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Uma contribuição para o debate sobre as causas da crise financeira estadunidense de 2007/2008

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RICARDO STRAZZACAPPA BARONE

Uma contribuição para o debate sobre as causas da crise

financeira estadunidense de 2007/2008

CAMPINAS 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

RICARDO STRAZZACAPPA BARONE

Uma contribuição para o debate sobre as causas da crise

financeira estadunidense de 2007/2008

Profª. Drª. Daniela Magalhães Prates – Orientadora

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas, do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestre em Ciências Econômicas.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELO ALUNO RICARDO STRAZZACAPPA BARONE E ORIENTADA PELA PROFª. DRª. DANIELA MAGALHÃES PRATES.

CAMPINAS 2015

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DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

RICARDO STRAZZACAPPA BARONE

Uma contribuição para o debate sobre as causas da crise

financeira estadunidense de 2007/2008.

Defendida em 26/02/2015

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Agradecimentos

Pela inestimável direção intelectual e rigor acadêmico, agradeço minha orientadora Prof.ª Daniela Magalhães Prates. Agradeço, também, os professores do curso de mestrado: Adriana Nunes, Ana Rosa Ribeiro, André Biancarelli, Bruno Conti, Celio Hiratuka, Daniela Prates, David Dequech, Fernando Sarti, Francisco Lopreato, José Carlos S. Braga, Julio Sérgio Gomes de Almeida, Paulo Fracalanza, Pedro Rossi, Rodolfo Hoffmane Simone Silva de Deos.

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Resumo

Esta dissertação tem por objetivo apresentar os principais argumentos da abordagem econômica mainstream acerca das raízes da crise financeira estadunidense de 2007/2008, bem como as principais críticas a ela endereçadas pelas abordagens alternativas. Argumenta-se que a abordagem mainstream oferece um conjunto de explicações que desviam a atenção dos fatores históricos, monetários e financeiros que realmente poderiam contribuir para o entendimento das origens da crise em questão. Para tanto, os argumentos da abordagem mainstream são apresentados segundo duas vertentes, a saber: uma vertente classificada como hard-core, que contempla questões vinculadas às falhas de governo, e outra vertente classificada como soft-core, relacionada às falhas de mercado e aos desequilíbrios internacionais. Procura-se, a partir da articulação das críticas à abordagem mainstream, desenvolver uma interpretação que tem como ponto central a emergência de um novo padrão sistêmico de riqueza capitalista: a financeirização. Esse novo padrão, entendido como uma forma específica pela qual se faz a definição, gestão e realização da riqueza, passa a condicionar o comportamento das famílias, das empresas, das instituições financeiras e dos governos segundo princípios de uma lógica financeira geral que define o modo de ser do capitalismo contemporâneo.

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Abstract

The aim of this MA dissertation is to present the key arguments of the mainstream economical approach concerning the origins of the US financial crisis of 2007/2008, as well as the principal criticisms put forward by alternative views. It is argued that the mainstream approach offers a range of explanations that overlooks important historical, monetary and financial factors, which, however, could help shedding light on the actual origins of the crisis. The analysis of the mainstream arguments is structured into two main groups: the first is known as the ‘hard-core’ and deals with issues concerning government errors; the second is the so-called ‘soft-core’ and focuses on both market errors and international phases of disequilibrium. Through an assessment of the principal criticisms to the mainstream approach, this dissertation offers an interpretation of the crisis which is based on the idea of the emergence of a new systemic pattern of capitalistic wealth, namely, the financialization. Understood as a specific form by which wealth is defined, managed and produced, this new pattern comes to determine the behaviour of families, businesses, financial and governmental institutions according to the principles of a comprehensive financial logic that shapes the contemporary capitalism.

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Lista de Gráficos e Quadros

Gráfico 1 – Taxa de juros do Fed e taxa de juros estimada com base na Regra de Taylor (%)....17 Gráfico 2 – Passivo do sistema bancário sombra vs. passivo sistema bancário tradicional (US$ trillion)...42

Gráfico 3 – Bolha imobiliária e taxa de juros do Fed...69 Quadro 1 – Globalização Financeira: conceito e etapas de constituição...82

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Sumário

INTRODUÇÃO...01

PARTE I – APRESENTAÇÃO DOS ARGUMENTOS MAINSTREAM: HARD E SOFT-CORE...11

Apresentação...11

Capítulo 1– Argumentos Hard-Core: política monetária e intervenção governamental no mercado imobiliário...13

1.1 – Introdução...13

1.2 – Política Monetária e Regra de Taylor...14

1.3 – Erro de Diagnóstico e Aprofundamento da Crise...19

1.4 – Intervenção Governamental e Papel das GSEs...24

Capítulo 2 - Argumentos Soft-Core: desequilíbrios internacionais vulnerabilidades internas ...29

