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UMA VISÃO FENOMENOLÓGICA DA CONTEMPLAÇÃO NA POESIA JAPONESA: O HAIKAI

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Academic year: 2018

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LUIZA BOZOLA

UMA VISÃO FENOMENOLÓGICA DA CONTEMPLAÇÃO

NA POESIA JAPONESA: O HAIKAI

Pontifícia Universidade Católica São Paulo

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LUIZA BOZOLA

UMA VISÃO FENOMENOLÓGICA DA CONTEMPLAÇÃO

NA POESIA JAPONESA: O HAIKAI

Trabalho de conclusão de curso como exigência parcial para graduação no curso de Psicologia, sob orientação da Prof. Dr. Talitha Ferraz de Souza

Pontifícia Universidade Católica São Paulo

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Agradecimentos

Aos meus pais que sempre me apoiaram durante toda a vida.

Aos professores do núcleo de fenomenologia do 5º ano que tornaram possível este trabalho. Aos professores que me orientaram ao longo do 4º e 5º ano da faculdade de psicologia. Ao Nichan Dichtchekenian que me ajudou muito a tornar possível essas palavras.

Aos meus companheiros de jornada e a todos que me ajudaram a realizar esse trabalho com pequenos empurrões que me deram a oportunidade de aos poucos refletir e concluir esse trabalho.

Ao silêncio que em nós vive.

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Resumo

Área do conhecimento: 7.07.00.00-1 – Psicologia

Luiza Bozola: Uma visão fenomenológica da contemplação na poesia japonesa: o haikai, 2008.

Orientador: Talitha Ferraz de Souza

Palavras-chave: Fenomenologia, contemplação, haikai

O presente trabalho teve como objetivo discorrer sobre a visão que a fenomenologia existencial tem da contemplação na poesia japonesa. Em vias de compreender como o homem foi se distanciando do contato com o mundo, consigo mesmo e com os outros investigamos rapidamente o conceito de alienação como o esquecimento do ser, baseando-se ilusoriamente no ente e concentrando-se nos aspectos mensuráveis da experiência. O contato com o mundo ajuda-nos a encontrar sentido, fonte de força e entusiasmo diante da vida, assim como entrar em contato conosco através da apreciação do mundo e do que ele nos pode oferecer.

Em seguida em vias de resgatar esse contato com o mundo procuramos abordar a contemplação como um possível caminho para entrar em contato com a intimidade do mundo, presente principalmente no conceito do homem como ser-no-mundo. Posteriormente apontamos para uma possível visão poética da vida através do haikai, a poesia japonesa discorrendo em seguida sobre a importância da contemplação e do haikai para a psicologia.

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SUMÁRIO:

™ Introdução: O homem contemporâneo...7

™ Metodologia...10

™ Capítulo 1 : ”O esquecimento do ser”...12

I. A perda do contato com o mundo da familiaridade...12

II. Em busca de um contato com a intimidade do mundo...19

™ Capítulo 2: A contemplação e a imagem poética...21

I. A contemplação...21

II. A imagem poética...23

. ™ Capítulo 3: A poesia japonesa: O haikai...29

I. A história do haikai...29

II. O haikai e sua forma poética...29

III. Matsuó Bashô e a cultura japonesa...31

™ Capítulo 4: A contemplação da natureza no haikai...36

™ Discussão: A importância do poético, da contemplação e do haikai para a psicologia...40

™ Considerações finais...43

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Introdução:

O homem contemporâneo

O homem vive hoje sendo bombardeado por muitas informações ao mesmo tempo. Nas cidades, enfrentar o trânsito se torna uma tarefa desgastante para ir e voltar de qualquer lugar. A poluição é também um incomodo para quem mora na cidade, afetando o sistema respiratório humano de forma violenta. A violência, a miséria, a corrupção predominam no mundo de hoje. Viver uma vida saudável é tarefa árdua para quem mora na cidade. O mundo está adoecendo e muitas pessoas estão adoecendo junto com ele, ou melhor, a humanidade adoece ao mesmo tempo que o mundo adoece.

A qualidade de vida cada vez mais piora na cidade. O mundo adoece junto com o homem contemporâneo. As doenças do mundo são muitas: aquecimento global, a poluição, o efeito estufa, o desmatamento. Tudo isso ocorre porque não criamos a cidade pensando na natureza, mas a destruímos, removendo-a do nosso lugar de habitação, com exceção de pouquíssimas plantas. Toda essa alteração na natureza tem uma conseqüência que se mostra nos dias de hoje. As condições de saúde e qualidade de vida estão cada vez piores, precisamos portanto fazer alguma coisa para resgatar o nosso eu, o nosso contato com a natureza, com o mundo da beleza, conscientizar-nos dessa importância em preservar o nosso planeta Terra, aprender a preservá-lo, respeitá-lo para também melhorar a nossa qualidade de vida e o nosso contato com o mundo.

Como seres humanos nossas raízes estão mergulhadas na natureza, não apenas pelo fato de que a química do nosso corpo é constituída essencialmente dos mesmos elementos que o ar, o pó ou a grama. Participamos da natureza numa multiplicidade de outras maneiras – o ritmo da mudança de estações; ou do dia e da noite, por exemplo, reflete-se no ritmo de nossos corpos, na fome e na satisfação, no sono e no despertar, no desejo sexual e na sua gratificação. (MAY 2005, p.61)

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processo de desencantamento iniciou-se quando Descartes ensinou que o corpo e a mente deveriam ser separados, que o mundo objetivo da natureza física era radicalmente diferente do mundo subjetivo da mente e da experiência interior. O resultado disso foi a desvalorização da experiência particular de cada homem, particularmente com o contato com a natureza. Dessa forma, a concentração das pesquisas foi direcionada para os aspectos mecânicos e mensuráveis da experiência. No século XIX, a natureza já se tornara impessoal em grande parte, no sentido que a maioria dos homens não mais encontra uma fonte de entusiasmo e força na natureza. A natureza não é como a ciência, mas o homem adotou uma postura frente a ela que a torna, em uma compreensão errônea, um objeto a ser calculado com finalidades comerciais.

...a alienação é o resultado final, depois de quatro séculos, do afastamento do homem, como sujeito, do mundo objetivo. Essa alienação pode ser observada ao longo de vários séculos na paixão do homem ocidental pela obtenção de poder sobre a natureza, transformada agora em pura indiferença por ela ou num sentimento vago, inarticulado e quase suprimido de desespero em obter qualquer relacionamento com o mundo natural, incluindo o próprio corpo. (MAY, 1993, p 132)

Nesse trecho May nos quer alertar para a ligação intrínseca do homem com a natureza, quando ele se afasta do mundo e tenta dominar a natureza ele se afasta também de si mesmo, pois a natureza está na constituição biológica do homem e não podemos esquecer que somos fundamentalmente animais em interação com o nosso meio ambiente. Quando desperdiçamos os recursos da natureza e agimos com inconsciência sem pensar na conseqüência dos nossos atos, o resultado geralmente é negativo. Pois quando estamos afastados de nós e em nossos atos não consideramos o todo, ou seja, o coletivo, as conseqüências dos nossos atos podem prejudicar os outros e simultaneamente o mundo ao nosso redor.

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qualquer instante. O homem se desapropria do seu ser quando quer ser no imaginário de outrem. Por isso é preciso que haja um vínculo e um objetivo na vida capaz de ligar a “bateria” da crença em si mesmo e faça o homem mover-se em direção ao seu objetivo, significando a sua existência.

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Metodologia

No primeiro capítulo desse trabalho pretendo discorrer a respeito da perda do contato com a intimidade do mundo, relatando sobre a questão do “esquecimento do ser” abordado por Muhl (1999), discutido principalmente na obra Ser e Tempo de Heidegger. Nesse capítulo tenho também como referência o psicanalista Rollo May nos livros A descoberta do Ser e O homem à procura de si mesmo. Na continuidade do capítulo, na busca de um contato com a intimidade abordo rapidamente as teses de Vargas (2003) e Ramos (2000), ao dizer a importância do homem valorizar a sua própria beleza e respeitar os seus próprios momentos de vida sejam eles de dor ou de alegria.

