4º Seminário de Relações Internacionais da Associação Brasileira de Relações Internacionais: As Diretrizes Curriculares Nacionais e seus impactos para as Relações
Internacionais no Brasil
27 e 28 de setembro de 2018 – Foz do Iguaçu – PR – Brasil
Área temática: Instituições e Regimes Internacionais (Workshop Doutoral)
A interrelação autonomia e intergovernamentalidade no Regionalismo Sul-Americano:
um paradigma institucional?
Jóhidson André Ferraz de Oliveira – Programa de Integração da América Latina (PROLAM)
– Universidade de São Paulo (USP)
RESUMO: Os regionalismos sul-americanos estiveram, ao longo da história, perpetrados
pelas nuances do cenário internacional, ora alinhando-se às demandas do sistema
internacional, ora adequando às demandas regionais a certo tipo de inserção na seara
internacional. Como resultado, os arranjos integracionistas atingiram um grau de
institucionalidade pautado pela intergovernamentalidade que é reiteradamente escolhida na
construção política-organizacional das instituições regionais sul-americanas,
independentemente das conjunturas e períodos histórico-políticos. A pesquisa aqui descrita
busca analisar as condicionantes que propiciaram os quadros institucionais de três
organizações sul-americanas que mesmo com históricos de formação e efetividade distintos
continuam a desempenhar um papel importante na região e detêm a mesma formação
institucional: o Pacto Andino (CAN), por ser o pioneiro arranjo integrativo sul-americano a
institucionalizar-se; o MERCOSUL, que fora resultado direto de uma mudança
paradigmática acerca do ideário integrativo da nossa região; e, a UNASUL, por ser a
primeira iniciativa integracionista sul-americana institucionalizada que congregou os 12
países do subcontinente. Ao observarmos os projetos integrativos sul-americanos no
decorrer do tempo, percebemos que os níveis de institucionalidade se pautam
reiteradamente na dinâmica intergovernamental – tanto enquanto composição política
institucional, quanto como mecanismo de tomada de decisão –, mesmo em conjunturas
políticas e econômicas de períodos distintos. Além disso, os objetivos dos Estados-
nacionais na formação desses regionalismos são baseados na busca pelo desenvolvimento
e pela autonomia no cenário internacional, como pode ser observado na formação do Pacto
Andino, datado em 1969, do MERCOSUL, em 1991/94 e da UNASUL em 2008. Esses
aspectos, portanto, englobam dois pontos importantes do problema desta pesquisa: a
questão da autonomia enquanto fator de formação das dinâmicas regionalistas sul-
americanas e a intergovernamentalidade, na medida em que é preferência e/ou resultado na
institucionalidade dos processos integrativos sul-americanos. Desse modo, abarcar a
questão da autonomia e o debate acerca da intergovernamentalidade é essencial para o
desenvolvimento da pesquisa aqui descrita, contribuindo com a percepção da nossa
hipótese central, a de que, mesmo em conjunturas e períodos distintos, a institucionalidade
da integração da nossa região é condicionada pela preservação, concessão e amparo de
ideais autonomizantes, os quais só são viabilizados através da dinâmica
intergovernamental. Não obstante, pensar a institucionalidade de projetos integracionistas é
adentrar o debate: Supranacionalismo versus Intergovernamentalismo, que é oriundo
predominantemente dos esforços teóricos-analíticos da integração europeia. Contudo,
revisitando o mainstream das Teorias de Integração Regional que é eminentemente europeu
ficam aparentes os desafios que se apresentam ao olharmos para os processos sul
americanos, uma vez que as mesmas variáveis para se pensar a supranacionalidade ou o
intergovernamentalismo no processo europeu não são suficientes ao serem aplicadas na
América do Sul. Nossos mecanismos são intergovernamentais e envolvem uma estrutura de
convergência no plano ideacional e racional que não é bem compreendida apenas se
olharmos para as ações individuais dos países dentro dos organismos. Desse modo, é
substanciosa uma análise aprofundada dos condicionantes integrativos (herança histórica
comum, inserção internacional, interesses estatais, lócus na ordem internacional, assimetria
dentre os países da região, a questão das identidades e do desenvolvimento) no momento
da formação da institucionalidade desses projetos (no caso desta pesquisa a formação do
Pacto Andino, do MERCOSUL e da UNASUL). Porém, também, se revela intrínseco analisar
a hipótese envolta desta pesquisa, a de que a institucionalidade dos arranjos cooperativos e
integracionistas sul-americanos a partir da autonomia (tanto interna e externa à região) dos
países é condição sine qua non da intergovernamentalidade experimentada no regionalismo
sul-americano. Desse modo, o objetivo geral da pesquisa é estudar e analisar as
condicionantes que propiciaram os quadros institucionais dos projetos integracionistas sul-
