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PARALELISMO GRAMATICAL: CONSTRUINDO SENTENÇAS COORDENADAS E CORRELATAS Humberto Borges 1

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PARALELISMO GRAMATICAL: CONSTRUINDO SENTENÇAS COORDENADAS E CORRELATAS

Humberto Borges1

RESUMO: O presente artigo analisa a presença e a ausência de paralelismo gramatical em sentenças coordenadas e correlatas na produção textual de estudantes de ensino médio em Brasília, tendo como objetivo mapear os fatores que influenciaram, especificamente, a ausência de paralelismo nos textos em análise.

PALAVRAS-CHAVE: Paralelismo gramatical. Coordenação. Correlação.

Na fala ou na escrita, a ocorrência de paralelismo dá-se pela retomada de estruturas nos níveis fonológico, lexical, morfossintático e semântico. O princípio de paralelismo gramatical, objeto de estudo deste trabalho, consiste na repetição de estruturas morfossintáticas numa sentença ou num texto, ou seja, o princípio de paralelismo gramatical induz haver relações de equivalência entre pontos de uma sequência verbal (ADAM, 2008). Vejamos:

(1) Ele acordou, desceu as escadas, comeu rapidamente e varreu a casa. (2) Ele deseja um doce, mas ela quer uma fruta.

Na oração (1), há uma breve narrativa de atividades que um indivíduo realizou durante determinado tempo. Como essas atividades ocorreram sucessivamente, ou seja, há uma equivalência entre as ações realizadas pelo indivíduo, os verbos foram todos conjugados no mesmo tempo e modo: pretérito perfeito do modo indicativo. Na oração (2), temos idêntica estrutura sintática para ambos os períodos: Sintagma Nominal Sujeito (SN1) + Sintagma Verbal (SV) + Sintagma Nominal Complemento (SN2), ou seja, há um argumento experienciador (SN1) e um tema (SN2) para cada SV, conjugados no mesmo tempo e modo – presente do indicativo.

Em ambas as orações, o paralelismo gramatical ocorre a partir de sentenças compostas por dois ou mais períodos, sendo (1) um caso de paralelismo morfológico e (2) um caso de paralelismo sintático. Diferentemente, na oração (3), abaixo, o paralelismo é gerado apenas pelo sintagma nominal, ou seja, pelo sujeito composto da sentença formado por entre pares correlatos tanto a filha quanto o pai, sendo esse sujeito predicado pelo verbo sofreram – sintagma verbal que, ainda, contém um adjunto causal (com o divórcio).

1

Bacharel em Letras – Língua Portuguesa e mestrando em Linguística pela Universidade de Brasília – UnB (hborges89@gmail.com).

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117 (3) Tanto a filha quanto o pai sofreram com o divórcio.

Os exemplos (1), (2) e (3) abordaram apenas a presença de paralelismo gramatical em sentenças complexas – duas coordenadas e uma correlata. Em Comunicação em Prosa Moderna, Othon Moacir Garcia (2010), ao tratar dos processos sintáticos de coordenação e de subordinação, sem esquecer-se de mencionar a correlação e a justaposição, traz para a tradição gramatical e para a linguística brasileira uma abordagem diferenciada no que diz respeito ao estudo das sentenças coordenadas e correlatas. Em sua abordagem inicial sobre a coordenação, Garcia (2010) já evidencia sua inquietação quanto ao acionamento de paralelismo gramatical e de simetria de ideias (paralelismo semântico)2 na estrutura dessas sentenças:

Na coordenação (...), que é um paralelismo de funções ou valores sintáticos idênticos, as orações se dizem da mesma natureza (ou categoria) e função, devem ter a mesma estrutura sintático-gramatical e se interligam por meio de conectivos chamados conjunções coordenativas. É, em essência, um processo de encadeamento de ideias. (GARCIA, 2010, p. 42)