No segundo capítulo abordarei a importância da contemplação, como forma de qualidade de vida e alimento para crescermos em direção a uma vida mais saudável e plena. Como referência utilizo Nichan Dichtchekenian em uma palestra realizada na sede do Humanitas “O mundo é a casa do homem”, também utilizo Vilella (2007) no seu trabalho de conclusão de curso a respeito da contemplação e da liberdade do homem, Romeiro (2007) cujo trabalho de conclusão de curso é focado na obra de Gaston Bachelard e na imaginação poética. Utilizo como referência principal desse capítulo Gaston Bachelard especificamente em sua obra A poética do espaço, focando na imagem poética e sua importância.

Em seguida, no terceiro capítulo desse trabalho discorrerei brevemente a respeito da origem do haikai tendo como principal referência Leminski no seu livro Matsuó Bashô e rapidamente cito Francetti (1996) que nos diz mais a respeito dos haikais, mas também para me referir ao budismo Zen, atitude principal nos haikais de Bashô utilizo Suzuki (1949) e (1960) que nos revela um olhar meditativo frente à vida.

No capítulo quatro discorro a respeito do haikai como um estilo poético que tem como atitude a contemplação, especificamente em Bashô, através do livro de Leminski (1983), que foi quem ajudou a criar o haikai. Falo também a respeito da imagem poética encontrada em haikais de Bashô.

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Capítulo 1:

”O esquecimento do ser”

A idéia fundamental utilizada nesse capítulo partiu de Muhl (1999), “o esquecimento do ser”, marcado pela história desde os pensadores gregos pelo pensamento metafísico. Isto quer dizer que os homens pensavam o “ser” também como uma estrutura metafísica esquecendo que transformar o “ser” em um conceito é impossível na realidade.

A história do esquecimento do ser revela como os homens “impõem ao pensamento e à própria existência humana a exigência de se constituírem lógica e eticamente, em detrimento da liberdade do pensar e do viver.” (p 92). Esse modo na maioria das vezes reflete o esquecimento do ser, que ao ser abandonado busca uma forma de controlar e manipular a subjetividade humana com uma sede de poder incontrolável. Deste modo as ciências se concentram e tem como objetivo criar instrumentos de controle e manipulação da realidade contribuindo dessa forma para uma sociedade individualista, sem a consciência fundamental de que qualquer ato humano influencia no todo, no mundo e na sociedade.

I. A perda do contato com o mundo da familiaridade

A perda do contato com o mundo na fenomenologia nunca pode ser vista como uma totalidade, pois o homem sempre está em contato com o mundo, mas existe sim uma perda de intimidade, familiaridade1 e respeito para com esse mundo que é o resultado do

esquecimento do indivíduo com aquilo que ele é. Chamarei essa perda de contato com a familiaridade como alienação, nesse caso seria viver uma vida superficial, se pré-ocupando em sobreviver no mundo e se comparando com os outros, com um constante

1 Quando existe familiaridade o homem vivencia o mundo como familiar, as coisas o chamam, ele é

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apelo para a competividade e rivalidade com os mesmos, o que gera a constante superficialidade no homem. A alienação dita acima é um estado de artificialidade do sentimento de si, traduzido como a desunião e o desencontro da consciência que permite o movimento natural do homem com o mundo que o rodeia. É ainda o resultado do esquecimento do próprio homem com aquilo que ele é, tendo como resultado viver uma vida supérflua, sem sentido para si mesmo.

Heidegger (1926), ao discorrer sobre o esquecimento do ser diz que investigar esta questão se tornou a preocupação central de seu trabalho filosófico. Para ele, o homem tornou-se essencialmente maléfico para ele mesmo no sentido em que a forma como o pensamento humano se desenvolveu omite a presença do ser na medida em que esqueceu-se dos sentidos, da natureza, do apreciar, do corpo, ou seja do próprio ser das coisas e começa a denunciar o modo de conhecer da tradição metafísica dualista: dos gregos aos pensadores contemporâneos, todos ocultaram a questão do ser preocupando-se exclusivamente com o ente e esquecendo-se do ser. O próprio Heidegger propõe-se a definir claramente o ser, diferenciando-o do ente. Por “ser” entende-se aqui a raiz fundamental e fonte de todas as coisas; “ente” refere-se a um ser concreto, particular que existe em uma realidade empírica.

Segundo Heidegger “”ser” é o conceito mais universal e mais vazio.” (HEIDEGGER, 1926, p 37). Isso significa que é impossível exprimir em palavras o “ser”, ele não é um conceito, ou seja, o ““ser” não é um ente” (p 39). O homem sempre vive em uma compreensão de mundo, “sempre nos movemos numa compreensão de ser.” (p 41). A compreensão do homem nunca abrange todas as possibilidades que existem da compreensão, isso quer dizer que o homem sempre compreende de forma mediana. Essa forma mediana de compreensão é uma característica fundamental do homem em contato com o mundo.

Dessa forma, descontente com o modo como o homem vinha construindo um pensamento omitindo o ser, Heidegger (1926), constrói o conceito de Dasein para incluir o homem como ser-no-mundo2, ou seja, o homem em interação constante com o mundo é

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uma totalidade, que se constrói no mundo a cada momento. Dasein, “este ente que cada um de nós mesmos sempre somos e que, entre outras coisas possui em seu ser a possibilidade de questionar” (p 42-43). Dasein pode ser entendido como ser-aí,

ser-no-mundo é o que define o homem como aquele que constrói a todo momento o ser,

compreendido somente através de uma temporalidade, ou seja, inserido dentro do seu próprio desenvolvimento. Dasein é um termo designado para o modo humano de ser no mundo, é conhecer, evoluir, compreender, ser jogado de encontro com a sua própria morte. Dasein é ainda a transcendência natural do ser, a existência que liberta o homem de suas pré-ocupações e o faz ir de encontro com a sua vivência como ser-no-mundo. Dasein é também dar sentido à existência e dar sentido à existência é também ser. Ir de encontro a algo é existir enquanto Dasein. Dasein só existe de encontro a outro, sem outro não existe Dasein, é no encontro com os demais entes que conhece e descobre o ser, se identificando com eles e intrinsecamente se relacionando consigo mesmo a partir deles.

Heidegger (1926), vê o homem como unidade com seu mundo diferente do modo metafísico dualista de conhecimento, sujeito-objeto é uma separação que só existe quando se rompe a unidade ser-no-mundo que caracteriza, ontologicamente, o ser humano. A raiz da alienação, o esquecimento do ser, para a fenomenologia consiste no modo como o homem concebeu a existência a partir de um pensamento científico que ignora o ser e o sentido próprio dado ao mesmo. A história do esquecimento do ser revela o modo como o homem esqueceu-se da experiência do “vivido” para basear-se em um sujeito ilusório do conhecimento, o “ente”. Ao excluir a vivência própria do homem em contato com o mundo qualquer conhecimento torna-se impossível.

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da morte. Junto da liberdade do homem em se conhecer de fato, a angústia3 tem o objetivo de atingir o lugar de habitar e se responsabilizar pelo ser.

A angústia e a confrontação com esse sentimento, muitas vezes citado como

“sentimento de morte”, é uma ferramenta que quando bem utilizada auxilia na ansiedade da busca do homem pelo ser. É na angústia que o homem entra em contato com a sua dor de ser para o mundo e para si mesmo, é nela que o homem experiencia a finitude da sua existência. É com essa visão que o homem se conscientiza das estruturas existenciais a que está condicionado, que atribui a ele a possibilidade de ver a superficialidade em que desenvolveu seus conflitos e uma vez que se conscientiza sobre o que causa esse conflito pode mudar a sua atitude para com eles. Dessa forma, a angústia funciona para revelar o ser autêntico através do desconforto com aquilo que ele experimenta e como o homem sempre tem a liberdade para escolher como quer viver, isso faz com que ele possa escolher entre a fuga de si ou habitar a si mesmo de forma a apropriar-se de si cada vez mais: “a angústia revela o ser para o poder-ser mais próprio, ou seja, o ser livre para a liberdade de escolher e acolher a si mesma.” (HEIDEGGER, 1926, p 254).

A angústia é para Heidegger um estado no qual o homem se sente de certa forma propenso a alterar o seu comportamento, já que ele se depara com a sua finitude, seu encontro com a morte. Dessa forma a angústia é um estado de contato consigo mesmo, mas que ao mesmo tempo capacita o homem a sentir-se, superar-se e transformar-se, atribui ao homem também a possibilidade de fugir novamente para o esquecimento do ser, já que o sentimento de angústia acarreta uma necessidade de mudança de si mesmo, da postura frente ao mundo e o homem na maioria das vezes utiliza suas defesas para evitar a todo custo essa transformação até que um dia, ela se torne para ele mesmo inevitável e urgente. Esse modo de evitar as transformações é dado o nome e

3 A angústia na fenomenologia é uma experiência intensa de contato com muitos sentimentos, o homem

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impropriedade4, quando o homem não faz a escolha por viver de um modo mais próprio5 e autêntico de ser-no-mundo.

