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Cooperativismo popular e a influência sobre a população de baixa renda: a partir do estudo de casos no Rio de Janeiro

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA

MONOGRAFIA DE BACHARELADO

COOPERATIVISMO POPULAR E A INFLUÊNCIA

SOBRE A POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA: A partir

do estudo de casos no Rio de Janeiro

Daniel Pereira Santos

matrícula n°.:100125411

ORIENTADORA: Profª. Beatriz Azeredo

SETEMBRO 2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA

MONOGRAFIA DE BACHARELADO

COOPERATIVISMO POPULAR E A INFLUÊNCIA

SOBRE A POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA: A partir

do estudo de casos no Rio de Janeiro

______________________

Daniel Pereira Santos

matrícula n°.:100125411

ORIENTADORA: Profª. Beatriz Azeredo

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2 As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade do autor.

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Dedico este trabalho a meus pais, Edson Lemes dos Santos e Maria Lucia Pereira Santos que sempre me apoiaram e contribuíram para minha formação acadêmica e profissional, e acima de tudo, pessoal, e à minha esposa, meu último romance.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço minha família, pilar de todos os meus valores e caráter, minha esposa Aline Marques Ferreira, pela importância de saber andar lado a lado (“ter fé e ver coragem no amor”), a professora Beatriz Azeredo, que aceitou o desafio de me conduzir nesta etapa final de mais uma jornada em minha carreira, amigos, professores e a todos aqueles que em algum momento de minha vida contribuíram para o meu amadurecimento.

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RESUMO

A intenção deste trabalho final de conclusão de curso é dar atenção análitica à formação do sistema de cooperativas e, com maior ênfase, abordar-se-á o surgimento, nos últimos anos, das cooperativas denominadas populares, como ferramentas de inserção sócio-econômica da população de baixo poder aquisitivo, excluídos ou marginalizados pelo modelo capitalista. E assim, sua tentativa de permanência no mercado de trabalho, através não só de um aprendizado com princípios característicos dos empreendedorismos solidários, mas também pelo ganho de uma remuneração.

De forma mais específica, a monografia tem por objetivo estudar a experiência do movimento cooperativo popular no Brasil, a partir do estudo de caso de duas cooperativas populares localizadas na cidade do Rio de Janeiro, e verificar o impacto positivo deste tipo de iniciativa econômica como forma de geração de trabalho e renda.

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SÍMBOLOS, ABREVIATURAS, SIGLAS E CONVENÇÕES

ACI Aliança Cooperativa Internacional

ANTEAG Associação Nacional de Trabalhadores e Empresas de Autogestão BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

ITCP Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares

COOPE Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas

ICA International Cooperative Alliance TEM Ministério do Trabalho e Emprego OCB Organização das Cooperativas Brasileiras OIT Organização Internacional do Trabalho

PRONINC Programa Nacional de Incubadora de Cooperativas Populares SENAES Secretaria Nacional de Economia Solidária

SIES Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

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ÍNDICE

APRESENTAÇÃO...09

1–INTRODUÇÃOAOMODELOCOOPERATIVISTA...12

1.1–OSURGIMENTO DO PENSAMENTO COOPERATIVISTA ...12

1.2–OS PRINCÍPIOS DO COOPERATIVISMO ...16

1.3–OCOOPERATIVISMO NO MUNDO ...17

1.4–AHISTÓRIA DO COOPERATIVISMO NO BRASIL ...20

2–COOPERATIVISMOPOPULAREAECONOMIASOLIDÁRIA...27

2.1–INTRODUÇÃO ...27

2.2–OCOOPERATIVISMO POPULAR ...28

2.3–AECONOMIA SOLIDÁRIA ...31

2.4–AGENTES DE FOMENTO AO COOPERATIVISMO ...35

3–ESTUDODEDOISCASOSDEEMPREENDIMENTOSSOLIDÁRIOSNORIO DEJANEIRO...37

3.1–A COOPERATIVA COMO UM EMPREENDIMENTO VIÁVEL ECONOMICAMENTE ...37

3.2-A CRIAÇÃO DE UM INDICADOR ...41

3.3–OS INDICADORES ...42

3.4–ESTUDO DE CASO ...44

3.4.1-COOPERATIVA PRAIA VERMELHA ...45

3.4.2–PAPEL PINEL ...48 3.5–CONCLUSÃO ...50 4–COMENTÁRIOS FINAIS ...53 REFERÊNCIASBIBLIOGRÁFICAS...56 ANEXOS...59 ANEXO A:QUESTIONÁRIO ...59 ANEXO B:LEI N°5.764 DE 16 DE DEZEMBRO DE 1971...63

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LISTAGEM DE TABELAS

TABELA 1:COOPERADOS EM NÚMEROS ...17

TABELA 2:COMPOSIÇÃO DO SISTEMA COOPERATIVO BRASILEIRO ...22

TABELA 3:DISTRIBUIÇÃO DAS COOPERATIVAS NO BRASIL COOPERATIVISMO ...23

TABELA 4:DIVISÃO DO EXCEDENTE PRODUTIVO ...47

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APRESENTAÇÃO

O crescimento do desemprego juntamente com as modificações no mercado de trabalho e na própria organização econômica no Brasil e no mundo está desencadeando um forte processo de expansão de novas formas de organização do trabalho e da produção, caracterizado pelo surgimento de um grande número de experiências coletivas de trabalho, voltadas para a (re)inserção econômica e social das camadas populares de baixa renda nos setores formais da economia, do qual excluídas ao longo do processo de reestruturação produtiva.

Dentre essas experiências, podemos citar o cooperativismo, que vêm se constituindo ao longo do tempo como um dos principais mecanismos alternativos de geração de trabalho e renda.

Conforme salienta FERNANDES,

O crescimento do número de cooperados coincide com o aumento do desemprego. Em seu último levantamento, a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) registrou 5,01 milhões de cooperados. A expectativa de quem estuda o fenômeno das cooperativas no Brasil, que segundo a OCB, participam com 7% do PIB (Produto Interno Bruto) do país, é que esses números são maiores, já que muitas operam sem registro na organização ou nas suas filiadas estaduais. A organização prevê que existam atualmente no país perto de 3.840 cooperativas só de trabalho, reunindo cerca de 640 mil cooperados - quase o dobro, portanto, dos 322,7 mil cooperados registrados no setor.1

O pensamento cooperativista surge no início do século XIX como uma proposta baseada nas experiências de ajuda mútua entre trabalhadores que se associavam buscando defender-se dos altos preços cobrados pelos gêneros de primeira necessidade.

A cooperativa existe para promover os interesses sociais dos seus associados – indivíduos unidos por certos laços comuns. E, conquanto possa ser reconhecida como pessoa jurídica e exsitir como sociedade anônima, não tem incentivos nem objetivos econômicos independentes, além do bem-estar dos indivíduos que a compõem.

1 FERNANDES, Fátima. ROLLI, Claudia. Cooperativas disfarçam crise do emprego. Sindicato Mercosul.

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O cooperativismo como parte da Economia Solidária, da qual falaremos mais a frente, configura-se como um sistema de cooperação mais adequado, participativo, democrático e mais justo para atender às necessidades e os interesses específicos dos trabalhadores. O crescimento desses empreendimentos tem sido significativo e vêm chamando a atenção das universidades e dos poderes públicos municipais e estaduais, que passam a apoiá-los, podendo citar iniciativas como as incubadoras tecnológicas de cooperativas populares, que surgem dentro da universidade com o propósito de modificar as relações sociais através da inserção social das camadas excluídas do mercado de trabalho, a partir da formação de cooperativas populares.

