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TÍTULO: HERANÇA DIGITAL NO BRASIL: REFLEXÕES JURÍDICAS SOBRE UMA NOVA REALIDADE

TÍTULO:

CATEGORIA: CONCLUÍDO

CATEGORIA:

ÁREA: CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

ÁREA:

SUBÁREA: DIREITO

SUBÁREA:

INSTITUIÇÃO: CENTRO UNIVERSITÁRIO CATÓLICO SALESIANO AUXILIUM

INSTITUIÇÃO:

AUTOR(ES): MARCELA CIOCCIA NEVES

AUTOR(ES):

ORIENTADOR(ES): VINICIUS ROBERTO PRIOLI DE SOUZA

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RESUMO

Ante as inovações tecnológicas e a complexidade da sociedade digital, a herança digital também passou a ser discutida como objeto de transmissão causa mortis. Dada a crescente relevância da matéria, ainda pouco explorada pela doutrina pátria, aborda-se a viabilidade jurídica de reconhecer bens armazenados virtualmente como parte do patrimônio de um indivíduo e transmiti-los após a morte. Os conceitos utilizados abordam temas acerca da realidade cibernética, principiologia constitucional e, por fim, aspectos da herança digital, tais como conceito, Projetos de Lei nº 4.099 e 4.847 de 2012 e a classificação dos bens digitais de acordo com sua possibilidade de sucessão. O objetivo geral do presente artigo consiste em analisar as consequências e os aspectos jurídicos relacionados ao direito sucessório de bens armazenados em meio virtual. Os objetivos específicos foram formulados da seguinte forma: efetuar investigações da legislação em vigor sobre o tema; pesquisar projetos de lei e suas implicações; efetuar apreciações dos princípios constitucionais que perpassem a matéria. No plano metodológico traçado se adotou a vertente metodológica jurídico-sociológica. Quanto ao procedimento, a pesquisa se pautou em buscas bibliográficas e documentais.

INTRODUÇÃO

Na sociedade atual há a preocupação crescente de construir um verdadeiro patrimônio digital na rede. Devido à importância dos bens digitais, é relevante a preocupação quanto a sua preservação e acesso, visto que os mesmos carregam a história de seus proprietários e até mesmo de uma nação.

Uma das alternativas viáveis de preservação é a transmissão destes ativos para os herdeiros do de cujus, contemplando a chamada herança digital. Isso porque os herdeiros recebem o domínio destes bens, podendo realizar a manutenção e a perpetuidade dos mesmos. Porém, na maioria das vezes, os proprietários dos ativos digitais não param para refletir qual será sua destinação após a morte. Além do mais, como a morte é um momento delicado, muitos familiares e até mesmo amigos não sabem como proceder em relação a estes materiais e/ou contas de usuário de redes sociais.

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Tal questionamento e outros mais podem ser respondidos com a interpelação das matérias de Direito Digital e do Direito das Sucessões. O primeiro é um ramo jurídico dinâmico que está se desenvolvendo cada vez mais a fim de solucionar situações que nem sempre os ramos jurídicos tradicionais conseguem resolver; já o segundo, codificado no ordenamento jurídico pátrio, já é tradicional no Brasil e entre os operadores do Direito.

A solução mais prática para o problema seria o falecido deixar senha e demais informações necessárias para acesso a uma ou mais pessoas de confiança. Porém, tal conduta pode configurar, em alguns casos, o crime de falsa identidade previsto no art. 307 do Código Penal. Outra solução encontrada pelos usuários são os serviços online que permitem fazer um planejamento não oficial do destino de propriedades digitais depois da morte de alguém, tratando-se de um testamento digital. No entanto, ressalta-se que a segurança do site não basta, pois um hacker pode ter acesso aos dados aproveitando a suscetibilidade do computador do próprio usuário. Como se vê, o melhor é tomar as providências legais a fim de obter acesso aos bens digitais de uma pessoa falecida, a fim de não ensejar algum problema penal ou civil para o herdeiro.

O objetivo geral do presente artigo consiste em analisar as consequências e os aspectos jurídicos relacionados ao direito sucessório de bens armazenados em meio virtual. Os objetivos específicos foram formulados da seguinte forma: efetuar investigações da legislação em vigor sobre o tema; pesquisar projetos de lei e suas implicações; efetuar apreciações dos princípios constitucionais que perpassem a matéria. No plano metodológico traçado se adotou a vertente metodológica jurídico-sociológica. Quanto ao procedimento, a pesquisa se pautou em buscas bibliográficas e documentais.