Um dos fatores que acarretam o distanciamento do sentido que o homem atribui ao que faz e ao que é, talvez seja o excesso de informação a que ele tem acesso nos dias de hoje, não é o fato em si da informação excessiva, que agrava o seu distanciamento, mas o modo como ele se utiliza dessa informação. Por exemplo, ao se confrontar com um mundo repleto de informações dispersas pela internet, o mundo a sua volta se torna cada vez mais turbulento e fragmentado. Até que ponto o homem sabe as conseqüências de seus atos sobre o meio? Até que ponto o homem interage ativamente, energeticamente motiva

m a vida, a crescente e desenfreada informação fragmentada no homem pela sua incapacidade de processá-la caracterizam o homem atual em sua ansiedade cres

obre nós em fragmentos através de rádio, televisão e satélite. Ao mesmo

do em seu trabalho como um sentido para si? Essa alienação seria uma das causas das grandes crises contemporâneas.

O homem acelerou a produção, gerando um aumento do ritmo a que estava acostumado na sua vida na tentativa de acompanhar o ritmo das máquinas. Desse modo a forma como o homem é visto na sociedade altera-se significativamente. O empobrecimento das relações humanas, o outro como “objeto” e a falta de comprometimento co

cente.

Jamais, em tempo algum, fomos tão sufocados por um volume de informação como o que é despejado hoje s

tempo nunca passamos por um momento de tão pouca convicção a respeito de nosso próprio ser. (MAY 1993, p.9)

Rollo May (2005), ao abordar o modo como as pessoas da nossa época são em geral caracterizadas por atitudes de passividade e apatia, diz que o jovem de hoje renunciou à ambição de destacar-se, é muito comum a atitude de querer ser aceito por seus iguais a todo custo, mesmo ao custo de desaparecer e ficar absorvido pelo grupo. É

4 A impropriedade é característica do homem cotidiano na maior parte das vezes, significa que ele não toma

para si a responsabilidade de ser, não habita a si mesmo. (Heidegger, 1926)

5 Viver de um modo mais próprio significa ser responsável e habitar a si mesmo, sendo mais verdadeiro

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cada vez mais comum o homem tornar a sua vida mecânica, sem sentido, destacando assim um sentimento de vazio. Esse vazio quando experienciado realmente pode fazer a pessoa questionar seus valores e realizar uma mudança em sua vida. Mas o modo como a maioria das pessoas vêm lidando com tal vazio não mostra uma evolução, mas uma

estagnação no er com suas

dificuldades e

). Esse fato acarreta a perda da autoconsciência e a perda da con

meio do percurso, sem forças e capacidade de aprend procurando fugir do contato com esse vazio.

O ser humano não pode viver muito tempo no vácuo. Se não estiver evoluindo em direção a alguma coisa acaba por estagnar-se; as potencialidades transformam-se em morbidez e desespero e eventualmente em atividades destrutivas. (MAY 2005, p.22)

Rollo May (2005) exemplifica o homem moderno perdendo contato consigo mesmo, substituindo suas prioridades de “ser” para “ter”, em uma sociedade cada vez mais consumista e alienada. Como conseqüência desse modo de estar no mundo, o homem moderno possui características de infelicidade crescente diante da vida tornando-se passivo, apático, incapaz de tomar decisões sobre sua própria vida, falta-lhe objetivo na vida e, além disso, a maioria dos homens não possuem uma idéia nítida a respeito do que sentem, menos ainda do que querem. Esse homem não teve uma experiência nítida a respeito de seus desejos, anseios e necessidades, como conseqüência, não sabe lidar com seu vazio, silêncio e solidão. Desse modo, ele atribui ao outro, a função de preencher essa falta, não assumindo, negando e desconhecendo seus próprios sonhos e motivações, pois existe um modo de se comportar no mundo que “deve” ser seguido por todos para serem vistos como igual. Assim, ele nega em si o que pode ser diferente do que conhece nos outros e critica muito o que desconhece. Dessa forma, passa a reprimir aquilo que em si mesmo percebe em seu ser. “Ser” aqui deve ser entendido como a expressão das potencialidades do homem e o reconhecimento destas seria o sentimento de ser. Uma das conseqüências dessa repressão “é a desintegração da imagem que o homem moderno tem de si mesmo” (MAY, 1993, p 17

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A influência dos meios de comunicação, a Mídia, faz com que o homem tenha uma opinião ilusória a respeito de si mesmo e também da informação noticiada como verdade absoluta. O homem, através dos meios de comunicação parece criar cada vez mais padrões de “como viver”, “como ser”, “aonde ir”, excluindo assim a subjetividade singular de cada indivíduo como portador de suas próprias características, vontades e singularidades, que podem não ser compatíveis com tal padrão divulgado. Sistematizando desse modo uma imagem de ser e viver, o homem limita sua atuação no mundo e é limitado pelos padrões de “beleza” e “felicidade” que a Mídia apresenta às massas. O homem sente-se inevitavelmente inferior, incapaz de atuação no mundo se não se transforma em um igual. É importante destacar aqui que esses padrões só são alimentados e continuam em pauta devido a esse sentimento, a baixa auto-estima que os sustentam. Como

ento das

ão tão crescente nos dias de hoje que levará o homem a procurar utros caminhos, que o ajude a resgatar o contato perdido. Pois é através do

e angustiado, portanto, mais ropenso a realizar uma mudança em sua vida para resgatar o sentido que dará um novo rumo a

conseqüência desse fator, a inferioridade, as pessoas criam essa idéia ilusória de si mesmas e não se expressam. Desse modo não há o contato consigo mesmas, a autenticidade de suas escolhas, pois permanecem contendo-se e esforçando-se ao máximo para se adequarem ao padrão do momento.

Por medo de não se expressar, nega-se a diversidade humana, transformando-se a diferença em algo ruim, enquanto inferioridade e vergonha. Na verdade os conceitos como belo e feio devem ser individuais e não ditados pelos meios de comunicação de massa como um padrão a ser seguido. A alienação estética acarreta conseqüências graves que podem ser observadas no mundo de hoje como a obsessão crescente, principalmente entre os jovens, de modelar o corpo, criando os viciados em malhar, o aum

doenças ligadas a distúrbios alimentares, como a anorexia e a bulimia, decorrentes da mesma obsessão com o corpo ditado pelo padrão social do que é “bonito”. Mas a crescente insatisfação consigo próprio é o motivo mais grave de todas essas conseqüências causadas por um padrão de ser, viver e comportar-se.

É essa insatisfaç o

reconhecimento dessa alienação que o homem pode sentir-s p

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II. Em busca de um contato com a intimidade do mundo

Em vias de resgatar o contato do homem com ele mesmo Ramos (2000), nos diz que pa

quem ele é, o individuo precisa ter consciê

ndo forma às coreog

, levam a maioria das pessoas ao desconhecimento de si mesmas. Para um bom

ra o homem conviver bem consigo ao longo de sua vida, terá que acompanhar as transformações de seu corpo, sua imagem e perceber a beleza existente neste, ir contra o pensamento atual, de um padrão de beleza jovem e antagônico para a maioria das pessoas. “Cada ruga, cada marca tem um significado” (Ramos, 2000, p.136).

O homem é definido por suas experiências passadas e atuais, por sua maneira própria de dar sentido e forma ao mundo. Para saber

ncia daquilo que sente, deve conhecer a expressão de seu rosto, a forma de seu corpo, a sua postura e a forma de movimentar-se, para então poder se aceitar, sem pré-conceitos e pré-conceitos da sociedade e do mundo que não vive o mesmo que ele, portanto desconhece-o e não possui capacidade para julgá-lo.

