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EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE MANGARATIBA/RJ

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Academic year: 2021

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1 EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE MANGARATIBA/RJ

Processo: XXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXX, já devidamente qualificado nos autos do processo em epígrafe, vem, perante V. Exa., através da Defensora Pública subscrita, apresentar suas

ALEGAÇÕES FINAIS

aduzindo, para tanto, as razões de fato e de direito que se seguem:

1) DOS FATOS

Trata-se de ação socioeducativa proposta em face de XXXXXXXXXXXXX, pela suposta prática de ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas, tipificado no art. 33 da Lei 11.343/06.

Em alegações finais, o Ministério Público requereu a procedência da representação, com aplicação da medida socioeducativa de internação.

Contudo o pedido do Ministério Público não merece prosperar, conforme será apresentado.

2) DA NULIDADE ABSOLUTA PELA AUSÊNCIA DE CITAÇÃO

Preliminarmente, requer seja reconhecida a nulidade processual absoluta em razão da ausência de citação do representado e de seus representantes legais para tomar ciência da ação socioeducativa ajuizada pelo Ministério Público.

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2 A Constituição da República assegura a todos os acusados a ampla defesa e o contraditório (art. 5º, LV, da CRFB/88). O princípio da ampla defesa permite a utilização de todas as faculdades processuais que o devido processo legal lhe oferece para sua defesa. Já o princípio do contraditório determina que o julgamento seja precedido de atos inequívocos de comunicação que viabilizem a uma das partes impugnar os atos processuais praticados pela parte adversa.

Note-se que é pressuposto para o exercício das mencionadas faculdades processuais que o acusado tenha conhecimento de que ocupa o polo passivo de uma demanda e saiba quais os fatos que lhe estão sendo imputados, conhecimento este que lhe é dado por meio de um ato de comunicação que precede o julgamento e efetiva o princípio do contraditório.

Ademais, o acusado deve tomar ciência da existência do processo e do teor da acusação com antecedência suficiente para que se recorde ou faça pesquisas com o escopo de saber onde estava, com quem estava e o que fazia no dia ou na época dos fatos que lhe são imputados. Não bastasse, a reclamada antecedência permite que o acusado apure o endereço das testemunhas que poderão corroborar sua versão, permitindo que as cite, inclusive, quando do interrogatório.

E é exatamente a citação que permite que o acusado tenha ciência, com a antecedência necessária ao pleno exercício da autodefesa, dos fatos que lhe estão imputando. Portanto, a citação é ato processual essencial à efetivação dos princípios processuais constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

Nessa esteira, o art. 360 do CPP, com redação determinada pela Lei 10.792/03, não mais se satisfaz com a simples requisição do réu preso, mas determina que o mesmo será pessoalmente citado, por meio da expedição de mandado entregue ao acusado pelo auxiliar da justiça, acompanhado da cópia da denúncia e com antecedência necessária ao pleno exercício da autodefesa. Assim, adequando-se a lei ordinária às normas constitucionais, o réu preso também deve ter ciência de que está sendo acusado e do teor desta acusação, não bastando a mera requisição para comparecimento em audiência. Inclusive, reconhecendo a necessidade da efetivação dos princípios processuais consectários do devido processo legal, o art. 564, III, e, do CPP, prevê que a falta de citação é causa de nulidade absoluta do processo

ORA, SE TAIS GARANTIAS ESSENCIAIS À EFETIVAÇÃO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA SÃO ASSEGURADAS AOS RÉUS EM

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3 PROCESSO PENAL, COM MUITO MAIS RAZÃO ELAS DEVEM SER RESPEITADAS NOS CASOS DE ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI! Afinal, conforme expressamente consagrado no art. 35, I, da Lei nº 12.594/12, é inadmissível conferir às crianças e adolescentes tratamento mais severo que ao adulto, haja vista o princípio constitucional da prioridade absoluta (art. 227 da CRFB/88).

Constituição Federal:

Art. 227: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comuniária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Lei 12.594/12

Art. 35. A execução das medidas socioeducativas reger-se-á pelos seguintes princípios:

I - legalidade, não podendo o adolescente receber tratamento mais gravoso do que o conferido ao adulto;

O caráter sancionatório das medidas socioeducativas é inegável, razão pela qual é extrema de dúvidas a plena aplicabilidade das garantias constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal às ações socioeducativas, sendo de se rechaçar qualquer falacioso argumento protecionista para respaldar a violação aos mais basilares direitos da criança e do adolescente, obstando que lhe seja conferindo tratamento mais gravoso do que ao adulto.

A sanção estatal juvenil possui finalidade retributiva (na medida em que somente ao autor do fato se lhe reconhece aplicação) e pedagógica (uma proposta de socioeducação) diante de um fato que lei define como ato infracional (é a conduta equiparada a crime ou contravenção).

Neste sentido, as elucidativas explanações de Antônio Fernando do Amaral e Silva, em sua obra “O Mito da Inimputabilidade Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente” citado pelo eminente magistrado gaúcho João Batista Costa Saraiva, em “Compêndio de Direito Penal Juvenil – Adolescente e Ato Infracional” (pág. 67):

“(...) Diante da delinqüência juvenil, seja nos antigos Códigos da Doutrina da Situação Irregular, seja nas modernas legislações, não se encontrou outra alternativa que referir a condutas tipificadas na lei penal.

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4 A resposta, tenha o nome que tiver, seja medida protetiva, socioeducativa, corresponderá sempre à responsabilização pelo ato delituoso. Tais medidas, por serem restritivas de direitos, inclusive da liberdade, conseqüência da responsabilização, terão sempre inescondível caráter penal. Essa característica (penal especial) é indesmentível e, em antigas ou novas legislações, não pode ser disfarçada.

O grande avanço será admitir explicitamente a existência de responsabilidade penal juvenil, como categoria jurídica, enfatizando o aspecto pedagógico da resposta como prioritário e dominante (...)”.

Visando assegurar o devido respeito aos direitos fundamentais consagrados no art. 5º, LIV e LV, da CRFB/88, aos adolescentes em conflito com a lei, o art. 227, § 3º, IV, da CRFB/88, expressamente prevê que o direito à proteção especial abrange a “GARANTIA DO PLENO E FORMA CONHECIMENTO DA ATRIBUIÇÃO DE ATO INFRACIONAL”. Na mesma esteira, o art. 111, I, do ECA, prevê como garantia básica do representado o “PLENO E FORMAL CONHECIMENTO DA ATRIBUIÇÃO DE ATO INFRACIONAL, MEDIANTE CITAÇÃO OU MEIO EQUIVALENTE”, e o art. 184, § 1º, do ECA, dispõe que “O ADOLESCENTE E SEUS PAIS OU RESPONSÁVEL SERÃO CIENTIFICADOS DO TEOR DA REPRESENTAÇÃO, e notificados a comparecer à audiência, acompanhados de advogado”.

A garantia processual também está consagrada no artigo 40, inciso II, da Convenção sobre os Direitos da Criança adotada pela Assembléia-Geral das Nações Unidas (1980), internalizada pelo ordenamento jurídico brasileiro através do Decreto Legislativo nº 11/90 e do Decreto Presidencial nº 99710, de 21/11/90, garantindo ao menor de dezoito anos "ser informado sem demora e diretamente ou, quando for o caso, por intermédio de seus pais ou de seus representantes legais, das acusações que pesem contra ele".

Verifica-se, destarte, que a citação do adolescente e de seus pais ou responsável do teor da ação socioeducativa, tomando pleno conhecimento dos fatos imputados com a antecedência necessária ao pleno exercício da autodefesa, constitui uma garantia basilar expressamente assegurada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, como corolário lógico dos direitos fundamentais previstos na Carta Magna. Assim como acontece com o réu preso, não basta a simples requisição do adolescente internado provisoriamente para comparecimento à audiência de apresentação, mas é imprescindível que o menor e seu

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5 representante sejam previamente cientificados do teor da representação, mediante citação ou meio equivalente.

No presente caso, contudo, o órgão judicial, ao receber a representação, se cingiu a designar audiência de apresentação, determinando-se a requisição do menor e a intimação do representante legal, sendo certo que esta última foi frustrada (fl. 75). Resta patente, portanto, o vício de nulidade de que padece a presente relação processual.

