego e Viseu, realizada em 1543, apresenta um total de 319 denúncias, número consideravelmente maior que o da visita aqui analisada. Dentre esses 319 registros, não há nenhum relativo à feitiçaria. Aqui o delito mais expressivo é o de judaísmo, compondo 84% das denúncias. É importante considerar também que essa foi a primeira visita inquisitorial à região.

DELITOS REGISTRADOS NAS DENÚNCIAS

DA VISITAÇÃO A LAMEGO E VISEU - 1543 NÚMERO DE DENÚNCIAS %

Judaísmo 268 84

Protestantismo - -

Maometismo - -

Blasfêmias e Palavras escandalosas 8 2,5

Manifestações contra o Dogma 6 1,9

Juízos contra a Igreja 7 2,2

Formulações de conteúdo erótico-sexual - -

Bigamia 1 0,3

Superstição - -

Feitiçaria - -

Contra o Santo Ofício 16 5

Diversos 10 3,2

Motivos extravagantes 2 0,6

Culpas não definidas 1 0,3

Sodomia - -

TOTAL 319 100

FONTE: MEA, 1997: 227

A visitação a Beira, em 1579, apresentou números também muito interessantes para um estudo comparativo sobre a bruxaria em Portugal. A visita dura cerca de seis meses, passando pelas principais regiões de Beira, abrangendo espaços sob a jurisdição tanto do Tribunal de Coimbra quanto sob o de Lisboa: Covilhã, Teixoso, Belmonte, Guarda, Celorico da Beira, Trancoso, Castelo Rodrigo, Almeida, Castelo Bom e Vila Maior.

Em um total de 668 denúncias, não há nenhuma sobre feitiçaria, em nenhuma das localidades visitadas. A esmagadora maioria dos delitos diz respeito aos judaizantes, seguida por outros delitos de expressão numérica similar e muito pequena.

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Delitos registrados nas denúncias da visitação à

Beira - 1579

Covilhã Teixoso Belmonte Guarda Celorico da Beira Trancoso Castelo Rodrigo Almeida Sabugal, Castelo Bom e Vilar Maior Total % Judaísmo 85 13 30 170 82 35 59 16 21 511 76,5% Protestantismo - - - - Maometismo - - - - Blasfêmias e Palavras escandalosas 4 2 - 3 2 1 3 6 1 22 3,3% Manifestações contra o dogma - - 2 4 2 5 2 5 6 26 3,9%

Juízos contra a Igreja 4 - 2 11 1 2 - 2 - 22 3,3%

Formulações de conteúdo erótico-sexual 2 - - - 1 - - - 1 4 0,6% Bigamia - - - - Superstição - - 1 - - - 1 0,2% Feitiçaria - - - -

Contra o Santo Ofício 3 1 - 3 10 - - - - 17 2,5%

Diversos 9 - - 10 7 1 3 3 3 36 5,4%

Motivos Extravagantes 4 2 2 5 5 4 5 - 2 29 4,3%

Culpas Não definidas - - - -

Sodomia - - - -

TOTAL 111 18 37 206 110 48 72 32 34 668 100%

FONTE: MEA, 1997: 238.

O já aqui citado José Pedro Paiva considera o Arcebispado de Braga uma região de grande peso no que concerne ao número de denúncias e processos relativos à feitiçaria. Porém, trata essa diferenciação regional como relativa à distribuição demográfica da população e de acordo com a geografia da repressão inquisitorial. Visto que aqui os números de delitos de bruxaria são considerados sempre em relação ao total de denúncias feitas em cada visita e comparados percentualmente, a concentração demográfica em cada uma das localidades aqui tratadas não é o fator determinante para efeito de comparação. Mesmo que a concentração demográfica do Arcebispado de Braga fosse maior, isso poderia até se refletir no número de denúncias geral, mas não especificamente nas de bruxaria.

A diferença encontrada entre os números da visitação a Braga e as outras visitações pode ser compreendida pela ação local mais enérgica no Arcebispado de Braga.

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episcopado exigia entrega total e disponibilidade para atender as necessidades espirituais dos fiéis, através da oração, da pregação e das visitas pastorais (PAIVA, 2006: 111-147). O esboço dessas idéias já podia ser encontrado nos escritos de intelectuais como Francisco Vitoria e Bartolomé de Carranza6; no entanto, foi durante o Concílio de Trento que esse modelo se desenvolveu e ganhou espaço. O Stimulus Pastorum7, de Frei Bartolomeu dos Mártires, obra sem valor institucional, escrita durante sua participação em Trento (1562-1563) e editado em 1565, foi considerado uma das principais obras (se não a principal) para a compreensão e difusão dessa idéia por toda a Europa católica (PAIVA, 2006:128-139).

Tal modelo de bispo-pastor foi aplicado pelo Arcebispo com muito esmero, e o levou a implementar uma política pastoral diferenciada no Arcebispado de Braga desde quando ainda estava presente ao Concílio. Com relação às visitas pastorais, Frei Bartolomeu dos Mártires não só pregava a importância e os objetivos de sua existência e assiduidade para o rebanho como também defendia que a visita deveria ser feita, sempre que possível, pelo próprio Bispo:

Entre os cuidados pastorais a solicitude em visitar a diocese ocupa um lugar de destaque. A visitação é quase a alma do governo episcopal porque é por ela que o pastor se desfaz e consome em benefício e utilidade de todas as suas ovelhas. O Bispo autêntico, quando sai a calcorrear todas as paróquias, é como um sol que desponta para iluminar as terras pelos três actos jerárquicos, a saber: limpar, ilustrar, aperfeiçoar. O Bispo sai a exortar, a pregar, a argüir, a repreender, a confirmar e a prescrutar como se administram os sacramentos, com que reverencia e dignidade se celebra o divino Sacrifício; finalmente, é missão suave do verdadeiro pastor consolar todos os que choram e acudir com o remédio a todas as necessidades espirituais e temporais.(MARTIRES, 1981:247)

O Arcebispo demonstrou preocupação com a ação catequética sobre a população desde que assumiu o título, organizando visitas pastorais logo no ano em que assume – sendo uma inclusive ao próprio Cabido da Sé. Seus relatos a respeito do rebanho sob sua jurisdição evidenciam a preocupação com uma ação pastoral mais intensa, a fim de erradicar práticas condenáveis, como o eram as de magia e feitiçaria.

