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Causas e consequências da Guerra de Tríplice Aliança

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Academic year: 2021

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CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS DA GUERRA DE TRÍPLICE ALIANÇA1

Juan Carlos Parodi Mintegui 2 Prof. Me. Carlos Roberto Carvalho Daróz (Orientador) 3

RESUMO

A Guerra de Tríplice Aliança foi o maior conflito bélico que se desenvolveu na América do Sul entre os países aliados, o Império do Brasil e as Repúblicas Argentina e Oriental do Uruguai contra a República do Paraguai no período 1864/1870. Muitas foram as causas pelas quais os países a ela recorreram. O objetivo é identificá-las, desmentindo as não verdadeiras, pois se sabe que a primeira vítima da guerra é a verdade. Von Clausewitz em sua obra “Da Guerra” nos ensina que, quando se esgotam o diálogo e as conversações, o conflito desemboca em guerra. Ter-se-á ao longo do trabalho a oportunidade de observar esses pontos de estrangulamento das relações e também as motivações que levaram seus protagonistas a esse desfecho entre Países que tinham dado entre si amostras de relações de amizade ao longo do tempo. O trabalho finalizará avaliando as consequências para cada um dos contendores. O rescaldo foi muita morte e muita destruição e, lembrando Clausewitz, o passo seguinte seria o restabelecimento da paz.

Palavras-chave: Guerra do Paraguai. Guerra de Tríplice Aliança

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Artigo apresentado para conclusão do curso de pós-graduação em História Militar na UNISUL 2

Graduado em Ciências Econômicas na UNISINOS e pós-graduado em Cooperativismo e Marketing (ULBRA). Graduado na Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra em Política, Estratégia e Gestão

Cursando pós-graduação em Relações Internacionais – Defesa e Gestão na UFRGS Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – Rio Grande do Sul

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ABSTRACT

The Triple Alliance War was the greatest military conflict that happened in South American countries and their allies: Brazilian Empire, Argentinian Republic and Uruguay against Paraguay Republic in 1864/1870. There were lots of reasons for those countries took part in that conflict. The aim of this study is to identify them, denying the not real reasons, considering that the first victim of a war is the truth. Von Clausewitz in his writings of “Da Guerra" teach us that when the dialogue and conversations are overstrained the conflict ends up in war. In this paper, it is going to be analyzed every previous point, the difficulties that those countries had in their relationships and what motivated them to declare war since they had a good long time relationship between countries. This paper is going to conclude its observations evaluating the consequences of this war for each country. The result of this conflict was a large number of dead people, destruction everywhere and according to Clausewitz the next step would be to restore peace.

Key words: Paraguay War, Triple Alliance War

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1 INTRODUÇÃO

Este trabalho tem por propósito examinar o cipoal de causas que conduziram ao desfecho do que se convencionou chamar de Guerra do Paraguai, Guerra da Tríplice Aliança, Guerra Grande ou Guerra Guazú, como, também, desentranhar os interesses e os posicionamentos de pessoas e segmentos sociais nos diversos países que participaram da guerra. Ora, esses interesses, dentre outros, são antagônicos, filosóficos e/ou conjunturais. Para melhor ilustrar o estudo, uma descrição dos fatos relevantes e pinceladas da situação econômica, social e política vigentes nos quatro países na época anterior ao conflito propriamente dito.

A posteriori, consolidar as consequências geradas pelo conflito, assim como o inventário de efeitos verificado nos cinco anos que durou.

Os positivistas vão se manifestar contrários ao conflito, como também publicistas como Juan B. Alberdi e Juan Carlos Gómez, estes últimos inimigos figadais do Império e de D. Pedro II. O próprio José Hernández, autor do “Martín Fierro”, exilado na fronteira de Rivera, também se somou àqueles contrários à Guerra.

Alberdi dizia que a palavra guerra justa acarreta um contrassenso selvagem: é a mesma coisa que dizer crime justo, crime santo, crime legal. Não pode haver guerra justa, pois não há guerra judiciosa. A guerra é a perda temporal do juízo. É a alienação mental, espécie de loucura ou monotonia, mais ou menos crítica ou transitória.

O próprio Hino do Exército brasileiro em uma de suas estrofes nos lembra:

“A paz queremos com fervor/a guerra só nos causa dor/porém se a Pátria amada/for um dia ultrajada/lutaremos sem temor. ”

Este pensamento baliza o sentir nacional e perpassa todas as atitudes tomadas ao

longo da Guerra. Uma nova posição que chamaremos de revisionista começou a circular nas

décadas de ’50 e ’60 na América Latina como uma resposta de setores contrários aos regimes militares vigentes em países da região, procurando achar um modelo de

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desenvolvimento autônomo que pudesse enfrentar essa realidade. Vão tentar demonstrar que a Guerra de Tríplice Aliança foi um mecanismo desencadeado contra esse modelo inédito que, segundo eles, não poderia prosseguir pois mostraria o caminho aos demais países da América Latina. Esse conflito teria sido manipulado pela Inglaterra, tendo o Império Brasileiro como executor. Os dois autores mais relevantes dessa corrente são Júlio César Chiavenatto, brasileiro, e León Pomer, argentino. Ao longo do trabalho deveremos examinar estas afirmativas.

O Brasil, malgrado os anos de confronto no Prata, sempre foi parceiro nas questões que afetavam tanto o Uruguai como a Argentina. Independente de Portugal em 1822, logo após, inclusive dentro do marco da Província Cisplatina, propugnou um grande acordo em 1828 que ficou conhecido como a Convenção Preliminar de Paz assinado Rio de Janeiro entre o Império do Brasil, a República Argentina e a Inglaterra, dando uma certidão de nascimento à novel República Oriental do Uruguai. Soube também o Império Brasileiro ouvir as vozes daqueles povos –argentinos e uruguaios- que aflitos e suplicantes apelaram à sua proteção contra os tiranos Rosas e Oribe. Sangue brasileiro correu naquelas terras, sangue generoso que lhes deu vida e liberdade (SOUZA DOCCA, 1919); da mesma forma o Império foi o primeiro a reconhecer em 1844 a independência paraguaia. Também o Império nomeou Carlos López como membro do Instituto Imperial do Rio de Janeiro e seu filho, Benigno López, admitido na Escola Naval da Marinha Imperial, como provas de amizade entre ambos os países.

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2 CAUSAS DA GUERRA

2.1 REPÚBLICA ARGENTINA

Bartolomé Mitre entendia, enquanto historiador e proprietário do jornal “La Nación”, que o Paraguai não aceitava a livre navegação dos rios, verdade liberal do mitrismo. Mitre e seus adeptos consideravam o regime lopizta como “tirânico e

expansionista”, ameaçando e enfrentando os interesses argentinos. Para estes, o Império

do Brasil era um regime democrático sem o viés expansionista. Diante da crise política do país oriental, a Argentina considerava-se neutro.

Para Ramón Cárcano (1860-1946), historiador liberal argentino, existiriam duas causas para a crise do Estado Oriental que viriam desencadear a Guerra de Tríplice Aliança: Solano López e a acusação do expansionismo brasileiro. Como poderemos observar quando da análise e desenvolver a sua ideia-força que era o equilíbrio na Bacia do Prata, López entendia que com a queda de Paysandú, a ocupação de Montevideo e a assunção ao Governo do Uruguay do Gen. Venancio Flores esse equilíbrio estaria rompido. Cárcano entendia também que tanto Tamandaré como López estavam convencidos de que o momento era de guerra. López considerava que, apesar das recomendações de seu pai até no próprio leito de morte de não guerrear contra o Império, este via a inevitabilidade da guerra contra o Império Brasileiro.

Urquiza, caudilho entrerriano, manifestou que se deveria manter firme a neutralidade para segurar as facções internas, mas, a partir do momento em que a República sofresse uma agressão estrangeira, a espada de Caseros deveria ficar sob as ordens do vencedor de Pavón. (CÁRCANO, 1941) A cristalização da agressão paraguaia foi o rompimento das relações diplomáticas e a invasão de Corrientes com a apreensão dos navios ancorados no porto por parte de forças paraguaias.

Mitre assume o poder na República Argentina no meio desta vorágine de fatos, “pacificada e unida” (CÁRCANO, 1941) porém não consolidada. O Presidente Mitre tinha a percepção de que a Argentina não estaria em condições de enfrentar uma guerra com pequeno orçamento e dívida elevada, pelo qual entendia ser a neutralidade a melhor opção, apesar de uma manifesta opinião a favor do Império do Brasil.

No passado, o Governo rosista passara a influenciar os praieiros de Pernambuco, república popular sem classes, nem escravos, e manteve contatos com os farrapos

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oferecendo-lhes armas e soldados, recebendo a resposta de Canabarro de que a primeira gota de sangue derramado do primeiro soldado que atravessasse a fronteira do Brasil seria usada como tinta para assinar a paz com o Império.