Sublinhe-se que, no caso em tela, a nulidade arguida decorre da violação de princípios processuais constitucionais, razão pela qual é absoluta, podendo ser suscitada a qualquer tempo, eis que nunca restará convalidada. E, tratando-se de nulidade absoluta, o prejuízo é evidente (Ada Pellegrini Grinover) ou presumido (Guilherme de Souza Nucci).

Nesse sentido, a tradicional lição do professor Vicente Greco Filho:

O brocardo pás de nullitè sans grief, que se generalizou como o grande princípio regente da decretação da invalidade e está consagrado no art. 563, artigo inicial do Capítulo das nulidades do Código, não se aplica à nulidade absoluta. A importância que se tem dado a ele decorre da repulsa histórica ao excessivo rigor formal que vigorou até o início do século passado, mas ele não é omnivalente, porque atua somente se o vício é a nulidade relativa ou a anulabilidade.1

A rigor, o vício de citação é tão grave que alguns doutrinadores chegam a sustentar que dele decorre não apenas uma nulidade processual, mas sim a própria inexistência jurídica da relação jurídico-processual.

De todo modo, é inegável o PREJUÍZO ocasionado ao adolescente, pois o mesmo não foi cientificado do teor da representação com a antecedência necessária para o exercício de sua ampla defesa. Portanto, não é possível afirmar que o comparecimento do menor à audiência de apresentação supriu a falta de citação, já que isso somente ocorre quando os objetivos da citação, dentre eles o conhecimento da imputação com antecedência razoável, são atingidos a despeito de o ato não ter sido realizado. Some-se a isso que a representante legal do menor não logrou ser intimada para comparecer à audiência, de modo que o teor da representação não chegou ao seu conhecimento quando da oportunidade de oitiva do adolescente, razão pela qual é evidente que a finalidade dos arts. 111, I, e 184, § 1º, do ECA, não foi atingida (vide fls. 75/76). Ademais, é de ressaltar que sequer foi nomeado curador especial para representar devidamente o adolescente no ato diante da ausência de sua

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6 genitora, em violação ao art. 184, § 2º, do ECA, sendo certo que isso não se confunde com a representação processual exercida pelo patrono.

Quanto ao tema, leciona PAULO AFONSO GARRIDO DE PAULA, in Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado Comentários Jurídicos e Sociais, 2ª edição, Malheiros, 1992, São Paulo, página 517:

Diz a lei que o adolescente e seus pais ou responsável serão cientificados do teor da representação, e notificados a comparecer à audiência, acompanhados de advogado (ECA, art. 184, parágrafo 1º). Cientificação, como sinônimo de citação, sendo certo que esta última expressão, que foi utilizada na redação do artigo 111, I, do ECA, deve ser entendida, neste procedimento de apuração, como o ato pelo qual se chama o adolescente a juízo para defender-se da atribuição de ato infracional, dando-lhe pleno e formal conhecimento do teor da representação. [...]

O mandado de citação deve ser instruído, para atendimento às disposições constantes dos artigos 227, parágrafo 3º, inciso IV, da Constituição Federal e 111, I, do Estatuto, com cópia da representação, quando esta for deduzida por petição escrita

[...]

Sem prejuízo da citação, estando o adolescente internado, será requisitada sua apresentação, para a audiência, junto à autoridade administrativa responsável pela medida."

No mesmo sentido é a lição de JOSÉ LUIZ MÔNACO DA SILVA, em Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, Editora Revista dos Tribunais, 1994, São Paulo, página 313:

Pouco técnico se mostrou o legislador menorista ao dizer no parágrafo 1º que o adolescente e seus pais ou responsável serão cientificados do teor da representação, se a hipótese é, inegavelmente, de citação. Ora, se se trata de uma ação aforada pelo representante do Ministério Público, nada mais justo que o adolescente e seus pais ou responsáveis sejam citados e não simplesmente cientificados como dispõe equivocadamente o dispositivo. A propósito, diz o artigo 111, inciso I do ECA que o adolescente tem asseguradas entre outras garantias a seguinte: "pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, mediante citação ou meio equivalente". Portanto, malgrado os termos do parágrafo primeiro do artigo 184, o adolescente e seus pais ou responsável deverão ser citados do teor da representação, bem como notificados do dia e hora da audiência designada, por mandado, com cópia da representação.

O entendimento já foi definitivamente consagrado no âmbito do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

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7 HABEAS CORPUS. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO A ROUBO CIRCUNSTANCIADO

(ARTIGO 157, § 2º, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL). AUSÊNCIA DE CITAÇÃO

PARA AUDIÊNCIA DE APRESENTAÇÃO. NULIDADE

CARACTERIZADA. CONCESSÃO DA ORDEM.

1. Os artigos 111, inciso I, e 184, § 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, em reforço ao conteúdo do artigo 227, § 3º, inciso IV, da Constituição Federal, esclarecem a obrigatoriedade de prévia cientificação do menor e de seus pais ou responsável acerca do teor da representação ministerial, com o objetivo de terem prévio conhecimento da acusação formulada, garantindo-se, assim, a observância dos postulados da ampla defesa e do contraditório. Doutrina.

2. Na hipótese vertente, da leitura da decisão que recebeu a representação, observa-se que o Juízo de origem não determinou a citação do adolescente e de seus pais ou responsável legal, tampouco notificou estes últimos sobre a audiência de apresentação.

3. A simples apresentação do menor para a audiência, à qual compareceu sua responsável legal, não é o bastante para se entender como cumprida a exigência de prévia ciência da acusação, tanto por ele quanto por seus pais, motivo pela qual resta patente a configuração da nulidade pela falta de citação.

AUDIÊNCIA DE APRESENTAÇÃO REALIZADA SEM A PRESENÇA DA DEFESA TÉCNICA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. NULIDADE ABSOLUTA.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM

CONCEDIDA.

1. Extrai-se de diversos dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente (artigos 111, inciso III, 184, § 1º, 186, § 2º e 207) que o menor deve estar acompanhado durante todo o procedimento de apuração de ato infracional por advogado ou defensor público.

2. Se o adolescente e seus pais não se apresentarem à audiência marcada para a oitiva do menor na companhia de profissional da advocacia, deve ser possibilitada a assistência por defensor público, ou mesmo nomeado um advogado dativo, tudo com a finalidade de garantir-lhes o exercício da ampla defesa e do contraditório.

3. In casu, depreende-se do termo de assentada, assinado apenas pelo menor e sua mãe, que a audiência de apresentação foi realizada sem a presença de advogado ou da Defensoria Pública, cuja atuação só se deu a partir do oferecimento da defesa prévia, razão pela qual está caracterizada a eiva de natureza absoluta. Doutrina. Precedentes.

4. Ordem concedida para anular a audiência de apresentação e todos os atos subsequentes, a fim de que sejam renovados com a prévia cientificação do adolescente e de seus pais ou representante legal, garantindo-lhe a assistência jurídica por profissional habilitado, seja por meio de defensor constituído ou pela Defensoria Pública.

(STJ, 5ª Turma, HC 147069 / MG, Ministro JORGE MUSSI, DJe 16/11/2010)

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8 Por todo o exposto, requer seja reconhecida a nulidade de todos os atos processuais posteriores ao momento processual em que deveria ter sido realizada a citação, citando-se pessoalmente o adolescente e seu representante legal na forma preconizada nos arts. 5º, LIV e LV, e 227, § 3º, IV, da CRFB/88, arts. 111, I, e 184, § 1º, do ECA, art. 40, inciso II, da Convenção sobre os Direitos da Criança adotada pela Assembléia-Geral das Nações Unidas, e art. 35, I, da Lei nº 12.594/12 c/c arts. 360 e 564, III, e, do CPP, designando-se data para a realização de nova audiência de apresentação.

3) DA NULIDADE ABSOLUTA PELA AUSÊNCIA DE REPRESENTANTE LEGAL OU CURADOR ESPECIAL NA AUDIÊNCIA DE APRESENTAÇÃO

Suscita, ainda, preliminar de nulidade absoluta pela ausência do representante legal, ou mesmo de nomeação de curador especial, para a audiência de apresentação do adolescente.

