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Águas subterrâneas transfronteiriças: o caso do Aquífero Guarani frente às relações internacionais

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Academic year: 2021

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FERNANDA FINK SCHAPPO

ÁGUAS SUBTERRÂNEAS TRANSFRONTEIRIÇAS:

O CASO DO AQUÍFERO GUARANI FRENTE ÀS RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Florianópolis 2018

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FERNANDA FINK SCHAPPO

ÁGUAS SUBTERRÂNEAS TRANSFRONTEIRIÇAS:

O CASO DO AQUÍFERO GUARANI FRENTE ÀS RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Projeto de Pesquisa apresentado ao Curso de Relações Internacionais, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel.

Orientador: Prof. Rafael de Miranda Santos, Dr.

Florianópolis 2018

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FERNANDA FINK SCHAPPO

ÁGUAS SUBTERRÂNEAS TRANSFRONTEIRIÇAS:

O CASO DO AQUÍFERO GUARANI FRENTE ÀS RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel de Relações Internacionais e aprovado em sua forma final pelo Curso de Relações Internacionais da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Florianópolis, 8 de novembro de 2018.

______________________________________________________ Professor e orientador Rafael de Miranda Santos, Dr.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Silvano Denega Souza, Ms.

Universidade Federal de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. José Baltazar Salgueirinho Osório de Andrade Guerra, Dr.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Ricardo Neumann, Dr.

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Dedico esse trabalho aos meus pais, por seu apoio e amor incondicional.

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Walter Schappo e Carla Fink. Por sempre me apoiarem com muito amor e compreensão, obrigado por todas as oportunidades e incentivos que vocês me proporcionam. Sou grata a vocês por tudo em minha vida.

Aos meus pais de coração, Pietro Zunino e Carla Bohn. Obrigado por terem me acolhido com tanto carinho, pelas orientações acadêmicas e pelo tempo, que tanto aprecio, que passamos juntos.

Aos meus irmãos, Pedro Fink Schappo e Bernardo Schappo. Alguém tinha que terminar a faculdade, né. Amo vocês, obrigado por sempre cuidarem de mim.

À minha companheira, Gabriela Correa Cardoso. Sou grata por todo o carinho, respeito, compreensão e felicidade que vivemos todos os dias, mesmo com prazos e provas. Amo crescer ao seu lado.

À minha cunhada, Janaína Kremer da Rocha. Obrigada por ser essa mulher forte e sensível, um exemplo para mim. Obrigada por colocar o Conrado e a Maia em nossas vidas.

Aos amigos que fiz durante a faculdade e estágio, obrigada por compartilharem seus conhecimentos, risadas e conselhos. Os últimos quatro anos foram únicos.

Ao meu orientador, prof. Dr. Rafael de Miranda Santos. Pelos ensinamentos desde a sala de aula até o desenvolvimento deste trabalho. Obrigada pelas correções, pelo seu tempo, pela paciência e confiança. Serei sempre grata.

Ao componente de minha banca, prof. Ms. Silvano Denega Souza. Muito obrigada pela disponibilidade e interesse de contribuir para o meu desenvolvimento acadêmico.

Ao componente de minha banca, prof. Dr. José Baltazar Salgueirinho Osório de Andrade Guerra. Obrigada pelo exemplo de ser um ótimo professor, por me abrir as portas do GREENS e estar desde o primeiro semestre incentivando seus alunos a prestar atenção aos tantos problemas ambientais do mundo.

Ao componente de minha banca, prof. Dr. Ricardo Neumann. Obrigada pelas ótimas aulas e, principalmente, pelas recomendações sobre o trabalho, que fizeram toda a diferença.

Aos meus professores e coordenadora de curso, Silvia Bach. Que fizeram parte da minha formação tanto acadêmica, como pessoal.

E finalmente, à Universidade do Sul de Santa Catarina e funcionários da instituição. Obrigada pela oportunidade de aprender.

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“A água de boa qualidade é como a saúde ou a liberdade: só tem valor quando acaba.” João Guimarães Rosa.

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RESUMO

O presente trabalho consiste em identificar os interesses da ONU e do Mercosul em proteger os recursos hídricos subterrâneos. O objetivo geral é identificar o (s) objetivo (s) da ONU e do Mercosul em proteger os recursos hídricos subterrâneos e o impacto na gestão brasileira do Aquífero Guarani, abordando primeiramente o conceito de soberania, cooperação e interdependência, bem como o papel das organizações internacionais e o processo de integração regional. Posteriormente, são apresentadas as características geológicas do Aquífero Guarani e o Acordo sobre o Aquífero Guarani, afim de demonstrar a sua importância como recurso nacional e internacional, em seguida, foi analisada a resolução 63/124 da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre o Direito dos Aquíferos Transfronteiriços e enfim a legislação brasileira sobre recursos hídricos foi examinada para compreender a relevância das águas subterrâneas destro dessa. Quanto à forma de abordagem esta é uma pesquisa qualitativa. O método de procedimento foi bibliográfico e documental, o embasamento teórico foi fundamentado nos conceitos trazidos pelos autores que abordam o tema em artigos, periódicos, teses, dissertações e livros, além da análise a partir de fontes primárias, como documentos oficiais e relatórios da ONU e de suas agências, do Mercosul e órgãos do governo brasileiro, como a ANA, o MMA e o CPRM. Concluiu-se que ao assinar o acordo sobre o Aquífero Guarani o Mercosul tinha como prioridade estabelecer a soberania dos Estados (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) sobre a sua parte territorial do aquífero; enquanto a ONU incentivou o interesse dos Estados sobre seus recursos subterrâneos e a buscar a cooperação internacional, visando a preservação dos aquíferos transfronteiriços.

Palavras-chave: Aquífero Guarani. Água subterrânea. Mercosul. ONU. Aquífero Transfronteiriço.

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ABSTRACT

The present work consists of identifying the interests of the UN and Mercosul in protecting groundwater resources. The general objective is to identify the objective (s) of the UN and Mercosul to protect groundwater resources and the impact on Brazilian management of the Guarani Aquifer, first addressing the concept of sovereignty, cooperation and interdependence, as well as the role of international organizations and the process of regional integration. Subsequently, the geological characteristics of the Guarani Aquifer and the Guarani Aquifer Agreement are presented, in order to demonstrate their importance as a national and international resource, afterwards the General Assembly resolution 63/124 on the Law of the Transboundary Aquifers was analysed and finally the Brazilian legislation on water resources was examined to understand the relevance of groundwater in it. As for the way of approach this is a qualitative research. The method of procedure was bibliographical and documentary, the theoretical basis was based on the concepts brought by the authors that approach the subject in articles, periodicals, theses, dissertations and books, besides the analysis from primary sources, like official documents and reports from UN and its agencies, Mercosul and Brazilian government agencies such as ANA, MMA and CPRM. It was concluded that when signing the agreement on the Guarani Aquifer the Mercosul had as priority to establish the sovereignty of the States (Argentina, Brazil, Paraguay and Uruguay) on its territorial part of the aquifer; while the UN encouraged the interest of States in their underground resources and to seek international cooperation, aiming at the preservation of transboundary aquifers.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Mapa 1 – Zonas de Gestão do SAG ... 40

Mapa 2 – Temperatura e Tempo de Residência das Águas do SAG ... 43

Mapa 3 – Evolução do Uso do Solo nas Áreas de Recarga ... 45

Mapa 4 - Distribuição Das 374 Estações De Monitoramento Por Aquífero Na Rimas ... 83

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LISTA DE ABREVIATURAS

AAG – Acordo Aquífero Guarani

AGNU – Assembleia Geral das Nações Unidas ANA – Agência Nacional de Águas

BGR – Bundesanstalt für Geowissenschaften und Rohstoffe BM – Banco Mundial

CDI – Comissão de Direito Internacional

CNRH – Conselho Nacional de Recursos Hídricos CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente CPRM - Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais

FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura FMI – Fundo Monetário Internacional

GEF – Global Environmental Fund

GW-MATE – Groundwater Management Advisory Team IAEA – Agência Internacional de Energia Atômica