O revisionismo argentino percebeu de que o Império via a guerra como um conflito para consolidar a política de hegemonia gestada antes inclusive da vitória de Caseros, também chamada de Santos Lugares, onde o exército de Rosas foi derrotado em 3 de fevereiro de 1852 por uma tropa de 20 mil entrerrianos e correntinos, 4 mil soldados brasileiros sob as ordens de Caxias e 2 mil uruguaios comandados pelo Gen. César Díaz.

O exército comandado por Urquiza com 35 mil homens enfrentou 22 mil infantes rosistas, 12 mil cavalarianos e 60 canhões nos subúrbios de Buenos Aires cujo combate durou cinco horas. As forças de Urquiza tiveram de 100 a 120 baixas e Rosas ferido na mão retira-se às 14 horas, renuncia e embarca num navio britânico para a Inglaterra. Os aliados sofrem 400 mortes e o exército rosista 1.200. Destaca-se o papel de Osório no combate e a participação dos brummers, soldados alemães mercenários, que tinham por missão caçar os artilheiros de Rosas.

As Províncias Argentinas não conheciam o alcance da guerra que estava para vir. Mitre revisa o seu conceito e passa a entender que o custo do empreendimento de entrar na guerra seria razoável para destruir as milícias das províncias e o regime paraguaio.

O Império do Brasil enfrentou e venceu Rosas por considerá-lo restaurador do Vice-Reinado do Rio da Prata e também por seus contatos e influências republicanas. O enfoque revisionista argentino atribui também à influência britânica o desfecho da Guerra de Tríplice Aliança e este será um estribilho muito usado pelos adeptos dessa vertente que abordaremos quando da análise do Brasil.

Dez anos de guerra entre Buenos Aires e a Confederação Argentina foi o que aconteceu após a queda de Rosas. Mitre vence a batalha de Pavón, em 17 de setembro de 1861, à frente de Buenos Aires contra Urquiza, comandante das forças da Confederação. Esta possuía 3 milhões de habitantes com 14 pequenas Repúblicas que se unem a Corrientes, Entre Rios e Buenos Aires. Em 1851 Urquiza batera Oribe no Uruguai, libertando-o, depois Santa Fé e em Caseros ou Santos Lugares, em 3 de fevereiro de 1852, derrota Rosas que migra para a Inglaterra (FIX, s/data). Entre Rios que era o “feudo” de Urquiza tinha 100.000 habitantes, 1 milhão de cavalos e 2 milhões de bois, insumos preferenciais para esse tipo de conflito bélico que se avizinhava. De outro lado, a guerra também impossibilitaria uma aliança entre o Paraguai e as províncias litorâneas.

Pelham Horton Box destacou que Pavón representou o triunfo de Buenos Aires sob a direção dos sucessores liberais dos velhos unitários e a vitória dos colorados

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proscritos pelos seus inimigos de Montevidéu, pois mediante Pavón os amigos dos colorados se tornaram donos da República Argentina. O próprio Horton Box fala de um “pacto implícito” entre Mitre e Urquiza que se cristaliza no apoio deste último a Mitre na Guerra de Tríplice Aliança. Urquiza deixa de ser a partir de Caseros o líder e caudilho regional e se converte em estadista nacional e implanta a Constituição do País. Mitre, por seu turno, numa atitude maior, acerta a reconciliação com Urquiza: esta foi a forma que lhe garantiu a Presidência da Nação.

Box escreve que, após Pavón, Mitre e Urquiza decidiram unir as suas forças contra o inimigo comum: Solano López. Embora essa união tenha se mantido ao longo da guerra, a oligarquia bonaerense desprezava os provincianos confederados e os explorava. O orçamento da Província de Buenos Aires de dez milhões de duros fica com Buenos Aires e toma das quatorze províncias mais dez milhões e Mitre manda emissário a Londres para conseguir empréstimo de dez milhões a mais, a cargo das Províncias, dinheiro que estas tinham, mas estava à disposição de Mitre para fazer a guerra.

Por conseguinte, o objetivo de Mitre era organizar o Estado Nacional, modernizando-o economicamente a operar como um país unificado; sem esta questão a guerra não teria se concretizado. No entanto, as milícias provinciais continuavam conspirando contra o seu Governo. O preço a ser pago por Mitre em prol da ordem foi a Guerra de Tríplice Aliança. No de Urquiza, tornar-se agente passivo na luta das milícias e isto representava a aliança implícita com Mitre em Pavón.

Essas milícias provinciais iriam atrapalhar o desempenho das forças argentinas na Aliança, ora o Gen. Mitre tendo que destinar soldados do front para fazer frente às “montoneras”, ora o próprio Presidente tendo que entregar seu comando a Caxias para voltar à Argentina diante da morte de seu Vice-Presidente.

O ministro Elizalde, das Relações Exteriores de Mitre, em discurso na Câmara dos Deputados de seu país manifestou que o Paraguai nos últimos 50 anos em nada mudara, mesmo com partidos diferentes no poder, mantinha uma política agressiva, irritante, audaciosa e perseverante em seus meios, até dispor da sorte do Rio da Prata, se assim desejasse.

No discurso, Elizalde lembra de que o Presidente Mitre tinha se dedicado a agradar a Solano López, pois acreditava que a Argentina não deveria entrar na guerra. Nesse meio tempo, o Uruguai assina Tratado com o Paraguai para retirar da Argentina o domínio da Ilha Martin García. Nesse momento, conforme consta dos Arquivos do Gen. Mitre, Tomo II Pág. 30- Biblioteca de “La Nación”. Museu Mitre, afirmava:

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“ [...]compreendemos que tudo era inútil, e que, por parte do Paraguai, não

teríamos mais nada a aguardar do que desgraças, que era um poder agressor, usurpador e despótico” “Com a agressão a Corrientes cristalizar-se-ia a aliança com os outros países [...]”.

Existia antiga rivalidade entre a oligarquia portenha e o Paraguai por causa dos impostos, taxas e monopólios comerciais, ao que se somava o fato de que este se imiscuía nos problemas de Buenos Aires com as províncias.

Vejamos, em síntese, as opiniões dos historiadores: Box, a corrente liberal argentina e Cecílio Baez, paraguaio, atribuem pouca prudência ao Presidente do Paraguai na sua política no Rio da Prata: este seria o responsável pelo desfecho da guerra. Os revisionistas argentinos como José Maria Rosa e Miguel Ángel Scenna responsabilizam o Império do Brasil e os fazendeiros gaúchos que viriam a romper o equilíbrio propugnado pelo Paraguai. Outras causas seriam os problemas de limites, pressões para que o Paraguai abrisse a sua economia e a crise blanqui-colorada no Uruguai. Halperín Donghi e McLynn ainda atribuem ao expansionismo brasileiro e ao poder de pressão da diplomacia uruguaia junto a Solano López; mas que a causa de todas as causas do lado da Argentina seria a procura da consolidação do seu Estado Nacional por parte de Mitre. Por analogia, algo semelhante viria a acontecer quando da crise das Malvinas: foi-se à guerra para unificar o País e o Obelisco de Buenos Aires poucas vezes teve tantos adeptos para a causa nacional propugnada pelo Governo Militar da época que imaginava angariar apoios pela invasão das Malvinas no plano nacional e internacional.

A Argentina tinha, em 1864, uma população de 1.737.076 habitantes, seu comércio exterior atingia 8.951.621 libras esterlinas, arrecadava 1.710.324 de impostos e tinha 6.000 soldados. Sua Marinha tinha quatro canhoneiras, quatro vapores mistos e uma corveta. Ao longo do conflito morreram 18 mil argentinos.

No que tange ao armamento de peças leves as armas disponíveis eram os artefatos Minié em seus três tamanhos: fuzil, carabina e clavina, alguns Spencer, foguetes e revólveres Lafoucheaux. Fábrica de canhões inaugurada em 1812 já produzia a partir de 1814; os primeiros eram constituídos de quatro peças de oito. Em 1815 foram produzidos canhões de avancarga, de 9,8 cm e de 306 kg de peso. Primeiros eram de alma lisa, logo raiada e aumentado seu calibre. Foram usados ao longo do conflito.

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2.2 REPÚBLICA DE PARAGUAI

O Paraguai tem uma extensão de 406.752 km quadrados; país mediterrâneo, limita com o Brasil a Leste, com a Argentina ao Sul e Oeste e com a Bolívia ao Norte. Atualmente tem 6.348.917 habitantes e seu PIB em 2016 foi de US$ 16 bilhões.