Segundo Vargas (2003), para o homem é importante aprender o seu próprio ritmo, movimento e compasso, vivido no presente, pois isso possibilita uma integração capaz de alimentar as suas necessidades. Dessa forma, concentrando-se nessa experiência de unidade consigo mesmo e com o meio é possível alinharmos com o nosso ritmo, percebendo e aprendendo com a nossa própria força. Mas, para que a dança da vida ocorra, a sua impermanência deve ser reconhecida e é preciso conviver com a constante incerteza do que acontecerá no momento seguinte, o que gera medo no homem e faz com que ele muitas vezes se estagne no meio do percurso. “Sob esse prisma podemos ver o mundo como um palco, a melodia como a vida e nós como os dançarinos da

rafias, tendo como referência a melodia da vida conduzida pelo Self” (VARGAS 2003, p.51). Mas, Vargas nos alerta que a boa vontade é necessária para abrirmos a porta de nossas casas, habitarmos a nós e nos abrirmos para o nosso potencial, sabendo, no entanto, que o caminho é feito tanto de momentos de alegrias, como de dor.

A relação que o homem estabelece com o mundo constrói sua percepção de mundo. Ao contrário, o pouco contato com as sensações e sentimentos e a pouca atenção dada aos sentidos

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de beleza, mas perceber a beleza única do seu corpo, do mundo e das suas potencialidades.

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Capítulo 2 :

A contemplação e a imagem poética

horizonte da nossa existência no qual nossos olhos percebem o mundo e o compreende, cada qual com a sua

singularidade p e encontro ao

mundo, como em é

ser-no-mundo estamo

ele vive em uma constante vivência de ter que ser e se entregar à responsabilidade de ser. I. A contemplação

Contemplar é segundo o dicionário Aurélio: “Olhar atentamente e embevicidamente; considerar com admiração ou com amor; meditar em; admirar; apreciar.”, “demorada e absorta aplicação da vista e do espírito; meditação.”. Contemplamos diversos movimentos de vida, diversas possibilidades do mundo vir de encontro a nós. Observamos o vento de encontro às árvores, o

ode ser percebido pelo homem como indo constantemente d ser-no-mundo a cada instante. Quando dizemos que o hom s afirmando que “o homem é contato com o mundo.”.

O que a fenomenologia coloca, é que desde o primeiro instante o homem é contato com o mundo, é destinado a ele. O contato que eu tenho com o mundo não é um contato superficial que mantém o mundo verdadeiro na obscuridade. O que eu toco e vejo é o mundo na sua versão própria e verdadeira, embora não única. Nós temos acesso imediato ao mundo porque somos nele, e o que se mostra homem do mundo é o mundo mesmo. Nós somos parte do mundo, somos do mundo. (DICHTCHEKENIAN, 2006)

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Mas é preciso ter uma abertura prévia para ser tocado e realizar um movimento de transformação em sua visão de mundo, pois o homem é um vir-a-ser que habita “espaços abertos

o o fazem, assimilam o mundo em um lapso de intimidade e em seu olhares

ma consciência de suas escolhas e potencialidades. Isto é, uma das características do homem é a impropriedade,

estado no qual amente o seu

ser e muitas ve

homem em relação ao mundo, nem a presença do homem no

”, isso significa que ele mora no horizonte de sua compreensão de mundo e à medida que sua compreensão se amplia pode habitar o seu espaço e apropriar-se de si cada vez mais.

Todos os homens em sua forma peculiar contemplam de algum modo algo, apesar dessa atitude ser considerada um momento raramente vivenciado do homem entrar em contato com o mundo, todos os homens admiram algo em algum instante de suas vidas. E quand

vêem manifestações de beleza nas expressões do que admira e do que vai de encontro, ou seja, encontram-se com o belo que o mundo mostra e por sua vez torna-se íntimo deste.

Contemplar é também um exercício, uma forma de compreensão daquilo que nos faz sentido e se apresenta como algo peculiar e de extrema importância na nossa vivência, pois nos conecta com algo capaz de nos revelar algo escondido, por trás da mera aparência das coisas ao qual estamos acostumados a vivenciar, mas cujo desvelamento (aparecer) se encontra justamente no que nos mostra. Esse modo que estamos acostumados a ver, a mera aparência das coisas segundo um ideal de beleza contaminado pela Mídia revela uma atitude superficial de entrar em contato com o mundo. Um modo muito rápido de observar as coisas e as pessoas, cuja atitude nos mostra o ritmo acelerado que estamos acostumados a vivenciar nos dias de hoje, o que nos afasta desse modo compreensivo e abrangente de contemplar as nossas próprias vivências em contato com a nossa intimidade, com a intimidade do mundo. Essa forma que estamos acostumados a olhar tem suas raízes no modo mundano cotidiano do homem. Isso quer dizer que o homem se encontra na maioria das vezes distante de seu modo mais próprio e autêntico de ser caracterizados por u

o homem não toma para si a escolha em habitar mais propri zes foge da responsabilidade de ter que ser algo.

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mundo resulta a sua perdição. A fenomenologia se propõe a habitar as coisas elas mesmas. Habitá-las é manter-se numa relação de contemplação das coisas. A contemplação é um

a cada vez mais da sua existência, do seu mundo, do instante. Desse odo, ao contemplar algo o homem se familiariza com o mundo, tornando-se mais íntimo deste.

esse contato implica deixar de lado as

nossas certeza o aprender a

habitar a image

habitar as coisas e fazer com que, através da observação você vá, cada vez mais, se aproximando da intimidade delas e percebendo o modo mais próprio delas serem. (DICHTCHEKENIAN, 2006)

Como para a fenomenologia a vivência de cada homem é algo que deve ser valorizado, essa intimidade com o mundo têm uma importância vital na formação do homem. Portanto essa vivência do homem vivida como íntima, como um habitar mais familiar, admirando as manifestações do mundo, é contemplação, pois toma para si a instância fundamental de ser-no-mundo para um encontro significativo recheado de sentidos, apreciando-os vividamente. A construção de sentidos no homem ocorre sempre que ele se aproxim

m

II. A imagem poética

Segundo Bachelard (1989), para compreender a imaginação poética o homem deve esquecer seu saber e romper com todos os hábitos de pesquisas filosóficas, pois a imagem é simplesmente a “dádiva de uma consciência ingênua” (p 4), é como a criança vivendo em constante novidade, para ela tudo é novo. Ela aprende com facilidade e é esse estado que o fenomenólogo deseja alcançar: estar aberto aos ensinamentos que o mundo nos oferece a cada instante. Se existe algo que nos afasta do contato com o mundo é a ignorância de que já sabemos o que nos ocorre ao nosso redor, com essa atitude nos fechamos à novidade do instante. Pois cada instante é único e só nos abrimos verdadeiramente ao aprendizado quando limpamos nossos pensamentos de pré-conceitos sobre o que vamos vivenciar, “é preciso que o saber seja acompanhado de um igual esquecimento do saber.” (p 11) Nos abrir para

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É necessário estar presente, presente à imagem no minuto da imagem: se há uma filosofia da poesia, ela deve nascer e renascer por ocasião de um verso dominante, na adesão total a uma imagem isolada, muito precisamente no próprio êxtase da novidade da imagem. (BACHELARD, 1989, p 1)

O exercício da contemplação nos ensina a saborear a nossa vivência e a presentificá-la. Ensina a presenciar o instante como dotado de um sentido mais familiar e próprio ao homem. É uma atitude de estar aberto para o que o mundo nos mostra, deixar-se ensinar pelo movimento da vida. Segundo a fenomenologia o homem é abertura à possibilidade de ser, um vir-a-ser que está na constante tarefa de ter que ser. A

contemplação detalhes e a

beleza do mun também uma

atitude que pos

ença imaginativa que se maravilha com aquilo que se apresenta à existência do homem. Contemplamos

o que nos esclareça ou nos faça sentir em con

ntido verdadeiro e não nos impelem para a apreciação do mundo tal como se fizéssemos o contrário. O poeta valoriza o real ginação, ou seja, “a imaginação aumenta os valores da realidade” (p 23). ão só os poetas, como todos que imaginam também aumentam o valor do real,

é uma relação existencial, uma vivência de encontro com os do, é uma abertura a um olhar o mundo sob a ótica do belo. É

sibilita uma ampliação da visão de mundo do homem. A contemplação é a pres

alguma coisa quando nos sentimos imersos na sua manifestação, e essa imersão, longe de ser um perder-se é o próprio reencontro entre homem e mundo. O homem que contempla reencontra uma unidade. O mundo contemplado é uma unidade de sentido. (VILLELA, 2007, p 30)

Quando em um recanto existencial encontramos uma morada que nos trás mais perto da intimidade e procuramos mais ao fundo alg

tato com o mundo, paramos aí nesse instante para saborear um pouco mais a existência, estamos contemplando, mas ao mesmo tempo não estamos completamente parados, estamos acontecendo a todo instante. Esse estado nos move em direção a uma vivência mais própria e familiar de ser-no-mundo.