IGRAC - International Groundwater Resources Assessment Centre IHP – Programa Hidrológico Internacional

ISARM – Internationally Shared Aquifer Resources Management MERCOSUL - Mercado Comum do Sul

MMA – Ministério do Meio Ambiente NBS – Nature Based Solutions

OEA – Organização dos Estados Americanos OI – Organização Intergovernamental

OMC – Organização Mundial do Comércio ONU – Organização das Nações Unidas PEA – Plano Estratégico de Ação PEB – Política Externa Brasileira

PNRH – Política Nacional de Recursos Hídricos

PSAG – Projeto de Proteção Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Sistema Aquífero

Guarani

RIMAS – Rede Integrada de Monitoramento de Águas Subterrâneas RS – Rio Grande do Sul

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SAG – Sistema Aquífero Guarani

SIAGAS – Sistema de Informações de Águas Subterrâneas

SINGREH – Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos SNIRH – Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura WMO – World Meteorological Organization

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 14

2 A SOBERANIA, A COOPERAÇÃO E A INTERDEPENDÊNCIA, AS ORGANIZAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS E A INTEGRAÇÃO REGIONAL .. 21

2.1 SOBERANIA ... 21

2.2 COOPERAÇÃO E INTERDEPENDÊNCIA ... 23

2.2.1 Cooperação e Soberania ... 25

2.3 ORGANIZAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS ... 26

2.3.1 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU ... 28

2.4 INTEGRAÇÃO REGIONAL ... 34

2.4.1 Mercosul e a Integração Ambiental Hídrica do Bloco ... 34

3 AQUÍFERO GUARANI ... 37

3.1 FORMAÇÃO DO AQUÍFERO ... 37

3.1.1 Características Hidrogeológicas do SAG ... 38

3.1.2 Características hidrológicas do SAG ... 42

3.2 O USO DO SAG ... 43

3.3 O PROJETO PROTEÇÃO AMBIENTAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO SISTEMA AQUÍFERO GUARANI – PSAG ... 46

3.4 ACORDO AQUÍFERO GUARANI – AAG ... 48

3.4.1 A afirmação explícita do princípio Soberano e a gestão ... 49

3.4.2 A responsabilidade de uso do SAG e a obrigação de não causar danos ... 49

3.4.3 O conhecimento técnico e a Gestão ... 50

3.4.4 Solução de controvérsias do AAG ... 51

3.5 A RATIFICAÇÃO DO ACORDO AQUÍFERO GUARANI ... 53

4 A ATUAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS COM AS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS ... 57

4.1 A RESOLUÇÃO 1803 (XVII) DA ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS 57 4.2 A RESOLUÇÃO 63/124 DA ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE O DIREITO DOS AQUÍFEROS TRANSFRONTEIRIÇOS ... 59

4.2.1 Direito dos Aquíferos Transfronteiriços ... 60

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4.3 A ONU E OS AQUÍFEROS TRANSFRONTEIRIÇOS APÓS A RESOLUÇÃO 63/124 DA AGNU ... 70

4.3.1 O Relatório de Desenvolvimento da Água das Nações Unidas de 2009 – A água em um Mundo em Mudanças ... 70 4.3.2 O Relatório de Desenvolvimento da Água das Nações Unidas de 2012 – A Gestão da Água sob Risco e Incerteza ... 71 4.3.3 O Relatório de Desenvolvimento da Água das Nações Unidas de 2015 – A Água pelo mundo sustentável ... 72 4.3.4 O Relatório de Desenvolvimento da Água das Nações Unidas de 2016 – Água e Trabalho ... 72 4.3.5 Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial da Água das Nações Unidas 2017 – Águas Residuais - o Recurso não Utilizado ... 73 4.3.6 O Relatório de Desenvolvimento da Água das Nações Unidas de 2018 – Soluções Baseadas na Natureza Para a Água ... 74 4.3.7 Década Internacional para a Ação: Água para o Desenvolvimento Sustentável (2018-2028) ... 74 5 A LEGISLAÇÃO NACIONAL BRASILEIRA PARA ÁGUAS SUBTERRÂNEAS. 77

5.1 AS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS: DOMÍNIO E COMPETÊNCIA ... 78

5.2 A POLÍTICA NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS (PNRH) E AS ÁGUAS

SUBTERRÂNEAS ... 80

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 89 REFERÊNCIAS ... 93

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1 INTRODUÇÃO

Os objetivos da Organização das Nações Unidas (ONU) e do Mercosul em proteger os recursos hídricos subterrâneos e o impacto na gestão brasileira do Aquífero Guarani constituem as discussões centrais do presente trabalho. Neste capítulo serão expostos o tema e a problematização, seguido do objetivo geral e específicos, por fim será apresentada a justificativa da autora para pesquisar o assunto e a metodologia utilizada para desenvolver o trabalho.

É de conhecimento popular que a água é fonte de vida e indispensável à sobrevivência, porém, para consumo e produção, o ser humano precisa que ela seja doce, e nesta condição, encontra-se apenas 2,53% da água disponível no mundo. Desta água doce, 68.7% está congelada em geleiras – não disponível para uso –, em torno de 1.2% é água superficial distribuída nos lagos, rios e pântanos, e todo o restante, 30.1%, são águas subterrâneas (UNESCO, 2003). Esta água subterrânea correndo abaixo do solo, preenchendo poros e fraturas, formam os reservatórios de águas conhecidos como aquíferos (REBOUÇAS; BRAGA; TUNDISI, 1999). De acordo com o glossário internacional de hidrologia da WMO e UNESCO (2012), a água subterrânea é a “água que ocupa a zona saturada do subsolo”, enquanto um aquífero trata-se de “formação permeável com capacidade de armazenar quantidades apreciáveis de água”. Souza (2009) afirma que existem diferentes tipos de reservatórios subterrâneos, mas é apenas dos aquíferos que se pode extrair água.

O potencial da reserva de água potável concentrada nos aquíferos ainda não foi totalmente reconhecido pelos Estados (UNESCO; WATER, 2018). Com a crescente escassez e contaminação das águas superficiais, os Estados e a população tem recorrido cada vez mais à mineração de águas subterrâneas (BRZEZINSKI, 2011). As formações geológicas dos aquíferos podem ser extremamente complexas e as águas que neles percorrem, abaixo dos subsolos dos Estados, não estão submetidas às fronteiras destes. Existe no mundo cerca de 274 aquíferos transfronteiriços, ou seja, compartilhados por dois ou mais Estados, como é o caso do Aquífero Guarani – um sistema de aquíferos interligados entre a Argentina, o Brasil, o Paraguai e o Uruguai (CONICELLI, 2008). A demonstração do percentual de água doce subterrânea existente e a constatação que muitos aquíferos são transfronteiriços explana a importância de estabelecer relações entre os Estados e a comunidade internacional sobre o uso deste recurso hídrico. Conforme Pillar (2016), o compartilhamento de um recurso natural e a falta de conhecimento e dificuldades para gestão de um recurso oculto em baixo da terra podem servir de impulso para promover a cooperação internacional.

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Os problemas de escassez da água já existentes, bem como os receios de que novas fontes possam ser comprometidas em função de impactos das atividades humanas trazem ainda mais urgência para o debate internacional sobre o tema, visto que a utilização da água subterrânea sem a gestão adequada pode resultar, também, em escassez e contaminação dos aquíferos (BRZEZINSKI, 2011). Nota-se cada vez mais a presença das organizações internacionais governamentais na discussão sobre a escassez e preservação da água, como a UNESCO, o Banco Mundial, entre outras; seus relatórios promovem resoluções para gestões sustentáveis dos recursos hídricos e propõe a cooperação entre os Estados, paralelamente, nos poucos tratados bilaterais e multilaterais assinados sobre a gestão compartilhada de aquíferos transfronteiriços percebe-se a recorrente menção da Soberania Estatal no contexto do direito soberano sobre os recursos naturais (BRZEZINSKI, 2011).