6 O primeiro, dominicano, professor da Universidade de Salamanca, deixou expressa em seus Comentários a San

Tomas a idéia de que o episcopado era um ofício, e exigia caridade e total dedicação. Já o segundo, também

dominicano, Arcebispo de Toledo de 1558 a 1576, também participante do Concílio de Trento, escreveu, em defesa desses mesmos ideais, um tratado denominado Hierarchia ecclesiastica in qua describuntur ministorum

ecclesiae militantis (o tratado data provavelmente de 1552 e não chegou a ser impresso). Sabe-se que em 1551

Carranza e Bartolomeu dos Mártires entraram em contato no Capítulo Geral dos dominicanos, em Salamanca. 7 Edição bilíngue da obra (latim e tradução portuguesa) pelo Movimento Bartolomeano (1981).

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Foi em sua passagem pelo Concílio de Trento, em 1562-1563, que Frei Bartolomeu dos Mártires conseguiu difundir suas idéias a respeito dos objetivos e da importância da regularidade das visitas. Como nesse momento não era possível que o Arcebispo visitasse suas freguesias, tinha a seu serviço dezoito visitadores, seis dos quais escolhidos por ele.

Logo após seu retorno, o Arcebispo organizou e fez cumprir a periodicidade regular para as visitas pastorais em seu Arcebispado, de modo que toda a região fosse visitada todos os anos por ele mesmo ou por pessoas delegadas para essa função. A urgência com que encarava o assunto o levou organizar um Sínodo Diocesano em 1564 e o IV Concílio Provincial Bracarense em 1566. Principalmente após sua passagem pelo Concílio de Trento, a visita pastoral, como uma tentativa de minimizar os erros de crença e conduta religiosa do rebanho, ganhou uma força e uma importância que não se comparam ao período de D. Frei Baltasar Limpo.

Durante o arcebispado de D. Frei Baltasar Limpo (1550-1558), houve também uma política de visitas pastorais, porém não tão valorizada e ativa quanto no período de seu sucessor. O próprio D. Frei Baltasar Limpo não chegou a visitar boa parte de seu Arcebispado, concentrando a maior parte de suas visitas à Colegiada de Nossa Senhora dos Guimarães, devido à contenda com o D. Prior local a respeito da jurisdição desta (SOARES, 1983).

Com o aumento da ação repressiva por parte da Igreja, através da intensificação da atividade pastoral, culminando com a visita do Sano Ofício ao Arcebispado, práticas de religiosidade popular passaram a sofrer uma condenação maior por parte da Igreja. Os editais das visitas, os sermões, a punição daqueles descobertos pelos visitadores, tudo isso colaborou para um quadro de demonização de tais práticas, incitando a população local a denunciar tudo aquilo que era apresentado como condenável por essa ação catequética mais intensa.

A visita da Inquisição de 1565 pode ser compreendida como ponto elevado dessa tensão criada pelo acirramento da ação pastoral. O maior número de denúncias relacionadas como delito de bruxaria pode ser compreendido como inserido nesse ambiente criado pela nova política pastoral de D. Frei Bartolomeu dos Mártires. A especificidade dessa visita Inquisitorial ao Arcebispado de Braga pode se justificar, então, pela intensificação da ação pastoral desenvolvida nesse espaço a partir do momento em que D. Frei Bartolomeu dos Mártires se tornou Arcebispo.

Assim, o trabalho em andamento tem a intenção de discutir a possível relação entre a atuação rigorosa de Frei Bartolomeu dos Mártires em Braga com a demonização das práticas

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de religiosidade popular na região controlada pelo Arcebispo, expressas no maior numero de denúncias feitas à visitação de Braga em 1565.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Fontes

Liuro da visitação que se [a Inquisição] fez na Cydade de Braga e seu Arcebispado [1565].

Porto: Arquivo Histórico Dominicano Português-Movimento Bartolomeano, 1974.

MÁRTIRES, Bartolomeu. Catecismo ou Doutrina Cristã e Práticas Espirituais, 1564. Edição do Movimento Bartolomeano, 1962.

_____________________. Estímulo de Pastores, 1565. Edição do Movimento Bartolomeano, 1981.

2. Bibliografia

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V-XIX. Lisboa: Temas e Debates, 1995.

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CARVALHO, Joaquim. A jurisdição episcopal sobre leigos em matéria de pecados públicos: as visitas pastorais e o comportamento moral das populações portuguesas de Antigo Regime. In: Revista Portuguesa de História. Coimbra: Tomo XXIV, pp. 121-163, 1990.

CLARK, Stuart. Pensando com Demônios: a idéia de bruxaria no princípio da Europa

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ROLO, Raul de Almeida. O Bispo e a sua Missão Pastoral Segundo D. Frei Bartolomeu dos

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SOARES, Franquelim. Visitações de D. Frei Baltasar Limpo na Arquidiocese de Braga. Braga: 1983.

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