2.1 – Introdução...29

2.2 – Desequilíbrios Internacionais: o excesso de poupança global...30

2.2.1 – Introdução...30

2.2.2 – Saving Glut Hypotesis...31

2.3 – Vulnerabilidades Internas: falhas de governo e falhas de mercado...35

2.3.1 – Introdução ...35

2.3.2 – Regulação e Supervisão do Mercado Financeiro...36

2.3.3 – Shadow Banks...40

2.3.4 – Políticas de Remuneração e Originate-to-Distribute-Model...45

2.3.5 – Soft-Fraud……….………...…...53

2.3.6 – Too-Big-to-Fail e Moral Hazard………..……….…....56

2.3.7 – Propostas de Regulação e o Papel da Política Monetária...58

Conclusão ...62

PARTE II – PRINCIPAIS CRÍTICAS À INTERPRETAÇÃO MAINSTREAM ...65

Apresentação...65

Capítulo 3 – Críticas à Interpretação Hard-Core...67

3.1 – Introdução ...67

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3.3 – Regra de Taylor ...69

3.4 – Intervenção Governamental no mercado imobiliário...73

3.5 – Retomando a questão da Política Monetária...73

Capítulo 4 – Críticas à Interpretação Soft-Core...81

4.1 – Global Saving Glut...81

4.1.1 – Introdução ...81

4.1.2 – Origens dos desequilíbrios internacionais...81

4.1.3 – Evidências empíricas e críticas teóricas...91

4.1.4 – Conclusão...98

4.2 – Vulnerabilidades internas...99

4.2.1 – Introdução...99

4.2.2 – Falhas ou Sucesso da Financeirização?...100

Conclusão...105

CONSIDERAÇÕES FINAIS...109

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INTRODUÇÃO

O objetivo desta dissertação é apontar os limites e a insuficiência dos principais argumentos do mainstream acerca das origens da crise financeira dos Estados Unidos (EUA) de 2007/20081, originada em meados de 2007 no mercado estadunidense de hipotecas de alto risco (subprime). Frente às incertezas sobre a verdadeira situação dos balanços das intuições financeiras mediante a eclosão da crise do subprime em agosto de 2007, durante os meses subsequentes, o mercado de crédito congelou, o mercado acionário despencou e os títulos de dívida perderam seu valor. Uma crise que até então parecia restrita ao segmento de hipotecas subprime rapidamente se espalhou para os demais segmentos do mercado financeiro dos EUA2. Configurou-se a pior crise financeira desde a Crise de 19293.

Diante disso, a crise financeira se tornou um dos assuntos mais debatidos dos últimos anos. Um dos principais temas desse debate refere-se à análise acerca de suas origens. Entender os motivos que levaram os mercados financeiros dos EUA a entrar em crise tornou-se um dos principais pontos de enfrentamento teórico entre as várias escolas ou correntes de pensamento econômico, tanto dentro quanto fora do mainstream. O conceito sociológico de economia mainstream, utilizado nesta dissertação, é o mesmo adotado por Colander at alli (2003), a saber:

1

A crise financeira estadunidense de 2007/2008 será referida, ao longo do trabalho, apenas como “crise financeira” ou simplesmente “crise”.

2 Segundo o relatório anual do Bank for International Settlements (BIS), divulgado em Junho de 2009, a crise financeira e econômica global apresentou cinco etapas que caracterizaram os primeiros anos de sua evolução, a saber: (i) “Prelúdio” de agosto/2007 até o resgate do Bear Stearns em março/2008; (ii) “Em direção à falência do Lehman” de março/2007 até meados de setembro/2008; (iii) “Crise de confiança global” de meados de setembro/2008 até final de outubro/2008; (iv) “Reversão econômica global” de final de outubro/2008 até meados de março/2009; e (v) “Crise econômica e primeiros sinais de estabilização dos mercados financeiros globais”, compreendida entre meados de março/2009 e junho/2009. Segundo esta periodização, a crise financeira estadunidense emerge e ganha proporções sistêmicas durante as duas primeiras etapas, isto é, entre meados de 2007, com o início da crise do subprime, e meados de 2008, com a falência do Lehman Brothers. Assim, a crise que estava relativamente limitada ao mercado financeiro dos EUA ganha proporções globais atingindo tanto países industrializados quanto países em desenvolvimento. Em suma, a periodização proposta pelo BIS permite diferenciar e organizar temporalmente a Crise Subprime, a Crise Financeira Estadunidense, e a Crise Financeira e Econômica Global. Esta periodização será adotada ao longo deste trabalho devido a sua importância para um recorte mais preciso do objeto em estudo. .

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Para uma reflexão sobre as semelhanças e as diferenças entre a depressão dos anos 1930 e a crise financeira atual, ver Mazzucchelli (2014).

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Mainstream consists of the ideas that are held by those individuals who are dominant in the leading academic institutions, organizations, and journals at any given time, especially the leading graduate research institutions. Mainstream economics consists of the ideas that the elite in the profession finds acceptable, where by elite we mean the leading economists in the top graduate schools. It is not a term describing a historically determined school, but is instead a term describing the beliefs that are seen by the top schools and institutions in the profession as intellectually sound and worth working on (Colander at alli, 2003, p. 05).