A partir de 1996, quando começaram a estudar o Sistema Aquífero Guarani (SAG), este recebeu certa fama como a principal reserva de água doce no mundo – posteriormente superada pela capacidade de outros aquíferos – e chamou a atenção da comunidade internacional devido a sua potencialidade de abastecer a humanidade com água potável, resultando na inserção do aquífero nos debates internacionais. O Acordo sobre o Aquífero Guarani foi assinado pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, no dia 2 de agosto de 2010, mas apenas entrou em vigor em 2018, com o Paraguai ratificando-o. Ele foi elaborado após um estudo que durou de 2004 até 2009, com a participação de pesquisadores, técnicos e representantes das quatro nacionalidades. O estudo, chamado de Proteção Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Sistema Aquífero Guarani, foi financiado pelo Fundo Global para o meio Ambiente, projeto do Bando Mundial, e coordenado pela OEA (BRZEZINSKI, 2011; SINDICO, 2017; MERCOSUL, 2010).

O acordo menciona e baseia-se na resolução 63/124 da Assembleia‐Geral das Nações Unidas sobre o Direito dos Aquíferos Transfronteiriços, na Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, Estocolmo, 1972; na Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1992; na Cúpula sobre Desenvolvimento Sustentável nas Américas, de Santa Cruz de a Sierra, 1996; nas conclusões da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável de Joanesburgo, 2002; no Tratado da Bacia do Prata, firmado em Brasília, 1969 e no Acordo‐Quadro sobre Meio Ambiente do MERCOSUL, firmado em Assunção, 2001. (MERCOSUL, 2010).

O objetivo geral do acordo é a preservação do SAG, mas também garantir a soberania de cada país sobre a região nacional abrangida pelo Aquífero. Isto indica que apesar

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da concordância em proteger o aquífero, a sua governança não é completamente compartilhada entre os Estados. (CORTE, 2015). Noschang (2017) realça que afim de ter uma gestão sustentável e eficiente da água subterrânea os Estados devem cooperar em todos os âmbitos. Pateiro (2016) complementa alegando que se deve haver responsabilidades compartilhadas por danos ambientais que podem vir a ocorrer.

O Brasil, possuindo a maior parte do SAG deve estar atento aos danos ambientais que causar, visto que o fluxo da água, ainda desconhecida na maior parte do SAG, pode espalhar as consequências ambientais para os demais Estados (CASSUTO, 2013). Viegas (2005) destaca a possibilidade de contaminação dos aquíferos a partir da infiltração do solo por ´lixões´ irregulares, vazamento sanitários, rejeitos das indústrias, entre outros.

O acordo demonstra progresso quanto a integração regional sobre questões ambientais e avanço internacional sobre o tema, porém ainda apresenta falhas e questões vagas, precisando ser melhor discutido. Um aspecto que deve ser trabalhado é buscar o envolvimento da sociedade civil e manter o gerenciamento de uso e exploração do aquífero de modo contínuo. (GERENT, 2016; CASSUTO, 2013).

É urgente que haja um verdadeiro comprometimento dos Estados para preservação dos recursos hídricos subterrâneos. Apesar de existir uma iniciativa com tratados e convenções internacionais específicos para aquíferos transfronteriços, gerando jurisprudência frente ao direito internacional, ainda não há segurança sobre quais seriam os parâmetros internacionais sobre os recursos transfronteiriços que garantem a oferta de água para todos e ofereçam meios para resolução de conflitos entre os Estados sobre o tema específico (BRZEZINSKI, 2011).

Os diversos interesses econômicos, sociais, geopolíticos, entre outros tornaram a disputa por recursos naturais mais evidente num cenário onde a água é cada vez mais escassa; trazendo, então, o debate sobre qual é a função das organizações internacionais no âmbito das águas transfronteiriças, e, no caso, subterrâneas.

Em contrapartida percebe-se que os Estados procuram firmar seu direito pela soberania em relação aos seus recursos naturais, buscando a manutenção da segurança hídrica, mesmo em contextos em que aceitam a integração regional, como é o caso do Aquífero Guarani. Frente a um cenário onde a água doce dos aquíferos transfronteiriços revela-se essencial para garantir a oferta de água potável no mundo e a crescente participação das organizações internacionais em trabalhar junto aos Estados para estabelecer normas comuns e eficazes para a preservação deste recurso finito, o trabalho de conclusão de curso apresenta, portanto, a seguinte problematização: Quais são os interesses centrais que levaram a ONU a desenvolver

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uma resolução sobre aquíferos transfronteiriços e o Brasil a assinar o acordo transfronteiriço do Aquífero Guarani?

Com base no problema de pesquisa, o trabalho tem como objetivo geral identificar os objetivos da ONU e do Mercosul em proteger os recursos hídricos subterrâneos e o seu impacto na gestão brasileira do Aquífero Guarani. Para tanto, têm-se como objetivos específicos: Entender a importância internacional e nacional do Aquífero e sua complexidade geológica; Analisar os tratados sobre aquíferos na ONU e no Mercosul e; Explorar a política nacional brasileira para gestão de águas subterrâneas e compreender se está de acordo com os termos do Acordo sobre o Guarani e com os princípios internacionais para gestão das águas subterrâneas.

Justifica-se a pesquisa pela necessidade dos Estados compreenderem a sua responsabilidade em preservar os recursos naturais. Visto que o meio ambiente está interligado, quando Estados compartilham recursos também acabam compartilhando as consequências de seus atos sobre a natureza. O conflito transfronteiriço por água ocorre muitas vezes devido à escassez desta numa região, no caso do Aquífero Guarani, um potencial conflito foi evitado pelo interesse comum dos Estados que compartilham o Guarani em preservar este enorme reservatório de água doce dentro de seu espaço soberano trazendo a cooperação e integração regional. Estes princípios deveriam servir de molde para Estados que se encontram na mesma situação hidrográfica.

A relevância para o Brasil sobre o assunto é extensa, pois o país compartilha onze aquíferos transfronteiriços. O Sistema Aquífero Guarani (SAG) é o segundo maior aquífero do Brasil, estando entre os maiores do mundo, a sua área é de aproximadamente 1.195.000 Km², abrangendo o Brasil (840.000 Km²), Paraguai (71.700 km2), Argentina (225.500 km²) e o Uruguai (58.500 km²) (CONICELLI, 2008). Portanto, é um aquífero transfronteiriço, e sua maior parte encontra-se em território brasileiro, o que também resulta em maior responsabilidade; as leis, planos e políticas adotadas possuem um grande impacto no sistema Guarani, no meio ambiente e oferta de água na região (CASSUTO, 2013).

Contudo, ao participar do 8º Fórum Mundial da Água, em Brasília, 2018, a autora percebeu que apesar dos esforços de alguns pesquisadores, geólogos e autoridades de ressaltar a importância da água dos aquíferos; a comunidade internacional que lá estava presente ainda não destaca o tema como deveria. A pauta de discussões focou no compartilhamento da água, porém, águas superficiais; que também precisam de atenção, mas não serão encarregadas pelo futuro abastecimento da grande parcela da população mundial. A presença de empresas privadas, como Coca Cola e Nestlé no evento também chamou a atenção, principalmente em

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relação a interação nos painéis entre OIs e o setor privado. Num mundo globalizado, o diálogo entre os mais diversos atores do sistema internacional pode ser interessante para o desenvolvimento, contudo, deve-se questionar os interesses de todas as partes. Portanto, o objeto de pesquisa foi influenciado pela necessidade de mais debates recentes sobre aquíferos transfronteiriços e a participação da comunidade internacional.

Como parte do Aquífero Guarani está localizado em Santa Catarina, o interesse de pesquisar um assunto tão atual que envolve além do âmbito internacional, a região de origem da autora acabou também influenciando. Poder trazer a perspectiva das relações internacionais para um tema regional, ampliando o conhecimento e a conscientização sobre a importância do Guarani é de extrema importância, pois a hibridez do tema envolvendo relações internacionais, direito ambiental internacional, geologia e hidrologia é inevitável; afim de compreender corretamente o assunto, podendo contribuir para o complemento dos estudos sobre o Aquífero, e se possível, colaborar na implementação das políticas mais adequadas.