Os poetas através da imagem poética nos revelam o mundo da poesia, mas somente quando estamos abertos para uma leitura contemplativa da vida, caso contrário encontraremos apenas palavras que não nos fazem se

através da ima N

(24)

A intimidade

A intimidade é um contato que o homem estabelece com o mundo que o possibilita a atribuir valor e habitar o mundo mais propriamente. Bachelard (1989) nos remete a imagens poéticas que possibilitam esse contato com a intimidade: a casa; a

o “valores oníricos consoantes” (p 25). A casa abriga lembranças, sejam elas sitiv

ntros de solidão, centros de devaneio se agrupam para

os mais equilibrados diante de tal imagem, o que nos leva a uma centralização, a um equilíbrio do nosso ser gaveta, os cofres e os armários; o ninho; a concha e os cantos. Todas essas imagens nos remetem a algo mais íntimo, algo essencialmente do homem, são lugares de habitação, lugares que podemos habitar e no imaginário cada um fala de um modo diferente, algo do homem, um nível de encontro em habitar um lugar diferente dos outros.

A casa segundo Bachelard (1989), é “o nosso primeiro universo” (p 24), e portanto onde residem as nossas primeiras lembranças do que seria um lar, um abrigo, onde temos a referência do que seria habitar em primeira instância. Todos os outros lugares terã

po as ou negativas. Não só como também “a casa abriga o devaneio, a casa protege o sonhador, a casa permite sonhar em paz.” (p 26). Dessa forma a casa integra os valores do homem, os seus pensamentos, as suas lembranças e os seus sonhos através do devaneio.

É também a casa natal onde a infância do homem foi vivida, na época que sonhávamos mais alto com o que iríamos nos tornar, quando acreditávamos em seres fantásticos e valorizávamos ainda mais nossos sonhos. Quando a casa natal desaparece abrigamos “Centros de tédio, ce

constituir a casa onírica” (p 35). Isso quer dizer que quando desabitamos a casa natal passamos a habitar lugares oníricos, de nossos sonhos, onde podemos nos sentir sós ou tediosos com a vida, uma vez que perdemos a nossa ingenuidade de criança, habitar a casa natal não faz mais sentido.

(25)

conscientizando-nos do que ocorre ao nosso redor. Ao mesmo tempo que nos atribui essa centralidade, pode também reduzir o sentido da vivência gerando um conforto aparente que nos oferece também uma estabilidade que é ilusória.

A forma mais simples da imagem da casa é quando devaneamos a imagem da cabana. “Com a cabana, com a luz que vela no horizonte distante, acabamos de indicar em sua forma mais simplificada a condensação de intimidade do refúgio.” (p 53). A cabana é o lugar que queremos habitar quando vivemos em um ambiente cheio de pessoas e informação, queremos nos refugiar e fugir para nos recolher em um ambiente mais silencioso que nos possibilite um contato mais profundo com o nosso íntimo, na nossa solidão mais intensa. Essa solidão que nos remete a entrar em contato conosco é de uma in

mplo em meio a um congestionamento a Avenida Paulista, é possível, embora mais difícil de acontecer. Quem aprende a criar agens poéticas no caos pode rir até dos acontecimentos mais absurdos, aprender com

ada vez mais o mundo de sentido.

A miniatura

. Mas fazendo isso, é preciso compreender que na miniatura os valores se condensam e se enriquecem. Não basta

lente de

tensidade singular, pois é no silêncio que conseguimos ouvir mais atentamente os barulhos dos nossos pensamentos e não só como também, podemos ficar cada vez mais sensíveis ao encontro com o mundo, afastados das grandes cidades.

Mas também, não podemos excluir a idéia de que é possível encontrar-se com a intimidade inclusive nas grandes cidades, um exe

n im

eles e habitar c

Possuo tanto melhor o mundo quanto mais hábil for em miniaturizá-lo

uma dialética platônica do grande e do pequeno para conhecer as virtudes dinâmicas da miniatura. É preciso ultrapassar a lógica para viver o que há de grande no pequeno. (BACHELARD, 1989, p 159)

Segundo Bachelard (1989), a miniatura é a representação do que existe no homem, ela ativa os valores e os engrandece condensando-os em uma imagem aparentemente pequena, mas que nos mostra todo um universo. O pequeno com uma

(26)

lente de aumento.”, ele nos remete a um instante em que estamos atentos ao pormenor, a um estado também contemplativo, já que contemplar é olhar, admirar atentamente algo.

Quando falamos da miniatura estamos nos referindo ao detalhe, de admirar e olhar o detalhe em sua plenitude. Admirando o detalhe podemos encontrar a transce

ão valorizamos podemos deixar em um outro lugar que posteriormente poderemos acessar, quando aquilo tiver um valor para nós. Pois “Para a gravita em torno de um valor.” (p 177), ou seja, só podemos entrar em contato com o que valorizamos, só podemos imaginar aquilo que atentamente admiramos de

A imensidão í

io. Sem dúvida o devaneio alimenta-se de espetáculos

nhador pode inventar a imagem poética que lhe for possível em um

ndência, ou seja, superarmos os limites do pensamento e entrarmos em um estado imaginativo, que vive em nosso íntimo onde o grande e o pequeno não são vistos em seu tamanho, mas na forma como a nossa atenção se dirige podemos captar um universo em algo aparentemente pequeno e insignificante.

Segundo Bachelard (1989), “Temos na memória microfilmes que só podem ser lidos quando recebem a luz viva da imaginação.” (p 181). A luz da imaginação pode nos proporcionar uma reciclagem em nossas lembranças, ou seja, no nosso filtro fica aquilo que nos é íntimo e o que n

imaginação, o mundo

alguma forma.

ntima

Poderiamos dizer que a imensidão é uma categoria filosófica do devane

variados; mas por uma espécie de inclinação inerente, ele contempla a grandeza. E a contemplação da grandeza determina uma atitude tão especial, um estado de alma tão particular que o devaneio coloca o sonhador fora do mundo próximo, diante de um mundo que traz o signo do infinito. (BACHELARD, 1989, p 189)

O devaneio para Bachelard (1989), é uma ação que pode oferecer liberdade para o homem na medida que o so

(27)

O que Bachelard (1989), nos mostra é que a “imensidão está em nós.” (p 190), “O espetáculo exterior vem ajudar a revelar uma grandeza íntima.” (p 197). Como o mundo que o h

idão de um homem é tão íntima, reflete o seu estado de alma, o seu próprio ser.

Segu iência do ser

que contempla ntade de ver,

mas principalm .

stado de alma mais livre, tranquilo e contemplativo. Mas é importante dizer que a imensidão é uma característica da imaginação poética. Mais do que um estado daquele que contempla ela ngrandece as imagens, multiplicando-as cada vez mais, alimentando o ser daquele que

agina, libertando-o para a vida imaginativa onde tudo pode ser possível.

omem vivencia é também o homem interagindo, e sendo assim, a imensidão está também no olhar daquele que enxerga o imenso no mundo. A imensidão particular de cada homem reflete aquilo que o próprio homem é. Por isso a imens

ndo Bachelard (1989) “o orgulho de ver é o núcleo da consc .” (p 195). Isso quer dizer que o ser que contempla tem a vo

ente se orgulha ao olhar algo em sua magnificidade

A imaginação libera o ser da inércia do peso da inércia. Ela quer mais, ela quer sempre mais. Seu ativismo faz o mundo maior, mais rico, sempre mais rico. O ser imediato, simples, superficial é superado pela atividade imaginante. O trabalho da imaginação é a própria atividade da criação. (ROMEIRO, 2007, p 41)

A imensidão íntima, mais do que uma característica do homem, ela nos oferece a possibilidade de entrar em contato com a intimidade. Ela nos remete a um e

(28)

A poesia Japonesa: o Haikai

o. O primeiro verso do haikai-renga e também do poe a haikai é chamado de "hokku". Os poetas às vezes apresentavam seus hokkus como poemas independentes pois este contem um acontecimento muito importante na singular pode ser poético. A origem do Haikai surgiu nessa é

ortuguês. No dicionário Aurélio, está registrado como

Capítulo 3:

I. A história do Haikai

Antes de nascer o haikai, no século XV, uma forma poética chamada "renga" começou a surgir no Japão. Renga é uma forma poética que vários poetas criavam cooperativamente. No século XVI o haikai começou a surgir e foi se tornando popular no Japão, originalmente para os japoneses da antiguidade eles se referiam ao haikai-renga, um poema feito de versos de 17 e 14 sílabas. Os poetas dessa época utilizavam jogos de palavras e falavam a respeito do cotidian

m

natureza e que visto de uma forma poca com o famoso poeta Bashô.