americanos (o Pacto Andino, o MERCOSUL e a UNASUL), a fim de compreender as
dinâmicas que levam à formação, escolha e predomínio da dinâmica intergovernamental
enquanto arranjo político-institucional das organizações internacionais regionais e a
interrelação deste, com os ideais de autonomia dos Estados sul-americanos nas Relações
Internacionais. Além disso, os objetivos específicos são divididos genericamente em: a) analisar profundamente os condicionantes que propiciaram a formação dos arranjos regionais sul-americanos, tomando como referência o Pacto Andino, o Mercosul e a UNASUL; b) pesquisar, verificar e compreender os fatores determinantes na interrelação autonomia e intergovernamentalidade na formação do processo institucional integracionista, tentando estabelecer e/ou contribuir para um diferente modo de entender os arranjos integrativos para além do debate “supranacionalismo versus intergovernamentalismo”, pautando-se nas experiências e especificidades sul e latino-americanas; e c) analisar como e porque a intergovernamentalidade é o quadro institucional e o articulador predominante no alicerce das organizações internacionais regionalistas sul-americanas. Para atingir tais objetivos a pesquisa aqui descrita tem um enquadramento metodológico qualitativo, o qual de forma ampliada está baseado: (a) no método sistemático para a organização das ideias;
(b) no método dedutivo para a análise do acervo dogmático; (c) no método dialético para o confronto de posições, argumentos e bases legislativas; e, por fim, (d) no método indutivo para o estabelecimento de regras gerais de aplicação. Igualmente para alcançar os objetivos elencados neste projeto, será feito um levantamento de bibliografia e de dados de pesquisas empíricas pertinentes ao tema, além de entrevistas com estudiosos e policy makers envolvidos no assunto. Tais procedimentos serão necessários para termos subsídios para abordar de forma articulada os três eixos principais pelos quais trabalharemos nosso objeto a fim de alcançar os objetivos acima propostos: 1) as condicionantes que propiciaram a formação dos arranjos integrativos (herança histórica comum, inserção internacional, interesses estatais, lócus na ordem internacional e a assimetria dentre os países da região) a partir do arcabouço analítico oferecido pela Teoria Crítica das Relações Internacionais; 2) a relação dos condicionantes integrativos com os ideais de autonomia e soberania dos Estados sul-americanos no momento da formação do projeto integrativo; e 3) a relação de autonomia com a institucionalidade integrativa. Como resultados esperados, deseja-se, a partir de um estudo minucioso da institucionalidade dos projetos integrativos sul-americanos, contribuir para o debate integracionista, o qual se faz fundamental nas Relações Internacionais contemporâneas da nossa região. Isso porque o aprofundamento ou mesmo a continuidade desses projetos estão postos em xeque, seja pela reconfiguração política- ideológica dos governos da região, seja pelas crises vivenciadas (decorrentes dessa reconfiguração) pelo MERCOSUL e pela CAN, ou mesmo o esvaziamento da UNASUL, fatores esses que estão diretamente ligados à intergovernamentalidade institucionalizada.
Palavras-Chave: Regionalismos Sul-americanos; Autonomia; Intergovernamentalidade;
MERCOSUL; CAN; UNASUL.
INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
Os primeiros ideais integrativos na, e para, a América Latina se remontam ao período de pós-independência dos países americanos com o Bolivarianismo e o Panamericanismo (DULCI, 2012). No entanto, os debates teórico-analíticos acerca dos estudos de integração regional latino-americana são iniciados apenas em 1948 com a fundação da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), e vão se adequando e, muitas vezes, se precavendo às conjunturas do cenário internacional (seja regional ou global).
Desse modo, esta pesquisa, inserida nesse debate integracionista, tem por objetivo analisar a institucionalidade dos projetos integracionistas sul-americanos, problematizando as condicionantes que levaram à formação de seus quadros político-institucionais. Para isso, nos remetemos a uma sintética análise da formação, objetivos e quadro institucional dos três organismos integrativos sul-americanos que, apesar das transformações sócio históricas e conjunturais desde as suas criações, persistem impactando nas relações internacionais sul-americanas: o Pacto Andino (CAN), por ser o pioneiro arranjo integrativo sul-americano a institucionalizar-se; o MERCOSUL, que fora resultado direto de uma mudança paradigmática acerca do ideário integrativo da nossa região; e, a UNASUL, por ser a primeira iniciativa integracionista sul-americana institucionalizada que congrega os 12 países do subcontinente.