A urgência de mudanças no cenário ambiental, faz com que os Estados participem mais intensamente em busca de soluções e que os temas sejam cada vez mais precisos. Analisando relatórios de organizações internacionais, e verificando a base de dados de atas da ONU e suas agencias, as águas subterrâneas - aquíferos - ainda são pouco explorados pelos debates internacionais, os centros de pesquisa e, pode-se mencionar, o interesse popular; contudo, por representarem o maior reservatório de água potável no mundo, aquíferos devem ganhar cada vez mais destaque com o decorrer do tempo, portanto, preserva-los é essencial para a manutenção do ecossistema mundial, e para o Brasil, lutar para a preservação dos aquíferos implica preservar o próprio patrimônio natural, soberania e segurança hídrica.

Para realizar o trabalho de conclusão de curso foram utilizadas as metodologias adequadas para melhor estrutura-lo e desenvolve-lo. Segundo Gil (2009) e Matias-Pereira (2016), o objetivo da pesquisa é descobrir respostas aos problemas propostos e isto será alcançado com a aplicação de procedimentos científicos. Estes procedimentos são sistemáticos e baseados no raciocínio lógico. A metodologia, então, examina os métodos utilizados na pesquisa, conduzindo o pensamento do autor e os procedimentos que foram utilizados na estruturação do trabalho (BARROS, 2007; LIMA; MIOTO, 2007; MARCONI; LAKATOS, 2010). A fim de desenvolver a pesquisa, a metodologia praticada neste trabalho será descrita a seguir, quanto à sua aplicabilidade, a forma de abordagem, os objetivos e os procedimentos.

A atual pesquisa classifica-se como básica quanto a aplicabilidade. Gil (2009) expõe que “a pesquisa pura busca o progresso da ciência, procura desenvolver os conhecimentos científicos sem a preocupação direta com suas aplicações e consequências

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práticas.”. Flick (2012) menciona que a pesquisa básica procura a “satisfação do desejo de adquirir conhecimento”. No caso, a discussão sobre os objetivos das organizações internacionais em proteger os recursos hídricos subterrâneos e o seu impacto na gestão brasileira do Aquífero Guarani busca primordialmente gerar novos conhecimentos sobre o tema, sem aspirar qualquer aplicação prática.

Quanto à forma de abordagem esta é uma pesquisa qualitativa. Flick (2012) afirma que o problema é relatado de maneira mais aberta, assim como a coleta de dados “tem como objetivo um quadro abrangente possibilitado pela reconstrução do caso que está sendo estudado”. Matias-Pereira (2016) também menciona que as informações coletadas não podem ser quantificáveis, portanto são analisados de forma indutiva. Desta forma que o problema do trabalhado será estudado.

Quanto aos objetivos, além de descrever o cenário que será estudado no trabalho, também se buscará entender os fatores que contribuem para a ocorrência do fenômeno, portanto é um trabalho explicativo. Gil (2009) descreve que a pesquisa explicativa “tem como preocupação central identificar os fatores que determinam ou que contribuem para a ocorrência dos fenômenos (...) aprofunda o conhecimento da realidade, porque explica a razão, o porquê das coisas”.

Quanto aos procedimentos, a pesquisa pode ser desenvolvida a partir de material já́ elaborado, constituído de livros, artigos científicos, teses e dissertações, manuais, normas técnicas, revisões, trabalhos de congressos, índices e bibliografias, meios audiovisuais; caracterizando-se como uma pesquisa bibliográfica (GIL, 2009; MATIAS-PEREIRA, 2016). Este trabalho usará a revisão bibliográfica como um dos procedimentos.

A pesquisa documental é similar à pesquisa bibliográfica, mas a natureza de suas fontes é diferente, visto que existem documentos que não receberam tratamento analítico, como: documentos oficiais, reportagens de jornal, cartas, contratos, diários, filmes, fotografias, gravações; e outros que de alguma forma já foram analisados: relatórios de pesquisa, relatórios de empresas, tabelas estatísticas, etc (GIL, 2009). A pesquisa documental também será aplicada no trabalho, principalmente na utilização de documentos oficiais como as Resoluções da ONU, O Acordo sobre o Aquífero Guarani, relatórios de Organizações Internacionais e demais resoluções de convenções internacionais sobre o meio ambiente e a água.

Também pode-se destacar o estudo de caso como procedimento para o trabalho. Yin (2015) relata que “(...) seja qual for o campo de interesse, a necessidade diferenciada da pesquisa de estudo de caso surge do desejo de entender fenômenos sociais complexos. Em resumo, um estudo de caso permite que os investigadores foquem um “caso” e retenham uma

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perspectiva holística e do mundo real”. Também deve-se reconhecer que o estudo de caso investiga um fenômeno contemporâneo, podendo considerar condicionamentos históricos, contudo o caso deve ser relevante para o momento em que se pesquisa. (GIL, 2009; FLICK, 2012).

Este trabalho de conclusão de curso possui cinco capítulos. O presente capítulo introduz o assunto abordado pelo trabalho, delimitando os objetivos que serão desenvolvidos nos capítulos seguintes e justificando as razões que levaram ao estudo do tema; por fim buscou-se aprebuscou-sentar os procedimentos metodológicos utilizados no trabalho.

O segundo capítulo apresenta os conceitos necessários para compreender o problema exposto na pesquisa e poder fundamentar as conclusões finais deste trabalho. Ele expõe o conceito de Soberania, Cooperação e Interdependência. Também evidencia o conceito e atuação das Organizações Intergovernamentais, com foco nas Nações Unidas e posteriormente irá introduzir o conceito de integração regional no âmbito do Mercosul.

No terceiro capítulo, o trabalho busca explicar o que é o Aquífero Guarani em relação às suas características geológicas e hidrológicas, com o objetivo de demonstrar a sua importância para a segurança hídrica nacional e regional, e analisar o Acordo sobre o Aquífero Guarani.

No quarto capítulo, é revisado a declaração das Nações Unidas sobre aquíferos transfronteiriços e busca-se compreender a convergências e divergências estre o Acordo sobre o Guarani e a Declaração mencionada, além de analisar o interesse da ONU sobre o assunto desde a firmação destes documentos até os dias atuais.

No quinto capítulo, a gestão das águas subterrâneas será discutida, a partir da análise da legislação nacional sobre recursos hídricos buscando destacar aquilo sobre águas subterrâneas e aquíferos.

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2 A SOBERANIA, A COOPERAÇÃO E A INTERDEPENDÊNCIA, AS ORGANIZAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS E A INTEGRAÇÃO REGIONAL

A fim de compreender o tema exposto no trabalho, o presente capítulo irá expor os conceitos básicos de soberania, cooperação e interdependência, para então introduzir a atuação das Organizações Intergovernamentais nos assuntos hídricos transfronteiços e expor a integração regional do Mercosul no âmbito ambiental.

2.1 SOBERANIA

A conceituação de soberania é necessária para o presente trabalho visto a importância desta para o reconhecimento do Estado no sistema internacional, assim como é o princípio para o Estado legitimar suas ações. Neste contexto se buscará explicar sucintamente a postura da soberania na política externa brasileira na sua história, para enfim, no próximo subcapítulo, discutir o conceito de soberania com a cooperação internacional.

Segundo Oliveira (2004), a soberania seria o poder pleno dentro do território nacional, o que no âmbito externo reflete como independência do Estado em ditar as próprias leis internas, não existindo um poder supranacional.

O Tratado de Vestfália, assinado em 1648, destaca o princípio da soberania ao ditar que:

[...] o Estado como poder supremo e soberano dentro de suas fronteiras, descartando as reivindicações transnacionais de autoridade política da Igreja. Considera-se geralmente como princípio constitutivo desse sistema o respeito mútuo dos Estados pela sua soberania. Outros princípios importantes, derivados da soberania estatal, são a não-intervenção nos assuntos internos [...], o consentimento como base de obrigação para cumprir as leis internacionais e a imunidade diplomática (ZACHER, 2000, p. 84-85, apud PECEQUILO, 2004, p. 45).