O conceito sociológico de economia mainstream aqui utilizado tem o objetivo de possibilitar a distinção entre diferentes interpretações sobre a origem da crise financeira. Mais especificamente, o intuito é conseguir separar os autores que abordam esta questão com um olhar mais próximo ao do saber dominante (ou dele derivado), daqueles que buscam uma abordagem baseada em interpretações alternativas, isto é, não plenamente alinhados ao mainstream. O propósito não é enquadrar autores em categorias pré-determinadas, mas classificar, à luz da natureza dos seus argumentos, suas interpretações como pertencentes ou não ao mainstream da profissão.

O conceito utilizado não faz referência a um conteúdo intelectual específico da economia mainstream uma vez que esta passa a ser caracterizada pelo conjunto de ideias mais prestigiosas e influentes de seu meio acadêmico e profissional. Seu conteúdo intelectual pode variar no tempo e no espaço e aquilo que é classificado como mainstream hoje pode não o ser amanhã. Ou seja, quando aplicado em sua dimensão sociológica, o conceito de mainstream não pode ser reduzido a uma escola ou corrente de pensamento econômico em particular, mas às ideias que dominam a profissão em um determinado período. Portanto, conforme Colander et alli (2003), o conceito de mainstream não pressupõe consistência interna e ideias que se chocam umas com as outras podem pertencer ao mainstream em um mesmo período de tempo. Além disso, a fronteira entre aquilo que se entende como mainstream e não-mainstream (alternativa) também não é clara4.

Decorre daí que a diversidade dentro da disciplina da economia configura-se numa situação na qual não existe consenso sobreas causas e propostas de solução dos problemas econômicos, ou seja, a economia enquanto campo do saber não representa uma disciplina unificada. Por essa razão, a questão central que permeia toda a discussão apresentada nesta dissertação não é apontar explicações “certas” ou “erradas”, mas identificar as diferentes visões de mundo e teorias que estão subjacentes a cada abordagem, mainstream e alternativa. E, a partir daí, assumir uma

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Para um estudo mais aprofundado sobre a diversidade da disciplina da economia e as diversas formas de classificar suas diferentes escolas de pensamento ver: Collander at alli (2003), Dequech (2007), Lavoie (2010) e Palley (2012).

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posição que compartilha das abordagens teóricas alternativas. Em relação à dificuldade e ao caráter subjetivo na tentativa de construção de um consenso sobre os fenômenos econômicos, Dow (2012) destaca:

For any economist, deciding on one approach or another is necessary for knowledge to be developed, to inform policy. The choice to adopt one approach involves putting higher value on what that approach allows relative to what it precludes. But, while reasoned justifications can be made, there is no absolute basis for choosing one approach over another. Choice for economists, as for economic agents (on which more below), requires the exercise of judgment (Dow 2012, p.81).

No entanto, segundo Colander at alli (2003), apesar de a definição de mainstream não corresponder a uma escola ou corrente de pensamento econômico particular, a teoria econômica neoclássica pode ser entendida como a principal corrente de pensamento da economia mainstream contemporânea, pois domina a profissão econômica e está amplamente representada nas universidades de maior prestígio. Em linhas gerais, baseada nos pressupostos de homo economicus, das expectativas racionais, de que a economia está ou tende ao equilíbrio e de uma visão de incerteza que corresponde ao risco knightiano (com funções de distribuição de probabilidades bem definidas), a teoria econômica neoclássica sustenta que os mercados tendem a ser eficientes e capazes de se autorregular. Como resultado, desde os anos 1970, com a consolidação da economia neoclássica5 como a principal corrente de pensamento do mainstream, que passa a se aproximar cada vez mais do liberalismo econômico (free markets), marcou uma importante mudança (ao menos em relação às três décadas anteriores) sobre o papel do Estado na economia (Colander 2003; Vercelli, 2010; Palley, 2012).

Apesar de a economia neoclássica ter sido culpada por alguns economistas como responsável pela crise financeira e ter sido incapaz de explicá-la de maneira adequada, seu prestígio e sua capacidade de influenciar a economia enquanto objeto permaneceu em grande medida inabalada.6 Foi apenas em decorrência da imediata intervenção governamental que a crise não se transformou em uma tragédia de proporções incalculáveis. Na tentativa de estabilizar os mercados financeiros, à beira da insolvência, o Federal Reserve (Fed) assumiu o socorro do sistema financeiro oferecendo um total de recursos (divididos entre empréstimos, garantias e compra de ativos

5 Para referências detalhadas sobre o conceito de economia neoclássica, ver Colander at alli (2003, 2007), Dequech (2007), Lavoie (2010) e Dow (2012).

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Uma visão contrária pode ser encontrada em Frey (2006), que argumenta que a economia como disciplina não tem efeitos substancias sobre a economia como objeto ou, mais amplamente, sobre a sociedade.