Dom Gaspar Rodríguez de Francia, Ditador Perpétuo e Supremo do Paraguai, governou desde 1814 a 1840, isto é, durante vinte e seis anos, convertendo o País em uma autarquia ao mundo externo. Inclemente com a oposição ou com o que ele entendia como tal, mandava fuzilar a quem entendesse suspeito de conspirar, negava a entrada a estrangeiros ao País e impedia viagens de paraguaios ao exterior.

Considerando-se extremamente patriota e protetor, colocou o Paraguai sob uma redoma para que sua população vivesse absolutamente à margem de influências externas. O Paraguai, dizia José Segundo Decoud (1848-1909), político, jornalista e jurista paraguaio, era um país de contrastes e cita a natureza tropical, belíssima, com a falta de poetas.

“O terror tinha contaminado todos com seu hálito venenoso até a vida se tornar insuportável e a morte era a única aspiração desejada por todas as classes sociais. O terror selara todos os lábios ...”. (POSADA, 1911, pag.49).

O isolamento em relação ao resto do mundo extinguira os últimos germes da ilustração e do saber, convertido em hábito após meio século.

Cecílio Báez (1862-1941), político paraguaio, historiador, catedrático e jornalista, reforçando Decoud, afirmara que a ditadura manteve o estado de ignorância do povo que provinha do regime colonial e jesuítico. Os índios eram tratados como bestas de trabalho, vivendo na maior miséria moral e material. Mestiços e crioulos, livres, aprendiam a ler e contar sem falar o idioma espanhol, vale dizer, não deu um passo para dar à República sua semente de democracia: portanto, nessas condições não existia o conceito de povo ou nação como hoje o conhecemos.

Carlos Antonio López, após a morte de causas naturais de Dom Francia, em 20 de setembro de 1840, iniciou seu governo quatro anos depois. No interregno, um consulado formado por ele próprio e Roque Alonso administrou o País. O governo de Carlos A. López era diferente do governo anterior. Em 1859 já possuía um exército numeroso com fábricas de pólvora e balas, fundição em Ibicuí desde 1854, arsenal em Asunción desde 1855 e uma marinha bivalente: transporte e marinha de guerra. Preocupou-se pela instrução pública, obrigatória e gratuita. A produção gráfica começou a operar, o

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comércio aumentou e o bem-estar se expandiu. Governo duro, mas nem sanguinário nem cruel: era um burocrata, fiel aos regulamentos. Esses regulamentos abrangiam múltiplos setores da vida nacional, como, por exemplo, é impedida a circulação de jornais de fora do País, os sinos das Igrejas deveriam cingir-se aos normativos presidenciais e até os paramentos dos Bispos, dentre outros.

Desde 1844 fixou cotas para estudantes no exterior em quantidade ínfima e em setores pré-determinados. Existiam na Capital poucas escolas primárias.

Sua atuação na área econômica monopolizou o comércio de madeira, de erva-mate, dos couros e povoou as “fazendas da pátria” com vistas a enriquecer o País, mas essa política levava ao empobrecimento do seu povo.

O paraguaio nunca pagou imposto e o País não gerou dívida pública. Os melhoramentos eram pagos às custas do Tesouro. A única fonte de renda do País era o monopólio da erva-mate, onde o Estado a comprava do produtor a 1 shilling a cada libra-peso e a revendia de 24 a 32 shillings. A atividade do Estado era ilimitada e Carlos A. López gastava recursos financeiros acumulados por Francia, tentando modernizar o País, importando tecnologia e contratando técnicos. Dentre muitos destacam-se Whitehead, Diretor do Arsenal da Asunción, e George Thompson, especialista em artilharia. No total, mais de 250 técnicos foram contratados, dos quais 200 da Inglaterra, nas áreas de engenharia e até na de cirurgia. 75% das importações do Paraguai eram de manufaturas inglesas, vale dizer bens de consumo. No que tange ao transporte ferroviário o Presidente Carlos Antonio contratou engenheiros ingleses para elaborar projeto e executar a obra, utilizando-se a distância entre rodas de 1,676 m.

Carlos A. López vem falecer a 10 de setembro de 1862. Seu filho, Francisco Solano López, convoca um congresso e é ungido Presidente em 16 de setembro do mesmo ano.

Solano López estava convencido da inevitabilidade da guerra e passa a dedicar-se diuturnamente a essa tarefa. Entre março e agosto de 1864, portanto antes da guerra, tinha os seguintes campos de treinamento com o número de soldados:

a) Cerro León 30.000 homens b) Encarnación 17.000 homens c) Humaitá 10.000 homens d) Asunción 4.000 homens e) Concepción 3.000 homens

Em janeiro de 1863 registros assinalam a existência no serviço ativo de 22 Chefes, 373 Oficiais e 12945 soldados de tropa. Na reserva e reformados três Chefes, 255

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Oficiais e 16482 soldados de tropa. Urbanos 109 Oficiais e 43.846 soldados de tropa, atingindo todos um total de 25 Chefes, 737 Oficiais e 73273 soldados de tropa.

No início da guerra, segundo Juan Crisóstomo Centurión (FRAGOSO, 1957) o Paraguai contava com 30.000 homens de infantaria e cavalaria. Thompson afirmou que o exército paraguaio contava, quando da invasão da Argentina, 80.000 homens e Masterman e Gould, Encarregado de Negócios de sua Majestade, afirmam que no início de 1865 teria 100.000 homens. O Coronel Francisco Martinez que capitulou em Humaitá de 50 a 70.000 homens e o Ten Cel. Lucas Carrillo, primo de López, que capitulou em Angostura, 56.000 homens. O Gen. Caballero, considerado herói do Paraguai, entregou um apontamento ao Gen. Tasso Fragoso de que López não tinha senão 55.000 homens em armas (FRAGOSO, 1957). Doratioto estima em 77.000 homens o exército de López.

Portanto, incapacitados de dar um número definitivo sobre o exército paraguaio pode-se afirmar que este teria de 55 a 100 mil homens.

Não se deve esquecer que o Paraguai não contava com academias militares: os oficiais vinham da tropa. López importou oficiais estrangeiros como o Cel. Morgenstern, austro-húngaro, o Cel. Eng. Myskowski, polonês, o Cel. Dionisio Lirio, espanhol, o Sgt. Mj. Sebastian Bullo, italiano, o Cel. George Thompson e os uruguaios Pedro Sipitria e os irmãos Pedro e Justiniano Salvagnac, dentre outros.

Pela estrutura da pirâmide populacional do Paraguai o máximo de soldados que o Paraguai poderia mobilizar estaria nas 100.000 pessoas, vale dizer que não era muito o seu potencial de trazer às armas um contingente maior.

Pelo Censo de 1857, publicado por Du Graty em 1862 – e as fontes confirmam isso – o Paraguai teria 1.337.439 habitantes. Esta informação suscita gritante controvérsia. Ora, o primeiro Censo acusava, em 1846, 238.862 habitantes. Para passarmos de 238.862 para 1.337.439 em 11 anos, de 1846 para 1857, a população paraguaia deveria ter crescido 460% no período, ou quase 16% a.a. o que é um absurdo, impossível.

Em virtude dessa visível incongruência a determinação da estimativa de mortos fica muito dificultada. Nas décadas de 1960 e 1970 dizia-se que 80% dos paraguaios tinham sido dizimados e as informações davam conta que de uma população de 800.000 almas, a metade teria morrido. Mas autores estimam que a população antes do conflito não superaria 400.000 pessoas. Como referenciais teríamos o Censo de 1846 citado acima e o de 1886 de 236.751 pessoas (LIMA, 2016). No início de 1960 a população atingia 2 milhões de pessoas. As estimativas recentes mais confiáveis indicam a morte de 15 a 20%

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da população, ou seja, no máximo 80.000 civis e militares, sendo que em torno da metade mortos por doença, fome, maus-tratos, etc.

O cerne da política externa paraguaia era a manutenção do equilíbrio dos estados do Prata. Até aqui Solano López aplicava o princípio da não intervenção, mas mudou-o, pois, a seu ver, a realidade desse princípio gerava risco no que tange à independência de seu País. Dependendo do equilíbrio entre seus dois grandes vizinhos: Argentina e Brasil e se rompido em um desses países ou se estes dois entrassem em um acordo a sua independência correria mortal risco. Conflito armado no Uruguai em 1863 no qual participaram primeiro os argentinos e depois o Brasil fez com que López reclamasse pela manutenção do equilíbrio. O Paraguai não aceitaria o menoscabo da autonomia uruguaia pois provocaria o rompimento do equilíbrio e uma ameaça à independência do Uruguai. O jovem historiador e jurista paraguaio Eduardo Nakayama, em trabalho apresentado no VII Encontro Internacional de História sobre as operações bélicas na Guerra de Tríplice Aliança, concorda com os termos acima expostos.