Os primeiros pressupostos cepalinos acerca da integração em nossa região, ficaram conhecidos como Regionalismo Fechado, o qual era assentado na proposição de meios para garantir a industrialização e o desenvolvimento econômico dos países da região. Tais meios passavam pelas políticas de industrialização por substituição de importação (ISI), as quais associadas a integração regional, alargariam o mercado (criação de um mercado regional), motivariam a instalação de plantas industriais (de bens de capital e de bens intermediários) que se complementariam regionalmente, resultando no desenvolvimento autônomo e endógeno da região (PREBISCH, 2000; SOUZA, 2012). Desses pressupostos surgem as primeiras iniciativas integrativas na região, como a Associação Latino-Americana de Livre-Comércio (ALALC), em 1960, e especificamente na América do Sul, o Pacto Andino – primeiro mecanismo integrativo sul-americano.
O Pacto Andino surge, em 1969, agrupando Bolívia, Chile, Colômbia, Equador e
Venezuela através do Acordo de Cartagena, tendo como principais objetivos, a promoção do
desenvolvimento equilibrado dos países membros, por meio da integração e cooperação
econômica e social, e, conforme seu artigo 3º, alcançar a diminuição da vulnerabilidade
externa e melhorar a posição dos países membros no contexto internacional (CAN, 2016
[grifo nosso]). Com isso, instaura-se o Sistema Andino de Integração, o qual confere o grau
de institucionalidade do pacto, e é organizado através de órgãos e instituições formais de
caráter intergovernamental
1. Não obstante, sua estrutura é alterada em 1989 na Reunião de Galápagos, onde foi aprovado o Desenho Estratégico e o Plano de Trabalho para a organização nos moldes de um regionalismo mais aberto (CAN, 2016).
Esse processo de mudanças e alterações do modelo regionalista do Pacto Andino é resultado do distanciamento do ideário desenvolvimentista cepalino (da década de 1960), da crise macroeconômica latino-americana (muito ligada, no caso sul-americano, às ditaduras civil-militares), do fim da Guerra Fria e a chegada do receituário do Consenso de Washington na América Latina, o qual traz em seu bojo proposições neoliberais para as economias latino-americanas (PENNAFORTE, 2001).
Provocada por essa nova conjuntura regional, e mundial em termos de globalização, a CEPAL formula novas teses e proposições para o desenvolvimento da região, através do que ficou conhecido como Regionalismo Aberto (CEPAL, 1994). Essas proposições abandonavam completamente o modelo industrial-desenvolvimentista, além da diminuição do papel do Estado na economia, ocasionando a venda de empresas e indústrias estatais, a entrada de empresas multinacionais no mercado regional, o foco na exportação de commodities e um foco na inserção internacional através de bases comerciais (PENNAFORTE, 2001).
Dessa nova conjuntura, o Pacto Andino altera seu foco mais alargado de integração, passando para um foco quase que exclusivamente comercial, transformando-se em Comunidade Andina de Nações (CAN), enquanto que na parte sul da América do Sul, forma-se o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL).
O Mercosul, criado a partir do Tratado de Assunção em 1991, reunindo inicialmente, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai vai ganhar seu quadro institucional apenas em 1994 com o Protocolo de Ouro Preto, o qual dá a institucionalidade ao bloco criando o Conselho do Mercado Comum (CMC), o Grupo Mercado Comum (GMC), a Comissão de Comércio do Mercosul (CCM), a Secretaria Administrativa do Mercosul (SAM), a Comissão Parlamentaria Conjunta (que posteriormente se torna o PARLASUL) e o Foro Consultivo Econômico-Social do Mercosul. Os três primeiros com capacidade técnica-decisória, porém dependentes das vontades expressas dos governos dos Estados-parte. Vale lembrar, também, que segundo o Tratado de Assunção (1991), o principal objetivo do bloco é propiciar um espaço comum que gere oportunidades comerciais e de investimentos através das economias nacionais ao mercado internacional, o qual já é evidenciado em seu preâmbulo:
Considerando que a ampliação das atuais dimensões de seus mercados nacionais, através da integração, constitui condição fundamental para acelerar seus processos de
1 Consejo Presidencial Andino, Consejo Andino de Ministros de Relaciones Exteriores, Comisión - conformada por delegados plenipotenciários, Secretaría General, Tribunal Andino de Justicia, Parlamento Andino, Universidad Andina Simón Bolívar, Corporación Andina de Fomento y el Fondo Latinoamericano de Reservas (CAN, 2016).
desenvolvimento econômico com justiça social [...] e a importância de lograr uma adequada inserção internacional para seus países [os Estados celebram o tratado]
(MERCOSUL. Tratado de Assunção, 1991).