A soberania enfatiza, portanto, a defesa do interesse nacional, que está incorporada à teoria realista, pois nesta o Estado é visto como principal autor (OLIVEIRA, 2004; PECEQUILO, 2016). O teórico Hans Mongenthau, em sua obra A Política Entre as Nações (2003), afirma que a soberania é indivisível, uma vez que em um território não se pode haver simultaneamente mais que uma autoridade. O autor Raymond Aron também menciona que “dentro de uma coletividade politicamente organizada não se pode haver dois soberanos, como não pode haver dois generais comandando um exército. Mesmo num regime democrático, há um só poder soberano, a despeito das aparências” (ARON, 2002, p. 887).

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Segundo os conceitos clássicos, a soberania, então, é o reconhecimento mútuo entre os Estados que cada um exerce dentro do seu território poder absoluto, não sendo possível o compartilhamento dessa.

2.1.1 A Soberania nas Fases da Política Externa Brasileira

Segundo Cervo e Bueno (2002) não se deve presumir que a soberania brasileira foi concebida como efeito súbito da Proclamação da Independência, em 7 de setembro. A política externa brasileira (PEB) passou por diversas fazes conforme novos governos foram formados, por consequência, a soberania brasileira também tomou diferentes formas, apesar estar estabelecida como um dos princípios da PEB.

São alguns os períodos que merecem destaque para esclarecer a postura do Brasil em relação à sua soberania no sistema internacional, mostrando as atuações externas que posicionam o país no sistema internacional em cada época. Adiantando ao tempo da República velha (1889 – 1930), a gestão do Barão do Rio Branco é marcada pela soberania nacional, consequência de muitos sucessos nas negociações para estabelecimento das fronteiras do país e a aproximação com os países vizinhos e com os Estados Unidos, visto como estratégico para inserir o Brasil no sistema internacional, rompendo com a PEB da época do império focada para a Europa (CERVO; BUENO, 2002; LESSA, 2012; PINHEIRO, 2004).

A partir de 1930, o nacional desenvolvimentismo, plano econômico de Getúlio Vargas também posicionou o país de forma interessante no sistema internacional, priorizando relações que levassem ao desenvolvimento do Estado. Ao manter relações econômicas com a Alemanha antes da guerra e estabelecer um acordo bilateral com os EUA possibilitou um desenvolvimento econômico interessante ao Brasil. Posteriormente, o Brasil se junta aos Aliados na segunda guerra mundial ampliando a atuação internacional do país. Após o fim da guerra e a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil ganha um assento rotativo nesta (CERVO; BUENO 2002; CERVO, 2008).

Enquanto a Política Externa Independente (PEI), de 1961 – 1964, de Jânio Quadros e João Goulart deu ao Brasil sua maior independência em relação aos EUA ao ampliar suas relações econômicas e políticas com outros Estados, a política externa na ditadura militar (1964-1985), além de ignorar as diretrizes da PEB, manteve uma relação oscilante em relação aos EUA; possivelmente caracterizando um período da PEB que se menos soube estabelecer e defender um interesse nacional no sistema internacional, devido à crise econômica e social no país (CERVO, 2002).

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A partir de 1990, época do neoliberalismo, o Brasil amplia sua participação em OIs e foros multilaterais, além de buscar aderir novos tratados e acordos. Relações com as potências internacionais foram restabelecidas, assim como instituições internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial ganharam atenção do Estado brasileiro. Na região sul o Mercosul começa a surgir, em 1991 (CERVO, 2002).

A política externa dos anos 2000 focou em novas parcerias comerciais e políticas, principalmente com países em desenvolvimento e fortalecendo a integração regional, a atuação em organizações internacionais e foros também ganham destaque. Apesar da instabilidade política interna, atualmente, o país procura manter as relações econômicas e diplomáticas no sistema internacional (PINHEIRO, 2004).

O panorama histórico da PEB permite visualizar que o sentimento de Soberania brasileira, mesmo teoricamente sendo concebida no momento em que o Estado é reconhecido no Sistema Internacional, foi construída com o passar do tempo, dependendo das relações políticas e econômicas que o Estado conseguia estabelecer com os demais atores e a forma que o país decide se posicionar internacionalmente.

2.2 COOPERAÇÃO E INTERDEPENDÊNCIA

A cooperação e a interdependências estão relacionados à teoria liberal, esta, segundo Pecequilo (2016) é definida pelos autores clássicos – John Locke, Immanuel Kant e Montesquieu1 – como uma corrente na qual o Estado é necessário para equilibrar o sistema internacional via um meio social pacífico, onde a prosperidade mútua gera oportunidades e ganhos a todos pelas vias da cooperação e integração; e o comércio é visto como ferramenta essencial para estabelecer a paz, pois expandindo as trocas comerciais, compartilha-se mais lucros e gera-se interdependência. Segundo Doyle:

A política internacional, ao invés de ser um estado homogêneo de guerra, é, no mínimo, um estado heterogêneo de paz e guerra, e pode se tornar um estado de paz global, na qual a expectativa da guerra desaparece (...) As sociedades liberais competem para se tornarem ricas, gloriosas, saudáveis, cultas, tudo isso sem ter que resolver seus problemas pela competição por meio da guerra (DOYLE, 1997, p.210 apud PECEQUILO, 2016).

1 Pecequilo (2016) menciona as obras: ‘A Paz Perpétua’, de Immanuel Kant; ‘O Segundo Tratado de Governo’, de

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Portanto, a paz torna-se um meio do Estado garantir tanto a sua sobrevivência como a sua prosperidade, segundo Doyle (1997, p.256 apud PECEQUILO), isto representa uma institucionalização da paz.

Como mencionado, a cooperação seria um meio para atingir a paz em médio e longo prazo; visando objetivos em comum, os Estados desenvolvem percepções instrumentais justificando o trabalho coletivo, gerando confiança e a formação de uma unidade política social, com resultados produzidos pela troca mútua entre os atores. Neste cenário se torna propício o estabelecimento de instituições estruturando a cooperação, criando um ambiente para os Estados compartilharem expectativas, benefícios e dividir custos (PECEQUILO, 2016). Segundo Joseph Nye (2002 apud PECEQUILO, 2016) a progressão para a cooperação e integração dependerá da percepção que a distribuição dos benefícios é mútua, da percepção comum dos objetivos entre os atores e do baixo custo.

Para expor o conceito de interdependência deve-se recorrer ao neoliberalismo e, portanto, aos clássicos de Robert O. Keohane e Nye. O neoliberalismo considera ainda o Estado como ator principal do sistema internacional, porém estabelece um foco de análise nos atores não estatais, como organizações internacionais governamentais, uma vez que reconhece que o poder dos Estados está condicionado a estas OIs; também sustenta que o sistema é anárquico e interdependente e, assim como os liberais, preocupa-se com a relação entre cooperação e conflito nas relações internacionais (PECEQUILO, 2016).

A teoria destaca o conflito entre a soberania do Estado e a autonomia da organização intergovernamental, o que pode estabelecer uma disputa entre domínio territorial e interesses internos com a governança global, visto que as organizações podem superar a lógica de poder dos Estados quando estes, segundo a teoria, cedem parte de sua soberania ao participar de acordos e até cooperar (PECEQUILO, 2016).

Já a interdependência, segundo Keohane e Nye (1989 apud PECEQUILO, 2016), ultrapassa a discussão da integração e amplia as relações e transações entre Estados e atores não estatais. Referindo-se aos cenários onde existe dependência mútua entre as partes:

A interdependência, de forma simplificada, significa dependência mútua. Na política mundial, a interdependência se refere a situações caracterizadas pelos efeitos recíprocos entre os países ou entre atores de diferentes países. Estes efeitos frequentemente resultam de transações internacionais – fluxos de dinheiro, bens, pessoas e mensagens além das fronteiras. Estas transações aumentaram dramaticamente desde a Segunda Guerra Mundial (KEOHANE e NIE, 1989, p. 8-9 apud PECEQUILO, 2016).

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Contudo, deve-se destacar que a interdependência não é necessariamente positiva ou vivenciada igualmente pelas partes. Os autores mencionam também a ausência de hierarquia entre os temas, pois o foco está nas dinâmicas provocadas além das fronteiras, desta forma, Pecequilo (2016) cita um conjunto de fenômenos que estão relacionados a esta interdependência como: meio ambiente, direitos humanos, transporte, finanças e pessoas.