A República do Paraguai tinha questões de limites com a Argentina e com o Brasil e no ano de 1862 venciam os tratados que as Partes Contratantes tinham assinado para solucionar as pendências. A guerra poderia ser o meio para destravar as negociações completamente estagnadas.

O Império do Brasil mantinha um contencioso com a República do Uruguai pelo tratamento que seus súbditos vinham sofrendo por parte das forças político-policiais da República, as quais não investigavam nem prendiam aqueles que, dentre outras ações, sequestravam fazendeiros, queimavam plantios, estupravam seus familiares, roubavam gado, e não respondiam às reclamações oficiais, chegando-se ao ponto que fez com que os fazendeiros gaúchos sob a liderança do Gen. Neto fossem à Corte pedir a Dom Pedro II que agisse de modo a sustar esse estado de coisas. Como resultado, Dom Pedro envia ao Uruguai o Conselheiro Saraiva para negociar a solução dessas controvérsias. Apresenta-se ao Governo com as suas credenciais e a resposta mais de uma vez é protelada até que, se afunilando o tempo, o Conselheiro Saraiva eleva ao Governo uruguaio seu ultimatum, de modo a que se, em seis dias não fosse encaminhada a solução das pendências, o Império tomaria as devidas represálias invadindo o País.

O Governo uruguaio, do Partido Nacional (blanco), respondeu queimando em praça pública os Acordos Brasil Uruguai de 1852 e enviou tropas à fronteira. O ambiente revolucionário da hora impediu o momento de razão do Governo e a crise se converteu na crônica de uma morte anunciada. Historiadores acreditam que a hora da Missão Saraiva estava errada. Não teria o Governo da República do Uruguai graus de liberdade que lhe

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permitisse tomar outra decisão que a adotada. O Império desloca suas forças pela cidade de Melo sob o comando de Mena Barreto e Tamandaré sitia Montevideo e, se dirigindo ao norte, sitia e bombardeia Salto e Paysandú. Embora os historiadores divirjam sobre a característica da invasão ela se configura como um ato de represália, sendo que, após a adoção dessas medidas, a tropa retira-se.

O Império do Brasil funda as colônias de Dourados e Miranda na margem direita do Rio Apa, protegidas pelo Tratado de 1856, área em litígio assentado na teoria do uti possidetis.

López observa a situação do Uruguai com sofreguidão e um mês depois, em 11 de novembro de 1864, apreende o “Marquês de Olinda”, seus passageiros e tripulação, navio que fazia o trajeto Rio de Janeiro/Mato Grosso, nesta viagem levando o Presidente da Província, mantimentos e dinheiro para as unidades militares daquela região. Rompe relações com o Brasil e impede a navegação nas águas internacionais dos Rios Paraná e Paraguai. Em 3 de dezembro do mesmo ano avança sobre o Mato Grosso via fluvial e em 29 via terrestre ocupa territórios em litígio. Posteriormente, encaminha pedido à Argentina para adentrar naquele País de modo a acessar o Rio Grande do Sul. Argentina nega essa autorização e López lhe declara guerra e invade e ocupa Corrientes, apreendendo dois navios que se encontravam no porto.

Após Corrientes, forças paraguaias invadem o Rio Grande do Sul ocupando Uruguaiana, São Borja e Itaqui. A partir destes momentos a Guerra era uma realidade, obrigando seus atores a acertar os detalhes de um conflito bélico de longo alcance e que ficaria sacramentado em maio de 1865 com a assinatura do Tratado de Tríplice Aliança.

Cecílio Báez informa que há concausas que contribuíram para o desfecho da Guerra de Tríplice Aliança:

a) A tendência beligerante do Império e da Argentina contra o Governo “blanco” do Uruguai;

b) O Acordo Mitre/Império Brasileiro de 22/8/64 em Puntas del Rosario foi a “causa determinante” da guerra declarada por López que expressava que ambos países teriam “o dever e o interesse de manter a independência, a integridade do território e a soberania da República Oriental do Uruguai” e que também teriam o direito de intervir “nos casos de desinteligência, como procedem todas as nações. ”;

c) O temperamento irascível de Solano López ao ser marginalizado dos acordos de ’64 e a influência da solerte diplomacia oriental na pessoa de José Sagastume;

d) As intenções permanentes de Solano López de hostilizar a Argentina e o Brasil; e) O Presidente López se sentia enclausurado pelo Império e desejava expandir-se.

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Por conseguinte, resumindo teríamos as seguintes causas mediatas e imediatas que definiram a guerra:

Causas Mediatas

1. A Guerra civil no Uruguai: Blancos e Colorados em luta com a invasão do Gen. Flores em 1863, para derrocar o Presidente Bernardo Berro.

2. A participação ativa do Brasil em função das tropelias feitas por agentes políticos e policiais contra súbditos brasileiros. O bombardeio de Salto, a tomada de Paysandú e o sítio de Montevideo.

3. O Presidente Atanásio Aguirre, do Uruguai, pedindo intervenção do Paraguai, por intermédio de seu emissário José Sagastume, denunciando pacto inexistente Brasil-Argentina para dividir o Paraguai.

4. O Estado de guerra declarado pelo Paraguai pela captura do “Marquês de Olinda”, a proibição de uso do rios internacionais e a invasão do Mato Grosso e do Rio Grande do Sul.

Causas Imediatas

1. A Negativa da Argentina de autorizar a passagem de forças paraguaias por território argentino para atacar o Brasil, arguindo neutralidade.

2. A declaração de guerra do Paraguai à Argentina e a invasão de Corrientes, com a captura de dois barcos. A declaração de guerra chegaria depois.

3. A Situação de guerra anterior entre Paraguai e Brasil.

Aliados também aduziam o armamentismo e a militarização do “Átila da

América”, como era conhecido López pela imprensa bonaerense, e a necessidade de

civilizar o Paraguay, liberando-o da ditadura lopizta.

O Paraguay tinha tomado todas as suas decisões para ir à Guerra, agora vai suportar o seu ônus.

2.3 REPÚBLICA ORIENTAL DO URUGUAY

Uruguay é um pequeno país de 177.508 km quadrados e com uma população que, segundo o Censo de 1860, tinha 229.000 habitantes. Encravado entre a República Argentina com a qual faz limites pelo Rio Uruguay e o Rio da Prata e com o Brasil, ao Norte, no Rio Quaraí ou Cuareim, o da Invernada e a Lagoa Mirim, teve a sua independência assinada no ano de 1828 na Convenção Preliminar de Paz e sua primeira

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Constituição foi assinada em 1830 quando inicia a vida institucional da República. A Constituição foi uma cópia da Constituição Argentina de 1826, alheia à ciência política e desconsiderando a idiossincrasia de sua cultura, fazendo tabula rasa de toda realidade (ZUM FELDE, 2016). Tanto isso é assim que a instituição mais arraigada na história da nova República, o Cabildo, o parlamento nativo, escola de democracia, é suprimido pelos Constituintes.

Banhado pelo Rio da Prata e o Oceano Atlântico a leste e o Rio Uruguay a oeste é um país levemente ondulado com coxilhas, com rios e arroios interiores abundantes e de campos de excelente qualidade para a exploração agropecuária sem acidentes geográficos notáveis. O clima é ameno e considerado temperado. Localizado entre dois grandes países, Brasil e Argentina, foi palco de inúmeras intervenções e revoluções com a presença do caudilhismo, militarismo, guerras civis, motins e crises econômicas.

A Constituição de 1830, que vigerá por mais de 80 anos, vai ser motivo de perturbações nos anos seguintes à sua promulgação. A forma de organização unitária fará com que o Poder Executivo, macrocéfalo, absorva poder desproporcional e, absoluto, será indutor de violência de todo tipo, mas também eleitoral, favorecendo a prepotência do caudilhismo. Pela impraticabilidade de muitas normas constitucionais passou-se a ignorá-la, a descumpri-la.

As revoluções estão inclusas implicitamente na Constituição e estas foram o único meio durante um século para as oposições acederem ao Governo. Para garantir que as eleições fossem absolutamente limpas seria necessário que os dirigentes políticos fossem pessoas de perfeita austeridade. E uma Constituição como a de 1830 não garantia isso, num País envolvido em guerras, sem hábito de governo civil e sem educação política, com uma população rural analfabeta, sem infraestrutura, sem indústria e sem agricultura, com apenas os interesses do latifúndio por extensão. E essa foi a Constituição que sepultou o Cabildo e deixou nas mãos do Presidente todos os poderes, inclusive o eleitoral.