Após tratar da função dos conectivos na construção de paralelismos nas sentenças coordenadas e afirmar que não há paralelismos gramaticais, mas, sim, uma desigualdade de funções e valores sintáticos na subordinação, Garcia (2010) retoma sua análise sobre paralelismo, dessa vez, tanto nas sentenças coordenadas quanto nas sentenças correlatas, acrescentando, ainda, os conceitos de paralelismo rítmico ou similicadência e de paralelismo semântico (sem restringir-se às sentenças coordenadas e correlatas, nesses casos), além de mencionar implicações didáticas e estilísticas para a ausência ou a ocorrência de paralelismos sintáticos no texto. Todavia, é nas sentenças coordenadas que Garcia (2010) busca força argumentativa para sua abordagem sobre paralelismo gramatical:

Se coordenação é, como vimos, um processo de encadeamento de valores sintáticos idênticos, é justo presumir que quaisquer elementos da frase – sejam orações, sejam termos dela–, coordenados entre si, devam – em princípio, pelo menos – apresentar estrutura gramatical idêntica, pois (...) não se podem coordenar frases que não comportem constituintes do mesmo tipo. Em outras palavras: a ideias similares devem

2

Entende-se por paralelismo semântico uma relação de sentido entre os termos de uma oração e suas funções na

mesma. Por exemplo, na frase Fiz duas operações: uma em São Paulo e outra no ouvido, os sintagmas preposicionais, apesar de paralelamente estruturados, não indicam circunstâncias de lugar correlatas quanto ao

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118 corresponder forma verbal similar. Isso é o que se costuma chamar paralelismo ou simetria de construção. (GARCIA, 2010, p. 52-53)

A tradição gramatical, em geral, e os linguistas aptos a descrever o português brasileiro não apresentam as mesmas preocupações de Garcia (2010) ao abordar as sentenças coordenadas e as sentenças correlatas. Em sua gramática, por exemplo, Cunha e Cintra (2008) abordam a coordenação do ponto de vista da sua constituição (apresentam conectivos (coordenadas sindéticas) ou não (coordenadas assindéticas)) e da sua classificação (aditivas, alternativas, adversativas, conclusivas, explicativas), porém nada citam a respeito de paralelismos gramaticais. Contudo, nota-se que exemplos de sentenças coordenadas apresentados pelos autores apresentam paralelismo gramatical (e semântico) estritos, conforme os exemplos: 1) A Grécia seduzia-o, mas Roma dominava-o e 2) Insisti no oferecimento da madeira, e ele estremeceu (CUNHA; CINTRA, 2008, p. 610). Nessa gramática, ainda, não é dado enfoque às orações correlatas.

Por outra parte, gramáticas que descrevem o português brasileiro, tais como a de Ataliba de Castilho (2010) e de Mário Perini (2010), não versam explicitamente sobre o princípio de paralelismo gramatical nas sentenças coordenadas e correlatas.3 Castilho (2010) discute as relações simétricas das terminações flexionais dos sintagmas nominais (substantivo e adjetivo) e do verbo com o substantivo-sujeito nas sentenças coordenadas a partir da ideia de Apolônio Díscolo, que enquadra a concordância na tipologia das sentenças: orações coordenadas concordam, oração subordinadas não concordam.4 Nesse caso, extrapola-se o conceito de concordância gramatical, restrito aos verbos e aos nomes, para as sentenças.

Quanto à correlação, Castilho (2010) debate a relação de simultaneidade e de gramaticalidade estabelecida pelos pares correlatos com os demais elementos da sentença, como os sintagmas nominais e verbais, conforme os exemplos: 1) Você ou estuda ou trabalha (...) *Você estuda trabalha; 2) Seja o aluno, seja a aluna, ambos dão duro na universidade, *O aluno a a aluna, ambos dão duro na universidade (p. 386).