1. Do conceito da herança digital

O objetivo deste tópico é conceituar o Direito Digital, mas não defini-lo. Conceito e definição possuem significados distintos. Quando um termo é definido, há um fechamento a respeito de determinada ideia. A expressão “definição” está intrinsecamente ligada à palavra “definitivo”. Enquanto isso, o termo “conceito” visa apenas um trabalho cognitivo do ser humano a respeito de algo, não tornando seu resultado definitivo. O “conceito” permite uma ampliação da compreensão que

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determinada pessoa tem a respeito de algo; corresponde, portanto, a trazer uma ideia de mente aberta, uma noção ou uma concepção sobre algo. Logo, o que se faz aqui é uma “conceituação” e não uma “definição”.

No escólio de Silva (2014, p. 31), “todo o legado digital de um indivíduo que fica disponível na nuvem ou armazenado em um computador logo após sua morte faz parte de sua herança digital”. Cahn e Beyer (2013, p. 137-138) defendem que a herança digital pode ser dividida em dados pessoais, dados de redes sociais, dados de contas financeiras e dados de contas empresariais. Alguns outros autores como Arnold, Bellamy, Gibbs, Nansen e Kohn (2013) utilizam o conceito de propriedade digital para definir o conjunto de todos os ativos digitais. A herança digital é constituída, deste modo, pelo conjunto de informações acerca de um usuário (formado pelos ativos digitais e pelas contas digitais) que se encontra em formato digital (OLIVEIRA, p. 23-24).

No Brasil não há nenhuma lei que regulamenta ou proíba a transmissão da herança digital. Assim, realizando uma interpretação extensiva do texto legal, não há óbice em inserir os bens digitais no conceito supramencionado de patrimônio e, por consequência, no de herança. Acerca do tema, refere-se Rohrmann (2005, p. 195) ao art. 83, I, do Código Civil, que constituiu uma importante inovação ao “estender o conceito de bem móvel às ‘energias que tenham valor econômico. É inegável que os arquivos digitais de computador são ‘energia armazenada’”. Por decorrência, segundo Costa Filho (2016, p. 191) é possível considerar o acervo digital como um conjunto de bens móveis para efeitos legais.

A localização da Herança Digital é considerada como estando dispersa por vários dispositivos eletrônicos, quer seja em armazenamento local (computadores, notebooks, celulares, pendrivers, discos externos), quer seja em armazenamento em nuvem (em servidor na Internet) (OLIVEIRA, 2016, p. 25).

2. Da principiologia constitucional aplicável à herança digital

Mauro Júnior (2012, p. 29) cita os seguintes princípios concernentes ao assunto (alguns deles já comentados anteriormente): dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF); propriedade (art. 5º, caput, XII, CF); igualdade (art. 5º, caput, CF); intimidade, vida privada, honra e imagem (art. 5º, X, CF); inviolabilidade das comunicações de dados (art. 5º, XII, CF); direito à informação (art. 5º, XIV, CF);

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direito de autor (art. 5º, XXVII, CF); direito de herança (art. 5º, XXX, CF); direito a defesa do consumidor (art. 5º, XXXII, CF).

Através da herança digital se perpetua a família (devido ao seu caráter predominantemente econômico) e projeta a memória dos antepassados. A herança digital também eleva os laços e vínculos familiares, reforçando o princípio da solidariedade familiar, pois resguarda muitos registros especiais entre parentes e amigos. Esta toca também o princípio da dignidade humana, que ampara os herdeiros quando pleiteiam acesso a certos materiais ou retiram outros conteúdos da Internet ligados ao falecido. Garantir a herança digital aos herdeiros legítimos e testamentários é também uma forma de preservar o princípio da proteção familiar, promovendo seu pleno desenvolvimento. Ao dispor de seu patrimônio digital em testamento, está também o usuário exercendo seu direito à herança, bem como o princípio da dignidade humana.