Montevideo foi sitiada por oito anos, desde fevereiro de 1843 até a paz em 1851, resultado do surgimento dos dois partidos políticos tradicionais no País e os planos rosistas de reincorporar a Banda Oriental às Províncias Unidas do Rio da Prata. Concomitantemente vão coexistir dois governos: o do Cerrito (local fora das muralhas da cidade) comandado por Oribe que controlará todo o País por oito anos, menos a Capital, e que restabelecerá a Câmara de Representantes e o Senado, fechados por Rivera; e o da Defesa, comandado por Rivera, também por 8 anos, controlava apenas Montevidéu, dentro de suas muralhas. Seu staff era formado por liberais que outrora tinham militado

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ao lado de Lecor na Cisplatina, no chamado Clube do Barão. Eram a nata da sociedade, urbanos, deploravam o caudilhismo e o autoritarismo. Dentre eles o jovem Andrés Lamas que logo após representaria o Uruguai na Corte de D. Pedro II. Dos estrangeiros, Garibaldi o mais notório, e os emigrados argentinos, unitários, como Paz e Lavalle, Mármol, Alberdi e Sarmiento. No plano militar jovens como Venancio Flores, Anacleto Medina, César Díaz e Lorenzo Batlle.

A luta contra o poder espanhol encerra em 1814 e contra o luso-brasileiro que vai de 1817 até 1828. Porém, a série de guerras civis após a Constituição e até a queda de Rosas em Caseiros, ou seja, 20 anos após o Tratado de Paz que, muito a contragosto, a Argentina reconhecia a independência do Uruguay vão continuar atormentando a população. Neste momento a história conjunta entre Argentina e Uruguay se separa para cada parte ter autonomia nas suas relações.

Numa linha de tempo, podem se visualizar três momentos da sua vida política: a) Desde o movimento emancipador de 1811 até a Convenção Preliminar de Paz de 1828; b) Desde a Convenção até a paz de outubro de 1851; e

c) Desde 1851 até nossos dias.4

O país navegava entre o Federalismo das Províncias capitaneado pelo caudilho e Chefe dos Orientais, José Artigas, e o unitarismo portenho (relativo ao porto de Buenos Aires). A Província – a Banda Oriental – se converteu em República, apesar de que muitos orientais não a desejavam. Rosas faz uma política de intrigas, fomentou discórdias e promoveu revoltas, contra o primeiro Presidente, o Gen. Fructuoso Rivera, atiçando contra ele o Gen. Lavalleja, liderança da invasão dos 33 Orientais. O movimento fracassa e Lavalleja e seu pessoal se refugiam no Brasil. O Uruguay é invadido por forças argentinas que são derrotadas pelo Governo. O tirano Rosas novamente monta uma nova revolução disponibilizando a Lavalleja os meios para tanto. Novamente é derrotado e novamente refugiado no Brasil. Rosas com seus movimentos consegue como inimigo o próprio Presidente Rivera.

Assume a Presidência o Gen. Oribe e rompe relações com Rivera. Observa-se um fenômeno interessante pois passam a visualizar-se muito claramente os dois partidos em ação: o Nacional - Blanco (Oribe) e o Colorado (Rivera), e uma simetria com os partidos argentinos unitários e federais.

Rivera, hostilizado pelo Governo de Oribe levanta-se em armas contra o Governo já na terceira guerra civil após a Constituição, apoiada pelos inimigos de Rosas. Há uma

4 ZUM FELDE, 2016, pag.144.

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simbiose muito grande entre os caudilhos e as cores de suas divisas. Oribe procura acusar Rivera de malversar recursos públicos durante seu governo. Comissão foi instalada com a finalidade de investigar, comprovando-se grande desordem nas contas públicas. Parte-se daí uma campanha tendente a anular o prestígio do Gen. Rivera e reduzir-lhe seus círculos de influência.

Rivera levanta-se contra o Governo com o apoio dos unitários argentinos, inclusive com colaboração militar. Rosas, por seu lado, manda tropas argentinas ao mando de Lavalleja para apoiar Oribe.

Montevideo, capital da República é ao mesmo tempo a capital do anti-rosismo; Rivera faz aliança com Lavalle, o chefe unitário e os franceses em guerra contra Rosas. Ali estavam Mitre, Sarmiento, Alberdi e tantos outros que depois iriam tomar conta do governo argentino.

Em abril de 1845, Plenipotenciários da França e Inglaterra oferecem plano de paz, rejeitado por Rosas que queria que a praça fosse entregue a Oribe e estas duas potências de acordo com o Governo da Defesa levam a Rosas um ultimatum para que retire do Uruguai suas tropas e navios. A esquadra europeia bloqueia o porto de Buenos Aires e toma os navios de Rosas com o apoio da esquadra da Defesa ao mando de Garibaldi.

Há uma segunda intervenção da Inglaterra e França em julho de ’46 propondo nova eleição para Presidente, rejeitada por Oribe. Uma terceira intervenção em maio de ’47 franco-britânica, também, sugere um armistício que o Governo da Defesa rejeita e motiva a retirada da Inglaterra de seu papel protagônico e retorna à Europa. A França permanece e garante o bloqueio a Buenos Aires e a ajuda à Defesa. Proposta de paz encaminhada pelos franceses é apoiada por Oribe que, a mando de Rosas, retira seu apoio.

Montevideo alia-se ao Brasil e à Urquiza o que representará o fim de Rosas. No ano de ’47 o Uruguai manda seu Ministro Andrés Lamas ao Brasil quem obteve a colaboração imperial contra o tirano. 1851 verá a Guerra Grande se encerrar. O ano de 1851 será o ano da assinatura de Tratados do governo da Defesa com o Brasil, porquanto sitiado por terra por Oribe, estava também sitiado por mar pela esquadra da Confederação ao mando do Almirante Brown, Inglaterra e França tinham assinado tratado de paz com Rosas e tinha cessado a ajuda de ambas as potências.

Ora, só restava o Império do Brasil e a negociação foi cara ao governo da Defesa. Acarretou a retificação das fronteiras e autorizou o Império a levantar fortes em território oriental nas desembocaduras dos rios Taquari e Cebollatí, O Brasil entregava um montante de recursos financeiros e um valor mensal a juros de 6% e o Uruguai

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hipotecava as rendas aduaneiras e as do Estado como garantias. Foi convencionada a livre navegação do Rio Uruguai e seus afluentes, ficava suspensa por dez anos a cobrança de direitos de trânsito aos semoventes de fazendeiros brasileiros e suprimia a proibição de exportação de gado em pé. Em compensação, o Brasil isentaria pela fronteira do Rio Grande do Sul a exportação de charque uruguaio e outros produtos da pecuária. Finalmente, foi assinado outro tratado referente à extradição onde ambas as Partes se comprometiam a devolver criminosos, desertores e escravos fugidios de ambos os países, apenas contra o pedido do senhor ante a autoridade constituída.

Mas a guerra das divisas continuava e a violência terrível foi a consequência dos rancores e ódios sem limites. Quinteros terá a sua contrapartida em Paysandú. O assassinato de Flores, com a morte de Berro no mesmo dia. Anacleto Medina, executor em Quinteiros, é caçado dez anos depois, lanceado, tirada a sua pele e enterrado vivo. 1852 é o ano da derrota rosista em Caseros que conduziria o tirano para a Inglaterra.

O Presidente blanco Juan F. Giró (1852-53) foi tirado do poder por um golpe dos colorados: Venancio Flores, colorado, governa até 1855. A fusão dos partidos levou ao poder Gabriel A. Pereira. Sofreu uma tentativa de golpe de uma dissidência colorada e suas lideranças blancas foram fuziladas em Quinteros. Bernardo Berro governou o País entre 1860 e 1864. Em 1863, Venancio Flores invade o Uruguai auxiliado por Bartolomé Mitre, enquanto o Presidente Berro procura ajuda no Paraguai, ajuda essa que nunca viria.

A Corte de São Cristóvão vinha reclamando – e o fez em múltiplas oportunidades – ao Governo uruguaio pelos desmandos que ocorriam no interior do País, por parte das autoridades políticas e policiais contra súbditos brasileiros, fazendeiros naquele País. Somavam-se denúncias de roubos, abigeatos, homicídios, estupros e outros crimes, sem que o Governo Berro desse uma explicação. O Gen. Netto, liderança dos fazendeiros e em nome destes, vai à Corte pedir intervenção do Imperador. A Corte enviou o Conselheiro Saraiva como Plenipotenciário para negociar essas reclamações. Mais uma vez não são atendidas e Saraiva entrega seu ultimatum ao Governo uruguaio para que em seis dias trouxesse uma solução à controvérsia, senão o Império adotaria represálias não é aceito, e o ultimatum é queimado junto com os Tratados de 1851 em praça pública de Montevidéu e rompidas as relações diplomáticas entre os países.