Considerando que o adolescente em conflito com a lei é pessoa ainda em desenvolvimento, incapaz para a prática dos atos da vida civil por si mesmo, o Estatuto da Criança e do Adolescente lhe assegura a representação/ assistência por seus pais, tutores ou curadores, a teor do art. 142, caput, daquele diploma legal. Por outro lado, nas hipóteses em que carecer, ainda que eventualmente, de representação ou assistência legal, o parágrafo único do art. 142 determina que a autoridade judiciária nomeie curador especial para a defesa dos interesses do menor.

Nessa esteira, o art. 184, § 1º, do ECA, dispõe que os pais ou responsável do adolescente em conflito com a lei deverão ser cientificados da ação socioeducativa, e notificados para comparecer à audiência de apresentação acompanhados de advogado. Colhe-se dos ensinamentos de João Batista Costa Saraiva, que "na regra mínima 7.1 de Beijing, que enumera, entre as garantias processuais, o direito à presença dos pais ou tutores encontra-se na normativa internacional o fundamento desta disposição, transposta ao ECA como garantia processual indeclinável" (Direito penal juvenil – adolescente e ato infracional: garantias processuais e medidas socioeducativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 79). Ocorre que, SE OS PAIS OU RESPONSÁVEIS NÃO FOREM LOCALIZADOS, É IMPERIOSA A NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL AO ADOLESCENTE, CONFORME EXPRESSAMENTE CONSAGRADO NO ART. 184, § 2º, DO ECA.

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9 Consoante se verifica, a função exercida pelo curador especial não se confunde com a do advogado. Afinal, enquanto aquele é nomeado para a defesa dos interesses do menor, exercendo a sua representação/ assistência na ausência dos pais ou responsáveis, o advogado possui a função estritamente técnica de representação processual, praticando os atos que demandem capacidade postulatória.

No presente caso, contudo, embora a genitora do representado não tenha sido localizada (fl. 75), a autoridade judiciária não efetuou a nomeação de curador especial para o menor por ocasião da audiência de apresentação (Assentada à fl. 76).

Assim, diante da frontal violação ao disposto nos arts. 142, parágrafo único, e 184, § 2º, do ECA, bem como aos princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CRFB/88), deve ser reconhecida a nulidade absoluta do processo.

Saliente-se que o prejuízo ocasionado ao menor é patente, já que o mesmo ficou desassistido durante a prática do ato. De acordo com as lições de Péricles Prade, a presença dos pais, responsáveis ou curador do menor, na audiência, "tem caráter psicológico, dando-se, assim, maior conforto moral e emocional no curso do processo. O que é plausível, tendo em vista a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. [...] merecedora, portanto, de 'proteção integral'" (PRADE, Péricles. Estatuto da criança e do adolescente comentado. 9. ed. São Paulo: Melheiros, 2008, p. 399).

Nessa esteira, colacionem-se os seguintes julgados:

HABEAS CORPUS. ECA. INTERNAÇÃO PROVISÓRIA. GRAVIDADE DO ATO INFRACIONAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. AUDIÊNCIA DE APRESENTAÇÃO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DOS PAIS OU RESPONSÁVEIS. AUSÊNCIA DE NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL. NULIDADE.

A notificação dos pais ou responsáveis para comparecer à audiência de apresentação é obrigatória (art. 184, § 1º, do ECA), sob pena de nulidade do procedimento.

Se os pais ou responsáveis não forem localizados, obrigatória à nomeação de Curador Especial ao adolescente (art. 184, § 2º, do ECA). As figuras do defensor e do curador não se confundem e tampouco se excluem, de sorte que, ausentes os pais ou responsáveis, necessárias às presenças tanto do curador, quanto do defensor para o ato.

(TJRS, 8ª Câmara Cível, Habeas Corpus 70050460054, DES. RUI PORTANOVA, Julgamento: 18/10/2012)

APELAÇÃO CÍVEL. ECA. ATO INFRACIONAL. ROUBO. NULIDADE DO FEITO. 1. INFRAÇÃO AOS §§ 1º E 2º DO ART. 184 E DO ART. 111,

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10 TODOS DO ECA. 2. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO ADOLESCENTE PARA A AUDIENCIA DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS. VIOLAÇÃO DAS GARANTIAS PROCESSUAIS (ART. 111, II DO ECA). 1. A notificação dos pais ou responsáveis para comparecer à audiência de apresentação é obrigatória (art. 184, § 1º, do ECA), sob pena de nulidade do procedimento. Se os pais ou responsáveis não forem localizados ou não comparecerem à solenidade, obrigatória a nomeação de Curador Especial ao adolescente (art. 184, § 2º, do ECA). As figuras do defensor e do curador não se confundem e tampouco se excluem, de sorte que, ausentes os pais ou responsáveis, necessária a presença tanto do curador, quanto do defensor para o ato.

2. Não tendo havido a intimação do adolescente para a audiência de inquirição de testemunhas, padece de nulidade o feito, em flagrante violação à garantia processual insculpida no art. 111, inc. II do ECA.

DE OFÍCIO, ANULARAM O FEITO DESDE A AUDIÊNCIA DE APRESENTAÇÃO. UNÂNIME.

(TJRS, 8ª Câmara Cível, Apelação Cível 70048548028, DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, Julgamento: 28/07/2012)

APELAÇÃO. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PRELIMINAR. NULIDADE PROCESSUAL. ALEGADA AUSÊNCIA DE LAUDO INTERDISCIPLINAR (ART. 186, CAPUT, DO ECA). MERA FACULDADE DO JUIZ. PREFACIAL AFASTADA.

NULIDADE DA AUDIÊNCIA DE APRESENTAÇÃO, ANTE A AUSÊNCIA DE PAIS, RESPONSÁVEL OU DE NOMEAÇÃO DE CURADOR AO REPRESENTADO. CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO, UMA VEZ QUE A PRESENÇA DESTES TEM CARÁTER PSICOLÓGICO E ATENDE AO PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO INTEGRAL. ANULAÇÃO DO PROCESSO DESDE A AUDIÊNCIA, INCLUSIVE. NULIDADE RECONHECIDA DE OFÍCIO. ANÁLISE DO MÉRITO RECURSAL PREJUDICADA.

(TJSC, Terceira Câmara Criminal, Apelação / Estatuto da Criança e do Adolescente n. 2010.005302-6, Relator: Des. Alexandre d'Ivanenko, Julgamento: 07/06/2010)

APELAÇÃO CÍVEL. ATO INFRACIONAL. AUSÊNCIA DE NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL. NULIDADE. Não sendo os pais ou responsáveis localizados é obrigatória a nomeação de Curador Especial ao adolescente (art. 184, § 2º, do ECA). PRELIMINAR ACOLHIDA. NULIDADE DECRETADA.

(TJSC, Apelação Cível Nº 70033932187, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Claudir Fidelis Faccenda, Julgado em 04/02/2010) Por conseguinte, requer seja declarada a nulidade absoluta desde a realização da audiência de apresentação sem a presença dos pais, responsável ou a nomeação de curador especial para o menor, ante a violação aos arts. 142, parágrafo único, e 184, § 2º, do ECA, e art. 5º, LIV e LV, da CRFB/88.

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11 4) DO MÉRITO: DA DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO USO DE DROGAS E DO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO

Ainda que superadas as preliminares suscitadas, o que apenas se admite em atenção ao princípio da eventualidade, no mérito, tampouco merece guarida a pretensão socioeducativa.

Por força do princípio constitucional da presunção de inocência, previsto no art. 5º, LVII, da CRFB/88, compete ao Ministério Público o ônus de provar a prática do ato infracional imputado ao representado. Exige-se, assim, que o acervo probatório carreado aos autos seja robusto, harmônico e seguro, a ponto de trazer a certeza absoluta da prática do ato infracional, pois a mera dúvida impõe sempre a improcedência da representação, em nome do princípio do in dubio pro reo.