Nessa direção, percebemos que tanto a nova “roupagem” do Pacto Andino, quanto a criação do MERCOSUL, de um lado, demonstram a perseguição do desenvolvimento para os países conveniados aos tratados, e de outro, uma ressignificação dos moldes e mecanismos desses arranjos regionalistas, os quais pautam-se nos princípios neoliberalizantes do Consenso de Washington, porém, com o mesmo tipo de arranjo intergovernamental em sua estrutura institucional, a intergovernamentalidade (TUSSIE;
RIGGIROZZI, 2015).
Assim, essa dinâmica regionalista perpetrada na América do Sul especificamente, amparada em termos essencialmente comerciais, vai ser alterada somente com a virada do século. A chegada de governos progressistas de esquerda na maioria dos países da região, sendo resultado direto do esfacelamento das políticas neoliberais, transforma os ideários de formação regionalista, iniciando os chamados regionalismos pós-neoliberal e/ou pós- hegemônico. Esse novo ideário é marcado por uma ressignificação dos mecanismos integrativos, deixando de lado a preponderância dos ideais neoliberais comerciais de inserção internacional, para o protagonismo de iniciativas que alargam o âmbito da cooperação regional para além do comércio, aliando uma nova agenda desenvolvimentista, a qual enfatiza a relação do desenvolvimento e a inclusão social com o estabelecimento de novos quadros normativos e espaços políticos de governança regional, afim de uma maior autonomia dos países, intra-regionalmente e da região para a arena internacional (VEIGA;
RIOS, 2007; TUSSIE; RIGGIROZZI, 2015).
Essa nova conjuntura, abriga, também, mudanças geopolíticas regionais e globais, que são iniciadas com à tensão causada pela ‘guerra ao terror’ após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 às torres gêmeas do World Trade Center, em Nova Iorque, a crise econômica nos EUA que se alastrou para a Europa em 2008, o surgimento do grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (BRICS) e a insistente sugestão de uma reorientação comercial mundial
2do Oceano Atlântico para o Pacífico, além da rejeição do projeto da Área de Livre Comercio das Américas (ALCA); o que propicia a criação de iniciativas integracionistas no marco do desenvolvimento autônomo regional e do distanciamento dos EUA, como a Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (ALBA) e a União de Nações Sul-Americanas (UNASUL).
2 Vale ressaltar, também, o fator da ascensão chinesa no comércio mundial, o qual atinge, pelo menos em uma primeira mirada, positivamente a região, onde o comércio de commodities dos países sul-americanos com a China nos primeiros anos 2000 representou um aumento de cerca de 150% e é apontado por muitos analistas como uma das causas dos baixos impactos da crise de 2008 na região (DUPAS; OLIVEIRA, 2008).
A ALBA é criada em 2006, como principal contraponto as ideias da ALCA, e se torna um mecanismo bastante encentrado nas dinâmicas da política-externa venezuelana (SARAIVA, 2010), enquanto que a UNASUL congrega os 12 países sul-americanos, inclusive a Guiana e o Suriname com forte identificação caribenha, o que a torna preponderante para os estudos de integração regional do nosso continente.
A UNASUL é criada em 2008, porém, tem seu funcionamento institucional efetivo iniciado em 2012 (quando da assinatura do Uruguai, nono Estado a ratificar seu tratado).
Seu quadro institucional é baseado em quatro órgãos intergovernamentais de deliberação (Conselho de Chefas e Chefes de estado, Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, Conselho de Delegadas e Delegados e Secretaria Geral), mais 12 conselhos setoriais
3e instituições ligadas a ela
4. Além disso, em seu preâmbulo, o Tratado Constitutivo da UNASUL consagra os esforços para a união da CAN (antigo Pacto Andino) e do MERCOSUL, além, da maximização de fatores sociais, culturais, políticos e de desenvolvimento em sua agenda integrativa (BRASIL, Tratado Constitutivo da UNASUL, 2016).
Assim, ao observarmos os projetos integrativos sul-americanos no decorrer do tempo, percebemos que os níveis de institucionalidade se pautam reiteradamente na dinâmica intergovernamental – tanto enquanto composição política institucional, quanto como mecanismo de tomada de decisão –, mesmo em conjunturas políticas e econômicas de períodos distintos. Além disso, os objetivos dos Estados-nacionais na formação desses regionalismos são baseados na busca pelo desenvolvimento e pela autonomia no cenário internacional, como pudemos observar na formação do Pacto Andino, datado em 1969, do MERCOSUL, em 1991/94 e da UNASUL em 2008.