Tropas brasileiras invadem o Uruguai por Melo sob o comando de Mena Barreto e Tamandaré bombardeia Salto e Paysandú, auxiliado por forças riograndenses e partidários de Venancio Flores.

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Venancio Flores assume a Presidência do Uruguay e reconhece a validade das reclamações brasileiras e as relações diplomáticas são regularizadas. As atitudes tomadas por Solano López constam do capítulo referente ao Paraguay.

Relativamente a causas específicas que induzissem o Uruguay à guerra não existiram. Não havia problemas pois não eram limítrofes, não tinha havido agressões e violências por parte do Paraguay. O que existia sim era o comprometimento do Uruguay para com o Brasil, por este, na sua luta pela questão exposta na Missão Saraiva, ter ajudado Venancio Flores a assumir a Presidência daquele País.

Estavam dadas as condições para o Uruguay aderir à aliança que se estava gestando contra o Paraguay.

2.4 IMPÉRIO DO BRASIL

Brasil, país-continente possui uma extensão de 8.516.000 de km quadrados, tem atualmente 207 milhões de habitantes, faz fronteira com todos os países da América Latina, excetuando Chile e Equador, conformando a metade oriental do continente.

O Império do Brasil possui características inéditas no que tange à sua emancipação e independência em 1822. Em 1808 já era sede de um reino europeu em terras tupiniquins: Dom João VI, Regente em Portugal e a sua mulher, a Princesa Da. Carlota Joaquina, fogem para o Brasil diante da invasão de Portugal pelos exércitos de Napoleão. Amparado por forças inglesas Dom João VI traz o Reino de Portugal para o Rio de Janeiro, com armas e bagagens, com a Biblioteca, o Tesouro, o Arquivo Real, a burocracia portuguesa e os burocratas. Em 1816 seria formado o Reino de Portugal,

Brasil e Algarves. A Independência do Brasil vai ocorrer com o retorno de Dom João VI a Portugal já sem o perigo napoleônico. Pressionado Dom Pedro I também

para retornar, este decide ficar e em 7 de setembro de 1822 e declara em alto e bom som a Independência do Brasil com grande apoio popular e quase sem derramamento de sangue, bem diferente do que ocorreu com as colônias espanholas.

Logo após disputa pelo trono português leva Dom Pedro I a abdicar e voltar para a Europa em 1831, deixando seu filho de cinco anos com tutores e Regente na Corte de São Cristóvão. Aclamada a criança, ratificou-se a manutenção da monarquia (CARVALHO,

2012). Nesse período o Brasil seria governado por brasileiros.

Ocorreram revoltas contra a ordem constituída durante a Regência em todo o País (1831-1840). Três províncias separaram-se do Brasil: Bahia, Pará e Rio Grande do Sul.

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Apesar das revoltas o Brasil Império permaneceu inteiro e uno. Não é a língua que obteve isso nem as dimensões do Império. Encontramos as raízes da unidade nacional em uma das heranças benditas de Portugal: a influência de Coimbra e dos intelectuais brasileiros que foram lá estudar. O Brasil não se fragmentou como a América espanhola.

Quando da abdicação de Dom Pedro I, não poucas foram as desforras contra os portugueses que controlavam a administração pública, por parte de funcionários e soldados, em suma, “tropa e povo” (CARVALHO, 2012). Houve revoltas em Salvador, Recife, Bahia, Minas e Alagoas. Três novas viriam a surgir no Pará, no Rio Grande do Sul e no Maranhão: a cabanagem, a farroupilha e a balaiada.

As rendas nacionais do período consistiram nas exportações de açúcar e algodão na Região Norte e do café no Sudeste. Continuou o tráfico de escravos em função da agricultura de exportação: 80% das receitas do comércio exterior provinham dessas operações (CARVALHO, 2012).

Dom Pedro II foi o grande incentivador das ciências, artes, música e cultura em geral. A Floresta da Tijuca aquele maravilhoso verde que se observa ao chegar ao Rio de Janeiro foi ele que mandou plantar, muda por muda, substituindo os pés de café. Desde criança foi preparado para ser Príncipe e o liberalismo regencial marcou a sua educação política. Falava fluentemente 14 línguas; nas suas viagens ao exterior era assíduo visitante de museus e monumentos, fábricas e teatros e conversava com personalidades desses ambientes. Perdeu o contato com Darwin mas conversou com Pasteur, Victor Hugo e outros. Prestigiou permanentemente o Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, fazendo dele um centro de estudos sobre o Brasil, e o Colégio Dom Pedro II. Poderia ser considerado o patrono do meio ambiente do Brasil já em 1850. Na área da fotografia mandou comprar equipamento para registrar as imagens que colecionava. Deposto, doou mais de 20.000 fotos da Coleção Teresa Cristina: foi um repórter de seu tempo.

Naquele Brasil, 85% da população era analfabeta. Dois mundos isolados: um, culto, erudito, de formação; outro, de raízes populares que se manifestava na religião, na música, nas diferentes expressões artísticas. Ponto de encontro das duas vertentes foi o conto popular.

O primeiro censo nacional foi o de 1872. A população brasileira atingia 9.930.478 habitantes, dos quais 85% livres e os demais escravos. A população escrava tinha sido dizimada pela epidemia de cólera de 1855, pelo acatamento do Bill Aberdeen que impedia o tráfico de escravos, o índice de natalidade diminuindo e o de mortalidade aumentando foram responsáveis pelo percentual atenuado da população escrava.

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O mesmo censo revelava que apenas 18,6% da população livre sabia ler e escrever, que 76,5% dos homens eram analfabetos e as mulheres atingiam um percentual maior: 86,5%.

A Constituição foi reformada em 1834 aumentando o grau de autonomia das províncias, abolindo o Conselho de Estado mantendo a vitaliciedade do Senado e a eleição popular do Regente. A Regência determinou em 1831 o fim do tráfico de escravos.

Dom Pedro II, já com 14 anos, órfão de pai e mãe, foi o pivô de um golpe que o considerou maior nessa idade para poder assumir o Reino. Foi recriado o Conselho de Estado e reformado o Código de Processo Criminal, tornando-o mais duro.

Em 1847 foi criado o cargo de Presidente do Conselho de Ministros, incumbido do Poder Executivo. O Poder Moderador, próprio do Imperador, era usado para dissolver a Câmara quando esta se opunha, por exemplo, à sua composição, ouvido o Conselho de Estado. Em 50 anos houve 36 gabinetes. Os partidos – Conservador e Liberal – se alternavam no Governo.

1850 foi, na vida do 2º Reinado, um ano paradigmático pelas mudanças encetadas em prol da modernização. Extinto o tráfico de escravos, promulgada a Lei de Terras, unificou-se a Guarda Nacional e aprovado o primeiro Código Comercial. Surgiram bancos, indústrias, empresas de navegação a vapor (FAUSTO, 2012). Acrescidos os percentuais das tarifas aduaneiras as rendas do Governo em 1844 que fizeram que dobrassem no período 1852-1853 em relação a 1842 e 1843 (FAUSTO, 2012).

Liberais e conservadores assinaram um acordo nacional consubstanciado no Ministério da Conciliação, vigente até 1861. Foi definida pelo Gabinete a posição quanto à política no Prata. Em 1852 Rosas tinha sido derrotado pelas forças aliadas na Batalha de Monte Caseros que se resumiria em “não conquistar e não deixar conquistar”.

Em 18 de junho de 1864 foi assinado um Pacto entre o Brasil com a participação do Conselheiro Saraiva; a Argentina representada pelo seu Ministro Elizalde, Venâncio Flores e a presença do Plenipotenciário Thornton em local denominado Puntas del Rosario, no Departamento de Colonia, Uruguay, muito próximo da Colonia do Sacramento, para examinar a situação do Uruguay, antevendo a invasão pelas forças brasileiras e a situação do Presidente Berro. Carta de Saraiva a Nabuco disse que “a Tríplice Aliança não surgiu depois da agressão paraguaia à Argentina em abril de 65 e sim nas Puntas del Rosario em junho de 1864”.

Na oportunidade, o Ministro Elizalde ouviu representantes de Atanasio Aguirre, que substituíra Berro, assim como Saraiva e Thornton ouviram Flores. Aguirre aceitou

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mudanças no Ministério substituindo blancos por colorados, porém este recua posteriormente e pede ajuda ao Paraguai. Nesse recuo caem por terra as exigências de Flores: o reconhecimento de promoções no Exército e e a não exigência de prestação de contas das despesas de guerra que se converteriam em dívida nacional pública.