Enfim, Keohane e Nye (1989 apud PECEQUILO, 2016) afirmam que os Estados continuam sendo os atores principais, mas devem se adaptar aos confrontos de sua autonomia via instituições, integração ou negociações, afim de terem competências para lidar com os temas mencionados, além de se beneficiarem – via as ações coletivas – com custos menores e redução de conflitos. Portanto, a cooperação e a interdependência não são fraquezas dos Estados, mas um comportamento racional para obter vantagens e ganhos (PECEQUILO, 2016).

2.2.1 Cooperação e Soberania

Demonstrada a definição de soberania e a visão liberal sobre a cooperação e seus reflexos sobre a soberania dos Estados, se faz necessário uma análise entre os conceitos enfim de esclarecer se realmente existe a perda do poder soberano dos Estados quando estes partem a cooperar com outros atores no sistema internacional, com destaque para a cooperação visando a proteção ambiental.

As definições de soberania já apresentadas destacam o exercício absoluto de poder do Estado dentro do seu território, porém num sistema multipolar com diversos atores exercendo influência de poder, este cenário pode ser contestado, por exemplo, quando demonstrado no contexto de compartilhamento de recursos naturais, onde diversas organizações atuam para promover a cooperação entre os países e tratados bilaterais/multilaterais são assinados. Estes acordos são constantemente utilizados como argumentos para debater se isto seria uma redução da soberania dos Estados (SANTOS, 2015). Aron (2002) afirma que submeter-se a uma legislação externa não é uma agressão à soberania, pois estão fazendo por livre vontade. Mongenthau (2003) também comenta em sua obra que pode existir um conflito entre precisar cooperar e manter os interesses nacionais, isto está ligado aos problemas da modernidade, pois as capacidades de um único Estado podem não ser o suficiente para resolver o que for preciso. Ele cita como um dos problemas a proteção e a restauração do meio ambiente.

Portanto, segundo Aron (2002), não há contradições em afirmar que não existem graus de soberania e aceitar propostas de tratados, pois os países estão aceitando limitações

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conscientemente. “Eles nunca se obrigam definitivamente, mantendo sempre, de modo implícito, a reserva rebus sic stantilms (“se as circunstâncias não se alterarem”) (ARON, 2002, p.713). Mongenthau (2003) complementa afirmando que o conceito de soberania se mantém forte, apesar da cooperação entre Estados, mas destaca que as limitações que o Estado aceitar em qualquer acordo não devem nunca atingir a sua capacidade de ser absoluta autoridade legisladora e de aplicação da lei em seu território.

A corrente liberal ao levantar este debate menciona que o poder dos Estados acaba relativizado pela participação em instituições internacionais, pois está sujeito às condições que podem ser impostas, contudo ainda reconhece que os Estados são os atores principais do sistema internacional e apesar de poderem estar cedendo parte de sua soberania, estão fazendo-o de acordo com seus objetivos e afim de obter benefícios (PECEQUILO, 2016).

Ao decorrer do trabalho serão analisados os documentos formalizados pelo Acordo sobre o Aquífero Guarani e a Declaração sobre aquíferos transfronteiriços da ONU, permitindo visualizar se o aspecto da soberania recebeu destaque pelos Estados ao formar um acordo entre si e pela organização intergovernamental, e se estes atores percebem os recursos naturais como um tema transnacional, que necessita de cooperação internacional.

2.3 ORGANIZAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS

As relações internacionais, no século XX, presenciaram o crescimento destes atores não-estatais no sistema internacional. Estas organizações surgem a partir da necessidade dos Estados estabilizarem suas relações via um organismo regulador, visto o contexto de conflitos presentes no início do século (SILVA; COSTA 2013).

As transformações da política internacional no pós-1945 geradas pelas dinâmicas do multilateralismo, da aceleração tecnológica, da consolidação de tendências sociais, políticas e econômicas que ultrapassam as fronteiras dos Estados como meio ambiente, direitos humanos, financeirização do capital, a integração regional, têm como resultado a criação de novos desafios no campo das relações internacionais. Dentre estes, os fenômenos da regionalização e da globalização possuem implicações para o futuro da teoria das relações internacionais, e levam ao aprofundamento de temas como governança global e o peso dos atores não estatais (PECEQUILO, 2016, p. 115).

A discussão em torno do tema da paz ganhou destaque entre os assuntos internacionais, e os Estados precisavam de um espaço, um fórum, para estabelecer tais debates (SILVA; COSTA 2013).

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Costa (2015) caracteriza as Organizações Intergovernamentais (OI) pela criação desta por dois ou mais Estados – através de instrumentos diplomáticos como tratados internacionais – e que possui personalidade jurídica própria, sede, funcionários e orçamento proveniente dos Estados-membros. Olsson (2003) complementa argumentando que uma organização surge a partir da necessidade de ordem do meio internacional anárquico, para ele as OIs são caracterizadas pela sua atuação, que ultrapassa as fronteiras nacionais.

Strenger (1998) comenta sobre a função da organização em promover a cooperação quando objetivos em comum são delineados e a gestão de tarefas sendo executadas por órgãos especialmente criados para tal, também destaca que a organização não é soberana, suas funções são limitadas às competências que lhe foram atribuídas pelos Estados. Outra característica importante das OIs é a sua personalidade jurídica, classificando-as como sujeito internacional, lhes conferindo a capacidade tomar decisões (OLIVEIRA, 2004; SILVA; COSTA, 2013).

As OIs podem ser classificadas de acordo com diferentes aspectos, como fins, composição e competência, por exemplo (SILVA et al, 2007). Para caracterizar as OIs que serão posteriormente apresentadas, se utilizará a classificação apresentada por Herz e Hoffmann (2004) e Oliveira (2004). Segundo os autores, as OIs podem ser classificadas pelos fatores geográficos, especificando-as como regionais, quando atuam no âmbito regional (como a Organização dos Estados Americanos – OEA), e as universais, que atuam no âmbito global (Organização Mundial do Comércio – OMC). Os objetivos também diferenciam as OIs entre si, podendo esses serem gerais, possuindo diversas finalidades como a ONU ou específicos, de organismos especializados, que detêm propósitos delimitados. Segundo Silva et al (2007), em relação às competências, as OIs ainda podem ser classificadas em Organizações de Cooperação ou Coordenação e Organizações de Integração ou de Unificação.

Percebe-se que a ampliação da atuação de OIs no sistema internacional é um reflexo da globalização e de processos de integração, tanto regionais como no globo. Contudo, a cooperação entre os Estados não significa estritamente solidariedade às pautas internacionais. Costa (2015) destaca que as OIs, além de servirem para a ação coletiva em busca da cooperação e paz, também são para os Estados um instrumento, para organizar sua agenda internacional em busca de seus interesses nacionais, destacando as grandes potências que utilizam as OIs como centros estratégicos de política externa.

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2.3.1 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU

A Organização das Nações Unidas, a ONU, é uma OI formada por 193 Estados que voluntariamente trabalham pela paz e desenvolvimento. Sua formação teve origem nos resultados devastadores da II Guerra Mundial (1939 – 1945), cuja destruição e violência motivaram os países a buscar uma forma de manter a paz na comunidade internacional (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2018).

Segundo Herz e Hoffmann (2004, p.29) “Sucessora legal e lógica da Liga das Nações2, a ONU representa o ápice do processo de institucionalização dos mecanismos de estabilização do sistema internacional, iniciado no século XIX”. O processo para sua formação deu-se ainda durante a guerra, em 1942, quando o presidente norte-americano Franklin Roosevelt concebe o nome Nações Unidas na sua 1º Declaração “Declaração das Nações Unidas” e 26 Estados assumem o compromisso de continuar lutando contra as potências do Eixo (Roma-Berlim-Tóquio). Posteriormente, em 1943, as Conferências de Moscou e de Teerã marcam o comprometimento das nações aliadas em estabelecer uma organização internacional para a manutenção da paz e segurança internacional; e é nos encontros de Dumbarton Oaks e Ialta que se delinearam as propostas iniciais que acabaram servindo de base para a Carta da ONU (ARAUJO, 2002; ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2018).