Perini (2010), apesar de não mencionar a questão do paralelismo, presenteia-nos com exemplos em que o paralelismo gramatical incide não só na repetição de estruturas entre sentenças coordenadas, mas também entre sintagmas adjetivais e entre sintagmas preposicionais. São eles, respectivamente: O Camilo é pobre mas muito esforçado; Esse

3 Perini (2010) sequer aborda as sentenças correlatas, limitando-se a tratar da coordenação.

4 Alguns autores, como Castilho (2010), utilizam os termos similitude ou simetria de construções no lugar de

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119 ônibus passa em Vitória e em Guarapari e Eu vou fazer o serviço com ou sem a sua ajuda (PERINI, 2010, p. 160).

Para Garcia (2010), a ausência de paralelismo gramatical nos constituintes da sentença ou na formação de sentenças complexas, como a coordenação, pode não figurar um erro gramatical, pois, afinal, em nada afeta a concordância (verbal ou nominal), a regência e a colocação, além disso, alega que a índole da língua, muitas vezes, faz com que o paralelismo não seja necessário na sentença.

Como unidade da sintaxe, segundo Castilho (2010, p. 691), a sentença é estruturada por um verbo que se relaciona com o sujeito e seus complementos. Em outras palavras, a sentença tem como núcleo o verbo e seus argumentos – externo (sujeito) e interno (complementos). Vale ressaltar que os adjuntos, também, integram a sentença, mas não são selecionados pelo verbo. Aqui, o termo sentença equivale aos termos frase, oração e período postulados pela Gramática Tradicional (doravante, GT).

A GT, em geral e com algumas variáveis terminológicas, costuma afirmar que a sentença é constituída pelos seguintes termos sintáticos: os termos essenciais (sujeito e predicado (verbo e complemento)), os termos integrantes (complemento verbal (objeto direto e objeto indireto), complemento nominal e agente da passiva) e os termos acessórios (adjunto adverbial, adjunto adnominal e aposto). Ainda, segundo a GT, as sentenças interligam-se, em geral, em dois arranjos sintáticos universais: a coordenação e a subordinação.

De um lado, para a GT, a independência de sentido e o desempenho das mesmas funções sintáticas de certa combinação de sentenças ou de constituintes de uma sentença é o que constitui a coordenação, podendo ser sindética (com a presença de conectivos) ou assindética (devido à ausência de conectivos), como, respectivamente, nos exemplos de Cunha e Cintra (2008): “Grécia seduzia-o, mas Roma dominava-o” (p. 610) e “As horas passam, os homens caem, a poesia fica.” (p. 607). Por outro lado, a dependência de uma sentença com outra para formar sentido completo e o fato de uma sentença exercer uma função sintática (sujeito, objeto, complemento nominal, etc.) diante de outra é o que caracteriza as sentenças subordinadas, conforme o exemplo de Cunha e Cintra (2008, p. 608): Moleque Nicanor arregalou os olhos e eu pensei que ia ouvir as pancadas do seu coração – as duas primeiras sentenças são coordenadas e a sentença subordinada que ia ouvir as pancadas do seu coração funciona como objeto direto da sentença anterior.5

5 Por não ser objeto de estudo deste trabalho, não esmiuçaremos a tipologia nem o estatuto das sentenças

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Numa abordagem linguística sobre a coordenação, Mateus et al. (2003) dizem que a coordenação caracteriza-se, principalmente, por apresentar núcleos ou constituintes plenamente expandidos, sintagmas ou frases exercendo as mesmas funções sintáticas e semânticas (MATEUS et al., 2003, p. 551), ou seja, pela presença de paralelismos gramatical e semântico.

Para diferenciar a coordenação da subordinação, Mateus et al. (2003) acrescentam que, além da função sintática, as sentenças subordinadas apresentam função temática (tema, adjunto de fim, de causa, de tempo, etc.), o que não ocorre com os elementos da coordenação. Ainda, os elementos da coordenação apresentam outra diferença quanto à subordinação: ausência de mobilidade frásica e não frásica, conforme os exemplos extraídos de Mateus et al. (2003, p. 553):

(a) Eles partiram para o Algarve mas não foram de férias. (aa) *Mas não foram de férias, eles partiram para Algarve.