II. O Haikai e sua forma poética

Haikai é uma forma de poesia de origem japonesa que começou a ser escrito há mais de 400 anos. Existem muitos nomes que podem ser utilizados para indicar o poema japonês como: haicai(s), haikai(s), hai-kai(s), hai-cai(s), haiku, hokku. Sua pronúncia seria “aicai”, já que o “h” é mudo em p

(29)

O haikai clássico japonês obedece a quatro regras fundamentais: normalmente têm 17 sílabas japonesas, divididas em três versos de 5, 7 e 5 sílabas; cita a natureza, fala a respeito de um evento particular, diz desse evento como ocorrendo no agora e não no passado. Outra característica fundamental em um haikai é ser desnecessário colocar título em cad

o na natureza e que é expressado como ocorrendo no

m no Japão, também porque os japoneses são dotados de uma sintonia

simbóli

ação que entravam pela janela na asa de cada japonês. A arquitetura japonesa dessa época tinha como característica a

tegração com a natureza e a preservação desta, através do mínimo desmatamento para criar um lar. Todo esse clima possibilita maior aproximação com a natureza e onseqüentemente com o surgimento do poema haikai.

a poema e também desnecessárias a rima e a pontuação existentes em poemas de outras origens. O título é dispensável, pois o haikai quer exprimir um momento e muitas vezes um título pode modificar o sentido do poema. O haicai japonês atribui importância ao número de sílabas, mas não é importante a acentuação e pontuação de cada frase.

Cada verso de um haikai tem um propósito. O primeiro verso expressa um acontecimento, normalmente ocorrid

agora imediato. O segundo verso quer situar a ocorrência do evento, uma transformação que ocorre. O terceiro verso de um haikai nos mostra o resultado dessa interação com a natureza, pode ser um sentimento do autor que brota junto com o acontecimento ou um resultado que ocorre na natureza.

Os haikais nascera

cultural com a natureza. Antigamente a cada mudança de estação, mudava-se o jogo de pratos da louça que era servida à mesa, as pinturas e tecidos que faziam parte da casa, os quimonos das mulheres e os arranjos florais também eram alterados em cada estação de ano diferente.

Os temas da maioria dos haikais escritos antigamente tinham como marco as estações de ano: primavera, verão, outono e inverno. Cada estação possui um caráter co marcante e portanto importante para a construção de um haikai. A primavera expressa: alegria, renovação, amor, flores, juventude. O verão revela: vivacidade, liberdade, calor, maturidade. O outono nos diz da melancolia, da decadência, da nostalgia e da colheita. O inverno nos fala da: tranqüilidade, da morte, do repouso, do frio.

No Japão cada estação é marcada por alterações na natureza e são extremamente diversificadas pela temperatura, pelas cores, pela veget

(30)

destrezas com as armas”, maneja

cultura, na literatura, no teatro, na arquite

rios. Os jesuítas apresentaram o cristianismo no Japão como uma nova seita do budism

III. Matsuô Bashô e a cultura japonesa

Matsuo Bashô foi o autor principal da poesia haikai e quem ajudou a criar essa forma de poesia de origem japonesa. Segundo Leminski (1983), Bashô quer dizer “bananeira” em japonês, um pseudônimo poético. Ele nasceu em 1644 em Ueno, na província de Iga perto de Kyoto. O seu pai era um fazendeiro samurai. Naquela época os samurais eram “ao mesmo tempo, um guerreiro e um idealista. Um atleta, um místico, um artista. Sobretudo um homem a dar vida por um código de honra de classe. Melhor: de casta.” (Leminski, 1983, p 16). Além disso os samurais tinham diversos aprendizados, dentre eles: as lutas marciais da época, o arco e flecha, “

vam a espada, o bastão, a lança. Todas essas lutas corporais eram aprendidas diante de uma disciplina baseada numa ideologia que acreditava “no budismo, em sua manifestação zen, derivada do budismo Chang, da China. Essa ideologia se chamava Bushidô, “o caminho do guerreiro”.” (Leminski, 1983, p 16).

No Japão o Zen tem influências fortes em toda

tura, nas artes plásticas e até na forma que os japoneses se comportam cotidianamente. Tendo nascido no Japão em uma família de samurais, é inegável que através de sua obra poética deixou vestígios de sua cultura. O Zen é ainda um caminho que só se vivencia pela prática, através da experiência.

No século XVI Francisco Xavier, tentou converter todo o Império do Sol Nascente à religião católica. Segundo Leminski (1983), os resultados do encontro foram contraditó

(31)

O budismo tem vários ramos, nos quais muitos possuem mosteiros e templos onde uma pessoa aprende a se tornar um monge. Matsuô Bashô foi também um monge budista. Em mosteiros zen se aprende o caminho de Buda em direção ao satori, também descrito como o “caminho do meio”. Satori é uma palavra japonesa que em português significa “iluminação”, “despertar”. Para os seguidores deste caminho isso quer dizer que o

homem nesse tudo ao seu

redor, conecta Deus em sua

manifestação e todos. Na

descrição de S

ção é um obstáculo para atingí-la. “O zen é uma fé de artistas. Uma fé que valoriza, absolutamente,

a experiência p 89). O Zen

valoriza “antes p 68), é uma

forma de abso não descreve

o objeto como o.

edos, todas as alegrias, todos os sofrimentos; isto é, toda a vida que vibra dentro dela. E não é só: a par com o meu estado de satori vive em estado de felicidade, de união com

do com o momento presente, com o Todo e tudo, que seria essencial. Seria uma expansão da consciência que permeia tudo

uzuki a respeito de quando alguém vivencia o satori:

Todas as vossas atividades mentais se processarão agora num estilo diferente, mais satisfatório, mais pacífico, mais cheio de alegria do que tudo o que já experimentastes. O tom da vida será alterado. Há o que quer que seja rejuvenescedor na posse de Zen. A flor primaveril parecerá mais bela e o arroio que desce da montanha correrá mais frio e mais transparente. (SUZUKI, 1949, pp 97-98)

Contudo é importante afirmar que nesse estado o homem não deseja nada senão realizar o seu propósito na terra, inclusive o desejo de atingir a ilumina

imediata,. A intuição. O aqui-e-agora.” (LEMINSKI, 1983, das palavras, uma experiência artística” (LEMINSKI, 1983, rver e enfocar a realidade, diferente da forma científica, pois separado do sujeito, mas parte de uma unidade homem-mund O enfoque Zen consiste em penetrar diretamente no objeto e vê-lo, por assim dizer, por dentro. Conhecer a flor é tornar-se flor, ser flor, florescer como flor e deleitar-se tanto com o sol quanto com a chuva. Feito isso, a flor fala comigo e eu lhe conheço todos os segr

(32)

Nesse parágrafo Suzuki nos descreve a maneira Zen de enfocar a realidade, nos mostrando que é possível unir o Eu com o mundo. No budismo se aprende que tudo é imperm nente exceto a impermanência. O objetivo do Zen é viver a vida como uma constan , como a cada segundo o mundo está em constante transformação,

assim é ente essa impermanência é objetivo de quem

segue e inski, expressa essa

imperm nência: além de um estado que observa a natureza, é um ser que se move nela.

mo o tempo passa! as nuvens

s

Bashô apud LEMINSKI, 1983, p 58)

o pai de Bashô faleceu ele escreveu um haikai que expressava o que sentia n quela

1983, p 88). Por ser uma prática zen e uma arte na linguagem japonesa, fica difícil traduzir um haikai em palavras. “Ele é inscrito. Desenhado.

Incrustado, palavras:

gestos, viv idioma

diferente qu uma arte

caligráfica,

natos. (LEMINSKI, 1983, p 41) a

te novidade

o homem. Observar atenciosam

sse caminho. No haikai a seguir, Bashô, pela tradução de Lem a este outono co n pássaro ( Quando

a ocasião tão difícil: a lua se foi

tristeza

os quatro cantos da mesa

(Bashô apud LEMINSKI, 1983, p 59)

Segundo Leminski, Bashô pela poesia conseguiu criar “uma produção verbal, em ‘caminho’ para o zen,” (

como um objeto, em outro sistema de signos. Palavras mais que ências, coisas-em-si.” (1983, p 88). A linguagem japonesa é um

e não pode ser traduzido em sua totalidade, originalmente ela é feita à mão.