No presente caso, contudo, o conjunto probatório colhido é insuficiente para arrimar a pretensão socioeducativa, já que inexiste nenhum elemento concreto no sentido de que o representado estivesse traficando drogas na localidade.

Primeiramente, é de se ressalvar que os testemunhos dos policiais militares devem ser interpretados com reservas, haja vista que são agentes estatais diretamente interessados na demonstração da legalidade da apreensão.

Nesse sentido, manifesta-se a abalizada doutrina do mestre Hélio Moniz Sodré Pereira:

Os policiais que prendem os acusados, que os algemam, que os espancam muitas vezes, que os levam para a cadeia não podem ser tidos, a rigor, como insuspeitos e isentos. Devem ser certamente encarados com reservas. Tais policiais não são estranhos às partes e ao processo, não deixam de ter participação no fato, nem podem mesmo deixar de estar, pelo menos, moralmente interessados no reconhecimento da procedência da Ação Penal a que deram causa. (PEREIRA, Hélio Moniz Sodré. A prova penal referente a posse de entorpecente” - pág.16)

Do mesmo modo, valiosa a lição de Fernando Capez:

Os policiais não estão impedidos de depor, pois não podem ser considerados testemunhas inidôneas ou suspeitas, pela mera condição funcional. Contudo, embora não suspeitos, têm eles todo o interesse em demonstrar a legitimidade do trabalho realizado, o que torna bem relativo o valor de suas palavras. Por mais honesto e correto que seja o policial, se participou da diligência, servindo de testemunha, no fundo estará sempre procurando

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12 legitimar a sua própria conduta, o que juridicamente não é admissível. Necessário, portanto, que seus depoimentos sejam corroborados por testemunhas estranhas aos quadros policiais. (obra citada, p. 298).

Esse é o posicionamento adotado por diversas decisões judiciais:

“Não faz sentido negar qualquer valor a depoimento de policial. Entretanto, uma condenação não se pode basear apenas nele que tem direto interesse em dizer legítimas e legais as providências por ele tomadas na fase de inquérito”. (TACRIM SP- RT. 597/ 330)

“Por mais idôneo que seja o policial, por mais honesto e correto, se participou da diligência, servindo como testemunha, no fundo está procurando legitimar a sua própria conduta, o que juridicamente não é admissível. A legitimidade de tais depoimentos surge, pois, com a corroboração por testemunhas estranhas aos quadros policiais” (TACRim SP – 3ª Câmara Criminal – Ap. 135-747 – Juiz Chiaradia Netto) “Em tema de comércio clandestino de entorpecentes, o isolado depoimento de policiais não basta, por si só, à produção de decreto condenatório” (JUTACRIM 43/166)

No presente caso, além de se verificarem contradições nos depoimentos dos policiais militares ouvidos em juízo, certo é que suas declarações não confirmam que o adolescente estivesse traficando drogas no local e não se coadunam com as demais provas dos autos.

Com efeito, os dois policiais militares afirmaram que, inicialmente, o representado estava namorando no momento da apreensão e, uma vez indagado acerca da droga apreendida, o mesmo esclareceu que estava apenas fazendo USO das substâncias entorpecentes.

Num segundo momento, os agentes estatais declararam ter efetuado nova indagação, quando os adolescentes afirmaram que tanto o representado, quanto Marcele, estariam vendendo drogas no local. Ora, a conduta das testemunhas de acusação, no sentido de - no mínimo - pressionarem dois adolescentes a respeito da prática do tráfico de drogas, quando já havia sido esclarecido sobre o mero uso das substâncias, se mostra totalmente ilegítima, já que afrontosa ao direito fundamental ao silêncio (art. 5º, LXIII, da CRFB/88)! Ademais, o relato dos policiais militares torna totalmente plausível a versão fornecida pelo representado perante o Ministério Público às fls. 33/34, quando afirmou que aqueles teriam lhe agredido para saber de quem eram as drogas.

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13 Não bastasse, as declarações fornecidas em juízo pelos policiais militares divergem daquelas por eles proferidas em sede policial. Sob o crivo do contraditório, Douglas Nunes de Jesus declarou que, naquele segundo momento, os dois menores confirmaram que a droga se destinava à venda (vide 0:40min a 1:00min), e Wellington de Magalhães Antunes Júnior afirmou que, depois de encontrarem a segunda sacola contendo droga nas proximidades do local, ambos informaram que estariam vendendo a substância entorpecente (vide 1:40min a 1:10min). Já em sede policial, as testemunhas de acusação noticiaram apenas a suposta confissão de Marcele (fls. 02/03).

Consoante se constata, são inúmeras as incongruências que permeiam os depoimentos prestados pelos policiais militares, de forma a lhes retirar totalmente a já questionável credibilidade.

Já a adolescente Marcele da Conceição, em seu depoimento judicial, afirmou que, QUANDO CHEGOU À PRAIA, O REPRESENTADO JÁ ESTAVA FAZENDO USO DA DROGA, NÃO TENDO VENDIDO NEM OFERECIDO A MESMA PARA NINGUÉM (vide a partir de 2:30min)!!! Mesmo porque, segundo os próprios policiais militares, NÃO HAVIA PESSOAS PRÓXIMAS AOS ADOLESCENTES NA PRAIA! Resta cristalino, portanto, que a droga apreendida em poder do representado se destinava a consumo próprio, e não ao tráfico de drogas.

O fato de Marcele supostamente já ter visto o representado traficando drogas é absolutamente irrelevante para o presente caso. Afinal, em um Estado Democrático de Direito, vigora o Direito Penal do fato, sendo inaceitável o Direito Penal do autor, o qual, nas palavras de Zaffaroni e Pierangeli, “é uma corrupção do direito penal, em que não se proíbe o ato em si, mas o ato como manifestação de uma ‘forma de ser’ do autor, esta sim considerada verdadeiramente delitiva” (Manuel de Direito Penal Brasileiro, vol. 1, p. 105). Portanto, a caracterização ou não do ato infracional análogo ao tráfico de drogas dependerá da prova da finalidade ou não da traficância em relação à substância concretamente apreendida (fato), sendo irrelevante se o agente já foi ou não um traficante (ser).

Milita, ainda, em favor do representado a quantidade de droga apreendida, consistente em 5,34g de maconha e 5,37g de cocaína, de acordo com o laudo definitivo de fl. 24. Isso, somado a todo o conjunto probatório colhido e analisado acima, torna plenamente factível que o adolescente não estava traficando no local, mas que a droga apreendida se

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14 destinava ao uso pessoal, já que é usuário de maconha e cocaína, conforme depoimento prestado às fls. 33/34.

Inclusive, no parecer social de fls. 88/90, há notícia de que o adolescente já esteve internado em uma clínica para reabilitação de dependentes químicos no Município de Mangaratiba.

Diante de todo o exposto, forçoso reconhecer que o conjunto probatório colhido é extremamente frágil para arrimar a imputação pela prática de ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas. Não tendo o órgão acusatório se desincumbido do ônus da prova a ele atribuído, o presunção constitucional de não culpabilidade determina a aplicação do princípio in dubio pro reo ao caso.

Cumpre registrar que, embora os fatos ora em apuração possam, em tese, se subsumir ao ato infracional análogo ao crime de uso de drogas (art. 28 da Lei nº 11.343/06), afigura-se descabida a desclassificação.

A representação não descreve a conduta de posse de drogas para consumo pessoal, mas sim a finalidade de tráfico de drogas. Assim, em atenção aos princípios da correlação entre acusação e sentença, da ampla defesa e do contraditório, deve ser julgada improcedente a representação socioeducativa.