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tóxicos) estimados em aproximadamente US$ 29 trilhões.7 Com isso, contrariamente à grande depressão dos anos 1930, em que os governos estavam despreparados para enfrentar uma crise financeira de tal magnitude, a crise recente, apesar de ter gerado algum descontentamento sobre o “paradigma do livre mercado”, não suscitou reações suficientemente fortes para alterar o core do conteúdo intelectual da abordagem mainstream.

Passada a tormenta inicial e alguns questionamentos sobre a eficiência dos mercados e de sua capacidade de se autorregular, veio a acomodação. Não se concretizou um consenso político maior (nem dentro nem fora da academia), capaz de efetivamente levar adiante medidas e propostas necessárias para disciplinar o funcionamento do capitalismo e dos mercados financeiros. A economia neoclássica enquanto principal escola de pensamento do mainstream perdeu um pouco de seu prestígio sem perder seu domínio sobre a profissão e sua capacidade de influenciar a formulação de políticas econômicas.

Pois bem, tomando-se como base a taxonomia sugerida por Palley (2012), os principais argumentos do mainstream sobre as origens da crise financeira foram divididos em duas correntes interpretativas, a hard-core e a soft-core.8 A separação da abordagem mainstream nessas duas correntes é apenas uma forma possível de organizar o debate sem perder de vista aquilo que já foi apontado sobre a diversidade dentro da disciplina da economia. Mesmo que possam existir pontos de comum acordo entre elas, bem como inevitavelmente existir certa dose de arbitrariedade em tal divisão, a distinção entre essas duas categorias é estabelecida com o propósito de facilitar a organização dos argumentos, agrupando-os segundo seu “radicalismo” quanto à crença na eficiência dos mercados e no Estado mínimo (Palley, 2012).

Esta forma de classificação não está livre de problemas, mas parece ser ao menos uma divisão analítica satisfatória e preferível a sua forma inversa, qual seja, classificar autores em categorias mais amplas. Um autor pode mudar seu ponto de vista ao longo do tempo, bem como pode não

7 Para um estudo detalhado sobre os custos envolvidos nas ações do Fed para socorrer as instituições financeiras à beira da insolvência, ver Felkerson (2009)

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Vale destacar que, diferentemente de Palley (2012), não entendemos neste trabalho neoliberalismo (mesmo em sua dimensão puramente econômica) como sinônimo de economia neoclássica; nem todo autor neoclássico é neoliberal e nem todo neoliberal é neoclássico – temos, por exemplo, os autores da escola austríaca. Além disso, como apontado, o mainstream da profissão não corresponde a uma única escola de pensamento. Além da definição de neoliberalismo proposta por Palley (2012), uma outra referência importante – não keynesina, mas marxista – sobre este conceito pode ser encontrada em Harvey (2005).

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estar necessariamente vinculado a uma corrente teórica especifica. Além disso, os argumentos do mainstream apresentados neste trabalho e classificados entre hard-core ou soft-core não necessitam satisfazer todas as condições necessárias para pertencerem ao conjunto mais restrito formado pela economia neoclássica.9

A primeira corrente, a hard-core, contempla explicações relacionadas às falhas de governo e a segunda, a soft-core, endereça explicações que remetem às falhas de mercado e aos desequilíbrios internacionais. Mais especificamente, a abordagem de caráter mainstream avalia a crise financeira como sendo resultado da combinação entre cinco elementos principais, dos quais os dois primeiros estão contidos dentro do grupo de explicações referente às falhas de governo e os três últimos dentro do grupo das falhas de mercado, a saber: falhas na condução da política monetária, excesso de intervenção no mercado imobiliário, falhas na estrutura de supervisão e regulamentação do sistema financeiro, práticas indevidas de negócio no mercado financeiro e o desenvolvimento de desequilíbrios internacionais que resultam em excesso de poupança global (Palley, 2012). No entanto, como destacado por Dow (2012), apesar de o mainstream apresentar diversas explicações sobre a crise financeira, que, por vezes, são conflitantes entre si, tanto a versão hard quanto a soft estão baseadas na presunção de que mercados competitivos estão em equilíbrio ou tendem a ele. Essas explicações, em última instância, referem-se a fatores que inibem este processo, particularmente assimetrias de informação, comportamentos irracionais e a excessiva interferência do Estado.10

Cumpre destacar, também, que a taxonomia apresentada não divide a economia mainstream em dois grupos distintos (reduzindo excessivamente sua diversidade interna). Dividem-se apenas os principais argumentos do mainstream, sobre as origens da crise financeira, em duas correntes interpretativas distintas11. Ademais, o que permite classificar um determinado argumento como

9 Seria possível construir uma outra (ou várias) forma de classificar os principais argumentos do mainstream. Por um lado, os argumentos hard-core poderiam ser classificados como pertencentes a economia neoclássica e rotulados de argumentos mainstream ortodoxos e, por outro lado, os argumentos soft-core poderiam ser classificados como mainstream não ortodoxos ou de fronteira, isto é, mais próximos a abordagens alternativas. Contudo, essa forma de classificação, devido à dificuldade de se estabelecer um critério preciso de separação e classificação dos argumentos, bem como das categorias utilizadas para classificá-los, poderia atrapalhar mais do que ajudar. Por esse motivo, preferiu-se trabalhar com uma forma de classificação mais geral que dá ênfase aos principais argumentos do

mainstream como um todo e estabelece uma forma mais simples de separá-los e compará-los.