(33)

A poesia do Japão “não conhece a rima” (p 35). Um ideograma japonês pode querer dizer muitas coisas ao mesmo tempo. Dessa forma a poesia japonesa constrói muitos

ância ao papel do pensamento no haikai por volta de 1680. O pens

stre que tinha ensinam

s alguns existencialistas franceses como: Jean-Paul Sartre, liam seus poemas nos cafés de Paris. O haikai aparece também “no Imagismo

inglês, derad ães,

até lati orada do século XX.” (Leminski, 1983, p 90).

Por exe

NUMA ESTAÇÃO DO METRÔ

trocadilhos e frases poéticas com diversos sentidos que se conectam entre si, de forma que podemos observar que vários acontecimentos da natureza ocorrem simultaneamente. Mas Bashô nos diz de um modo humorístico a respeito desses acontecimentos tão freqüentes raramente contemplados na vida cotidiana.

Bashô não foi apenas um desenhista, também escreveu poemas e peças de teatro, mas começou a atribuir import

ador Tchouang-tseu por quem Bashô foi influenciado, negou a artificialidade e o utilitarismo, vendo a pouca importância de se intelectualizar demais, afirmou que as coisas aparentemente inúteis tinham valor real e que a maneira certa de viver era seguir os ensinamentos da natureza.

A literatura de Bashô torna-nos conscientes da grandeza da natureza e da nossa unidade com ela. Bashô foi um mestre para muitos, teve aproximadamente 3000 discípulos quando vivo. Segundo Leminski (1983), Bashô foi um grande me

entos como estes: “Repita seu verso/mil vezes nos lábios”, “Não siga os antigos. Procure o que eles procuraram.” e “Respeite as regras. Então, jogue todas fora. Pela primeira vez, você atinge a liberdade.” (p 41-42) Aos 50 anos de idade, Bashô foi acometido por uma enfermidade intestinal aguda, vindo a falecer em 1694.

O mestre Zen Shunryu Suzuki, um dos que ajudaram a propagar o budismo nos Estados Unidos, fala de Bashô como um peregrino que considerava o exercício do haikai como sua respiração matinal. O poeta ensinou não só uma forma inspiradora de contemplação da natureza, mas também uma filosofia de vida que encantou muitas gerações seguintes. Os beatniks, poetas americanos rebeldes da metade do século passado tinham seus livros e uma década ante

li o por Ezra Pound nos anos 20 deste século. Franceses, ingleses, alem no-americanos, o praticaram na alv

(34)

A aparição dessas caras na multidão; Pétalas num galho úmido, escuro.

(Ezra Pound)

Como podemos observar, o haikai que Bashô compôs pertence a uma cultura e ainda a uma atitude de contemplação frente à natureza baseada em princípios Zen budistas. Muitos foram influenciados por seu estilo de compor uma poesia e podemos observar poetas pós Bashô que se inspiraram nesse estilo, como Drummond com a poesia “No meio do caminho”, Ezra Pound com a poesia acima e muitos outros até os dias de je. É inegável que Bashô influenciou globalmente muitos poetas, escritores, fluenciou inclusive a cultura japonesa e o modo de alguns homens estarem no mundo, lvez mais conectados e integrados com a natureza.

(35)

Capítulo 4:

omentos pessoais interligados com movimentos

stado meditativo de

dúvida demonstra através do pequeno como, por exemplo, uma flor, todo um universo de sentido. Podemos dizer que em muitos haikais a atenção à naturez a na qual quem lê pode sentir um instante de silêncio

escrito tato.

Silêncio

O som das cigarras Penetra as pedras

A contemplação da natureza no Haikai

No haikai, a atitude frente ao mundo é de contemplação, observa-se atentamente os movimentos do mundo em contato com sentimentos humanos de sensibilidade. Essa atitude frente ao mundo e frente à natureza em um haikai é muitas vezes marcada pelas quatro estações do ano tão presentes no Japão onde essa forma poética se originou. Cada estação é marcada por diferentes m

naturais, mas nem sempre aparecem nos haikais de forma direta esses sentimentos humanos, eles são colocados em decorrência da ligação com a natureza e seus movimentos.

Os haikais possuem raízes no pensamento Zen, marcado por uma atitude contemplativa frente à vida, fruto de observações e reflexões frente à impermanência em conexão com a natureza e com o momento presente. Podemos dizer que essa atitude chamada de contemplativa pode também ser referida como uma atitude meditativa. Enquanto atitude, a contemplação pode ser uma via de acesso ao e

contato com o silêncio do mundo. Considerando que este estado é inexpressável em palavras o poeta que alguma vez teve esse lapso de consciência ao ouvir o silêncio do mundo pode expressar em palavras o que percebeu naquele instante.

No haikai podemos encontrar muitas imagens poéticas facilmente observáveis. A imagem poética no haikai sem

(36)

(Bashô apud Leminski, p 52)

A atenção ao aparentemente insignificante como “o som das cigarras” revela uma atitude de sensibilidade frente à natureza. O silêncio faz ouvir muitos sussurros para quem aprende a ouvir os mais diversos sons da natureza. Neste haikai o poeta Bashô expressa esse lapso de consciência, o instante em que sentiu uma conexão com esse silêncio, um momento que pôde sentir a natureza. O “som das cigarras” penetrando nas pedras como se esse repercutisse como uma onda sonora que vibra nas pedras. Esse é um momento de sensibilidade e sem dúvida nos mostra a capacidade do homem em sentir-se tocado pelo mundo. A estação do ano desse haikai é o outono, ele revela um momento intenso de conexão profunda com a natureza. No outono as folhas caem das árvores, ficamos com uma sensibilidade mais apurada, mais rica. O haikai do outono é como se fosse u

o dessa forma como surgiram. Em de seus relatos, ao início de sua viagem quando vende a sua cabana e altera o curso de

m compõe esse haikai:

as (o mundo todo muda) vira casa de bonecas

eve de se despedir de seus amigos e do lugar no qual estava, percebeu que iria ainda mais longe de sua casa, ficou profundamente triste e pintou também o seguinte haikai:

grimas

no olho do peixe

m cartão postal que revela os movimentos da natureza e do homem conectado com ela.

Bashô publicou muitos relatos de viagem, nos quais nos mostra o que ocorreu em suas experiências através de seus haikais descrevend

um

sua vida ao realizar uma viage

a cabana de ervas sec

(Bashô apud Leminski, 1983, p 10)

Quando t

primavera não nos deixe

ássaros choram p

(37)

Esses dois últimos haikais demonstram momentos de reconhecimento da impermanência da vida, “(o mundo todo muda)”, nos quais o mundo muda e o poeta precisa também mudar não só de ambiente, mas também se transformar para estar devidamente preparado para fazer a sua viagem. O último haikai citado nos revela a vontade de Bashô voltar para sua casa, a sua tristeza em deixar tudo para trás, mas ao mesmo tempo ter que ir para frente. Os “pássaros choram” e existem “lágrimas no olho do peixe”, ele olha ao seu redor e observa no navio em que viaja, pássaros e peixes, mas como está triste, olha o mundo que lhe revela sua própria tristeza. Um instante em que a sua tristeza é vista no mundo ao seu redor, um momento também de conexão com seus próprios sentimentos que nos diz de seu universo pessoal, neste momento de profunda tristeza. Quando ele nos mostra saudades da primavera, nos remete a uma estação do ano na qual as plantas florescem, as pessoas colhem flores, um momento de muita beleza e é essa “primavera” que ele pede que “não nos deixe”, porém precisa deixar esse lugar que conhece tão bem onde sabe que seus amigos estão. A intimidade com a natureza que este haikai demonstra revela um mundo íntimo, no qual a tristeza do poeta nos é visível através dos pássaros que choram e das lágrimas “no olho do peixe”. O haikai inclusive é formado como se houvessem lágrimas que saem da poesia. O lugar que Bashô habita

neste h de uma conexão com os seres que

circundam pela natureza ao seu redor.