(b) [Poucos professores, mas muitos alunos] compareceram à reunião. (bb) *[Mas muitos alunos, poucos professores] comparecem à reunião. (c) Ele só confessou que detestava cozinhar à Maria.

(cc) Que detestava cozinhar, ele só confessou à Maria.

Como se pode ver, as duas primeiras sentenças tornam-se agramaticais quando a segunda estrutura frásica (aa) ou não frásica (bb) é posta em posição anterior à primeira, o que não ocorre com a sentença subordinada nos exemplos (c) e (cc). Mateus et al. (2003) alegam que os estudos da GT costumam manipular os dados e não considerar a conjunção da sentença coordenada como parte integrante do elemento ou da sentença que ele introduz na coordenação. Assim, em (aa) e (bb), pela GT, teríamos, respectivamente: Não foram de férias, mas partiram para Algarve e Muitos alunos, mas poucos professores foram à reunião. Ou seja, sentenças gramaticais.

Apesar de considerar a ausência de mobilidade frásica e não frásica como parte do estatuto da coordenação, Mateus et al. (2003, p. 561) consideram a sentença a seguir como coordenada: O Luís anda cansado: deita-se tarde, levanta-se cedo, trabalha demasiado! Entretanto, essa sentença coordenada apresenta bastante mobilidade entre si, apesar da alteração semântica, como em: O Luís anda cansado: trabalha demasiado, levanta-se cedo, deita-se tarde! Diferentemente ocorreria se a conjunção e fosse utilizada nessa sentença e se fizermos o teste de mobilidade sintática aplicado nas sentenças (a), (b) e (c), como em “O

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121 Luís anda cansado: deita-se tarde, levanta-se cedo e trabalha demasiado” para “O Luís anda cansado: e trabalha demasiado, levanta-se cedo, deita-se tarde”.

Segundo Mateus et al. (2003), as conjunções são o núcleo das sentenças coordenadas. Assim, de acordo com o valor semântico que expressam as conjunções, classificam as sentenças coordenadas em três classes tidas como principais: copulativas ou aditivas, disjuntivas ou alternativas e contrajuntivas ou adversativas. Para Mateus et al. (2003), as conjunções copulativas ou aditivas sujeitam o valor semântico de adição, são elas: as conjunções e e nem e os pares correlatos não só... mas também, não só... como, tanto... como. Já as conjunções disjuntivas ou alternativas sugerem uma escolha entre os elementos da coordenação, tendo a conjunção ou por excelência. Ademais, integram essa classe as conjunções correlativas ou... ou, nem... nem, ora... ora, quer... quer. Por fim, as conjunções contrajuntivas ou adversativas contrapõem semanticamente os elementos coordenados, são elas: mas, senão, porém, todavia, contudo.

Ainda, Mateus et al. (2003) classificam os nexos de coordenação de sentenças a partir de três classes de conectores: contrastivos, explicativos, conclusivos. Os conectores contrastivos caracterizam-se por contrastar dois constituintes da coordenação, são eles: porém, todavia, contudo, entretanto, no entanto. Já os conectores explicativos e conclusivos apresentam uma relação de efeito-causa e de causa-efeito, respectivamente, sendo que o primeiro constituinte produz o sentido de efeito e o segundo, de causa, quando a sentença for constituída por conectores explicativos, tais como: pois, que, porque, porquanto. Por outro lado, quando a sentença for constituída por conectores conclusivos, o sentido de causa é produzido pelo primeiro constituinte da coordenação, enquanto o segundo constituinte produz o sentido de efeito. São os conectores conclusivos: logo, pois (posposto)¸ assim, portanto, por isso, por conseguinte, por consequência.6

Neste trabalho, só consideramos como sentenças coordenadas aquelas que apresentam conjunções. As sentenças complexas coordenadas que não apresentam conjunções são consideradas sentenças justapostas. Ainda, contrariando a perspectiva teórica de Mateus et al. (2003), não trataremos como sentenças coordenadas aquelas que apresentam pares correlatos introduzindo sintagmas ou verbos nas sentenças, conforme o exemplo a seguir: Tanto a Ana quanto o Miguel compraram alguns quadros desse pintor. Tal sentença será denominada de sentença correlata.