Muitos casos podem ser citados a fim de ilustrar a importância da temática, mas, salienta-se um em específico que ocorreu no Brasil e envolveu os familiares da jornalista Juliana Ribeiro Campos, falecida em maio de 2012, na época com 24 anos. Dolores Pereira Ribeiro, mãe da jovem, conta que, ao tentar cancelar a conta de sua filha através das ferramentas disponibilizadas pela própria rede social Facebook, foi informada que a página fora transformada em memorial post mortem, conforme a política da empresa para usuários falecidos, o que continuaria a permitir a postagem de conteúdo pelos contatos da filha. Desejando a remoção completa do perfil, afirmando que a página havia se transformado em um “muro de lamentações”, Dolores ajuizou ação contra o Facebook Brasil na 1ª Vara do Juizado Central de Campo Grande, sendo determinado em caráter liminar o imediato cancelamento do perfil com multa de R$500,00 por dia de descumprimento.

No Brasil, existem dois Projetos de Lei que visam a inclusão da herança digital no ordenamento jurídico, notadamente no Código Civil. O Projeto de Lei nº 4.099, de 2012, do deputado Jorginho Mello (na época pelo PSDB/SC), visa inserir o tema Herança Digital no art. 1.788, do Código Civil de 2002, através da criação de um parágrafo único com a seguinte redação: “Serão transmitidos aos herdeiros todos os conteúdos de contas ou arquivos digitais de titularidade do autor da herança”. O Projeto foi remetido ao Senado Federal em 02 de outubro de 2013, em caráter conclusivo, ainda em trâmite. Por outro lado, o Projeto de Lei nº 4.847, de 2012, de Marçal Filho, na época deputado pelo PMDB/MS, dispunha também acerca

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do assunto da herança digital. Seu texto visava igualmente inserir a mesma ao Código Civil de 2002 através da criação do Capítulo II-A e dos arts. A a 1.797-C. Ressalta-se que o referido Projeto de Lei, apesar de mais completo, não logrou êxito em ser aprovado, sendo arquivado em 02 de outubro de 2013, em detrimento do Projeto de Lei principal, o citado PL nº 4.099/12, constando apenas o texto deste na Redação Final.

Destarte, a ausência de tratamento específico sobre o legado virtual não implica na inexistência de um centro de interesses a ser tutelado juridicamente. Para tanto, é preciso realizar uma interpretação lógica e extensiva dos direitos sucessórios advindos do CC.

3. Da classificação dos bens digitais de acordo com sua possibilidade de sucessão

Lima (2013, p. 33) explica que a forma de intervenção dos herdeiros no acervo digital do falecido pode ser subdividida em duas modalidades: de bens suscetíveis de apreciação econômica e bens não suscetíveis de valoração econômica. Entretanto, deve-se deixar claro que esta classificação é apenas para fins didáticos, vez que, conforme narra Costa Filho “tal distinção pode se tornar problemática, considerando que bens virtuais de aparente valor exclusivamente afetivo podem um dia se tornar fonte de propriedade intelectual” (2016, p. 209).

A despeito da ausência de legislação sobre o assunto, há compatibilidade do sistema jurídico com o reconhecimento do valor econômico do acervo digital, bem como não há dúvidas de que os ativos digitais de valor econômico devem constar na lista de bens que serão repartidos, sobretudo se forem objeto de testamento (consistindo na categoria de bens suscetíveis economicamente).

Porquanto, de acordo com o CC, se alguém quiser deixar seus bens digitais para uma pessoa em especial, deverá dispor em testamento, registrá-lo em cartório e, preferencialmente, assessorado por advogado a fim de assegurar-se de que o testamento não seja dado por inválido. Contrariamente, se nada for previamente testado, o CC prioriza familiares do falecido para definir os herdeiros.

Quando estes bens digitais estão dispostos em testamento elaborado pelo usuário, não há nenhum óbice em transferi-los aos herdeiros, desde que não estejam dispostos em plataformas, sites, aplicativos, etc. cujo termo de compromisso

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traga cláusula proibitiva de transferência. "Aquilo que não é vedado, a rigor, é permitido. Se você tem uma conta em um site importante para você, e se há permissão dentro do provedor, não há nada que impeça (a inclusão no testamento)", afirma Zeger (apud Bôas, 2012).

De qualquer modo, Blum (2012) afirma que nem mesmo restrições do próprio provedor do serviço à inclusão de uma conta como herança seriam um impedimento definitivo. Neste sentido, Mauro Júnior (2012, p. 24) sugere que, se os herdeiros presumirem haver algo de valor na internet, deve relacionar este bem no inventário e pleitear ao juiz através de liminar de antecipação de tutela, expedindo ofício às empresas responsáveis, para que preservem o conteúdo e posteriormente o tragam aos autos.