A Carta das Nações Unidas – conhecida como Carta de São Francisco – foi assinada no dia 26 de junho de 1945, e as Nações Unidas começaram a existir oficialmente no dia 24 de outubro de 1945, com sede em Nova York (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2018a). No capítulo 1, a Carta das Nações Unidas expõe os propósitos e princípios da instituição: “Manter a paz e a segurança internacionais [...] Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de igualdade de direitos e de autodeterminação dos povos [...] Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; e Ser um centro destinado a harmonizar a ação

2 A Liga das Nações foi uma organização intergovernamental idealizada em 1919, após a primeira guerra, com o

Tratado de Versalhes. As potências vencedoras da I Guerra Mundial criaram a organização com o objetivo de assegurar a paz, mas com o início da II Guerra Mundial a Liga foi dissolvida, visto que falhou com o seu propósito (KISSINGER, 2015).

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das nações para a consecução desses objetivos comuns (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1945, p.5).

Para estes fins, a ONU declara que suas ações são fundamentas no princípio da igualdade soberana de todos os membros, o cumprimento de boa-fé das obrigações assumidas pelos membros, a resolução de controvérsias por meios pacíficos, a inibição de ameaças e uso da força, e a não intervenção da organização em assuntos internos (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2018b).

Em relação ao seu sistema a ONU possui seis órgãos principais, a Assembleia Geral, o Conselho de Segurança, o Conselho Econômico e Social, o Conselho de Tutela, a Corte Internacional de Justiça e o Secretariado. Destacamos a Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) que é composta por todos os membros com no máximo 5 representantes de cada, lá eles se reúnem para deliberar os assuntos em pauta da ONU e todos os países têm direito a um voto, com total igualdade entre os membros. Entre as principais funções estão: Discutir e fazer recomendações sobre todos os assuntos em pauta na ONU; Discutir questões relacionadas a conflitos militares que não estejam na pauta do Conselho de Segurança; Discutir formas e meios para melhorar as condições de vidas das crianças, dos jovens e das mulheres; Discutir assuntos ligados ao desenvolvimento sustentável, meio ambiente e direitos humanos; Questões de orçamento; Eleger novos Secretários-Gerais da Organização (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2018c).

Além dos seis principais órgãos da Organização, também estão vinculados com a estrutura da Organização 26 agências especializadas, fundos, programas, comissões, departamentos e escritórios. Todos estes atuam em áreas específicas prestando assistência técnica e humanitária, são autônomas com seus próprios orçamentos, funcionários e estão ligados a ONU através de acordos internacionais (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2018c).

Entendemos, portanto, o destaque da ONU na busca pela manutenção da paz no sistema internacional através da cooperação. Dentro deste contexto geral de atuação da ONU reconhece-se que a água é um elemento com implicações gerais na paz e na segurança; o Painel de Alto Nível sobre Água da ONU (UN NEWS, 2018) alertou que o mundo enfrenta uma crise de água que é um dos maiores riscos para o progresso econômico, a erradicação da pobreza, a paz e segurança global. Será, então, discutido no trabalho a atuação da ONU em relação a água, especificamente sobre a água subterrânea e transfronteiriças, abaixo iremos descrever a evolução da ONU sobre o assunto.

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2.3.1.1 As Conferências de Estocolmo, Eco-92 e a Convenção de Nova York: o caminho até a atuação da ONU sobre as águas subterrâneas

Segundo Brzezinski (2012), A Conferência Internacional sobre o Meio Ambiente

Humano, realizada em Estocolmo, em 1972, foi o primeiro evento direcionado de forma preventiva ao tema ambiental. Ela foi caracterizada pelas divergências entre os Estados em relação ao meio ambiente, pois enquanto uns priorizavam a preservação de políticas de industrialização para o desenvolvimento econômico, outros preocupavam-se em destacar a poluição da água, solo e atmosfera. Em sua declaração, a água é mencionada em relação à responsabilidade do homem pela contaminação, na proclamação nº 33:

O homem deve fazer constante avaliação de sua experiência e continuar descobrindo, inventando, criando e progredindo. Hoje em dia, a capacidade do homem de transformar o que o cerca, utilizada com discernimento, pode levar a todos os povos os benefícios do desenvolvimento e oferecer-lhes a oportunidade de enobrecer sua existência. Aplicado errônea e imprudentemente, o mesmo poder pode causar danos incalculáveis ao ser humano e a seu meio ambiente. Em nosso redor vemos multiplicar-se as provas do dano causado pelo homem em muitas regiões da terra, níveis perigosos de poluição da água, do ar, da terra e dos seres vivos; grandes transtornos de equilíbrio ecológico da biosfera; destruição e esgotamento de recursos insubstituíveis e graves deficiências, nocivas para a saúde física, mental e social do homem, no meio ambiente por ele criado, especialmente naquele em que vive e trabalha (ONU, 1972).

E, também, no segundo princípio, em relação a necessidade da preservação destacando que tais medidas devem ser reconhecidas pelo bem das gerações presentes e futuras:

Os recursos naturais da terra incluídos o ar, a água, a terra, a flora e a fauna e especialmente amostras representativas dos ecossistemas naturais devem ser preservadas em benefício das gerações presentes e futuras, mediante uma cuidadosa planificação ou ordenamento (ONU, 1972).4

Fica evidente que a discussão não destacava a água ou o próprio ecossistema como elemento essencial para manutenção do meio ambiente, na verdade, ressalta que este é essencial para o homem e o crescimento econômico (BRZEZINSKI, 2012). A declaração também traz

3 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o

Meio Ambiente Humano. 1972. Disponível em: <

https://www.apambiente.pt/_zdata/Politicas/DesenvolvimentoSustentavel/1972_Declaracao_Estocolmo.pdf>. Acesso em: 13 jun. 2018.

4 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o

Meio Ambiente Humano. 1972. Disponível em: <

https://www.apambiente.pt/_zdata/Politicas/DesenvolvimentoSustentavel/1972_Declaracao_Estocolmo.pdf>. Acesso em: 13 jun. 2018.

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como princípio a soberania permanente dos Estados sobre os bens naturais, mencionando o direito de explorar os recursos conforme as próprias políticas e assumindo a responsabilidade que as suas ações não causem danos a outros Estados. Corte (2015) declara que a falta de clareza e apresentação de conceitos na declaração dificultou a implementação de mecanismos eficientes na proteção do meio ambiente.

Em 1992, no Rio de Janeiro, vinte anos após a conferência de Estocolmo, a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) foi realizada. Também conhecida como Eco-92 e Rio-92, a conferência trouxe a declaração do Rio

de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e a Agenda 21 (CORTE, 2015). Na declaração a água não é direcionada expressamente, entretanto a soberania

permanente dos Estados sobre seus recursos naturais está presente nos seus princípios, assim como, destaca-se a obrigação de não causar prejuízo a outros Estados; o comprometimento com a integração pela proteção ambiental no processo de desenvolvimento; o estabelecimento de cooperações entre os Estados para a erradicação da pobreza e para a difusão do conhecimento científico e tecnológico. Portanto, mesmo não direcionando a água especificamente, diversos dos princípios estabelecidos na declaração influenciaram e foram incorporados nas políticas hídricas mundiais (BRZEZINSKI, 2012; CORTE, 2015).