, agora referente ao verão:

a montanha sop

lha em flor em folha em

uma constante. No verão, estação do clima quente onde as

pessoa . É a estação da alegria, do calor,

da expansão, da vitalidade.

m exemplo referente ao inverno: aikai é um ambiente de saudade e também

Mais um exemplo

ra fo

flor em folha em

(Taigi apud Leminski, 1983, p 36)

Esse haikai demonstra uma expansão do poeta, discípulo de Bashô, revela um movimento de continuidade da natureza da folha que brota como flor continuamente. Esse haikai mostra a expansão da estação do verão na qual o mundo amplia, “a montanha sopra” e a “folha em flor” é

s podem sair de suas casas e aproveitar o tempo

(38)

do orvalho unca esqueça

itário” que o “orvalho” tem e pede em uma voz de respeito ao momento da solidão que nunca esqueçam esse gosto de solidão do inverno pois ele também

n

o branco gosto solitário

(Bashô apud Leminski, 1983, p 64)

Esse haikai revela a estação do inverno onde o frio faz as pessoas se recolherem em um momento de maior reflexão e contato com a própria solidão. Por isso o poeta se refere ao “branco gosto sol

(39)

Discussão:

A importância do poético, da contemplação e do Haikai para a psicologia

que oc

o que percebe, intui e contempla. Dessa rma

s da linguagem. “O poético extrai a sua capacidade reveladora

tato com o ser, em outras A linguagem é um meio de comunicação, que possibilita ao homem a compreensão do outro, do mundo e de si mesmo na medida em que pode-se escutar o outro e a si mesmo através de um conjunto de signos constituído pelo seu idioma de origem. É através da linguagem que o discurso pode ser construído pelo homem desvelando-se em um espaço previamente aberto, revelando o si mesmo daquele que discursa. Esse espaço previamente aberto constitui o valor que o homem atribui àquilo upou o seu pensamento, ou seja, o homem precisa valorizar (por valorizar entendemos focar a sua atenção em algo) de alguma forma aquilo que ocupa o seu pensar. Quando o pensamento se transforma em uma forma perceptiva, descritiva ou contemplativa de estar no mundo podemos dizer que sob um sentido mais autêntico o homem se mobiliza a escrever ou dizer aquil

fo ele tem a possibilidade de transformar a linguagem em um sistema de signos interligados com um ritmo próprio de seu ser.

O poético possibilita a revelação do si mesmo autêntico, ou seja, através do desvelamento do pensar o homem pode se aproximar mais de si ao compreender poeticamente os acontecimentos do mundo ao seu redor, pode aproximar-se de um sentido revelador atrave

inesgotável do ser que solicita o pensamento apelando para o dizer da linguagem.” (NUNES, 1992, p 262)

(40)

palavras o homem habita o sentido através da linguagem, ou seja, é através da linguagem que o homem estabelece uma relação de pertencimento ao ser.

Dessa forma, torna-se necessário ao psicólogo compreender e se tornar perceptivo através de uma forma contemplativa que o possibilite pensar poeticamente, já que segundo Nunes (1992), esse movimento constitui o dizer em sua propriedade essencial. O homem habita a sua compreensão de mundo poeticamente, na medida que essa compreensão tem um movimento constante de desvelamento. A partir do momento que o psicólogo clínico compreende esse movimento ele pode perceber cada vez mais como devolver o paciente a ele mesmo de forma mais clara e esclarecedora através da linguagem do outro, seja ela verbal ou não-verbal. Dessa forma pode contribuir para o seu cli

ele não o uve, esse interesse tem que nascer de uma genuína capacidade de apreciar o outro e

conhecer a pessoa na qual está atendendo da forma mais abrangente possível.

A impo

ente perceber outras visões daquilo que vivencia, outras possibilidades de compreender e significar suas vivências possibilitando uma maior liberdade a este.

A contemplação em última instância possibilita o homem a entrar em contato com o mundo de forma a perceber a sua beleza. O psicólogo de alguma forma precisa entrar em contato com o mundo para poder contribuir com o seu trabalho. O psicólogo clínico principalmente, precisa se interessar pelo discurso de seu cliente, caso contrário

o re

rtância do haikai e da contemplação para a psicologia

(41)

insignificante. Também significa uma abertura e ampliação da percepção, por exemplo na flor o haikaísta vê o mundo se ampliar, suas sensações também se expandem. O poeta que rea

xistência mais genuína quando ele não compreende a sua possibilidade de ser livre do pen

uma maneira geral pode entrar em contato com a poesia de um haikai e compreender em sua simplicidade os movimentos da natureza e também da vida de uma pessoa.

liza haikais e aquele que quer lê-los observará uma sensibilidade ao entrar em contato com os sentidos e lhar com atenção o que ocorre no cotidiano.

O haikai como via contemplativa do mundo pode ser um modo do homem entrar em contato com a sua imensidão íntima, conseqüentemente com a sua capacidade de ultrapassar os limites do pensamento metafísico. O que poderia aprisionar o homem em sua e

samento metafísico que tem como característica fundamental o esquecimento do ser.

(42)

Considerações finais

Através desse Trabalho de Conclusão de Curso podemos refletir sobre alguns temas atuais da contemporaneidade como o atual distanciamento do homem da natureza, mas principalmente de si mesmo. Abordamos o esquecimento do ser que revela uma atitude caracterizada p

essa realidade: a perda do contato com

haikai. A imagem poética em um haikai revela esse estado de ter ouvido o silêncio do mundo, ou de ter entrado em contato com um elo pensamento metafísico como o de privilegiar a ciência como detentora do saber e sacrificar as vivências do homem reduzindo-as a aspectos mensuráveis da experiência.

Com o pensamento metafísico o homem passa a viver sempre em comparação com os outros, a busca atual do homem passa a ser para os outros, ter sucesso para os outros. Com toda essa influência o homem passa a se preocupar mais com “ter” do que com “ser” e se afasta do seu verdadeiro objetivo, caracterizado nesse trabalho como a perda do contato com a intimidade do mundo. Mas, mais do que isso o homem perde a capacidade de descobrir sentidos e atribuir valores às coisas simples da vida, fundamentais para um bom relacionamento pessoal com o mundo, com a intimidade. Essa dificuldade atual do homem se relacionar com os outros e consigo mesmo reflete a intimidade do mundo. Isso faz com que o homem busque outros caminhos para resgatar esse contato fundamental consigo mesmo, com o mundo. Caminhos estes que possibilitem o contato com a intimidade do mundo.

(43)

sentime

erso naquele instante. A atitude de olhar a vida pe

s. Essa literatura é muito extensa no Japão. Inclusiv

mpliar visões de mundo quando lidos. Dessa forma o homem pode ser capaz de hab

s coisas, para a vida, para nto que a própria natureza nos revela, nos fala em tom de quietude e recolhimento.

Nesse trabalho quisemos revelar um olhar que possibilite ao homem perceber o mundo sob uma outra visão, que o permita talvez ser mais sensível e feliz e ser cada vez mais livre em sua vida cotidiana contemplando a beleza da vida. Para um psicólogo é fundamental uma certa sensibilidade para ouvir o que o paciente verdadeiramente nos diz naquele momento e exercitar essa sensibilidade é necessário. Ler ou realizar haikais pode oferecer essa abertura ao mundo do sensível, da beleza, mas principalmente da observação minuciosa do que nos mostra o univ

la observação de um haikai pode sensibilizar e ampliar a visão sob uma outra ótica capaz de nos abrir a porta ao mundo da beleza.

Existem muitas poesias que podem nos mostrar esse movimento de contemplação diante da vida. Nesse trabalho não foi possível abordar todos os poetas de haikais, mas outros existem além de Bashô e seus discípulo

e nasceu um fenômeno no Brasil a partir do movimento da poesia do haikai que influenciou muitos poetas ate os dias de hoje.

Um tema citado nesse trabalho sem muito aprofundamento, já que o foco desse trabalho é a contemplação na poesia japonesa, mereceria um outro trabalho: a experiência Zen do satori, relacionando a contemplação com a meditação e descrevendo estes dois estados e suas diferenças e semelhanças. A contemplação nesse trabalho é abordada como uma atitude capaz de atribuir ao homem uma experiência de contato com a intimidade e silêncio do mundo e isso seria um estado meditativo diante da vida capaz de rechear a vida de sentido e beleza. Muitos que experienciam esse estado querem comunicar ao mundo o que viram, estes são os verdadeiros poetas da imensidão íntima capazes de a

itar o mundo poeticamente, compreendendo a vida sob uma visão mais clara e reflexiva.

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a autenticidade do ser. Nesse sentido ser autêntico é em última instância apreciar a vida, reservá-la e ir em direção à compreensão da poética da vida.

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REFERÊNCIAS DA INTERNET:

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