10 Como será visto na seção 4.2.2 desta dissertação, Braga (2013) também esta alinhado com tal argumento. 11

Esta é uma diferença importante entre as ideias propostas nesta dissertação com o trabalho de Palley (2012). Palley argumenta que a economia mainstream pode ser dividida em duas correntes principais: uma hard-core que enfatiza

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pertencente à economia mainstream é justamente seu alinhamento tanto com as ideias defendidas por aqueles indivíduos que dominam a profissão quanto a sua capacidade de refletir as crenças e as ideias defendidas pelas universidades e instituições mais prestigiosas. Em outras palavras, o conteúdo intelectual é importante, mas alinhado ao conceito sociológico de mainstream apresentado acima; o que permite um argumento ser classificado como pertencente, ou não, ao mainstream é seu prestigio e influência dentro das principais universidades e instituições da economia.

Apesar de se seguir a taxonomia adotada por Palley (2012) como um guia para a construção do conjunto dos principais argumentos do mainstream, foram escolhidos alguns autores com o propósito de se estabelecer um eixo central para cada uma dessas correntes a fim de manter a objetividade e a coerência da exposição. Os trabalhos de Taylor (2007, 2008, 2009a, 2009b, 2010, 2013) foram escolhidos para representar a corrente hard-core e os trabalhos de Bernanke (2005, 2007, 2010, 2011, 2012, 2013) e Greenspan (2010) para representar a corrente soft-core. Apesar de formarem o core dos argumentos apresentados, procurou-se complementar a construção dessas duas correntes interpretativas a partir da leitura de outros autores que defenderam ideias similares, como Caballero (2009), Gourinchas (2010), Rajan (2010), bem como de autores que os criticam, como Borio & Disyatat (2011)12, Dow (2012), Kregel (2008), Wray, (2009a, 2009b) Palley (2012) e Vercelli (2010).

as falhas de governo e esta mais associada com o departamento de economia da Universidade de Chicago e outra soft-core que dá maior reconhecimento as falha de mercado e esta mais próxima ao departamento de economia do Massachusetts Institute of Technology (MIT). Esta forma de dividir a economia mainstream nos parece demasiadamente simples, pois presume que o mainstream varia apenas em grau e não em tipo, ou seja, o mainstream é entendido como um conjunto de ideias que possui coerência interna, equiparando-o a uma corrente de pensamento econômico. No entanto, como aponta Colander et alli (2003), apesar de a corrente neoclássica ser a principal corrente de pensamento dentro do mainstream contemporâneo, existem em seu interior outras correntes (ou apenas ideias que ainda não formam ou pertencem a uma corrente de pensamento) que não têm associação direta com a corrente neoclássica e, mesmo assim, são ensinadas nas universidades de maior prestígio. Em linha com esses autores, define-se aqui que a economia enquanto campo do saber não é uma disciplina unificada e mesmo dentro do mainstream existe diversidade. É por esta razão, portanto, que restringimos a classificação adotada por Palley (2012), hard-core ou soft-core, apenas aos argumentos propostos pelo mainstream sobre as causas da crise financeira e não estendemos tal classificação para a economia mainstream como um todo. Em outras palavras é preferível dizer que os principais argumentos do mainstream acerca das origens da crise (e não o mainstream enquanto conjunto de ideias) variam em grau; enquanto alguns deles levam em conta as falhas de mercado, outros ficam mais restritos as ideias de mercados perfeitos.

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Este autor, como será visto no desenvolver do trabalho, apesar de poder ser considerado como pertencente ao mainstream da profissão, utiliza-se de ideias e constrói argumentos alternativos àqueles apresentados pelo

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Justifica-se, também, a escolha desses três autores principais, por um lado, pelo fato de Taylor, de certa forma, sintetizar a visão mais conservadora da crise, entendida como o resultado do excesso de intervenção governamental, tanto na condução da política monetária, excessivamente relaxada, quanto na intervenção direta sobre o mercado imobiliário residencial. E, por outro lado, pelo fato de Greenspan e Bernanke (presidentes do Fed, o banco central dos EUA, de 1987 a 2006 e de 2006 a 2014, respectivamente), além de bem “representarem” a abordagem soft, contraporem-se à explicação de Taylor, desenvolvendo uma interpretação distinta da crise. Esses autores desenvolvem uma interpretação que coloca ênfase sobre questões relacionadas aos desequilíbrios internacionais e às falhas de mercado, ao mesmo tempo em que se lançam na defesa do Fed e desassociam a política monetária expansionista da crise financeira.