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Por questão de autoria, mantivemos o termo conectores na análise acima. Entretanto, adotaremos o ponto de

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Contestando grande parte dos estudos da tradição gramatical, Garcia (2010) reconhece, apesar de pouco discutir sobre elas, o estatuto das sentenças justapostas e correlatas, alegando que os estudos normativos brasileiros costumam tratar esses dois processos sintáticos como variantes dos outros dois, a coordenação e a subordinação, respectivamente. Sendo assim, vejamos:

(1) As horas passam, os homens caem, a poesia fica (CUNHA E CINTRA, 2008, p. 607). (2) Tem mais samba no encontro que na espera.

Para a GT, as sentenças acima seriam assim classificadas como: (1) coordenação assindética, pois as sentenças estão empregadas uma ao lado da outra sem a utilização de conectivos, e (2) subordinação adverbial comparativa, pois considera o termo que na espera como adjunto adverbial da sentença que o precede Tem mais samba no encontro, além disso, a conjunção que estabelece um elo comparativo do termo que o sucede com termo que o antecede. Entretanto, numa perspectiva teórica que abarque os quatros mecanismos sintáticos citados acima, isto é, a coordenação, a correlação, a justaposição e a subordinação, tais sentenças seriam assim classificadas: (1) sentença justaposta e (2) sentença correlata comparativa.

A ausência de conectivos na justaposição de sentenças em (1) permite que a mobilidade dos verbos e seus argumentos nessa sentença seja maior do que nas sentenças coordenadas propriamente ditas, como, por exemplo: (1a) Os homens caem, a poesia fica, as horas passam ou (1b) Passam as horas, caem os homens, fica a poesia, mas não em *Mas Roma dominava-o, Grécia seduzia-o. Vale ressaltar que o valor semântico do texto poético em (1) é alterado quando movimentados os seus constituintes em (1a) e em (1b), entretanto, essas sentenças não se tornam agramaticais como em *Mas Roma dominava-o, Grécia seduzia-o.

A sentença (2), retirada de uma letra de música de Chico Buarque, é classificada pela GT como sentença subordinada adverbial comparativa, pois segundo a lógica gramatical o conectivo que estabelece uma comparação da sentença elidida que o sucede (tem mais samba na espera) com a sentença que o precede (Tem mais samba no encontro). Entretanto, essa explicação deixa a desejar, pois, entre outros fatores, não abarca a função do vocábulo mais no processo de construção da comparação presente na sentença. Para Castilho (2010), a sentença (2) seria classificada como sentença correlata comparativa. Correlata porque os

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conectivos mais e que são indissociáveis, estabelecendo um relacionamento simultâneo na construção sintática e semântica da sentença.

Sendo assim, este estudo adota a perspectiva teórica de que há quatro mecanismos de conexão frásica que se caracterizam por apresentar: na coordenação, relação de equivalência gramatical e semântica entre as sentenças coordenadas, o que implica em paralelismo gramatical e semântico, e a presença de conectivos impossibilitando a mobilidade frásica; na correlação, relação de simultaneidade entre os pares correlatos que influi sobre a sintaxe e a semântica da sentença e que implica em paralelismo gramatical e semântico; na justaposição, aposição de sentenças sem a presença de conectivos, o que possibilita mobilidade frásica com alteração semântica, evidentemente; e, na subordinação, relação de dependência entre sentenças.