Esses aspectos, portanto, englobam dois pontos importantes do problema desta pesquisa: a questão da autonomia enquanto fator de formação das dinâmicas regionalistas sul-americanas e a intergovernamentalidade, na medida em que é preferência e/ou resultado na institucionalidade dos processos integrativos sul-americanos.
Desse modo, abarcar a questão da autonomia e o debate acerca da intergovernamentalidade é essencial para o desenvolvimento da pesquisa aqui descrita, contribuindo com a percepção da nossa hipótese central, a de que, mesmo em conjunturas e períodos distintos, a institucionalidade da integração da nossa região é condicionada pela
3 Conselho Sul-Americano de Saúde; Conselho Sul-Americano de Desenvolvimento Social; Conselho Sul- Americano de Infraestrutura e Planejamento, também conhecido como COSIPLAN; o Conselho Sul-Americano de Educação; Conselho Sul-Americano de Cultura; Conselho Sul-Americano de Ciência, Tecnologia e Inovação;
Conselho sobre o Problema Mundial das Drogas; Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS); Conselho Sul- Americano de Economia e Finanças; Conselho Energético Sul-Americano; Conselho Eleitoral e o Conselho de Segurança Pública, Justiça e Coordenação de Ações contra a Delinquência Transnacional.
4 Fazem parte da UNASUL o Centro de Estudos Estratégicos de Defesa (CEED – CDS) e o Instituto Sul- Americano de Governança em Saúde (ISAGS).
preservação, concessão e amparo de ideais autonomizantes, o quais só são viabilizados através da dinâmica intergovernamental.
Discutir autonomia é adentrar um campo de debate epistemológico interdisciplinar bastante profícuo e necessário para nossos estudos. No âmbito da Ciência Política e das Relações Internacionais, sobretudo no caso latino-americano, os aportes de Hélio Jaguaribe e de Juan Carlos Puig vão construir um robusto arsenal para a ideia de autonomia durante as décadas de 1960/70 e início da 80, com a Escola da Autonomia Latino-Americana
5.
Contemporaneamente, em um recente artigo, Leonardo Granato (2014), apresenta a autonomia como vetor da ação externa e da integração na América do Sul, manejando desde os conceitos de autonomia formados com a Escola da Autonomia Latino-Americana, até as novas abordagens, com especial atenção para o diferente e renovado entendimento de autonomia na América do Sul a partir de 2003 com as experiências do Mercosul e de 2008 com as da UNASUL.
Para Granato (2014), autonomia dos Estados deve ser entendida: como um suficiente grau de liberdade de manobra para projetar e executar projetos nacionais viáveis de desenvolvimento, que os converta em participantes ativos e não subordinados da globalização (GRANATO, 2014: p. 80).
Essa concepção é assimilada com a proposta por Ferrer (2006), que é herança e tem influência dos escritos da CEPAL sobre integração regional nos anos 1960, a qual devia ser usada como ferramenta com vistas a reverter o “estado de periferismo” dos países da América Latina. Em um sentido geral, caberia aos Estados criarem estratégias autonomizantes, as quais seriam sustentadas por ideologias do tipo nacionalista e mercado internista, para gerar certa influência no sistema internacional, fundamentalmente em relação com os mais poderosos (GRANATO, 2014).
Ao encontro desses escritos temos os aportes trazidos por Russell e Tokatlian (2001), os quais apontam que a ideia tradicional de autonomia nas Relações Internacionais está relacionada, no decorrer do desenvolvimento da disciplina e das conjunturas internacionais, com condições de isolamento, autossuficiência, ou de oposição, principalmente em relação os países da periferia do sistema internacional. Para esses autores, a aceleração da globalização nas últimas décadas teria modificado sensivelmente o espaço de ação dos países latino-americanos. Segundo eles:
Autonomía ha tenido a ligarse con autosuficiencia bajo involucramiento en esquemas cooperativos y regímenes internacionales e identidades nacionales que se construyen por oposición. La definición que proponemos asigna otro
5 Ver os textos: PUIG, Juan Carlos. Doctrinas Internacionales y Autonomía Latinoamericana. Instituto de Altos Estudios de América Latina. Caracas, Universidad Simón Bolívar, 1980; e JAGUARIBE, H. Autonomía periférica y hegemonía céntrica. In: Revista Estudios Internacionales. N° 49 Santiago de Chile, Instituto de Estudios Internacionales, abril- junio 1979.