Além disso, o trabalho não se completa apenas com a descrição da interpretação mainstream e suas diferentes explicações acerca das causas da crise. Também é objetivo deste estudo construir, com base em uma diversidade de autores, em geral próximos à visão pós-keynesiana, uma série de críticas aos principais argumentos do mainstream. Estes, em geral, invertem os mecanismos causais que contribuíram para desencadear o boom de crédito que, em última instância, culminou na crise. Essencialmente, os diversos trabalhos que compõem uma interpretação alternativa sobre as causas da crise estão baseados em hipóteses diferentes daquelas que norteiam a economia mainstream. Dentre elas, se destacam: a separação dos planos de poupança dos de investimentos, com base em outra relação de determinação; a ausência de qualquer eficácia inerente dos processos econômicos que os direcionem ao equilíbrio; a diferença conceitual entre incerteza e risco probabilístico; o modo como se apreende o dinheiro e o papel dos mercados financeiros nas economias contemporâneas.13

mainstream sobre as origens da crise financeira. Assim, por conta da natureza dos argumentos que apresenta, estes foram classificados como críticos à visão mainstream.

13

Argumenta-se que, em grande medida, as interpretações alternativas àquelas do mainstream sobre as causas da crise financeira têm como base uma visão de mundo diferente. No sentido de Schumpeter, a visão de mundo diz respeito a um ato cognitivo pré-analítico que fornece a matéria-prima para o esforço analítico subsequente, bem como identifica o conjunto de fenômenos que devem ser objeto da análise. Em suas palavras: “(…) in order to be able to posit to ourselves any problems at all, we should first have to visualize a distinct set of coherent phenomena as a worth-History of economic analysis while object of our analytic efforts. In other words, analytic effort is of necessity preceded by a preanalytic cognitive act that supplies the raw material for the analytic effort. In this book, this preanalytic cognitive act will be called Vision. It is interesting to note that vision of this kind not only must precede historically the emergence of analytic effort in any field but also may re-enter the history of every established science each time somebody teaches us to see things in a light of which the source is not to be found in

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Seguramente, vários dos argumentos apresentados ao longo deste trabalho sobre as causas da crise recente – falhas de governo, falhas de mercado, fraudes, deslocalização produtiva, instabilidade inerente dos mercados financeiros, global imbalances – independentemente de sua filiação ou proximidade com alguma corrente de pensamento econômico específica, seja ela mais ou menos próxima do mainstream, contribuíram em maior ou menor grau para tal desfecho e, por este motivo, seria um equívoco considerar uma única causa para compreender a origem da crise financeira. Assim, a partir da apresentação e da crítica dos principais argumentos da abordagem mainstream, o trabalho procura indicar caminhos alternativos para a construção de uma interpretação que possa dar conta de suprir os requisitos necessários para uma explicação de caráter mais abrangente.

Desse modo, a partir de suas críticas, é proposta uma interpretação alternativa acerca das causas da crise financeira. Sob esta interpretação alternativa, a crise não é entendida como resultado de falhas de mercados ou das intervenções desastrosas do Estado, mas, sim, como uma forma de manifestação da própria natureza contraditória do sistema capitalista que, sob um novo regime de acumulação com dominância financeira, a financeirização, tem seu potencial de desordem econômica e social exacerbado. Este novo padrão, entendido como uma forma específica pela qual se faz a definição, gestão e realização da riqueza, passa a condicionar o comportamento das famílias, das empresas, das instituições financeiras e dos governos segundo princípios de uma lógica financeira geral que define o modo de ser do capitalismo contemporâneo. Portanto, defende-se nesta dissertação que as causas mais profundas da crise devam ser buscadas a partir de uma perspectiva mais ampla, capaz de iluminar a importância da nova dinâmica econômica internacional e a consolidação de um novo regime de acumulação, marcado pela dominância da lógica de valorização financeira.

Para tanto, este trabalho está organizado em duas partes, além desta introdução e das considerações finais. A primeira tem a finalidade de apresentar os argumentos elaborados pela abordagem mainstream e, a segunda, de apontar algumas das principais críticas a ela, à luz de abordagens alternativas com base em literatura, em grande parte, de caráter pós-keynesiano. A

the facts, methods, and results of the preexisting state of the science” (1954, p. 39). Para os pós-keynesianos, por exemplo, a visão de mundo de Keynes poderia ser resumida no conceito de economia monetária da produção.

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primeira parte foi dividida em dois capítulos. O primeiro, relacionado à corrente interpretativa mainstream hard-core, destinado à apresentação dos argumentos referentes aos equívocos de política monetária, ao aprofundamento da crise devido a ações vacilantes do governo em seu enfrentamento e ao excesso de intervenção governamental no mercado imobiliário residencial. O segundo divide-se em dois temas: os desequilíbrios internacionais e o excesso de poupança global e o acúmulo de fragilidades da economia dos EUA, nos anos que antecederam a crise.