Retomando o nosso item de estudo, analisaremos a construção de sentenças coordenadas e de sentenças correlatas a partir do princípio de paralelismo gramatical em produções textuais de estudantes de ensino médio na cidade de Brasília. Faz-se saber que nosso corpus é constituído de oito cartas formais escritas por jovens distintos, sendo que as cartas foram endereçadas à coordenação de um curso gratuito de redação para estudantes de ensino médio. Conforme o padrão, as cartas formais redigidas pelos estudantes são constituídas de cabeçalho, corpo e fecho. Porém, o que se pretende analisar nas cartas é a construção das sentenças coordenadas e correlatas a partir do princípio de paralelismo gramatical.

As cartas analisadas apresentaram um grande número de sentenças coordenadas, bem como de termos gramaticais coordenados. Os desvios estritos de paralelismo gramatical nessas sentenças são oriundos da não padronização morfológica nas sentenças, ou seja, originam-se da ausência de paralelismo morfológico, conforme os exemplos:

(1) Tal curso será de grande valia profissional, creditando-me maiores conhecimentos redacionais e literários e possibilitar-me-á uma maior probabilidade de ingresso na Universidade de Brasília.

(2) o objetivo do curso é melhorar a escrita e aprimorar produções de texto entre adolescentes (...).

O caso (1) apresenta ausência de paralelismo morfológico na flexão verbal: o primeiro verbo, no gerúndio, apresenta uma ênclise, ou seja, o pronome oblíquo átono vem após o verbo. Já o segundo verbo, no futuro, apresenta uma mesóclise, ou seja, o pronome oblíquo

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átono aparece dentro do verbo. Mantendo o paralelismo gramatical sentencial e textual, o texto pode assim ser reescrito: Tal curso será de grande valia, creditando-me maiores conhecimentos redacionais e literários e possibilitando-me ingressar na Universidade de Brasília.

No caso (2) há ausência de paralelismo gramatical sentencial devido a uma não assimilação semântica dos termos escrita e produção de textos, o que fez a autora do texto tratar esses termos como fenômenos distintos, quebrando, assim, o paralelismo sintático entre os verbos melhorar e aprimorar da sentença. Além disso, não há paralelismo morfológico entre os termos a escrita e produções de textos. A sentença (2) pode assim ser reescrita: o objetivo do curso é melhorar e aprimorar a escrita entre adolescentes ou o objetivo do curso é melhorar e aprimorar a produção de textos entre adolescentes.

Quanto aos termos gramaticais, houve um problema generalizado de paralelismo gramatical causado pela elipse de item lexical (oriunda da manifestação da fala na escrita), conforme os exemplos: (a) ter um novo ou melhor conhecimento e (b) uma importante ferramenta para a interpretação e construção de textos. Uma reescrita adequada para essas sentenças pode ser: um novo ou um melhor conhecimento e uma importante ferramenta para a interpretação e a construção de textos.

Por outro lado, percebemos que os problemas de paralelismo gramatical apresentados em algumas cartas não são fruto de uma deficiência linguística dos estudantes para a construção de sentenças coordenadas em si, mas sim de problemas que dizem respeito à lógica, à semântica e à precisão vocabular, ou seja, dizem respeito a mecanismos intelectuais e linguísticos que estão em desenvolvimento/amadurecimento na adolescência.7 Vejamos isso a partir da carta (Carta 1) de uma estudante. A Carta 1 apresentou apenas um parágrafo composto de uma coordenada explicativa com a conjunção pois e uma oração simples (em que agradece a disposição da organização do curso em ofertá-lo gratuitamente). Vejamos a sentença coordenada: O motivo pelo qual venho inserir minha solicitação de uma vaga no curso (...) é de suma importância, pois é sempre bom ter um novo ou melhor conhecimento sobre o que mais nos implica no futuro.