O cooperativismo popular é uma releitura da ideologia cooperativista, criada no século XIX, na Europa (...). Tal como o cooperativismo, que surgiu em conseqüência da revolução industrial, seu desenvolvimento ocorre, no Brasil, nos anos 1990, em resposta ao modelo econômico então implantado - terceira revolução. Nesse contexto, buscou-se promover a mobilização e a formação de lideranças para gerar trabalho e renda e possibilitar a transformação da realidade social excludente. 2

O sistema capitalista à medida que se desenvolve, gera cada vez mais modernização tecnológica, aumenta e concentra riqueza ao mesmo tempo em que dissemina a pobreza. Os vitimados por este processo precisam de alguma forma ganhar a vida e reintegrar-se à divisão social do trabalho. Atualmente, os meios encontrados com freqüência pelos trabalhadores apontam para as atividades econômicas informais e/ou associativas e coletivas, que se transformam em empreendimentos solidários e autogestionários que vão competir no mercado com as empresas capitalistas tradicionais. O cooperativismo provê impacto social positivo pois oferece oportunidades de trabalho aos cooperados e o desenvolvimento de suas habilidades, contudo as linhas determinantes da economia popular solidária ainda estão em processo, mas se apresentam como caminhos possíveis.

Esta dissertação tem como objetivo geral a análise do sistema de cooperativas no Brasil, especialmente as denominadas populares, como alternativa para (re)inserção de trabalhadores excluídos ou marginalizados pelo mercado formal de trabalho, e mais especificamente, a partir do estudo de caso de dois empreendimentos localizados na cidade do

2 Portal do Cooperativismo Popular. Disponível em:

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Rio de Janeiro, comprovar a eficácia deste tipo de iniciativa econômica como forma de geração de trabalho e renda.

O primeiro capítulo deste trabalho narra o contexto histórico do cooperativismo, desde a Revolução Industrial aos anos recentes, perfazendo o posicionamento do modelo cooperativista perante o sistema capitalista no mundo, com enfoque na história do modelo no Brasil.

No capítulo dois é estudado o cooperativismo popular (uma nova categoria dentro deste segmento) e sua diferenciação do que podemos considerar como cooperativismo “habitual”. As características desse tipo de cooperativa são explicadas dando um enfoque no conceito de Economia Solidária e seu papel de importância no sistema econômico em que vivemos hoje.

Já no terceiro capitulo, pela elaboração de indicadores como instrumento de mensuração de resultados de pesquisa, estudamos o caso de dois empreendimentos solidários com base no Rio de Janeiro, analisando a sua influência na geração de renda e trabalho. Os valores obtidos são comparados com outras fontes de recursos e analisados sobre o ponto de vista de seus impactos nos trabalhadores.

A última parte deste trabalho, o quarto capítulo, apresenta as considerações finais, conclusivas ou não, das reflexões desenvolvidas. Busca restabelecer as idéias, problemas, questões e situações concretas, captados na experiência dos empreendimentos solidários, promovendo reflexão crítica do processo.

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CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO AO MODELO COOPERATIVISTA

I. 1 – O Surgimento do Pensamento Cooperativista

Com início nas últimas décadas do século XVIII, mais precisamente em 1789 na Inglaterra, a Revolução Industrial “potencializou enormemente a capacidade de geração de riqueza (isto é, de produção de excedente econômico) sob a lógica capitalista de produzir. Não era mais meramente a ampla disseminação do trabalho assalariado, mas a maneira como ele executava suas atividades produtivas que se tornava subsumida à lógica capitalista.” (TAUILE, 2001, p. 83). Este fato trouxe uma nova visão de pensamento da relação capital-trabalho. Se antes, o homem apenas vivia da subsistência, ou seja, a produção de bens para consumo próprio, o advento de novas tecnologias, traz aos detentores do capital a possibilidade de produzir mais capital.

Segundo Karl Marx, fundamental na análise da Revolução Industrial não era o desenvolvimento de tecnologias, como a máquina à vapor que dispensava ou potencializava a exploração da força humana, mas sim de uma ferramenta que torna real a transferência do conhecimento dos processos de trabalho das mãos dos trabalhadores para bens imóveis, a entrega do conhecimento produtivo (trabalho) ao detentor da produção (capital).

Essa alteração crucial quer a localizemos na mudança de uma ferramenta da mão humana para um mecanismo, ou mesmo na adaptação da maquinária a uma nova fonte de energia, transformou radicalmente o processo de produção. Ela não só tornou necessário que os trabalhadores se concentrassem em um só lugar de trabalho (a fábrica), mas impôs ao processo de produção um caráter coletivo e padronizado. O trabalhador que antes era um indivíduo de caracteres únicos e com vontade própria tornava-se apenas um mero negociante de sua força humana em troca de dinheiro para seu sustento e de sua família. Segundo Tauile, “cada vez mais era preciso que o indvíduo fosse assalariado e estivesse sob as condições de

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trabalho que se modernizavam com a revolução industrial, para ser incluído no circuito econômico e para atingir sua sociabilidade como cidadão” (Ibid)

Tais condições, descritas acima, só foram possíveis pelo enorme contingente populacional que tomou conta dos centros urbanos, principalmente, pelo cercamento dos campos3 provocando inicialmente um intenso deslocamento da população rural para as cidades; a população de Londres cresceu de 800.000 habitantes em 1780 para mais de cinco milhões em 1880, um aumento de 625% em dez anos. O êxodo rural foi, também, grande responsável por aquilo que Marx denominou como exército industrial de reserva4, indispensável à classe capitalista, que pode ser usado e dispensado à vontade, tendo de estar disponíveis para serem exploradas, sem prejudicar a escala de produção. Uma população de trabalhadores excedente é condição necessária para a acumulação e o desenvolvimento da riqueza capitalista, pois com o aumento da produtividade do trabalho cresce a força do capital, assim como a massa de riqueza impulsionando novos ramos de produção

A extrema exploração do capitalista sobre a mão-de-obra, que incluia extensas horas de trabalho em situações precárias, além do uso de trabalhos feminino e infantil, engendrou aos trabalhadores um espírito de revolta. Em muitas regiões da Europa, os trabalhadores se organizaram para lutar por melhores condições de trabalho. Os empregados das fábricas formaram as trade unions (espécie de sindicatos) com o objetivo de melhorar as suas condições de trabalho. Houve também movimentos mais violentos como, por exemplo, o ludismo (conhecidos como "quebradores de máquinas"), onde se invadiam fábricas e destruíam seus equipamentos numa forma de protesto e revolta com relação à vida dos empregados.

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A burguesia passa a investir também no campo e cria os cercamentos (grandes propriedades rurais). Novos métodos agrícolas permitem o aumento da produtividade e racionalização do trabalho. Assim, muitos camponeses deixam de ter trabalho no campo ou são expulsos de suas terras e buscam trabalho nas cidades e são incorporados pela indústria nascente.

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Segundo Canuto (2003), o exército industrial de reserva “é a força de trabalho que estará disponível para ser explorada de acordo com as necessidades variáveis da expansão do capital. [...] A existência desse exército industrial de reserva está incorporado de tal forma no sistema capitalista que, a sua maior ou menor absorção é parte da mão de obra da burguesia nos variáveis ciclos da indústria, nas fases de pouca ou muita produção. Marx deixa claro que esse fenômeno é exclusivo daquela época, com a produção industrial num ritmo acelerado de desenvolvimento, com produção em larga escala”.

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Em 21 de dezembro de 1844 no bairro de Rochdale, em Manchester (Inglaterra), 27 tecelões e uma tecelã fundaram a "Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale" com o resultado da economia mensal de uma libra de cada participante durante um ano.

Tendo o homem como principal finalidade - e não o lucro, os tecelões de Rochdale buscavam naquele momento uma alternativa econômica para atuarem no mercado, frente ao capitalismo ganancioso que os submetiam a preços abusivos, exploração da jornada de trabalho de mulheres e crianças (com duração de até 16 horas por dia) e do desemprego crescente advindo da revolução industrial. Tal iniciativa foi motivo de deboche por parte dos comerciantes, mas logo no primeiro ano de funcionamento o capital da sociedade aumentou para 180 libras e cerca de dez anos mais tarde o "Armazém de Rochdale" já contava com 1.400 cooperantes. O sucesso dessa iniciativa passou a ser um exemplo para outros grupos.