Por sua vez, a segunda parte, também dividida em dois capítulos, trata de apresentar as principais críticas aos argumentos mainstream, ou seja, em primeiro momento desdobra-se a crítica sobre a corrente hard-core, para que, na sequência, seja dado foco às críticas à corrente soft-core. Por um lado, a crítica à corrente hard-core procura ressaltar a importância excessiva dada à política monetária como o principal fator explicativo da crise. Argumenta-se que essa política foi relevante, porém não determinante para a ordem dos acontecimentos. Por outro lado, a crítica à corrente soft-core, foi construída com base em duas frentes distintas. A primeira busca formas alternativas de explicar os desequilíbrios globais na medida em que constrói argumentos históricos, empíricos e teóricos que refutam a tese do Global Saving Glut. A segunda procura estabelecer uma visão paralela à explicação fundada nas vulnerabilidades internas da economia americana, pois entende que tais vulnerabilidades são elementos imanentes ao capitalismo contemporâneo dominado pelas finanças ou financeirização e não “problemas externos” relacionados às falhas de mercados.

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PARTE I - APRESENTAÇÃO DOS ARGUMENTOS MAINSTREAM: HARD

E SOFT-CORE

Apresentação

A abordagem de caráter mainstream avalia a crise financeira como sendo o resultado da combinação de cinco elementos principais: falhas na condução da política monetária, excesso de intervenção governamental no mercado imobiliário, falhas na estrutura de supervisão e regulamentação do sistema financeiro, práticas indevidas de negócio no mercado financeiro (vulnerabilidades) e o desenvolvimento de desequilíbrios financeiros internacionais que resultam em excesso de poupança global. Essa parte do trabalho será dedicada a esses argumentos que são apresentados em duas correntes: a hard-core e a soft-core com base na taxonomia de Palley (2012). Para tanto, esta primeira parte do trabalho foi organizada da seguinte maneira. No primeiro capítulo, será exposta a interpretação hard-core estruturada fundamentalmente a partir de três argumentos: (i) os equívocos na condução da política monetária pelo Fed que, ao manter as taxas de juros baixas por muito tempo, seria o verdadeiro responsável pela bolha de crédito imobiliário; (ii) o erro de diagnóstico, responsável pela propagação e o aprofundamento da crise, cometido pelas autoridades governamentais que, ao invés de entenderem a crise como uma crise de solvência, teriam se equivocado, entendendo-a como uma crise de liquidez; (iii) por fim, o excesso de intervenção governamental no mercado imobiliário residencial destacando o papel e a forma de atuação das Government Sponsored Enterprises (GSE) – agências quase-públicas (Fannie Mae e Freddie Mac).

O segundo capítulo apresenta a corrente soft-core dividida em dois argumentos: um de caráter macroeconômico, que concentra a análise sobre os desequilíbrios internacionais de transações correntes e outro de caráter microeconômico, construído basicamente sobre a teoria das falhas de mercado. O primeiro trata do excesso de poupança global gerado pelos superávits em transações correntes dos países em desenvolvimento, que teriam pressionado as taxas de juros de longo prazo dos EUA para níveis progressivamente baixos, contribuindo, assim, para uma bolha de preços dos imóveis nos EUA.

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O segundo argumento dá ênfase às vulnerabilidades internas da economia estadunidense que estariam associadas aos seguintes fatores: a regulação e supervisão dos mercados financeiros, o shadow banking system, as instituições grandes demais para falir e risco moral, as políticas de remuneração do mercado financeiro, o novo modelo de negócio bancário, e, por fim, as soft-frauds nos mercados de concessão de crédito imobiliário.

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Capítulo 1- Argumentos Hard-Core: política monetária e intervenção

governamental no mercado imobiliário

1.1 - Introdução

Aventada nos trabalhos de Taylor (2007, 2008, 2009a, 2009b, 2010, 2013), a corrente interpretativa associada às falhas de governo propõe que a crise financeira teria sido resultado, basicamente, da combinação de três fatores: adoção de uma política monetária excessivamente relaxada no início da década de 2000, erro de diagnóstico sobre a verdadeira natureza da crise (de solvência e não de liquidez) e excesso de intervenção governamental no mercado imobiliário residencial. O conjunto desses fatores, segundo o autor, representou graves desvios da política econômica em relação ao regime que havia funcionado bem durante as três décadas da “Grande Moderação”14: a política econômica teria se tornado mais intervencionista, menos baseada em regras claras e menos previsível.15 A crise financeira teria sido uma decorrência direta desta mudança de rumo de política econômica, discricionária e intervencionista.

Neste sentido, permeia todo o argumento da abordagem hard a suposição implícita de que a intervenção governamental, seja via política monetária discricionária16, seja via intervenções no mercado imobiliário, provoca desvios de um suposto curso natural de desenvolvimento econômico equilibrado, mediante a má alocação de recursos privados gerada pela distorção “artificial” do sistema de preços relativos. Em outras palavras, a condução desta política econômica com viés discricionário perturba a eficiência alocativa gerada pelos sistemas de preços de mercado e provoca alocação de recursos de forma ineficiente. Portanto, o foco da análise desta

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A expressão “Grande Moderação” refere-se ao período de diminuição de volatilidade macroeconômica nos EUA desde a década de 1980 até a eclosão da crise financeira em 2007/2008. Durante este período, as oscilações tanto do produto agregado quanto dos índices de inflação foram bastante baixas (Taylor, 2010).