Nota-se que a estudante optou por introduzir a coordenada explicativa com a conjunção pois, o que corrobora a argumentação de Mateus et al. (2003) quando alegam que a conjunção pois introduz o sentido de causa, ou seja, a causa pela qual se solicita a participação no curso é a de que o curso trata de um conhecimento que tem efeitos positivos

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em toda a vida (presente e futura) da requerente. Entretanto, a desnecessária locução verbal (venho inserir), a elipse de um artigo indefinido antes do vocábulo melhor e o trecho mal elaborado conhecimento sobre o que mais nos implica no futuro revelam a imaturidade da estudante em organizar linguisticamente suas ideias e sua argumentação. Uma reescrita adequada da sentença acima, mantendo os padrões de escrita da estudante, pode ser: O motivo pelo qual solicito uma vaga no curso (...) é de suma importância, pois é sempre bom ter um novo ou um melhor conhecimento sobre algo que tanto influencia em nosso futuro.

Outro exemplo de que a ausência de paralelismo gramatical (e semântico) causada pela imaturidade intelectual e linguística dos estudantes está nessa sentença em que há coordenação entre sintagmas preposicionais: Os motivos que me levam a pedir-lhe isso advêm dos resultados de minha autoavaliação e daquela feita por meus amigos e parentes sobre minhas habilidades em redação. Uma reescrita menos confusa dessa sentença pode ser: Os motivos da minha solicitação advêm dos resultados de avaliações feitas por mim e por meus amigos e parentes sobre minhas habilidades em redação.

As cartas, em sua maioria, apresentaram apenas duas variantes da coordenação: a coordenação aditiva e a coordenação explicativa, o que é plausível, pois apenas esses tipos de coordenação, além, talvez, da coordenação conclusiva, poderiam auxiliar os estudantes na argumentação da carta. Ressalta-se que nos dois tipos de coordenação (aditiva e explicativa) foram utilizadas apenas as conjunções e e pois, respectivamente.

Garcia (2009) alega que a conclusão dos textos argumentativos devem ser com partículas típicas de uma conclusão, como as conjunções conclusivas logo e portanto. Entretanto, devido o pequeno tamanho das cartas formais e o fato de elas exigirem uma justificativa (e não uma conclusão especificamente) para a concessão de uma vaga no curso, torna-se pouco necessária a utilização de coordenadas conclusivas, pois não há a necessidade de expor evidências (dados, exemplos, testemunhos e ilustrações) para, por fim, concluir-se algo sobre o que foi evidenciado, conforme explica Garcia (2009).

Inusitadamente, um estudante utilizou uma coordenada conclusiva em seu texto. Vejamos trechos que elucidam o feito do aluno: O neoliberalismo, nova ideologia adotada pelo mundo, exige cada vez mais mão de obra altamente qualificada (...) Antigamente se uma pessoa tinha um diploma de nível superior (...) a possibilidade de entrar no mercado de trabalho era grande, hoje (...) é necessário (...) uma pós-graduação, um mestrado (...) Portanto, solicito uma vaga (...).

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argumentar a favor de seu ingresso no curso pretendido. Entretanto, esse exemplo serve-nos para mostrar que a maioria dos estudantes preferiu ser mais direta em suas cartas, apresentando, inicialmente, coordenadas aditivas (para adicionar informações, ideais e opiniões) e, por fim, coordenadas explicativas (para justificar os motivos para obter uma vaga no curso), conforme a carta de um estudante: Fui aconselhado por eles a exercitar-me nesta faculdade (da escrita), buscando produzir mais textos e estando mais atento aos meus erros de escrita. (...) serei grandemente ajudado se obter uma vaga, pois preciso saber produzir bons textos tanto para o vestibular quanto para a carreira que pretendo seguir (...).

Por seu turno, a correlação apareceu, principalmente, nas formas com o par correlato tanto... quanto e com o par correlato tanto... como. Essas duas formas apresentaram o mesmo valor semântico e sintático, bem como concorreram entre si, o que pode ser observado em uma das cartas em que o aluno risca o correlato como e o substitui pelo correlato quanto: (...) me providenciará tanto um ambiente propício para a prática da escrita de textos como quanto os devidos conhecimentos e ferramentas de que poderei dispor para tal. Ademais, houve correlação apenas com os pares ou... ou, utilizado para a alternância de sintagmas e de ideias.