A experiência foi primeiramente difundida na Europa, com a formação de cooperativas de agricultura (França) e de crédito (Alemanha e Itália), e seguiu para o resto do mundo. No ano de 1881, já existiam 1.000 cooperativas que totalizavam 550 mil associados.

O cooperativismo evoluiu e conquistou um espaço próprio, definido por uma nova forma de pensar o homem, o trabalho e o desenvolvimento social.

Dentre as várias definições dadas ao termo cooperativa, merece destaque a definição apresentada pela Aliança Cooperativa Internacional (ACI)5, em congresso de comemoração de seu centenário realizado no ano de 1995:

Cooperativa é uma associação autônoma de pessoas unidas voluntariamente, para atender suas necessidades e aspirações econômicas, sociais e culturais comuns, por meio de uma empresa de propriedade coletiva e democraticamente gerida. (ACI apud SCHMIDT & PERIUS, 2003, p.63)

Além da definição de cooperativa, foram também expressos pela instituição os valores nos quais a doutrina está fundamentada:

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Instituição criada em 1895 em Londres, atualmente com sede em Genebra, a ACI é o órgão de representação das cooperativas do mundo inteiro. Tem como principais objetivos: a) influir cooperativamente sobre as políticas governamentais e legislações nacionais; b) ajudar o desenvolvimento institucional das cooperativas em nível nacional; c) concentrar-se no desenvolvimento dos recursos humanos, em nível nacional e regional; d) mobilizar recursos, estimular agências de desenvolvimento para suporte das cooperativas e coordenar movimentos de assistência às cooperativas.” (PINHO, 2004, p. 69).

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15 As cooperativas estão baseadas nos valores de auto-ajuda, responsabilidade própria, democracia, igualdade, equidade e solidariedade. Com base na tradição de seus fundadores [os Pioneiros de Rochdale], os membros da cooperativa acreditam nos valores éticos de honestidade, sinceridade, responsabilidade social e preocupação com os outros. (Ibid.)

Na sua essência, a dimensão econômica do cooperativismo deve ser desenvolvida tomando-se como base o trabalho e a ajuda mútua, não apenas o lucro, a competitividade e a concorrência, como ocorre numa empresa capitalista. Tampouco deve permitir o acúmulo de capital de poucos através da exploração do trabalho da grande maioria. Além disso, o cooperativismo deve promover mecanismos que permitam o acesso do grupo à educação, proporcionando também o desenvolvimento social do associado. Em resumo, a cooperativa pode ser um meio de sobrevivência capaz de integrar plenamente o bem estar social e econômico, bem como uma forma alternativa de pensar a relação do homem com o próximo e com o trabalho. Possivelmente, esse é um dos motivos pelo qual o cooperativismo encontra-se disseminado pelo mundo, atuando em diversos setores econômicos e sociais.

A cooperativa existe para promover os interesses sociais dos seus associados – indivíduos unidos por certos laços comuns. E, conquanto possa ser reconhecida como pessoa jurídica e existir como sociedade anônima, não tem incentivos nem objetivos econômicos independentes, além do bem-estar dos indivíduos que a compõem.

Compreensivelmente, os economistas têm dificuldade em identificar o fundamento lógico de uma empresa que não procure necessariamente “maximizar os lucros”, conforme é de presumir que o devam fazer todas as entidades econômicas. Como definido por Paul Singer, “a ciência econômica é uma generalização, no caso correta, de que todas as empresas capitalistas têm o mesmo objetivo. Qual é? Maximizar, tomar máximo, a maior possível, a taxa anual de retorno. Este é o modelo capitalista” (SINGER, 2002). Numa economia de concorrência, as cooperativas, independentemente do setor em que atuam, operam competitivamente no mesmo mercado das empresas capitalistas.

Em um sistema acionado pela motivação do lucro, as cooperativas movimentam milhões em seus negócios em todo o mundo, sob a administração de voluntários não-pagos. E, ao dizer “não-pagos”, faz-se uma contraposição ao tradicional modelo capitalista onde o trabalhador recebe um salário ao final do mês, por força de um contrato e uma legislação de

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trabalho, enquanto cooperados recebem uma remuneração, igualmente dividida entre os associados, advinda da renda gerada exclusivamente pelo seu trabalho.

I.2 – Os princípios do cooperativismo

Após a apresentação de algumas definições para o termo cooperativa e uma formulação sobre sua formação, destacamos brevemente nesta seção uma série de alinhamentos gerais que regem o funcionamento de qualquer modelo cooperativista por natureza.

Conforme apresentado na primeira seção deste capítulo, a origem dos princípios do cooperativismo vigentes nos dias atuais tiveram sua essência baseada nos Pioneiros de Rochdale. Atualmente, a ACI é a instituição responsável pela regulamentação dos princípios universais que devem nortear a construção de um empreendimento cooperativista. No ano de 1995, essa instituição os submeteu a uma reformulação e aperfeiçoamento, de forma que os válidos são descritos a seguir:

Princípio de adesão voluntária e livre – as cooperativas são organizações voluntárias, abertas a todas as pessoas aptas a usar seus serviços e dispostas a aceitas as responsabilidades de sócio, sem discriminação social racial, política, religiosa e de gênero

Princípio de controle democrático pelos membros – as cooperativas são organizações democráticas, controladas por seus sócios que participam ativamente no estabelecimento de suas políticas e na tomada de decisões. Homens e mulheres, eleitos como representantes, são responsáveis para com os sócios. Nas cooperativas singulares, os sócios têm igualdade na votação (um sócio, um voto); as cooperativas de outros graus são também organizadas de maneira democrática;

Princípio da participação econômica dos membros – os sócios contribuem de forma equitativa e controlam democraticamente o capital de suas cooperativas. Usualmente, os sócios recebem juros limitados (se houver algum) sobre o capital, como condição de sociedade. Os sócios destinam as sobras aos seguintes propósitos: desenvolvimento das cooperativas, possibilitando a formação de reservas, parte dessas podendo ser indivisíveis; retorno aos sócios na proporção de suas transações com as cooperativas e apoio a outras atividades que forem aprovadas pelos sócios;

Princípio de autonomia e independência – as cooperativas são organizações autônomas de ajuda mútua controladas por seus membros. Entrando em acordo

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operacional com outras entidades, inclusive governamentais, ou recebendo capital de origem externa, devem fazê-lo de forma a preservar seu controle democrático pelos sócios e manter a sua autonomia;

Princípio da educação, formação e informação – as cooperativas proporcionam educação e formação aos seus membros, dirigentes eleitos e administradores, de modo a contribuir efetivamente para o seu desenvolvimento. Eles deverão informar o público em geral, particularmente os jovens e os líderes formadores de opinião, sobre a natureza e os benefícios da cooperação;

Princípio da cooperação entre cooperativas – as cooperativas atendem a seus membros mais efetivamente e fortalecem o movimento cooperativo trabalhando juntas, através de estruturas locais, nacionais, regionais e internacionais;

Princípio da preocupação com a comunidade – as cooperativas trabalham pelo desenvolvimento sustentável de suas comunidades, municípios, regiões, estados e país através de políticas aprovadas por seus membros.

Ao final desta seção, como uma síntese dos pontos explicitados acima, podemos ressaltar que o cooperativismo tem como objetivo maior a promoção do bem-estar dos cooperados, bem como de toda a comunidade onde estiver inserido.

I.3 – O cooperativismo no mundo

Desde o seu surgimento as cooperativas vêm se expandindo e ganhando força no que tange às alternativas encontradas dentro do sistema capitalista vigente para o desenvolvimento econômico e social dos indivíduos.