O ano de 1864 traria novamente os ventos da guerra: o conflito que haveria de vir sentia-se nos proprietários de terras brasileiros no Uruguay que vinham sendo violentamente perseguidos pelas forças oficiais uruguaias. Reclamavam interferências da Corte: esta fazia os protestos diplomáticos, os quais nem respondidos eram. Determinado momento os fazendeiros reunidos decidem enviar o Gen. Neto ao Rio de Janeiro para se entrevistar pessoalmente com Dom Pedro II e levar-lhe os seus pleitos. O Ministério enviará ao Prata o Conselheiro Saraiva para negociações e resolver definitivamente a questão. Frustradas as negociações, o Império do Brasil jogará em peso seu poder nacional invadindo o Uruguay pela fronteira de Melo, sitiando Montevideo e bombardeando Salto e Paysandú, nos meses de novembro e dezembro, para após retirar-se.

Nesse meio tempo, o Uruguay aliado do Paraguay suplica àquele País que o defenda sem este atendê-lo, restringindo-se a declarações belicosas sem maiores efeitos.

3 CONCLUSÃO

CONSEQUÊNCIAS DA GUERRA DE TRÍPLICE ALIANÇA

A bibliografia revisionista insiste, até hoje, no papel da Inglaterra no desfecho e manutenção da guerra, como a sua grande incentivadora e promotora e o Império do Brasil como seu sócio executor. Este estava virtualmente de relações interrompidas com a Inglaterra pois não era atendido plenamente o Bill Aberdeen que proibia o tráfico de escravos e tinha, ainda, outras questões, a resultante da Missão Christie que procurava indenização pelo roubo da carga do navio Prince of Wales, naufragado nas costas do Rio Grande do Sul, explicações por incidentes entre uma fragata inglesa e um bote que redundou na morte de um marinheiro brasileiro, arruaças entre marinheiros bêbados ingleses e cinco barcos brasileiros capturados no mar por navios ingleses para receber a indenização do Prince of Wales.

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Essas informações desmentem clima para qualquer acordo entre a Inglaterra e o Brasil que só se desmancharia quando da rendição de Uruguaiana com o Ministro Thornton ante o Imperador Pedro II.

Outra acusação assacada contra o Império do Brasil é que este era expansionista. Os problemas de limites com seu vizinho Uruguay estavam resolvidos desde 1851 e a disputa com o Paraguay era pela terra do Mato Grosso entre os Rios Branco e Apa que estava tecnicamente em negociações. O Império do Brasil tinha se acolhido à tese do uti possidetis. A invasão do Uruguay foi em represália pela omissão das autoridades daquele País ao não adotar qualquer medida contra os malfeitores nem contra as autoridades que os protegiam. Invadiu, fez a represália e retornou ao Brasil.

José Maria Rosa (1906-1991), advogado, professor universitário, historiador e diplomata argentino, um dos historiadores mais representativos do revisionismo histórico no seu País, escreveu que o Ministro inglês Thornton não desejava hecatombe do Paraguai, talvez destruir Humaitá, os fornos de Ibicuí, estabelecer um regime democrático e a abertura das fronteiras para as mercadorias inglesas. O Paraguay já estava aberto às importações provenientes da Inglaterra.

Também nessa linha de esclarecimentos é importante elucidar uma afirmativa repetida ad nauseam pelo revisionismo de que a Inglaterra estava de olho no mercado paraguaio. Ora, o Paraguai era importador da Inglaterra de bens de consumo, de tecnologia e de técnicos. Observem-se os volumes, em libras, do comércio exterior dos países envolvidos na Guerra em 1860:

PAÍS COMÉRCIO EXT (em £) IMPOSTOS (em £)

PARAGUAY 560.392 314.420

ARGENTINA 8.951.621 1.710.324

URUGUAY 3.607.711 870.714

BRASIL 23.739.898 4.392.226

Fonte: DORATIOTO (2002)

É evidente que o Paraguay, um país pobre, tinha um comércio exterior de pequeno porte, que não tinha condições de se expandir e que não ofereceria à Inglaterra qualquer atratividade. A baixa captação de impostos também não destinava ao setor público montante que pudesse demonstrar que realmente era um país que estaria criando efeito demonstração para os outros da região.

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De outro lado, o revisionismo afirmava que a Inglaterra queria destruir todo e qualquer exemplo que mostrasse ao mundo o desenvolvimento econômico autossustentado e moderno. O que se constata é que o uso de tecnologia, por exemplo, no transporte ferroviário, na telegrafia e nas fundições e no fabrico de armas e munições foi o resultado da importação de tecnologia e técnicos da Alemanha e da Inglaterra.

O Império do Brasil gastou nos cinco anos que durou a Guerra a importância de 14 Orçamentos referentes ao ano de 1864. 139.000 homens estiveram na Guerra em nome do Império do Brasil, excetuado o contingente do Exército profissional e da Marinha, quando este tinha 9 milhões de habitantes, ou seja, 1,5% da população.

No momento do ultimatum do Conselheiro Saraiva ao Governo do Uruguai, em 4 de agosto de 1864, o exército brasileiro compunha-se de 16.000 homens. Desde 1861, os liberais pediam na Câmara que se reduzissem as forças militares previstas para 1864-65 fixadas em 18.000 homens (FRAGOSO, 1957).

Em 1º de julho de 1865 havia 18.977 homens em Concórdia (Argentina) sob as ordens do Gen. Osório. Ao invadir o Paraguai o Brasil dispunha de 67.365 homens e para 1867 estava previsto um contingente de 71.039 homens (FRAGOSO, 1957).

No conflito bélico morreram em torno dos 50.000 brasileiros, dos quais 4.000 de cólera, número este avalizado pelo Visconde de Ouro Preto, 18.000 argentinos dos 30.000 mobilizados e o Uruguai teve 3.120 mortos num total de 5.000 soldados mobilizados (LIMA, 2016, pág. 370) O número de mortos descrito por Tasso Fragoso era sensivelmente menor. Entre mortos, feridos e extraviados, oficiais e praças, até 18 de agosto de 1869, no total de 23.917.

Dos 50.000 soldados alistados como Voluntários da Pátria voltaram 14.000, sendo 1.000 mutilados de guerra sem condições de sobrevivência econômica e para eles foi criado o Asilo dos Inválidos da Pátria.

Da Guerra surge um novo Exército, unido, que seria protagonista principal na queda do Império e na Proclamação da República, impregnado pelo positivismo de Benjamim Constant na defesa dos ideais republicanos. A sociedade civil começa a dar sinais de vida organizada e assim como o Exército outros grupamentos e instituições, bem como classes sociais onde se destaca o operariado, passam a exercer suas influências na defesa de seus interesses.

O percentual de mortos paraguaios é muito dúbio. Os dados de censo não fecham e isso foi levantado no capítulo das causas que tinham levado o Paraguai à Guerra. No entanto, a estimativa mais provável seria a de que morreram no País entre 15 e 20% de sua população, ou seja, se em 1846 o Censo afirmou existirem 238.862 habitantes e no

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Censo de 1886 haveria 236.751 indivíduos, tendo morrido aproximadamente 50.000 paraguaios (LIMA,2016, pág. 370).

As dívidas externas do Brasil e da Argentina com a Inglaterra dispararam violentamente. A Argentina ficou no vermelho em 100 milhões de libras e o Brasil, entre 1871 e 1889, atingiu 402 milhões de libras (LIMA, 2016), sendo que a Guerra consumiu 337 milhões.

Em compensação, a Guerra teve faceta relevante para a Argentina que foi a principal fornecedora da cavalhada, bois, forragens e alimentos em geral, cujos principais produtores e comerciantes foram o próprio Urquiza, Lezica e Lanús, investindo os recursos em infraestrutura, educação, justiça e na organização do Exército (LIMA, 2016). O Uruguay não sofreu grandes prejuízos financeiros e saiu do conflito perfilando-se como nação próspera atraindo capitais e migrantes. O maior prejuízo foi em vidas humanas: o Uruguay teve percentualmente mais mortos e feridos do que os aliados, 62% de seu contingente, resultado da lei dos grandes números à inversa.

O Império do Brasil resolveu a maioria de suas pendências com o Paraguay: a fronteira pleiteada e baseada no uti possidetis ficou definitivamente regularizada. Foi também sacramentada a livre navegação dos rios internacionais e, com o Uruguay, viu, ainda antes da Guerra, solucionada a perseguição a súbditos brasileiros, na maioria fazendeiros gaúchos, com a queda do Presidente Atanásio Aguirre. Em suma, o fim da Guerra encontrou o Império no apogeu de seu poder militar e diplomático.

O Paraguay foi quem deveras sofreu mais. Sua capital, Asunción, foi evacuada em fevereiro de 1868 quando a Marinha Imperial passou Humaitá. As tropas argentinas acamparam perto da Capital e as tropas brasileiras entraram na cidade. O resultado não envaidece ninguém, pois os roubos e as arruaças diárias impregnavam o quotidiano da cidade. A mendicância se estabeleceu pedindo aos quatro cantos alguma coisa para comer, convivendo com cadáveres insepultos, mortos pela fome e a miséria.