A quebra de paralelismo gramatical apresentada em um dos termos correlatos foi causada pela desnecessária utilização de uma vírgula para separar os pares correlatos e os sintagmas nominais que eles introduzem: (...) grande importância da escrita em nossa vida, tanto cotidiana como profissional, (...). Assim, podemos, também, alegar que o desconhecimento das regras de pontuação da língua portuguesa gera a quebra de paralelismo gramatical tanto na correlação como na coordenação, de acordo com o exemplo: Pretendo desenvolver o máximo possível, dentro do que for empregado aos alunos. A fim de agregar e otimizar o conteúdo passado.

Em suma, os problemas apontados neste breve estudo quanto à ausência de paralelismo gramatical e, consequentemente, desvios na construção de sentenças coordenadas e de sentenças correlatas pelos estudantes de ensino médio são:

a) a ausência de paralelismo (morfológico) nas terminações flexionais dos sintagmas nominais (substantivos e adjetivos) e dos sintagmas verbais;

b) a manifestação de aspectos da fala, como a omissão e a elipse de certos termos gramaticais (artigos e preposições, principalmente), na escrita;

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c) a dificuldade e a imaturidade intelectual e linguística dos alunos em organizar, na escrita, suas ideias;

d) e, finalizando, o desconhecimento das regras de pontuação da língua portuguesa.

Considerações Finais

A partir do que foi exposto em nosso estudo, podemos concluir que certas afirmações do senso comum de que a má escrita de estudantes de ensino médio provém do desconhecimento das construções sintáticas básicas, como a coordenação e a correlação, de sua língua estão equivocadas, pois o que evidenciamos é que a falta de técnica para a produção de textos demonstrada pela excessiva manifestação da fala na escrita e a imaturidade linguística e intelectual dos estudantes são o fatores que implicam na má elaboração e construção escrita de sentenças e, consequentemente, do texto por parte desses estudantes.

A imaturidade linguística e intelectual desses estudantes nada têm a ver com seus processos de desenvolvimento mental (cerebral) e físico, mas, sim, com uma imaturidade relacionada às poucas experiências de vida e ao reduzido desempenho (por falta de leitura e estudo) de suas competências linguísticas e intelectuais.

Sendo assim, afirmamos que o ensino de língua portuguesa nas escolas não tem priorizado desenvolver as habilidades linguísticas dos estudantes. O que se supõe que aconteça é que os alunos continuam expostos a incontáveis listas de exercício de reconhecimento e classificação de estruturas sintáticas já internalizadas em suas mentes. Entretanto, esquece-se que uma boa construção de sentenças, além do reconhecimento e da classificação dessas sentenças, ocorre também quando a argumentação e o estabelecimento de relações e de ideias lógicas estiverem bem estruturados.

Finalizando, ressaltamos que o princípio de paralelismo gramatical sentencial é uma excelente ferramenta para o ensino e o aprendizado das estruturas sintáticas de nossa língua, contribuindo para o desenvolvimento de uma escrita mais concisa e objetiva.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ADAM, Jean-Michel. A linguística textual: introdução à análise textual dos discursos. São Paulo, Cortez: 2008.

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CASTILHO, Ataliba Teixeira de. Nova gramática do português brasileiro. São Paulo, Editora Contexto: 2010.

CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro, Lexicon: 2008.

GARCIA, Othon Moacir. Comunicação em prosa moderna. Rio de Janeiro, Editora FGV: 2010.

MATEUS, H. M. M. et al. Gramática da língua portuguesa. Lisboa: Caminho, 2003.

PERINI, Mario Alberto. Gramática do português brasileiro. São Paulo, Parábola Editorial: 2010.

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