Veiga (2001, p.26) afirma que aproximadamente 1/6 da população mundial encontra-se inencontra-serida em alguma forma de empreendimento cooperativo, o que coloca este sistema a frente de outros como maior fomentador sócio-econômico mundial, utilizando-se de alguns exemplos do desenvolvimento cooperativismo no mundo.

Tabela 1

Cooperados em número

Continente Países Cooperados (em milhões)

América do Norte 2 162

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Europa 41 140

África 16 14

América Latina 16 10

Fonte: ICA, 2005.

Pode-se citar como o maior exemplo do êxito do cooperativismo o Complexo de Mondragón, na Espanha, que surgiu nos anos 60 (resultante do processo falimentar de uma empresa de fogões) com a formação de uma rede de cooperativas, naquele momento de produção, mas que atualmente incluem outros tipos, como o setor de autopeças e construções em aço. Este complexo configura-se como um dos principais produtores de eletrodomésticos do país, com participação no mercado de 25%, contando com filiais inclusive fora da Europa, com mais de 60 mil pessoas, 208 atividades industriais e banco próprio.

Outra experiência recente demonstra o potencial do cooperativismo como fomentador de ferramentas para inclusão socioeconômica. Em Bangladesh, o professor Mohamed Yunnus com seus alunos fundaram o Grameen Bank. O banco concede microcrédito a grupo de mulheres de aldeias mais pobres e a concessão traz uma conotação coletiva a partir do aval solidário, ou seja, o dinheiro é destinado a uma delas, servindo as demais de avalistas.

A “International Cooperative Alliance” faz uma estimativa de 750 mil cooperativas classificadas em quatro modalidades, contando 800 milhões de cooperados, (ICA,2005).

A cooperativa de produção é a mais difundida por ser o modelo mais antigo e incorporado no ramo de trabalho. Segundo Singer (2003), esta modalidade é protótipo de organização solidária, devido à posse coletiva dos meios de produção e repartição da receitas e sobra entre cooperados. Esta modalidade é presente em vários países, principalmente os periféricos, tendo subsídios das autoridades governamentais para um melhor desenvolvimento da economia, através, claro, de uma renda, mas também da inserção no mercado de trabalho.

O setor agrícola concentra o maior número de cooperativas, agrupando 540 mil cooperativas com 410 milhões de trabalhadores, sendo que 83% dos associados são asiáticos, sobretudo da China, onde a adesão às cooperativas se tornou obrigatório por parte do poder público que as consideravam mais como instrumentos de política pública do que como organizações democráticas.

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A cooperativa de consumo se relaciona ao setor de distribuição e se constitui para o provimento de bens e serviços em condições de preço e qualidade melhores que a iniciativa privada. Na Finlândia, 35% das entidades pertenciam a este segmento contando 14 milhões de associados (VEIGA & FONSECA, 2002, p.20). Contudo, o surgimento dos varejos nos anos de 1960 provocou o desaparecimento de inúmeras cooperativas.

A cooperativa de comercialização é formada por pequenos e médios produtores (agricultores, taxistas, comerciantes ou profissionais liberais, etc.) que visam obter ganhos de escala, unificando suas compras ou vendas. Nesta modalidade, novamente, predomina a cooperativa agrícola, pois pequenos agricultores que não conseguem investir em tecnologias para competir no mercado, se agrupam em vista a mecanizar a sua lavoura, e tornaram-se mais competitivos. Nos países europeus, os agricultores consideravam este segmento como indústria de processamento dos produtos. No final dos anos 90, existiam 58 mil cooperativas agrícolas com 13,8 milhões de membros (SINGER, 2002, p.86).

A cooperativa de crédito destinada a financiar as necessidades dos associados foi idealizada por alemães para se restabelecer da crise ocorrida em 1846, na época em que os camponeses perderam as safras de cereais e passaram por um inverno rígido. As cooperativas de crédito se difundiram em países como Alemanha, que tem a maior concentração de cooperativas deste segmento na Europa. Esta possui mais de 2.589 empreendimentos com um total de 13,4 milhões de cooperados. Na Alemanha, 25% do sistema financeiro como um todo é formado de um sistema bancário organizado em cooperativa, o complexo DG-Bank e Volksbank.

Na Irlanda, estas cooperativas chegam a quase 500, com 1,6 milhões de membros. Na França, 50% dos empreendimentos cooperativos são desta modalidade, entretanto as atividades são restringidas pelas leis bancárias européias, o que estimulou as parcerias entre cooperativas para poder se manter no mercado e suscitar empréstimos às populações de média e baixa renda (BIRSHALL, 1997, apud SINGER, 2002, p.70).

A OIT (Organização Internacional do Trabalho) em publicação sobre “Cooperativas: Mudanças, Oportunidades e Desafios” de 2001 coloca que no Uruguai, 90% do leite que é destinado ao consumo nacional, e 70% do que é exportado, são produzidos por cooperativas.

Já na Alemanha, 502.700 pessoas em 1996 estavam desenvolvendo atividade profissional em cooperativas. No Japão, em 1997, esse número chegava a 508.000, sendo a

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jornada de trabalho integral. No caso da jornada parcial, o país contava com 95.000 pessoas “empregadas”.

E é claro que no Brasil esse movimento também possui a sua devida importância. A mesma publicação coloca que, em nosso país, “a Organização de Cooperativas do Brasil” (OCB) “engloba mais de 296.000 empregos” e termina citando o exemplo da cooperativa de saúde UNIMED, que “emprega cerca de 148.000 pessoas”.6

Porém, cabe perguntar, como o movimento cooperativo teve seu início no país e quais foram os desdobramentos que acarretou?

Para responder a essa questão, discorrer-se-á no próximo ponto sobre o surgimento do cooperativismo no Brasil.

I.4 – A história do cooperativismo no Brasil

No Brasil, as primeiras cooperativas de consumo surgiram nos grandes centros urbanos em fins do século XIX, a partir do decreto da Lei Áurea, da crise estrutural do fim do Império e da promulgação da Constituição Republicana de 1891. Já as cooperativas rurais apareceram em 1902, como conseqüência do trabalho realizado pelos jesuítas no Rio Grande do Sul, gerando a expansão mais tarde, para outros Estados. Nota-se, porém, uma relação entre tais cooperativas e a cultura trazida pelos imigrantes europeus, que eram influenciados pelos Pioneiros de Rochdale.

O crescimento das cooperativas brasileiras se processa a partir da década de 1930, quando ocorre o aparecimento de cooperativas de produção, crédito e consumo em vários setores da economia. Até aquele momento,

“o governo reconhecia a utilidade das cooperativas, mas não a sua forma jurídica distinta de outras entidades. A Revolução de 30 criou condições para que o cooperativismo fosse reconhecido como uma necessidade nacional” (VEIGA, 2001, p.28).

A motivação para esse florescimento baseou-se em dois pontos principais. O primeiro está ligado ao fato do poder público naquele momento identificar o cooperativismo como uma forma de reestruturar as atividades agrícolas, e por isso, estimular esse tipo de iniciativa.

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O outro ponto fundamental foi a promulgação da lei básica do cooperativismo, que contribuiu para a definição das singularidades do movimento cooperativo em contraponto às demais formas associativas. Getúlio Vargas, então presidente, foi o responsável pela promulgação, em 1932, da primeira lei brasileira sobre o cooperativismo (Decreto 22.239/32) que tratava da organização e funcionamento das cooperativas.

Segundo Veiga (2003, p.29), em 1945, com a situação de fome gerada pela II Guerra Mundial, o comércio internacional se restabeleceu, propiciando um desenvolvimento ainda maior das cooperativas agrícolas, através de vários incentivos fiscais. Em 1951, foi criado o Banco Nacional de Créditos para cooperativas, que acabou extinto pelo governo Collor.

Ainda segundo a autora, com o golpe militar de 1964, vários direitos conquistados pelo movimento foram retirados, e a cobrança de ICMS, antes extinta, voltou a acontecer. Dois anos depois, mais incetivos fiscais foram negados, e ocorreu a reforma bancária, culminando no fechamento de um grande número de cooperativas, em sua maioria, de crédito.