Dos 100.000 homens mobilizados pelo Paraguay e envolvidos no conflito, divididos em 200 regimentos originais e 16 corpos, em Cerro Corá, no último momento da Guerra, foi achado no bolso da camisa de Panchito, o filho de López, o número de 409 soldados remanescentes de diferentes idades. Resulta impossível afirmar com certeza qual o percentual de pessoas que remanesceram da guerra: a realidade, sim, é que o esforço de recuperação teve de ser marcado pelo necessário repovoamento do País e para isso não se pouparam energias. O Paraguai teve de encarar indenizações e sanções econômicas e recorrer aos bancos ingleses pela primeira vez para levantar financiamento de 1 milhão de libras.

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O Atlas da Guerra do Paraguai elaborado pelo Ten Cel. Jourdan e o Corpo de Engenheiros, dentre os quais consta o nome do Cap. Benjamim Constant, no fim da Guerra, encontrado na Biblioteca do Senado Federal, relata as perdas de materiais no período de 25 de maio de 1865 a 5 de agosto de 1868:

PARAGUAY

271 canhões, oito navios, 13 baterias flutuantes, sete estativas de foguetes à Congrève, 51 bandeiras, armamento e munições.

IMPÉRIO DO BRASIL

Cinco Canhões, dois navios (um encouraçado), 50.000 homens (maior parte devido a moléstias da insalubridade, longas marchas, privações e cólera).

ARGENTINA

Nove canhões, 15/18.000 homens.

A Argentina não expandiu as suas fronteiras, tem muitos mortos, os soldados retornam com febre amarela e cólera. Seu endividamento aumentou sensivelmente e permaneceram os problemas de limites com o Paraguay, concluídos só após cem anos de acabada a guerra. No que tange à desembocadura do Rio Pilcomayo, fruto do tratado Ameghino-Pecci, saiu favorecido o Paraguai. Anexou definitivamente o território das Missões e o Chaco Central.

Concluindo, podemos afirmar de que a Guerra de Tríplice Aliança foi de uma violência tal onde afloraram os piores instintos humanos, mas também, paradoxalmente, se teve oportunidade de apreciar inúmeras demonstrações de valentia, arrojo, coragem e destemor em todos os exércitos que participaram da contenda.

Não podemos deixar de citar Caxias, Osório, Tamandaré, Barroso, Andrade Neves, Tibúrcio, Neto e tantos outros. Na Argentina, o seu Presidente, Gen. Bartolomé Mitre, fiel aliado, respeitador do Brasil, com relevante autoridade política, literato e militar. Do Uruguai deveríamos citar, ao menos, o Cel. León de Palleja, valente militar espanhol a serviço da República, que caiu morto na Batalha de Boquerón del Sauce.

Mas, por quê o Império do Brasil não só foi à guerra como a liderou em força militar, materiais e entusiasmo? O autor entende que o ponto de inflexão foi a apreensão do “Marquês de Olinda” e a invasão do Mato Grosso e do Rio Grande do Sul, sendo que a reação foi de tal porte que inflamou todo o País. O poder militar estava forte, vinha anos atrás do combate ao tirano Rosas, com as forças brasileiras e Osório participando do desfile das forças vitoriosas em Buenos Aires pela vitória de Caseros (Santos Lugares).

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O Império do Brasil não estava preparado para a guerra. Não estava preparado e não a queria. Foi levado pelos fatos a defender a honra do Brasil e de suas instituições. A Província do Mato Grosso – área que estava em litígio – estava desprovida de apoio militar que lhe desse sustentação. O Presidente da Província Souza Gonzaga em Relatório ao Visconde de Boa Vista registrou:

“Poucas forças de linha, mal armadas e disseminadas em pontos longínquos. Arsenais e depósitos desprovidos. Os regimentos não tinham cavalhadas. Havia na Província 5 Regimentos e 3 Batalhões com um total de 2.503 homens”.

O Mato Grosso não estava só desorganizado, estava abandonado. 41.000 habitantes e um estado militar lastimoso (BARROSO, 1952).

Houve pontos relevantes no conflito. Por exemplo, dentre outros e, em primeiro lugar, a invasão da terra paraguaia próxima a Itapiru por 12 cavalarianos comandados por Osório como força precursora sem saber o que haveria depois das barrancas, a Batalha de Riachuelo que dizimou a marinha lopizta, as Batalhas de Tuyuti e Curupaiti onde os vitoriosos na primeira foram os aliados e as forças paraguaias na segunda. A tomada de Humaitá, a Sebastopol latina, a muralha que López com engenheiros brasileiros, dentre eles Vilagrán Cabrita, levantara para proteger Asunción, e que paradoxalmente morrera de um tiro de canhão paraguaio. As campanhas da Dezembrada e da Cordilheira, no final da Guerra, não podem ficar de fora. Também não o soldado paraguaio, vigoroso e enérgico, preferindo morrer a se entregar.

Solano López mostrou-se, ao longo da guerra, um indivíduo carismático que tinha ganho o apoio e veneração de sua população. Pessoas diziam que isso era terror e que os soldados devotavam a ele um medo terrível. Bartolomé Mitre, diante de pessoas que afirmavam isso, pediu que lhe explicassem o porquê então de soldados paraguaios presos após a Batalha de Yatay, recolhidos com respeito, alimentação decorosa e roupas, apenas aguardavam a possibilidade de fuga para voltar a seu verdugo.

Mas ele muitas vezes se excedeu e os fuzilamentos eram moeda corrente à sua volta. Sua estratégia e tática militares eram muito discutíveis. Criativo, na medida em que estava em inferioridade de condições aos aliados, aguçava com inteligência os ataques, muitos deles relâmpagos, muitas emboscadas, retornando à posição anterior. Ele que inventou as balsas artilhadas com um canhão que girava 360º. As manobras de atacar de surpresa os navios para capturá-los era uma tática de guerrilha moderna. Porém muitos de seus erros foram insanáveis. Cecílio Baez escreveu:

“ [...] se a declaração de guerra ao Brasil foi da parte de Solano López uma insensatez e uma temeridade, a declaração de guerra à Argentina ao mesmo

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tempo foi uma demência, uma loucura, um ato próprio de uma fera, de um selvagem que só obedece ao instinto carniceiro, pois um governante judicioso nem busca a guerra, nem provoca simultaneamente várias potências ao mesmo tempo. ” (POSADA, 1911)

Os tratados de paz foram assinados por parte de cada País com o Paraguay, contrariamente ao que explicitava o Tratado da Tríplice Aliança. Em 1872 foi assinado o Tratado com o Império do Brasil e em 1873 com o Uruguai. Só em 1876 a Argentina assinou pois postulava a parte ocidental e o Paraguai alegava ter direitos sobre essa área. Arbitragem do Presidente dos Estados Unidos, Mr. Hayes, reconhece ao Paraguai o seu domínio. Restabeleceu-se a paz e a amizade, consolidando a dívida nacional resultado das despesas de guerra e as indenizações devidas. Finalmente, a República Argentina comprometia-se a respeitar definitivamente a independência, a soberania e a integridade da República do Paraguai, enterrando para sempre o sonho da restauração do Vice-Reinado do Rio da Prata.

REFERÊNCIAS

1. ABREU, Sergio. La Vieja Trenza. La alianza porteño-lusitana em la Cuenca del

Plata (1800-1875). Montevideo: Planeta, 2014. 413 p.

2. ACEVEDO, Esteban Rodrigo Federico. Guerra de la Triple Alianza. Buenos Aires: Monografia. s/data. 14p.

3. ANAIS DO VII ENCONTRO INTERNACIONAL DE HISTÓRIA SOBRE AS OPERAÇÕES BÉLICAS NA GUERRA DA TRÍPLICE ALIANÇA. Instituto de Geografia e História Militar do Brasil-Rio de Janeiro: IGHMB, 2015. 447 p.

4. ASSUNÇÃO, Moacir. Nem heróis, nem vilões: Curepas, caboclos, cambás,

macaquitos e outras revelações da sangrenta Guerra do Paraguai. Rio de Janeiro:

Editora Record, 2012. 458 p.

5. BAPTISTA, Fernando. Madame Lynch. Mujer de mundo y de guerra. Buenos Aires: Emecé Editores, 1987. 433 p.

6. BARRÁN, José Pedro. El Uruguai Pastoril e Caudillesco em la Primera Mitad del

siglo XIX. Montevideo. Setembro de 1995 1-5 págs.

7. BARROSO, Gustavo. A Guerra do Flores. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 202 p.

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