Quanto aos bens não suscetíveis, para Bulos (2000, p. 249), assim como para Venosa (2003, p. 249), o conceito de herança e a previsão constitucional de sua proteção baseiam-se justamente na ideia de destaque de tudo aquilo que representa o patrimônio e sua importância. Ou seja, o que não representar conteúdo econômico não é capaz de ser repassado aos herdeiros via causa mortis.

Há que se analisar juridicamente a questão à luz da teoria dos direitos da personalidade, pois o perfil público decorre de uma exteriorização da intimidade do usuário, além do uso de sua imagem, ambos direitos personalíssimos, com todos os atributos que lhe são inerentes (MELLO; VANNUCCI, 2008, p. 02).

Os direitos de personalidade estão previstos na parte geral do Código Civil, especificamente no Capítulo II, do Título I, do Livro I. A morte determina o término da personalidade do indivíduo (arts. 6º e 11 do CC). Deste modo, resta claro que o morto não detém personalidade e, portanto, os direitos a ela inerentes; o que não significa, todavia, que o mesmo não os detinha em vida. Igualmente, não há que se falar em transferência à família dos direitos da personalidade do falecido, por também não se perfazer em titular desse elenco de direitos. Por outro lado, não se pode negar a conservação de alguns atributos da personalidade após a morte e a necessidade de proteção jurídica desse centro de interesses do morto, aos quais a própria legislação civil brasileira atribui à família a sua tutela.

O próprio ordenamento jurídico reforça a continuidade da tutela de interesses atrelados à personalidade após a morte de seu titular, protegendo o que aparenta ser uma continuidade da personalidade do morto (NAVES; SÁ, 2009, p. 74). Nesta toada, as pessoas elencadas pelo art. 12, parágrafo único, do CC são as legitimadas

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a tutelar os direitos da personalidade do morto, sendo que qualquer deles poderá “agir em defesa do nome, da vida privada ou da honra da pessoa falecida” (COELHO, 2010, p. 232-233). Dos direitos personalíssimos existentes, destacam-se, ante o titular que possui atividades na Internet, a privacidade, a honra (ambos previstos no art. art. 5, X da CF) e a imagem (art. 5º, X e XXVIII, CF).

O Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965 de 23 de abril de 2014), estabeleceu sólida base principiológica para lidar com certas indagações provenientes do tema, tendo por foco a privacidade, sobretudo a das comunicações. Importante destacar, neste sentido, os arts. 3º, 6º, 7º, 8º e 10 do referido Codex, pois reiteram a garantia de privacidade de todos os usuários (Cf. BLUM, R. O. O marco civil da internet e a legislação brasileira. Informativo jurídico Consulex. Brasília, Consulex, 1999, v. 25, n. 5, p. 3-4, 31 jan. 2011).

Tendo em vista os artigos supramencionados, em relação aos arquivos insuscetíveis de valoração econômica, Lima (2013, p. 33) aduz que prevalece a vontade do de cujus: se inexistir expressão de vontade, não poderão os herdeiros pleitear a posse dos arquivos pessoais, mas poderão solicitar a retirada de material publicado ostensivamente; mas, existindo declaração de vontade (expressa ou tácita), respeitar-se-á esta manifestação.

O mesmo entendimento é o de Costa filho (2016, p. 194), ao lecionar que “a lei consolida a privacidade dos dados armazenados, fortalecendo a corrente jurisprudencial que não concede aos herdeiros acesso ao acervo digital deixado, no caso de não haver disposição de última vontade do de cujus nesse sentido”. Tal corrente, tendo em vista a garantia constitucional à intimidade e vida privada (art. 5º, X, da CF) e o Marco Civil da Internet, privilegia a inviolabilidade e sigilo das informações em face do direito dos herdeiros (art. 3º, II e III; art. 7º, I, II e III, todos do mesmo codex). Por outro lado, de acordo com Blum, os parentes têm direito às informações e arquivos postados por quem já morreu, mas não há nada que possa ser feito quanto ao destino de uma conta em uma rede social como o Facebook, por exemplo: “O usuário concordou com essa política no momento em que fez a inscrição no site. Então, a empresa não está errada em seguir o que foi previamente determinado” (apud BÔAS, 2012). O referido autor ainda continua sua linha de raciocínio manifestando que, se a pessoa não quer que algo se transmita aos herdeiros, deve tomar medidas para evitar isso, através da redação de um

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testamento, caso contrário, nada impede que uma ordem judicial determine o acesso. Tal colocação está de acordo com o art. 7º, II e III do Marco Civil da Internet.