A história das cooperativas no Brasil é caracterizada por sucessivas crises, que por muitas vezes, se não causaram o encerramento de suas atividades, pelo menos colocaram-nas em grandes dificuldades. Uma delas se deu pelo surgimento, na década de 1960, das grandes lojas de varejo, afetando as cooperativas de consumo. Ainda nesse período, as cooperativas sofreram também com o advento do regime militar que além de conferir maiores controles sobre elas, institui a reforma bancária, com novas normas políticas e financeiras. Este evento eliminou quase que em sua totalidade as cooperativas de crédito, já que impôs o fim de incentivos fiscais dos quais tais cooperativas usufruíam.

Em 1971 foi decretada a lei 5.764 que até hoje regulamenta o cooperativismo no Brasil, e “instituiu o regime jurídico das cooperativas. São sociedades de pessoas de natureza civil, com forma jurídica própria, não sujeitas à falência, constituídas para prestar serviços aos associados.” 7

O movimento cooperativista no país se encontra atualmente em intensa expansão, o que pode ser corroborado observando o crescente número de cooperativas que vêm surgindo a cada dia. Além disso, pode-se constatar tal fenômeno através da intensa participação de diferentes organismos governamentais ou da sociedade civil organizada que fomentam esse tipo de iniciativa, contribuindo de diversas formas, seja oferecendo capacitação e treinamento,

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crédito, ou através de ações que visam o desenvolvimento das cooperativas. Destaca-se, nesse contexto, a criação pelo governo, no ano de 2003, da Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que tem como proposta promover a articulação das iniciativas da economia solidária no âmbito nacional.

Tabela 2

Composição do Sistema Cooperativo Brasileiro Dezembro/2009

Ramo Cooperativas Cooperados Empregados

Agropecuário 1.615 942.147 138.829 Consumo 128 2.304.830 9.702 Crédito 1.100 3.497.735 42.802 Educacional 304 55.838 3.716 Especial 15 469 9 Habitacional 253 108.695 1.406 Infra-estrutura 154 715.800 6.045 Mineral 58 20.031 103 Produção 226 11.396 2.936 Saúde 871 225.980 55.709 Trabalho 1.408 260.891 4.243 Transporte 1.100 107.109 8.660 Turismo e lazer 29 1.489 30 Total 7.261 8.252.410 274.190

Fonte: Núcleo de Banco de Dados da OCB

Segundo dados da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), divulgados em dezembro de 2009, o cooperativismo no país é hoje uma importante força econômica nacional, composto por 7.261 cooperativas dos diversos ramos, com 8,252 milhões de cooperados, gerando de forma direta, cerca de 274 mil empregos. As cooperativas são responsáveis por um volume de transações econômicas equivalente a 7% PIB (Produto Interno Bruto).

É interessante notar que, apesar de as cooperativas de trabalho existirem em maior número, as do ramo de crédito agregam maior número de cooperados – 3.497.735 de um total de 8.252.410. Também com um grande número de cooperados estão as cooperativas do ramo de consumo, com 2.304.830 membros. Estes dois ramos representam 42,4% e 27,9%, respectivamente, sobre o total de cooperativas em todo o território nacional.

Por outro lado, quando observamos os dados referentes às cooperativas de produção, as quais Singer (2002) considera serem as autênticas “empresas solidárias”, verifica-se que elas apresentam números que podem ser considerados inexpressivos, em face de sua

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importância para a economia solidária. A quantidade irrisória de 226 empreendimentos no Brasil, ou 3,1% sobre o total, mostra a necessidade de maiores avanços. É importante lembrar que nesse ramo de cooperativas se enquadram as empresas falidas que foram assumidas pelos seus empregados. Podemos citar como exemplo, a Cooperativa Mineira de Equipamentos Ferroviários (Coomefer), em Conselheiro Lafayette (MG), assumida pelos trabalhadores no sistema de autogestão e que fatura mais de R$15 milhões anualmente8.

Quando se passa a observar a distribuição das cooperativas entre os Estados da federação (Tabela 3), percebe-se que o estado de São Paulo se destaca em relação aos demais quanto ao número expressivo de cooperativas (905) e o número de cooperados e empregados, num somatório total de 2.881.328.

Tabela 3

Distribuição das Cooperativas no Brasil – Dezembro/2009

Estados Cooperativas Cooperados Empregados

Acre 48 7.385 195 Alagoas 98 19.986 3.341 Amazonas 165 12.047 1.485 Amapá 47 4.622 450 Bahia 820 73.220 2.668 Ceará 154 67.243 5.582 Distrito Federal 154 142.180 1.774 Espírito Santo 143 147.127 5.641 Goiás 225 82.020 6.043 Maranhão 244 12.636 676 Minas Gerais 789 902.749 26.239 Mato Grosso 159 183.957 6.139

Mato Grosso do Sul 105 77.752 3.322

Pará 264 45.566 1.669 Paraíba 115 45.768 2.581 Pernambuco 199 105.268 3.126 Piauí 75 15.243 686 Paraná 238 513.771 55.367

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Rio de Janeiro 815 268.235 8.222

Rio Grande do Norte 124 58.169 1.297

Rio Grande do Sul 799 1.738.510 45.874

Rondônia 124 24.208 1.182 Roraima 58 3.533 348 Santa Catarina 257 858.671 29.924 Sergipe 60 10.913 585 São Paulo 905 2.822.202 59.126 Tocantins 77 9.420 648 Total 7.261 8.252.410 274.190

Fonte: Núcleo de Banco de Dados da OCB

Se considerarmos que a maior parte da população do país encontra-se na região Sudeste (42,33% de acordo com o último censo do IBGE) é compreensível o fato das cooperativas estarem localizadas predominantemente em seus estados, principalmente, em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Secundariamente a estes, apresentam bastante relevância os estados da região Sul, com Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina. É preocupante, no entanto, a pouca participação dos estados da região Norte e Nordeste, justo onde estão registrados os maiores índices de pobreza.

Devemos, no entanto, ter cautela com o uso dos dados apresentados nesta seção (tabelas 2 e 3), por duas principais razões. Primeiramente, porque tais informações são baseadas no banco de dados da OCB, organização que tem a sua legitimidade para representar o movimento cooperativista brasileiro questionada por movimentos sociais, por políticos, por cooperados e diversas instituições ligadas ao setor (PINHO, 2004, p.39). Sendo assim, muitos empreendimentos de natureza cooperativa certamente não foram contemplados por não possuírem vínculo com a organização. Além disso, existem diversos empreendimentos de pequeno porte que, embora possuam condições potenciais de virem a se tornar cooperativa, do ponto de vista legal, ainda não regularizaram sua situação, não sendo também contempladas na pesquisa da OCB.

A segunda razão a ser considerada, é o fato dos dados serem quantitativos, o que pode nos levar a certas distorções na análise das informações. Mais importante do que saber que o estado de São Paulo possui o maior número de cooperativas, por exemplo, seria conseguimos definir que tipos de cooperativas são essas, no que se refere ao cumprimento da doutrina a

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respeito dos valores e princípios do cooperativismo. Da mesma forma, que o fato do estado de São Paulo possuir o maior número de cooperados (cerca de 34% do total no país), não significa que este seja mais solidário que outros, pois não é possível afirmar a quais ramos estariam vinculados (crédito, consumo, produção ou outro qualquer).

Por isso, a afirmativa feita por Santana (2001, p.43) de que “o cooperativismo brasileiro em 2000 (...) [foi] responsável por transações econômicas equivalentes a 6% do PIB (...)” deve ser relativizada. Devemos antes de tudo, saber a que ramo do cooperativismo se deve esse sucesso econômico, ou ainda se esse suposto bom desempenho está se convertendo em benefícios aos seus membros associados e à comunidade. Do contrário, esses dados podem estar mascarando uma fraude, onde empresas interessadas apenas no capital se passam por cooperativas apenas para obter benefícios como exploração de mão-de-obra ou subsídios fiscais.