Nesse sentido, tem reiteradamente decidido as Câmaras Criminais do TJRJ:

APELAÇÃO CRIMINAL. CONDENAÇÃO POR TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS (ARTIGOS 33 DA LEI Nº 11.343/06). PRETENSÃO DEDESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA O CRIME DE USO DE ENTORPECENTE (ART. 28 DA LEI Nº 11.343/06). SUBSIDIARIAMENTE, A DEFESA PUGNA PELA SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVA DE DIREITO. A APREENSÃO DO ENTORPECENTE RESTOU INCONTROVERSA, NA MEDIDA EM QUE NÃO FOI NEGADA PELO APELANTE. ENTRENTANTO, EM SEU INTERROGATÓRIO, ELE DECLAROU QUE A DROGA SE DESTINAVA AO PRÓPRIO CONSUMO. OS POLICIAIS NÃO AFIRMARAM A REALIZAÇÃO DE QUALQUER ATO CONCRETO DO APELANTE CAPAZ DE CARACTERIZAR A ATIVIDADE DE MERCANCIA. A QUANTIDADE DE ENTORPECENTE ENCONTRADO EM PODER DO APELANTE, POR SI SÓ, NÃO NOS AUTORIZA A CONCLUSÃO DE QUE TINHA DESTINAÇÃO DE COMERCIALIZAÇÃO. CONDUTA QUE MELHOR SE ADEQUA AO CRIME DE USO DE ENTORPECENTE. A DENÚNCIA DESCREVE APENAS A CONDUTA DE TRÁFICO DE ENTORPECENTE,. O QUE TORNA IMPOSITIVA A ABSOLVIÇÃO, EM HOMENAGEM AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. ISTO PORQUE O CRIME DE POSSE DE DROGA PARA USO PESSOAL EXIGE UM ESPECIAL FIM DE AGIR NÃO DESCRITO NA DENÚNCIA, IMPOSSIBILITANDO AO

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15 APELANTE O EXERCÍCIO DA AMPLA DEFESA NESSE

PARTICULAR. POR ESSE MOTIVO, RESTA VEDADA

ADESCLASSIFICAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA, NA FORMA DO INCISO VII DO ART. 386, DO C.P.P., ABSOLVER O APELANTE. EXPEÇA-SE ALVARÁ DE SOLTURA CLAUSULADO. (TJRJ, 7ª Câmara Criminal, 0319674-97.2011.8.19.0001 – APELACAO, DES. SIDNEY ROSA DA SILVA, Julgamento: 17/07/2012)

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO. ARTIGOS 33 E 35 AMBOS DA LEI Nº 11.343/06, NA FORMA DO ARTIGO 69 DO CÓDIGO PENAL. DEFESA SUSTENTANDO A ABSOLVIÇÃO POR ENTENDER QUE NÃO HÁ PROVAS SUFICIENTES A ENSEJAR O DECRETO CONDENATÓRIO. SUBSIDIARIAMENTE, PUGNA PELA DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO PARA AQUELE TIPIFICADO NO ARTIGO 28 DA LEI ANTIDROGAS. PROVIMENTO DO RECURSO.

1. A materialidade está comprovada através dos laudos acostados aos autos que atestam que a substância apreendida no interior da residência do Apelante é o entorpecente identificado como “Cannabis sativa L.”, popularmente denominado “maconha” e Cloridrato de Cocaína, acondicionados, o primeiro em 06 embalagens confeccionadas com plástico transparente e fechadas em nó, contendo erva seca picada, com peso líquido total de 8,9g e, o segundo em 05 embalagens confeccionadas com plástico transparente e fechadas com nó, contendo pó branco, com peso líquido total de 4,6g.

2. A destinação mercantil da droga, porém, não resta extreme de dúvidas. O único indício de que o entorpecente visava o tráfico ilícito são as alegações dos policiais responsáveis pela prisão que, percebe-se nitidamente, são inseguros e contraditórios, ao afirmar: “que ficaram de campana no mato, próximo à casa do acusado”; “que ficaram por cerca de duas horas em observação”; “que o depoente ficou na rua, juntamente com o SdPM Maximiano, que os outros componentes da PATAMO ficaram escondidos no mato” e “que ficaram por cerca de uma hora em observação”.

3. Contudo, diante da dinâmica do caso concreto, dessume-se que a maconha apreendida destinava-se ao consumo do próprio Apelante.

4. Some-se a isso, o fato do Apelante ser vítima de agressão quando da abordagem policial, como se pode dar crédito à Apelação Criminal n° 0012815-60.2008.8.19.0061 V Desembargador Sidney Rosa da Silva 2 Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro gabinete do Desembargador Sidney Rosa da Silva 3ª Câmara Criminal palavra de policiais que desrespeitam a nossa Lei, o que restou comprovado, de forma cabal, pelo exame de corpo de delito.

5. Como conseqüência deste raciocínio, impõe-se a absolvição do apelante, eis que a conduta de posse de droga para uso pessoal não está contida naquela imputada a ele na denúncia (tráfico de drogas), contra a qual o acusado exerceu ampla defesa.

6. O crime de posse de droga para uso pessoal exige um especial fim de agir que não está descrito na denúncia e, por isso, é vedada a desclassificação exercida pelo juiz sentenciante sob pena de ser violado o princípio da correlação.

7. Observa-se, assim, a aplicação do princípio da correlação entre a denúncia e a sentença de forma a garantir a adequada oportunidade de o

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16 acusado responder ao processo exercendo ampla defesa especificamente contra os fatos cuja autoria é imputada a ele.

8. PROVIMENTO DO RECURSO DEFENSIVO, para absolver FABIO DOS SANTOS, por ausência de provas, nos termos do artigo 386, VII do Código de Processo Penal, determinando-se a expedição de alvará de soltura, se por outro motivo não estiver preso.

(TJRJ, 3ª Câmara Criminal, apelação 0012815-60.2008.8.19.0061, Des. Sidney Rosa da Silva, Julgamento: 28/09/2010)

ENTORPECENTES. TRÁFICO (ART. 33, LEI 11.343/06). PROVA INSUFICIENTE. IMPUTAÇÃO NÃO DEMONSTRADA. PRESUNÇÃO DE DOLO INADMISSÍVEL. DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO PRÓPRIO (ART. 28, LEI 11.343/2006). ABSOLVIÇÃO. Inviável o reconhecimento do crime do art. 33, da lei 11.343/06, se a prova não é certa e precisa sobre a destinação ao tráfico da substância entorpecente apreendida com o acusado, inadmissível a presunção do dolo. O ônus de demonstrar a existência do tipo penal imputado na denúncia é da acusação (art. 156, C.P.P.), não se podendo inverter este ônus processual para a defesa. “Todos os elementos constitutivos do tipo devem ter sua existência provada, ficando o onus probandi, no caso, para a acusação” (Frederico Marques). ACÓRDÃO – APELAÇÃO CRIMINAL 2007.050.05181 2. O princípio da verdade real é incompatível com as certezas predeterminadas; e, para a condenação, exige-se que a imputação seja demonstrada de forma ampla, absoluta, induvidosa. Insuficiente a prova para demonstrar que o entorpecente apreendido – 25,6g de maconha – se destinava ao tráfico, e não descrevendo a denúncia conduta que se amolde ao tipo do art. 28, da lei 11.343/2006 – posse de entorpecente para uso próprio – inviável a desclassificação, sob pena de afronta aos princípios da imutatio libelli e da correlação, impondo-se a absolvição do acusado. Recurso provido, sob pena de afronta aos princípios da mutatio libelli e da correlação, impondo-se a absolvição do acusado. Recurso provido.

(TJRJ, 5ª Câmara Criminal, apelação 0013837-71.2006.8.19.0014. Rel.: Des. Sérgio de Souza Verani. Julgamento 15/01/2009)

TRÁFICO. PEDIDOS DE ABSOLVIÇÃO POR PRECARIEDADE PROBATÓRIA OU REVISÃO DA DOSIMETRIA. APELOS PROVIDOS. Os apelantes são irmãos e residem em terreno comunitário, onde existem outras residências. A pequena quantidade de entorpecente apreendida, os contraditórios depoimentos dos policiais, admitem a tese de que o entorpecente se destinaria a uso próprio, conforme confessado pelos réus.

Todavia, inviável um juízo de desclassificação, por ofensa ao princípio da correlação, impondo-se a absolvição dos apelantes, por precariedade probatória. APELOS PROVIDOS, para absolver os apelantes com base no artigo 386, inciso VII do CPP, com expedição de alvará de soltura.