Em relação a Agenda 21, seu objetivo é servir como plano de ação para o Estados se espelharem e cooperarem. Ela direciona o capítulo 18 para os recursos hídricos “promoção da qualidade e do abastecimento dos recursos hídricos: aplicação de critérios integrados no desenvolvimento, manejo e uso dos recursos hídricos” (ONU, 1992):

18.2: A água é necessária em todos os aspectos da vida. O objetivo geral é assegurar que se mantenha uma oferta adequada de água de boa qualidade para toda a população do planeta, ao mesmo tempo em que se preserve as funções hidrológicas, biológicas e químicas dos ecossistemas, adaptando as atividades humanas aos limites da capacidade da natureza e combatendo vetores de moléstias relacionadas com a água. Tecnologias inovadoras, inclusive o aperfeiçoamento de tecnologias nativas, são necessárias para aproveitar plenamente os recursos hídricos limitados e protegê-los da poluição. 18.3: A escassez generalizada, a destruição gradual e o agravamento da poluição dos recursos hídricos em muitas regiões do mundo, ao lado da implantação progressiva de atividades incompatíveis, exigem o planejamento e manejo integrados desses recursos. Essa integração deve cobrir todos os tipos de massas inter-relacionadas de água doce, incluindo tanto águas de superfície como subterrâneas, e levar devidamente em consideração os aspectos quantitativos e qualitativos. Deve-se reconhecer o caráter multissetorial do desenvolvimento dos recursos hídricos no contexto do desenvolvimento socioeconômico [...]. (ONU, 1992).5

5 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o

Meio Ambiente e Desenvolvimento. 1992. Disponível em: <

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A agenda também aponta sete meios para garantir o acesso à água: Desenvolvimento e manejo integrado dos recursos hídricos; Avaliação dos recursos hídricos; Proteção dos recursos hídricos, da qualidade da água e dos ecossistemas aquáticos; Abastecimento de água potável e saneamento; Água e desenvolvimento sustentável; Água para produção sustentável de alimentos e desenvolvimento rural sustentável; e Impactos da mudança do clima sobre os recursos hídricos (ONU, 1992). Apesar da importância de todos os meios descritos na agenda, para o presente trabalho, deve-se destacar a recomendação do planejamento integrado dos recursos hídricos pelos Estados, o que marca o início de uma discussão sobre compartilhamento de recursos.

Apesar de propor tais princípios citados e até a integração ambiental entre os Estados, o cenário que foi presenciado pela comunidade internacional após a Rio-92 não refletiu todas as propostas feitas na Conferência. Corte (2015) expõe que os programas da agenda eram bastante abrangentes e se fossem devidamente aplicados a situação ambiental atual poderia ser diferente.

Durante a Conferência, também, foi proposta a criação do Dia Mundial da Água, que foi adotada pela Assembleia Geral em 22 de dezembro de 1992 (Resolução n.º 47/93)", o objetivo seria utilizar a data para desenvolvimento de conscientização da conservação dos recursos hídricos, além da implementação da Agenda 21 (BRZEZINSKI, 2012).

Os princípios adotados em 1992 e aqueles também destacados em 1972 foram implementados ao preâmbulo da Convenção de Nova York, 1997. A Convenção chamada de Convenção das Nações Unidas sobre os Cursos de Água é um tratado internacional adotado pelas Nações Unidas, em 21 de maio de 1997. O tratado faz menção ao uso e conservação às águas que se cruzam internacionalmente, incluindo águas subterrâneas. O objetivo da ONU era produzir um documento para auxiliar os Estados na conservação e gerencia destes recursos hídricos. Contudo, a conveção entrou em vigor apenas em 17 de agosto de 2014, sendo

ratificado por 36 Estados (BRZEZINSKI, 2012).

A Convenção de NY não afetaria os acordos já assinados entre Estados, contudo deveriam considerar adequações de acordo com os princípios da Convenção. Também é destacado que todo Estado do curso de água tem o direito de participar de negociações sobre um possível acordo. Em seus princípios o documento procurava gerar nos Estados a conscientização de considerar os impactos da utilização da água e compartilhar equitativamente os recursos, atentos a fatores variantes, como o tamanho da população, a disponibilidade de

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Machado (2009), a Convenção peca na especificação dos procedimento adminstrativos para coleta de dados e geração de informação sobre o curso de água em cada Estado, afim de definir a utilização equitativa de forma precisa.

O art. 7º6 da Convenção de NY, ao tratar das obrigações de não causar dano, torna-se o mais controverso para os Estados, pois define como o dever dos Estados adotar todas as medidas evitar prejudicar outros Estados, e se causado, o Estado deve adotar as medidas necessárias para reduzir ou eliminar o dano, estando sujeito a negociar compensações (BRZEZINSKI, 2012).

Apesar da relutância internacional em participar do tratado, possivelmente pelas responsabilidades ambientais nele estabelecidas, a Convenção é importante por destacar a necessidade de diálogo entre os Estados que compartilham recursos e incluir as águas

subterrâneas nesta discussão. (BRZEZINSKI, 2012) também menciona que a convenção é

importante no estabelecimento do direito internacional que rege a água.

A crescente atenção nas últimas décadas com o assunto de compartilhamento dos recursos hídricos, até a menção das águas subterrâneas transfronteiças é uma consequência da escasses hídrica cada vez mais presente no globo. Neste contexto, a atenção e conhecimento sobre aquíferos transfronteiriços tem pedido maior discussão nos foros internacionais e entre os Estados, afim de concluir acordos sobre a gestão compartilhada deste recurso (PATEIRO, 2016). Em 2009, A Assembléia Geral das Nações Unidas aprova a resolução 63/124 - A lei dos aquíferos transfronteiriços. No seu preâmbulo deve-se destacar o reconhecimento da importância para a humanidade dos recursos de água subterrânea, a menção da resolução 1803 da Assembléia Geral, de 14 de dezembro de 1962, sobre a soberania permanente sobre os recursos naturais, a referenciação dos princípios e recomendações adotados pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, e a afirmação da importancia da cooperação internacional (AGNU, 2008). O acordo será objeto de análise nos seguinte capítulo do trabalho de conclusão de curso.

6 No original: “Article 7. Obligation not to cause significant harm

1. Watercourse States shall, in utilizing an international watercourse in their territories, take all appropriate measures to prevent the causing of significant harm to other watercourse States.

2. Where significant harm nevertheless is caused to another watercourse State, the State whose use causes such harm shall, in the absence of agreement to such use, take all appropriate measures, having due regard for the provisions of articles 5 and 6, in consultation with the affected State, to eliminate or mitigate such harm and, where appropriate, to discuss the question of compensation”.

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2.4 INTEGRAÇÃO REGIONAL

Segundo Amado Luiz Cervo (2008), com o fim da guerra fria e da era bipolar, o sistema internacional molda-se a partir de duas tendências: o crescimento do capitalismo e da globalização e pelos processos de integração. A integração, portanto, é vista como uma contenção aos avanços deste capitalismo e aos desafios da inserção internacional trazidos pelo neoliberalismo presentes neste cenário da história (SILVA; RIEDIGER, 2016)

Afim de reestabelecer sua importância como ator no sistema internacional, o Estado precisa, frente ao novo cenário internacional caracterizado pela interdependência, aderir à cooperação intergovernamental. Um dos meios, portanto, é a integração via formação de blocos regionais. Apesar de uma comunidade de países poder constituir uma organização internacional, dotada de personalidade jurídica, essa deve passar por fazes de integração, para enfim poder ter uma relação de cooperação mútua nos mais diversos âmbitos. A fases de integração podem ser descritas como: Zona de Livre Comércio, União Aduaneira, Mercado Comum e União Econômica e Monetária (GUERRA, 2004; BÖHLKE, 2002).

Apesar das fases descritas, não existe um modelo único a ser seguido para formação dos blocos de integração, cada processo irá variar de acordo com os objetivos a serem alcançados, além das vontades políticas de cada Estado. (BÖHLKE, 2002)

Por fim, a análise do fenômeno da integração pode compreende distintas áreas do conhecimento. Podendo focar nas relações econômicas, políticas, sócias, entre outras. Para a delimitação do trabalho, a análise irá focar na integração e atuação do Mercosul em relação às questões ambientais pertinentes ao bloco, especificamente a água subterrânea.

2.4.1 Mercosul e a Integração Ambiental Hídrica do Bloco

O Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) é a mais ampla integração regional da América Latina. Seus membros fundadores, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, signatários do Tratado de Assunção de 1991, fundam o bloco num contexto da redemocratização e reaproximação dos países da região. O tratado estabeleceu a constituição do Mercosul, sendo este concretizado em 1994. O objetivo era de estabelecer um mercado comum entre os países signatários - com livre circulação interna de bens, serviços e fatores produtivos – além do estabelecimento de uma Tarifa Externa Comum (TEC) com terceiros países e a adoção de uma política comercial comum. A criação do Mercosul é, então, o resultado de um longo processo

Referências

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