Por isso, o “cooperativismo autêntico”, aquele norteado pelos princípios cooperativistas não se encontra hegemônico, uma vez que surgem cada vez mais cooperativas que funcionam na verdade nos moldes das empresas capitalistas, contribuindo para a permanência do processo de acumulação de capital.

O cooperativismo, como um todo, apresenta diversas ramificações dentro do próprio movimento, a exemplo das “coopergatos”

que se caracterizam por burlar a legislação vigente e servirem para pessoas inescrupulosas explorarem o trabalhador, precarizando a situação de trabalho e eliminando os direitos trabalhistas conquistados , sem oferecer um instrumental de remuneração equivalente a estes direitos e sem equalizarem os lucros obtidos entre direção e associados, tornando-se este tipo distorcido de cooperativismo vantajoso apenas para quem detém o poder nessas falsas cooperativas”. 9

Hoje o cooperativismo no Brasil passa por um grande desenvolvimento. De um lado, há o que podemos chamar de cooperativismo oficial, ligado à agências governamentais e de iniciativas de grande e médio porte, que não respeitam os direitos e princípios do modelo cooperativista, em suma, agem como empresas capitalistas se apoiando no sistema como forma de reduzir gastos e auferir maiores retornos na exploração, de alguma forma, da

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de-obra. Uma cooperativa considerada pura nos seus princípios não visa o lucro, é gerida por todos e somente aqueles que a compõem e não por um patrão, ou seja, autogestionária; todas as decisões são tomadas de forma democrática uma vez que todos são donos daquele empreendimento; não existe, portanto, carteira de trabalho assinada, todos são profissionais autônomos.

Posto isso, veremos adiante o surgimento de uma nova modalidade de cooperativismo, dentro de seu próprio modelo, com fins de destacar a participação popular, principalmente daqueles à margem da sociedade econômica, e o impacto do princípio da preocupação com a comunidade e o bem-estar social advindo disto.

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CAPÍTULO II – COOPERATIVISMO POPULAR E A ECONOMIA SOLIDÁRIA

II.1 - Introdução

O atual contexto das grandes tendências mundiais em referência à globalização, aos progressos na área de tecnologia da informação e emergência da sociedade civil organizada, levou à concepção de um novo papel do Estado. De mero produtor de bens e serviços para indutor e regulador do desenvolvimento, a reforma do Estado é orientada para o mercado, exigindo o abandono de instrumentos de controle político (como a descentralização de setores, mesmo estratégicos como o de comunicação, através da privatização) e o fortalecimento de ações de natureza privada.

A preocupação em melhorar o desempenho econômico permitiu nos últimos anos que os governos se alinhassem em um esforço de abertura econômica e de incremento do comércio internacional. Nesse âmbito, as condições de concorrência se intensificaram na economia, gerando eficiência que se reflete em benefícios diretos aos consumidores, mas de outro, produz como conseqüência o fechamento de empresas e o desemprego em massa, deteriorando as condições sociais.

O crescimento dos problemas sociais que gerou o paradigma da exclusão social de hoje no Brasil, vem exigindo de todos os atores políticos e sociais uma nova atitude. Uma atitude de mudança, inovadora em sua natureza e essência, voltada para o desenvolvimento sustentável das comunidades em geral e, sobretudo, das comunidades de baixa renda.

Tais mudanças representam um novo paradigma da economia, “é aquele que segue o caminho da cooperatividade em vez da competitividade, da eficiência sistêmica em vez de eficiência apenas individual, do ‘um por todos, todos por um’ em vez do ‘cada um por si e Deus só por mim’”.10

10 Singer, P. & Souza, A.R. (org.). “A Economia Solidária no Brasil: a Autogestão como Resposta ao

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Em uma apresentação de uma nova dinâmica socioeconômica, “empreendedores sociais são atores relevantes deste modelo. Como fruto de suas ações (...), surgem as mudanças necessárias. Isto é um avanço, operando no sentido contrário ao do modelo anterior, que centrava as ações de mudança no governo e nas empresas.”11

No empreendedorismo convencional são claros os desafios a serem enfrentados ao iniciar o seu negócio: a competitividade, a busca por diferenciais competitivos, ultrapassar a concorrência, conquistar e fidelizar clientes, e acima de tudo, ou em conseqüência disso, maximizar sua lucratividade.

No que podemos considerar como empreendedorismo social, os desafios se mostram diferentes, até por conta de ter outro tipo de natureza como base. São decorrentes de condicionamentos sociais, econômicos, políticos, e também, culturais e ambientais. Este tipo de empreendimento tem na comunidade o seu cerne principal de atuação, diferentemente do empreendedorismo convencional, cujo eixo principal é o mercado, mostrando-se um caminho de mão dupla, um processo de ganha-ganha, onde a comunidade é ao mesmo tempo protagonista e beneficiária direta de suas ações, em especial as comunidades menos privilegiadas.

Neste sentido, podemos considerar que a cooperação, enquanto forma de integração social, na qual as pessoas se unem para alcançar um objetivo comum, é uma boa estratégia para legitimar social e legalmente aqueles que estão à margem da sociedade.

II.2 – O cooperativismo popular

Observou-se, no século XIX, o surgimento de uma nova “categoria” de cooperativismo, face à insustentável escassez de emprego. Este novo tipo de cooperativa é caracterizado por contemplar grupos de baixa renda, desempregados ou inseridos em atividades profissionais precarizadas, os quais se encontram à margem do sistema econômico de maior atuação em determinada região.

A inclusão de uma nova categoria, por assim dizer, com caras e olhos voltados para uma visão social mostra-se, neste ponto, necessária uma vez que conforme supra mencionado,

11 MELO NETO, Francisco de Paulo de & FROES, César. Empreendedorismo social: a transição para a

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o público envolvido no neste tipo de cooperativa apresenta certas particularidades, que serão relatadas ao longo desta seção.

Conforme definição de Sandra Mayrink Veiga (2003), o cooperativismo popular se caracteriza pelo seu aspecto primário de autogestão, pela busca da melhoria da qualidade de vida dos cooperados bem como da comunidade em que estão inseridos, e ainda por visar os desempregados, os excluídos, porém articulada ao desenvolvimento regional sustentado e que tenha um propósito perante a sociedade.

O cooperativismo popular surge no Brasil na década de 1990 buscando, através do trabalho dos desempregados, daqueles trabalhadores precarizados, que se submetem a péssimas condições de trabalho e não tem seus direitos social assegurados, formando um cooperativismo articulado em redes, que seja como já citado, autogestionário, auto-sustentável e mais do que isso, integrado ao desenvolvimento local e regional.

O cooperativismo popular, como uma ferramenta na organização social e produtiva de comunidades de menor poder aquisitivo, apresenta-se como alternativa de sobrevivência e emancipação econômica e social dos trabalhadores (sem renda ou de baixa remuneração) por desvincular-se de intermediários e apropriar-se de maior parcela de valor gerado pelo seu próprio trabalho.

No sentido de buscar uma definição mais apurada do que seria cooperativismo popular e seu diferencial perante o cooperativismo “habitual”, podemos citar a Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP/COOPE/UFRJ)12, projeto de extensão universitária da Universidade Federal do Rio de Janeiro pioneiro no processo de incubação de cooperativas no Brasil, que apresenta algumas diretrizes políticas que devem ser seguidas pelos empreendimentos sociais para que sejam considerados de fato, populares13.

a. Quanto à origem – deve ser composta por membros oriundos de baixa renda, desempregados, ou em situação precária de trabalho, os quais se reúnem para exercer atividades profissionais de um mesmo ramo;

12

A Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP) é um programa de extensão universitária do COPPE da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Há 12 anos, a ITCP foi concebida como um centro de tecnologia que tornaria disponíveis os conhecimentos e os recursos acumulados na universidade pública para gerar, por meio do suporte à formação e desenvolvimento (incubação) de empreendimentos solidários autogestionários, alternativas de trabalho, renda e cidadania para indivíduos e grupos em situação de vulnerabilidade social e econômica.