(TJRJ, 7ª Câmara Criminal, apelação 0015439-92.2009.8.19.0014, Des. Alexandre H. Varella, Julgamento: 08/07/2010)

APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO E QUADRILHA. FATO

OCORRIDO EM 1988. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA PARA ABSOLVER MAURÍCIO DA SILVA, ORLANDO SILVA DO CARMO E

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17 WALTER NOGUEIRA FILHO DO CRIME DO ART. 288 DO CÓDIGO PENAL, COM FUNDAMENTO NO ART. 386, VI CPP, CONDENANDO-OS COMO INCURSOS NAS PENAS DO ART. 157 § 2º, INCISOS I E II DO CP ÀS PENAS DE 05 ANOS E 04 MESES DE RECLUSÃO EM REGIME INICIALMENTE FECHADO E 54 (CINQÜENTA E QUATRO) DIASMULTA, AO VALOR CADA DIA DE 1/30 DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS, TUDO CORRIGIDO ATÉ A DATA DO EFETIVO PAGAMENTO. CONCEDEU AOS ACUSADOS O DIREITO DE RECORREREM EM LIBERDADE, CONSIDERANDO OS ANOS TRANSCORRIDOS (29/11/2000). INCONFORMISMOS DEFENSIVOS. EM QUE PESE A PRESENÇA DE TERMO DE RECONHECIMENTO E IDENTIFICAÇÃO DE CADÁVER ÀS FLS. 400/402, CONSIDERANDO A INEXISTÊNCIA NOS AUTOS DE CERTIDÃO DE ÓBITO DE ORLANDO SILVA DO CARMO, CONSOANTE DISPOSTO NO ARTIGO 62 CPP, IMPOSSIBILITADA A DECLARAÇÃO DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, RAZÃO PELA QUAL PROSSIGO NO JULGAMENTO DAS APELAÇÕES INTERPOSTAS. AO RECURSO DOS APELANTES DEVERÁ SER DADO PROVIMENTO, COMO SE DEMONSTRARÁ. VERIFICO A PRECARIEDADE DO SUPORTE PROBATÓRIO DIANTE DA AUSÊNCIA DE PROVAS CONTUNDENTES DA AUTORIA DELITIVA. AMPAROU-SE A SENTENÇA NO DEPOIMETO DE UMA ÚNICA TESTEMUNHA (FL. 173) QUE NADA ESCLARECEU SOBRE FATO OCORRIDO EM 1988, SENDO A PROVA

INSUFICIENTE PARA CONDENAÇÃO DOS ACUSADOS.

VISLUMBRO QUE DEVE SER DADO PROVIMENTO AO RECURSO DO APELANTE PARA ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. OBSERVA-SE QUE O DEPOIMENTO COLHIDO NÃO EVIDENCIA CERTEZA PARA CONDENAÇÃO. DE FATO, O MINISTÉRIO PÚBLICO NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS QUE LHE COMPETE. OS ACUSADOS NÃO TEM QUE PROVAR NADA, PORQUE A PRESUNÇÃO CONSTITUCIONAL É DE INOCÊNCIA. É IMPORTANTE SALIENTAR, QUE O MINISTÉRIO PÚBLICO, PARTE INTERESSADA NO ACOLHIMENTO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO E AUTOR DA AÇÃO PENAL, NÃO RECONHECEU A IDONEIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO PRESENTE NOS AUTOS A ENSEJAR A CONDENAÇÃO DO ACUSADO, POR TAL ARGUMENTAÇÃO É QUE SUSTENTO PELA NÃO MANUTENÇÃO DO DECRETO CONDENATÓRIO, EM RAZÃO DA

FRAGILIDADE DAS PROVAS QUE EMBASARAM A SENTENÇA CONDENATÓRIA EM DESFAVOR DOS APELANTES. RECURSOS PARA DAR PROVIMENTO PARA ABSOLVIÇÃO DOS APELANTES, POR AUSÊNCIA DE PROVAS, NOS TERMOS DO ARTIGO 386, VII DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, DETERMINANDO-SE A EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA, SE POR OUTRO MOTIVO NÃO ESTIVEREM PRESOS.

(TJRJ, 7ª Câmara Criminal. Apelação Criminal nº 0038518-77.1988.8.19.0001, Desembargador Siro Darlan de Oliveira, Julgamento: 19/10/2010)

Em síntese, diante da total ausência de provas de que a droga apreendida seria destinada à traficância, e tendo em vista que a representação não descreve a conduta de uso de

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18 drogas, requer seja julgada improcedente a ação socioeducativa, com fundamento no art. 189, IV, do ECA, em respeito ao princípios da não-culpabilidade, da correlação, da ampla defesa e do contraditório.

4) DA IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE INTERNAÇÃO PELA NÃO CONFIGURAÇÃO DE QUAISQUER DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ARTIGO 122 DO ECA (ROL TAXATIVO) E EM RAZÃO DO PRINCÍPIO DA EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA DE INTERNAÇÃO.

Subsidiariamente, ainda que se considere que há provas suficientes do ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas, o que não se espera, a medida socioeducativa de internação postulada pelo órgão acusador não está em consonância com os ditames do ECA.

O artigo 122 do ECA é claro ao prever as hipóteses taxativas em que se pode aplicar a medida mais severa, sendo certo que o adolescente não se enquadra em nenhuma delas, estando vedado pelo princípio da legalidade o emprego de analogia in malam partem.

Primeiramente, ressalte-se que o ato não foi praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, não cabendo, assim, a aplicação do inciso I do artigo supracitado. Nesse sentido, a jurisprudência pacífica do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que resultou na edição do enunciado 492, da Súmula do STJ, verbis: “O ato infracional análogo ao crime de tráfico, por si só, não conduz obrigatoriamente à imposição de medida socioeducativa de internação do adolescente”.

Por outro lado, o presente caso não se amolda ao inciso II, pois é certo que o representado não possui mais de 3 (três) sentenças de procedência de representação por infrações graves transitadas em julgado e praticadas anteriormente ao presente. A FAI acostada à fl. 37 demonstra que o adolescente responde apenas ao processo nº 0001372-06.2011.8.19.0030, o qual ainda está curso (vide pesquisa em anexo), de modo que não pode ser considerado para fins de reiteração da conduta por força do princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CRFB/88). Por sua vez, a cópia da representação acostada às fls. 67/70 se refere a fato posterior ao presente, tampouco servindo para fins de reiteração.

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19 Por fim, não há qualquer notícia nos autos do descumprimento injustificável e por pelo menos 3 (três) vezes de medida socioeducativa imposta, não restando configurada a hipótese prevista no inciso III. Ao revés, a síntese informativa de fl. 112 revela que a medida de semiliberdade que cumpre o adolescente vem atendendo ao seu objetivo, aderindo este último às normas da unidade e às intervenções propostas.

Ainda no que tange aos incisos II e III do artigo 122 do ECA, saliente-se que a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que, para que sejam aplicadas ambas as hipóteses, o adolescente deve ter praticado anteriormente pelo menos 3 (três) atos infracionais graves com sentença transitada em julgado, ou deve ter descumprido pelo menos 3 (três) medidas anteriormente impostas, respectivamente, já que reiteração não se confunde com reincidência. Senão vejamos:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO. ART. 122 DA LEI Nº 8.069/90. ROL TAXATIVO. INTERNAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Nos termos da orientação deste Superior Tribunal de Justiça, a internação, medida socioeducativa extrema, somente está autorizada nas hipóteses taxativamente elencadas no art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

2. Na hipótese, os atos infracionais cometidos pelo paciente, análogos aos crimes de tráfico ilícito de drogas e associação, embora sejam socialmente reprováveis, são desprovidos de violência ou grave ameaça à pessoa. E não ficou comprovada a reiteração de infrações graves - para tanto, necessária a prática de, no mínimo, 3 (três) atos anteriores e de igual gravidade - ou o descumprimento reiterável e injustificável de medida anteriormente imposta. Assim, não há como subsistir, na espécie, a internação aplicada.

3. A reincidência e a gravidade dos atos infracionais praticados recomendam a aplicação da medida socioeducativa de semiliberdade.