No mesmo entendimento está o escólio de Costa Filho (2016, p. 208-209), que alega que na ausência de disposição de última vontade do titular da conta, é preciso considerar se o falecido desejaria que seus herdeiros tivessem acesso aos seus dados e conteúdos privados. Se sim, “nesses casos, os herdeiros poderão pleitear judicialmente o acesso ou a transmissão do conteúdo armazenado que poderão ser autorizados por sentença, levando em conta o grau de parentesco”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com resultado verifica-se que a herança digital é compatível com o ordenamento jurídico hodierno pátrio, sendo pautada em princípios constitucionais e já fazendo parte da realidade dos usuários da Internet. A relevância do tema deve-se à falta de doutrina específica, bem como ao fato do mesmo ser ainda uma novidade.

Entrementes, realizando uma interpretação analógica, foi possível realizar duas divisões quanto à transferência dos bens digitais para os herdeiros: na primeira, infere-se que bens armazenados virtualmente suscetíveis de apreciação econômica fazem parte incontroversa da herança, constituindo direito dos herdeiros independentemente de previsão em testamento. Quando não há nada determinado em testamento, o Código Civil prioriza familiares da pessoa que morreu para definir herdeiros. Já a segunda modalidade de bens digitais, insuscetíveis de valoração econômica, dependem, a priori, de manifestação prévia (expressa ou tácita) do de cujus e ordem judicial. Não havendo disposição de última vontade, devido a atual imprevisibilidade jurisprudencial, deve-se analisar a juridicamente a questão à luz da teoria dos direitos da personalidade.

Como estudado, o morto não detém personalidade e, portanto, os direitos a ela inerentes; o que não significa, todavia, que o mesmo não os detinha em vida. Por outro lado, não se pode negar a conservação de alguns atributos da personalidade após a morte e a necessidade de proteção jurídica desse centro de interesses do morto, aos quais a própria legislação civil brasileira atribui à família a sua tutela. Nesta senda, as pessoas elencadas pelo art. 12, parágrafo único, do CC, são as legitimadas a tutelar os direitos da personalidade do morto, sendo que qualquer

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deles poderá agir em defesa do nome, da vida privada ou da honra da pessoa falecida.

Nesta toada, a proteção aos dados dos internautas é garantida e só pode ser quebrada mediante ordem judicial; o Marco Civil da Internet também garante a privacidade das comunicações. Conclui-se, portanto, que se deve privilegiar a privacidade do de cujus, negando-se o acesso dos herdeiros ante a ausência de testamento. Entretanto, esses ainda poderão conseguir, ao menos, a determinação judicial de exclusão do conteúdo armazenado ou postado, dependendo do tipo de serviço. Ressalta-se, ainda, a importância da redação de um testamento, principalmente aqueles que detenham um valioso acervo eletrônico e não queiram que determinados parentes tenham acesso (ou não) aos seus ativos digitais.

Por fim, salienta-se que não há aqui a pretensão de esgotar o assunto, riquíssimo em possibilidades de abordagens críticas. Com efeito, a herança digital é um conceito em construção e reclama acompanhamento pelos operadores do Direito.

REFERÊNCIAS

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BÔAS, R. V. Para quem deixar a herança digital? 31 mar. 2012. Disponível em: <http://www.tribunadabahia.com.br/2012/03/31/para-quem-deixar-a-heranca-digital->. Acesso em: 29 jan. 2017.

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COELHO, F. U. Curso de direito civil: parte geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. COSTA FILHO, M. A. F. Herança digital: valor patrimonial e sucessão de bens armazenados virtualmente. Revista Jurídica da Seção Judiciária de Pernambuco, n. 09, 2016. Disponível em: < https://revista.jfpe.jus.br/index.php/RJSJPE/article/

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MÃE PEDE NA JUSTIÇA QUE FACEBOOK EXCLUA PERFIL DE FILHA MORTA EM MS. Acesso em: <http://g1.globo.com/mato-grosso-do-sul/noticia/2013/04/mae-pede-na-justica-que-facebook-exclua-perfil-de-filha-falecida-em-ms.html>. Acesso em: 13 jan. 2017.

MAURO JÚNIOR, M. R. Inventário Digital: Responsabilidade pela guarda das informações da pessoa falecida e os requisitos para sua divulgação. Comissão de Ciência e Tecnologia da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São

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