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b. Quanto à constituição do capital – considera-se como principal capital do cooperativado, senão o único, a sua força de trabalho. A cota parte, que deve ser estabelecida em função dos custos necessários de legalização do empreendimento, é igual para todos os membros;

c. Quanto à gestão democrática – as decisões estratégicas partem da consulta aos membros mediante a atuação de uma assembléia. Deve haver rotatividade nos cargos de diretoria, mediante eleição democrática. Há atuação de conselhos de ética e fiscal;

d. Quanto à distribuição de renda – a relação entre a maior e a menor remuneração não deve ser superior a três vezes e deve incidir sobre o trabalho. A divisão das sobras e a remuneração de todos os cooperados devem ser de forma igualitária;

e. Quanto à divisão de tarefas – o trabalho deve ser desenvolvido somente pelo cooperado, não podendo haver terceirização.

f. Quanto aos instrumentos do princípio de gestão – o estatuto, as atas, o regimento, e quaisquer documentos devem ser elaborados e controlados pelos cooperados, pois são de fundamental importância;

g. Quanto ao quadro de associados – todos devem conhecer os instrumentos de gestão, participar de assembléias e estar dispostos a se capacitar profissionalmente;

h. Quanto às garantias de continuidade da cooperativa – a cooperativa deve possuir fundos que assegurem, basicamente, a sua sustentabilidade, a seguridade dos associados, a remuneração do descanso e as gratificações natalinas, e outros benefícios quaisquer propostos pelos associados;

i. Quanto à responsabilidade social – a cooperativa deve estar voltada para a comunidade na qual esteja inserida, priorizando o acesso de membros do local e contribuindo com o mínimo de 1% das sobras para o fundo intercooperativo.

Cabe ressaltar que as diretrizes acima mencionadas, não ferem os princípios da Aliança Cooperativa Internacional, citados no Capítulo 1, ou mesmo a legislação brasileira. Como são baseadas na observância da prática cotidiana de trabalho tanto das cooperativas populares, como da própria ITCP, podemos considerar as diretrizes como sendo complementares.

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O grande desafio da cooperativa popular está na implantação de ações que promovam, ao mesmo tempo, o desenvolvimento político – através da formação de uma consciência crítica por parte dos cooperados - social, pela educação e a qualificação profissional, possibilitando, desta forma, a inserção do espírito de cidadania destes indivíduos e também, o desenvolvimento econômico da cooperativa, de modo que ela possua condições de se manter competitivamente dentro do mercado formal de trabalho.

Por todos esses frutos, fica claro que “as cooperativas – e é possível afirmar que não somente elas, como a economia solidária em si – estão muito longe de ser um fenômeno circunstancial historicamente datado e passageiro”. (GEDIEL, 2005, p. 12.)

Neste momento, torna-se interessante discorrer, sobre a idéia de Economia Solidária.

II.3 – A Economia Solidária

A Economia Solidária vem se transformando em um eficiente mecanismo gerador de trabalho e renda. SINGER, (2002) a diferencia do modelo econômico capitalista apontando certos princípios. Os princípios básicos da economia solidária são: a propriedade coletiva ou associada do capital e o direito de liberdade individual enquanto que no capitalismo, a propriedade individual aplicada ao capital e o direito a liberdade individual constituem seus princípios.

Inseridas nela, encontram-se empreendimentos orientados pelo princípio da autogestão, como ONGs, associações, empreendimentos individuais, empresas de pequeno e grande porte, bem como as cooperativas.

Mundialmente, segundo GEDIEL (2005, p.78) o termo Economia Solidária surge a partir da década de 1980, com o aparecimento de empreendimentos cujas características baseavam-se pela “solidariedade, valorização do espaço local e por iniciativas comunitárias”. Citando Jean-Loup Motchane, o autor afirma ser a economia solidária uma “nova economia”, já que retoma aspectos dos movimentos sindicais e operários contra a situação de miséria impostas pelas relações sociais capitalistas, como foi apresentado no início deste capítulo, quando foi discorrida a Revolução Industrial e suas transformações no mundo do trabalho.

Já no Brasil, o termo economia solidária ganhou evidência a partir do Fórum Social Mundial, realizado em 2003, quando foi um dos temas centrais do encontro. Além disso,

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ganhou peso a partir da Secretaria Nacional de Economia Solidária, como parte integrante do Ministério do Trabalho e Emprego, criado no mesmo ano.

Como poderemos ler nos próximos parágrafos, não há ainda uma definição universalmente adotada sobre o que seja economia solidária. Esta perpassa por acepções distintas, mas todas giram em torno da idéia de solidariedade em contraste com o individualismo competitivo. 14

Na visão de Paul Singer, a economia solidária se refere a “rede de organizações, onde os trabalhadores se incubem de criar sua própria fonte de trabalho, ou buscar acesso a bens e serviços de qualidade a baixos custos, através de uma participação cidadã e de reciprocidade que articula os interesses individuais aos coletivos.” (SINGER, 2002, p.116)

A Associação Nacional de Trabalhadores e Empresas de Autogestão (ANTEAG) a define como um modo de produção e distribuição que tem bases diferenciadas de relacionamento, focadas mais na pessoa do que no capital, isto se expressa pela forma de gestão, onde a tomada de gestões estratégicas depende da participação coletiva dos sócios. As atividades são organizadas em bases democráticas, em que as pessoas têm uma participação ativa nos meios de produção e a forma de produção independe do capital.

Segundo o Fórum Brasileiro de Economia Solidária, este modelo

“constitui o fundamento de uma globalização humanizadora, de um desenvolvimento sustentável, socialmente justo e voltado para a satisfação racional das necessidades de cada um e de todos os cidadãos da Terra seguindo um caminho intergeracional de desenvolvimento sustentável na qualidade de sua vida.”

Na prática, de acordo com Genauto Filho (2002),

“o termo economia solidária identifica hoje uma série de experiências organizacionais inscritas numa dinâmica atual em torno das chamadas novas formas de solidariedade. (...) Ela assumem, na maioria dos casos, a forma associativa e buscam responder a certas problemáticas locais específicas.”

14

CHAVES, Daniela Freitas & PINTO. Economia solidária como alternativa de desenvolvimento regional. Amazonas: T&C Amazônia, p. 60-67, 2007.

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Expostas à luz, as concepções e definições de diferentes autores sobre a economia solidária, podemos condensar suas palavras em um caminho de que ainda trata-se de um assunto bastante incipiente e passível de novas definições, dado, principalmente, seu campo de estudos ter surgido da tentativa de compreensão de experiências de naturezas empíricas distintas presentes em diversas áreas de produção, comercialização e crédito.

Isto traz à tona uma discussão que está atualmente em pauta quando nos referimos à economia solidária e sua atuação na sociedade. Seria a economia solidária uma resposta às lacunas deixadas pelo modelo capitalista, ou seria a economia solidária uma alternativa ao capitalismo vigente, e assim, competir com ele como modo de melhor atuação ao bem-estar coletivo?