4. Recurso provi

(STJ, 6ª Turma, RHC 35878 / RJ, Ministro OG FERNANDES, DJe 22/04/2013)

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. UTILIZAÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. ART. 122 DA LEI N.º 8.069/90. ROL TAXATIVO. INTERNAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

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20 1. A Constituição da República define, no art. 105, incisos I, II e III, o rol de competências do Superior Tribunal de Justiça para o exercício da jurisdição em âmbito nacional.

2. À luz desse preceito, esta Corte de Justiça e o Supremo Tribunal Federal não vêm mais admitindo a utilização do habeas corpus como substituto de recurso ordinário, tampouco de recurso especial, nem como sucedâneo da revisão criminal, sob pena de se frustrar sua celeridade e desvirtuar a essência desse instrumento constitucional.

3. Ora, a existência de recurso próprio para a análise da questão obsta o conhecimento do presente writ. De ressaltar que, uma vez constatada a existência de ilegalidade flagrante, nada impede que esta Corte defira ordem de ofício, como forma de refrear constrangimento ilegal.

4. Nos termos da orientação deste Superior Tribunal de Justiça, a internação, medida socioeducativa extrema, somente está autorizada nas hipóteses taxativamente elencadas no art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

5. Na hipótese, o ato infracional cometido pelo adolescente, análogo ao crime de tráfico ilícito de drogas, embora seja socialmente reprovável, é desprovido de violência ou grave ameaça à pessoa. Não há, portanto, como subsistir, na espécie, a medida excepcional imposta, porquanto a conduta perpetrada pelo paciente e suas condições pessoais não se amoldam às hipóteses do art. 122 do ECA.

6. Os antecedentes do adolescente não justificam a adoção da medida de internação, visto que não preenchido o requisito quantitativo reconhecido pela jurisprudência dominante, no sentido de que somente ocorre reiteração de conduta infracional pelo menor, quando, no mínimo, são praticadas três ou mais infrações graves anteriores, o que não é o caso dos autos.

7. O contexto social em que está inserido o adolescente, a prática anterior de outros dois atos infracionais e a natureza da droga apreendida em seu poder justificam a aplicação da medida socioeducativa de semiliberdade.

8. Habeas corpus não conhecido, mas concedida a ordem de ofício para que seja aplicada a medida de semiliberdade ao paciente.

(STJ, 6ª Turma, HC 260449 / SP, Ministro OG FERNANDES, DJe 05/04/2013)

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. DESCABIMENTO.

RECENTE ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ATO INFRACIONAL.

PLEITO POR MEDIDA SOCIOEDUCATIVA MAIS BRANDA. POSSIBILIDADE.

AUSÊNCIA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA JUSTIFICAR A INTERNAÇÃO.

1. Buscando dar efetividade às normas previstas no artigo 102, inciso II, alínea "a", da Constituição Federal, e aos artigos 30 a 32, ambos da Lei nº 8.038/90, a mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal passou a não mais admitir o manejo do habeas corpus em substituição a recursos ordinários (apelação, agravo em execução, recurso especial), tampouco como sucedâneo de revisão criminal.

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21 2. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se à nova jurisprudência da Colenda Corte, passou também a restringir as hipóteses de cabimento do habeas corpus, não admitindo que o remédio constitucional seja utilizado em substituição do recurso cabível.

3. A medida socioeducativa de internação só deverá ser decretada, de forma excepcional e breve, se o ato infracional ocorrer mediante grave ameaça ou violência à pessoa, por reiteração no cometimento de outras infrações graves ou por descumprimento repetido e injustificável da anteriormente imposta, quando comprovados a sua existência e o indício suficiente de autoria.

4. Esta Corte Superior mantém a orientação no sentido de que, para resultar em reiteração de infrações graves (art. 122, II, da Lei nº 8.069/90), é necessário terem sido prolatadas, no mínimo, três outras sentenças desfavoráveis, com trânsito em julgado, não podendo ser computadas as remissões.

5. O juízo de probabilidades e ilações abstratas não constitui fundamentação idônea a autorizar medida mais gravosa que a prevista em lei, diante da desvinculação com elementos concretos.

6. Habeas corpus não conhecido, por ser substitutivo do recurso cabível. Ordem concedida, de ofício, para anular a decisão monocrática, no tocante à medida socioeducativa, a fim de que seja imposta ao paciente medida diversa da internação, a cargo do juízo de primeiro grau, permitindo que o adolescente aguarde tal desfecho em liberdade assistida.

(STJ, 5ª Turma, HC 246083 / SP, Ministro CAMPOS MARQUES, DJe 26/11/2012)

HABEAS CORPUS. 1. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO A FURTO QUALIFICADO. INTERNAÇÃO. 2. FIXAÇÃO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA MENOS GRAVOSA. POSSIBILIDADE. HIPÓTESE PREVISTA NO INCISO II DO ARTIGO 122 DO ALUDIDO ESTATUTO. NÃO OCORRÊNCIA 3. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. A medida socioeducativa de internação somente pode ser imposta ao adolescente na hipótese de não haver outra mais adequada e menos onerosa à sua liberdade, e caso o adolescente incida em quaisquer das hipóteses previstas no artigo 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

2. É pacífico o entendimento deste Tribunal Superior de que a reiteração prevista nos incisos II e III do artigo 122 do Estatuto Menorista não se confunde com o conceito de reincidência, de sorte que, para a sua configuração, é necessária a prática de, pelo menos, três atos anteriores, seja infração grave ou medida anteriormente imposta. 3. Consta na certidão de antecedentes criminais do paciente a instauração de três procedimentos de apuração de atos infracionais, ainda em andamento, além de duas outras anotações que, embora referentes à execução de medidas socioeducativas, são insuficientes para autorizar a medida mais rigorosa, pois, nos termos da jurisprudência firmada no Superior Tribunal de Justiça, configura-se a reiteração no cometimento de três ou mais atos infracionais de natureza grave.

4. A fixação de medida socioeducativa em meio aberto não é possível nesta instância, devendo o Juiz de primeiro grau, que possui maior proximidade

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22 com os fatos, analisar as circunstâncias que particularizam o caso e aplicar a medida mais apropriada ao menor.

5. Habeas corpus parcialmente concedido para anular o acórdão nº 2011.027201-4/0000-00, proferido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, na parte referente à aplicação da medida socioeducativa, a fim de que seja imposta medida diversa da internação, devendo o paciente permanecer, nesse ínterim, na medida socioeducativa de semiliberdade.

(STJ, 5ª Turma, HC 225470 / MS, Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 31/05/2012)

HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES. APLICAÇÃO DA MEDIDA DE INTERNAÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO. GRAVIDADE ABSTRATA DA INFRAÇÃO. REITERAÇÃO NÃO-DEMONSTRADA. ART. 122 DO ECA. ROL TAXATIVO. ILEGALIDADE CONFIGURADA. ORDEM CONCEDIDA.

1. O art. 122 da Lei n. 8.069/1990 estabelece que a internação do adolescente somente será cabível quando o ato infracional for perpetrado com violência ou grave ameaça à pessoa ou na hipótese de reiteração na prática de outras infrações graves ou de descumprimento reiterado e injustificado de medida prévia.

2. A prática de ato infracional equiparado ao delito de tráfico de entorpecentes, em virtude da sua gravidade abstrata, por si só, não autoriza a segregação dos menores.

3. É assente na jurisprudência desta Corte o entendimento no sentido de que "a reiteração prevista nos incisos II e III do art. 122 do ECA, não se confunde com o conceito de reincidência, de sorte que, para sua configuração, é necessária a prática de, pelo menos, 3 atos anteriores, seja infração grave ou medida anteriormente imposta, respectivamente." (Habeas corpus n.º 90.920/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Quinta Turma, julgado em 06/05/2008 e DJe 26/05/2008).

4. In casu, não obstante contar com quatro registros em sua folha de antecedentes, o menor fora beneficiado com a remissão em duas oportunidades, razão pela qual não há que se falar em reiteração, uma vez que o art. 127 do ECA determina que aludido instituto não implica reconhecimento de responsabilidade nem vale como antecedentes. Precedentes.

5. Ordem concedida para reformar o aresto do Tribunal a quo e restabelecer a decisão singular, que aplicou ao adolescente a medida socioeducativa de liberdade assistida.

(STJ, 5ª Turma, HC 164819/SP, Ministro JORGE MUSSI, DJe 18/10/2010)

De fato, o previsão taxativa das hipóteses de internação nos incisos I a III do art. 122 do ECA se coaduna com o princípio da excepcionalidade da medida extrema restritiva da liberdade do adolescente, consagrado nos arts. 121 e 122, §2º, daquele diploma legal.

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23 Afinal, ao se tratar de adolescentes, muitas peculiaridades devem ser observadas, tendo em vista estarmos diante de um ser humano em desenvolvimento, muitas vezes vítima da falta de estrutura familiar e da situação de pobreza que assola as comunidades mais carentes, cabendo ressaltar os ensinamentos abaixo expostos:

“(...) O caráter breve e excepcional da medida – internação – surge também do reconhecimento dos provados efeitos negativos da privação da liberdade, principalmente no caso da pessoa humana em condição peculiar de desenvolvimento.” (Emílio García Mendez. UNICEF/ América do Sul. E.C.A. Comentários Jurídicos e Sociais, p. 399)

“(...) Três são os princípios que condicionam a aplicação da medida privativa de liberdade: o princípio da brevidade enquanto limite cronológico; o princípio da excepcionalidade, enquanto limite lógico; e o princípio do respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, enquanto limite ontológico, a ser considerado na decisão e na implementação da medida.” (Antônio Carlos Gomes da Costa. Pedagogo/ Minas Gerais. ECA. Comentários Jurídicos e Sociais, p. 401) - grifamos

A retirada brusca de um adolescente do seio de sua família deve ser a última alternativa adotada pelo Estado, ostentando sempre preferência as medidas que preservem o convívio familiar e social, indispensável ao salutar desenvolvimento enquanto pessoa.

Em síntese, tendo em vista que não restam caracterizadas quaisquer das hipóteses previstas nos incisos I a III do artigo 122 do ECA, e em atenção ao princípio da excepcionalidade, está vedada a aplicação da medida socioeducativa de internação ao representado.

5) DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS EM MEIO ABERTO

Em caso de procedência da representação socioeducativa, deve ser aplicada medida socioeducativa em meio aberto por se revelar adequada e proporcional ao ato infracional praticado e às condições pessoais do adolescente.

O Estatuto da Criança e do Adolescente reservou a aplicação das medidas extremas de internação e de semiliberdade para as situações excepcionais (arts. 120, § 2º, 121 e 122, § 2º), ditadas não exclusivamente pela gravidade do ato cometido, mas pelas necessidades da pessoa em desenvolvimento, devendo-se sempre optar, quando possível, pelas medidas de proteção e socioeducativas em meio aberto.

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24 In casu, as condições pessoais do adolescente são plenamente favoráveis à aplicação de medida mais branda, vez que o mesmo tem demonstrado senso crítico e de responsabilidade, respeito aos limites impostos e boa vontade no seu desenvolvimento sadio enquanto pessoa, além de receber apoio de sua genitora.

O parecer social de fls. 78/90, embora elaborado ainda com superficialidade quando o adolescente se encontrava internado no CAI Belford Roxo, demonstra se tratar de pessoa carente, vítima do sistema desigual e com parcas oportunidades em que estarmos incursos e que, apesar de todas as dificuldades e da pouca idade, já exerceu atividade laborativa como ajudante de pedreiro.

No parecer de fls. 88/90, há notícia de que o adolescente já esteve internado em uma clínica para reabilitação de dependentes químicos em Mangaratiba e se vislumbra a intenção da genitora do menor em se mudar da localidade em que residem, proporcionando um novo começo ao adolescente. Restam claro, portanto, os esforços no sentido da reabilitação do adolescente, com o necessário apoio familiar. Foi relatado, ainda, que o menor recebe visitas regulares de sua genitora, dos irmãos e da avó materna, o que contribui para o processo socioeducativo. Por fim, foi destacado o bom comportamento do adolescente no CAI Baixada, respeitando os técnicos e demais funcionários.

Na mesma esteira, a síntese informativa de fls. 112/113, elaborada em 20/05/2013, estando o adolescente cumprindo medida de semiliberdade, informa, mais uma vez, que a sua genitora comparece regularmente à unidade e “demonstra disponibilidade em auxiliar o filho no que for preciso em relação ao acompanhamento da medida”. Concluem a psicóloga, a pedagoga e a assistente social que a medida de semiliberdade vem cumprindo seu objetivo à medida que o jovem vem conseguindo aderir às normas da unidade e às intervenções propostas.

Vale salientar que, de acordo com o relatório de fls. 88/90, o adolescente, após três anos afastado da rede escolar, passou a cursar o 6º ano no Colégio Estadual Jornalista Barbosa Lima Sobrinho, além de ser inserido na oficina de batik e adestramento de cães. Atualmente, conforme consta da síntese informativa de fls. 112/113, o menor está inserido na rede regular de ensino Escola Municipal Nilo Peçanha.

Não há dúvidas, portanto, de que as condições pessoais do adolescente são plenamente favoráveis à imposição de medida socioeducativa em meio aberto, sendo certo que, se a atual medida de semiliberdade a que está sujeito o menor vem cumprindo seu objetivo, o próximo passo é a implementação da sua transição para o meio aberto, conforme prevê o caput do

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25 art. 120 do ECA.

Por outro lado, o princípio da proteção integral, norteador do ECA, não pode ser utilizado para o fim de submeter o adolescente à medida da qual não necessita, o que resultaria em sério prejuízo àqueles que realmente dela necessitam e ao seu desenvolvimento enquanto pessoa com senso crítico e de responsabilidade.

Destarte, a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade ou, no máximo, a de liberdade assistida, se revela a mais adequada às circunstâncias do caso e à capacidade do agente em cumpri-la, contribuindo, ainda, para a sua sadia reinserção ao convívio familiar e social. Ademais, considerando que o ato infracional não foi cometido com violência ou grave ameaça à pessoa e que não consta da FAI de fl. 37 nenhuma sentença de procedência de ação socioeducativa com trânsito em julgado, forçoso reconhecer as medidas em meio aberto atendem à necessária proporcionalidade.

Em síntese, caso seja julgada procedente a representação, requer a V. Exa a aplicação da medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade ou, no máximo, da liberdade assistida.

6) DA CONCLUSÃO

Por todo o exposto acima, postula a defesa técnica:

a) Preliminarmente, a declaração da nulidade absoluta do processo a partir do recebimento da representação, citando-se pessoalmente o adolescente e seu representante legal na forma preconizada nos arts. 5º, LIV e LV, e 227, § 3º, IV, da CRFB/88, arts. 111, I, e 184, § 1º, do ECA, art. 40, inciso II, da Convenção sobre os Direitos da Criança adotada pela Assembléia-Geral das Nações Unidas, e art. 35, I, da Lei nº 12.594/12 c/c arts. 360 e 564, III, e, do CPP, designando-se data para a realização de nova audiência de apresentação;

b) Ainda em sede de preliminar, a declaração da nulidade absoluta do processo desde a realização da audiência de apresentação sem a presença dos pais, responsável ou a nomeação de curador especial para o menor, ante a violação aos arts. 142, parágrafo único, e 184, § 2º, do ECA, e art. 5º, LIV e LV, da CRFB/88;

c) No mérito, a improcedência da representação, diante da total ausência de provas da prática de ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas, com fundamento

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26 no art. 189, IV, do ECA, e tendo em vista que a representação não descreve a conduta de uso de drogas, em respeito ao princípios da da correlação, da ampla defesa e do contraditório;

d) Na eventual hipótese de procedência da representação, a aplicação de medida socioeducativa em meio aberto, por se revelar adequada e proporcional ao ato infracional praticado e às condições pessoais do adolescente, estando vedada a aplicação de internação em razão de não estarem configuradas as hipóteses taxativas do art. 122 do ECA.

Mangaratiba, 17 de junho de 2013.

Bruna Martins Amorim Dutra Defensora Pública

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