Para Singer (2002, p. 116-117), a economia solidária deve ser vista como um modelo em competição com a economia capitalista, e não apenas um meio de produção residual a este sistema. Sendo uma estratégia na luta contra as desigualdades sociais e o desemprego,

“ela aproveita a mudança nas relações de produção provocada pelo grande capital para lançar os alicerces de novas formas de organização da produção, à base de uma lógica oposta àquela que rege o mercado capitalista. Tudo leva crer que a economia solidária permitirá, ao cabo de alguns anos, dar a muitos, que esperam em vão um novo emprego, a oportunidade de se reintegrar à produção por conta própria individual ou coletivamente”. (Ibid)

Esta visão é reforçada por Mance, ao argumentar que o potencial da economia solidária está ligado à noção de colaboração solidária, que consistiria na

“estratégia para organização de uma sociedade pós-capitalista, baseada na implantação de redes que conectam unidades de produção e de consumo, em um movimento recíproco de realimentação, permitindo a geração de emprego e renda, o fortalecimento da economia e do poder locais, bem como uma transformação cultural das sociedades em que se implanta, com a afirmação de uma ética e de uma visão de mundo antagônicas não apenas ao neoliberalismo mas ao próprio capitalismo.” (MANCE, 1999)

Cabe ressaltar que ao citar “novas formas de produção”, Singer nos remete ao cooperativismo, pois para o autor, a cooperativa é a unidade básica de análise sócio-econômica deste tipo de empreendimento.

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Mas qual seria a relação entre o cooperativismo popular e a economia solidária? Seriam ambos sinônimos?

Benedito Oliveira (2003) indica que existem três grandes correntes de compreensão do cooperativismo15, sendo que a terceira delas aproxima-se do cooperativismo popular ao dizer que se trata de “um instrumento para negar a ordem liberal e servir como fundamento para a construção de fontes alternativas aos efeitos negativos causados pelo capitalismo globalizado”. Cita também que no Brasil, o cooperativismo popular “está se desenvolvendo e é parte constitutiva de um movimento que convencionou chamar de Economia Solidária”.

O cooperativismo popular como parte da Economia Solidária também é reforçado no trabalho de Szerman (2003), sobre o cooperativismo, economia solidária e autogestão, ao negritar a distinção nos dois termos quando afirma que o cooperativismo denomina-se um movimento, enquanto a economia solidária seria um modo de produção, baseado na ideologia do socialismo utópico de Owen e Fourier.16

De fato, se pensarmos nas cooperativas populares (e no princípio quanto à constituição do capital), considerando como principal capital do cooperativado a sua força de trabalho, explicitado anteriormente, este é um movimento que se põe a serviço do modelo de economia solidária na medida em que trazem ao trabalhador excluído acesso a oportunidades de trabalho e à renda, além de criação e ampliação do seu próprio trabalho quando da conversão de interesses com outros trabalhadores na constituição de empreendimentos autogestionários. Eles, os trabalhadores, têm na cooperativa a possibilidade real de, coletivamente, identificar seus problemas e suas limitações, seus anseios e vontade de realização, e enfrentar estes conflitos atuando dentro de sua comunidade com uma perspectiva transformadora ao somar esforços com outros homens que na mesma situação deparam-se com barreiras externas, para explorar o mercado de trabalho.

15 As duas primeiras fazem referência a 1) que ele (o cooperativismo popular) representa um fim em sí –

defendida pela maioria dos integrantes do sistema liderado internacionalmente pela Aliança Internacional Cooperativista; 2) que ele é um instrumento para reforçar os princípios liberais – representada por lideres cooperativas das chamadas cooperativas agropecuárias brasileiras, por exemplo.

16

Robert Owen pretendia acabar com a pobreza através da geração de postos de trabalho para os indivíduos que não possuíam renda e contavam apenas com as benesses da Igreja Católica. Sua idéia era formar aldeias

produtivas, onde estes trabalhadores viveriam daquilo que produziriam em comum nas terras designadas e

cuidadas por eles, podendo trocar estes produtos com outras aldeias produtivas, que poderiam ser agrícolas e também industriais. Já Charles Fourier, acreditava que a ordem social só seria conquistada mediante leis morais e intelectuais, que seriam apreendidas pelos homens, que aprenderiam a viver harmonicamente. (Veiga, 2001, p. 23-25).

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Concomitantemente, são expostos aos conflitos inerentes aos empreendimentos autenticamente autogestionários, com a transferência do controle para as suas mãos, e a batalha cotidiana do sentimento duplo de serem, ao mesmo tempo, executores do serviço e administradores das atividades, o que faz necessário um esforço permanente para que estas experiências não acabem se transformando em cooperativas com alguns ‘donos’ que mandam, e os ‘não donos’, que simplesmente são executores de tarefas, meros empregados.

Não obstante, enfrentam como qualquer outra instituição, a competitividade do mundo externo. Assim como as pequenas empresas, as cooperativas populares não estão isentas das normas inerentes ao sistema capitalista.

Para competir em nível de igualdade com os empreendimentos capitalistas, a economia solidária

[...] terá de alcançar níveis de eficiência na produção e distribuição de mercadorias comparáveis aos da economia capitalista e de outros modos de produção, mediante o apoio de serviços financeiros e científico-tecnológico solidários. SINGER (2002, p. 121)

E para isso, segundo Pinho:

[...] o aspecto da produtividade ou êxito externo da cooperativa implica a utilização das mais modernas técnicas de organização empresarial; conquista de mercado pela qualidade de seus êxitos; utilização de inovações tecnológicas e outras para a atividade cooperativista ser competitiva; enfim, apresentação de vantagens típicas das empresas econômicas [...] (PINHO, 2004, p. 301).

II.4 – Agentes de fomento ao cooperativismo

Na seção anterior, pudemos observar alguns dos obstáculos enfrentados pelas cooperativas mediante sua atuação em um sistema predominantemente capitalista, onde não há subterfúgio para a não competitividade. A necessidade de conciliar a produção e comercialização de bens e serviços com custos compatíveis ao de mercado, e ao mesmo tempo, assegurar um retorno financeiro aos cooperados, mostra-se como um dos principais desafios para a sustentabilidade dos empreendimentos solidários.

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Pelo seu caráter salvador, no sentido de serem uma das grandes oportunidades de absorção dos trabalhadores desempregados ou à margem da sociedade, as cooperativas populares contam com o apoio de vários organismos institucionais que se mostram de grande importância para o desenvolvimento destes empreendimentos e, por conseguinte, da economia solidária no Brasil.

Assim, podemos indicar a participação:

• de todas as esferas governamentais (municipal, estadual e federal), com ações como a criação em 1997 do Programa Nacional de Incubadora de Cooperativas Populares (PRONINC); a Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), com funcionamento iniciado em 2003, sob responsabilidade do Ministério de Trabalho e Emprego dando apoio político e material, ou por meio de convênios; pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com linhas de financiamento, principalmente, em projetos cooperativistas de crédito, reciclagem e agropecuária;

• das universidades, através da crescente produção acadêmica voltada para o assunto da economia solidária, mas principalmente, por projetos de extensão universitária. Destacamos, dentre eles, a criação de incubadoras tecnológicas de cooperativas populares (ITCP) que semelhante às incubadoras de empresas, dispõem às cooperativas populares as ferramentas (estruturais e de conhecimento) necessárias ao desenvolvimento dos empreendimentos incubados. Através de seu trabalho oferecem aos cooperados a percepção das oportunidades e potencialidades de seus projetos pela conscientização dos valores e dos princípios cooperativistas;

• de ONGs e agências de cooperação internacional, por sua atuação junto à sociedade na busca pelo desenvolvimento na formação da democracia e espírito de cidadania, fazendo a mediação com os empreendimentos solidários, quer através de uma mobilização social, ou através da elaboração e implementação de projetos sociais.

Todas estas instituições comentadas acima têm um senso comum de não servirem como um mero canal de assistencialismo. Há uma grande preocupação de todas com o êxito dos empreendimentos e de seus cooperados, e sua contribuição na reversão dos quadros de desemprego, pobreza e desigualdade social, não somente das pessoas envolvidas, mas também da comunidade em que atuam.

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Com isso, uma vez esclarecidas tais questões, é possível discorrer, no capítulo seguinte, sobre os meios que podemos dispor para avaliar se a alternativa do cooperativismo pode acarretar transformações concretas à vida daqueles que se encontram de alguma forma, ligados a esse movimento.

Referências

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