15 Taylor (2010, p. 166) é bastante claro sobre este ponto: “The Great Moderation ended because of a “Great Deviation,” in which economic policy deviated from what was working well during the Great Moderation. Compared with the Great Moderation, policy became more interventionist, less rules-based, and less predictable.” 16 Em linhas gerais, a ação discricionária da política monetária se contrapõe à ação baseada em regras. A primeira refere-se a uma situação na qual a oferta monetária é graduada ao sabor das necessidades da economia, e a segunda estabelece metas de taxas de crescimento estáveis do agregado monetário ou ajusta a taxa de crescimento do agregado monetário em função, grosso modo, do objetivo de controlar a inflação via ajustes na taxa de juros básica para não perturbar o livre funcionamento das forças de mercado e manter a estabilidade de preços. Vale destacar que o tratamento da taxa básica de juros como o único instrumento de política monetária passa a valer de forma mais contundente na macroeconomia mainstream dos últimos anos, ancorada no “Novo Consenso”. Para uma crítica de caráter não-mainstream, ver, por exemplo, Arestis e Sawyer (2008).

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corrente recai sobre argumentos que buscam identificar como as ações e intervenções governamentais teriam contribuído para causar a crise financeira.

Destaca-se também que, para esta corrente interpretativa, a intervenção governamental no mercado imobiliário residencial não é o principal determinante da crise. A ênfase é colocada sobre o caráter discricionário17 da política monetária expansionista, principal fator subjacente à alta de preços no mercado imobiliário. Para Taylor, se o Fed tivesse mantido as taxas de juros em patamares sugeridos pela “Regra de Taylor” – neste caso, acima do efetivamente adotado – a expansão do mercado imobiliário poderia ter sido bem mais moderada. Em outras palavras, o núcleo da argumentação deste autor refere-se à hipótese de que a adoção de uma política monetária demasiadamente relaxada pelo Fed teria pressionado as taxas de juros de curto prazo para níveis progressivamente baixos, o que promoveu a expansão de crédito residencial e a formação da bolha imobiliária.

Este capítulo está organizado em três seções, além desta introdução. A primeira ilumina como esta corrente percebe na atuação do banco central dos EUA a responsabilidade pela criação de uma bolha de crédito imobiliário, ao manter as taxas de juros curtas baixas por muito tempo. A segunda chama a atenção para as ações vacilantes do governo estadunidense ao enfrentar a crise, baseadas em erros de diagnóstico sobre sua verdadeira natureza, dado que os responsáveis não teriam sido capazes de perceber a extensão dos problemas dos bancos, muito mais relacionados a uma crise de solvência do que a uma de liquidez. E, por fim, a terceira seção trata da excessiva intervenção governamental no mercado imobiliário residencial.

1.2 - Política Monetária e Regra de Taylor

Antes de iniciar a apresentação sobre os argumentos de Taylor, cabe considerar que, nas últimas décadas, a condução da política monetária – fundada essencialmente nos preceitos do “Novo Consenso Macroeconômico” (NCM), em muitos países, incluindo os EUA18

, mesmo que não

17 “A defining characteristic of monetary policy during this decade has been the highly discretionary and unpredictable nature of the changes in the policy instruments, especially in contrast to the steadier rules-based policy of the 1980s and 1990s” (Taylor, 2013, p. 01).

18 Embora o Fed nunca tenha adotado formalmente a política de metas inflacionárias, é notório seu compromisso, desde os anos 1980, em não permitir que a inflação voltasse a sair de controle. O ponto central é que o Fed, diferentemente de outros bancos centrais que têm o objetivo único de manter a estabilidade de preços, tem um duplo mandato: estabilidade de preços e de emprego. (Bernanke, 2010; Vercelli, 2010; Palley, 2012).

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explicitamente – tornou-se o principal instrumento de política econômica e operou baseada, quase que exclusivamente, na utilização da taxa de juros como seu instrumento-chave. Em outras palavras, a política monetária não só se tornou o principal pilar da política macroeconômica, como também foi reduzida a um modelo operacional que preconiza um alvo (metas de inflação) e um instrumento (taxa de juros), ou seja, a política monetária foi prioritariamente direcionada para a manutenção da estabilidade de preços correntes (Arestis & Sawyer 2008, p. 01).19

Segundo Taylor (2008, 2009 e 2010), a origem da crise financeira reside no estouro da bolha imobiliária. Esta, por sua vez, teria sido gerada pela adoção de uma política monetária expansionista no início da década de 2000. Ao reduzir e manter as taxas de juros de curto prazo em patamares demasiadamente baixos, a política monetária conduzida pelo Fed teria contribuído para aumentar a demanda por residências, inflar, sobremaneira, seus preços e incentivar os agentes econômicos a buscar rendimentos mais altos e tomar posições mais arriscadas. Nas palavras do autor:

Like most financial crises, this one was originally due to monetary excesses which led to a huge boom—especially in housing—followed by a bust with defaults, toxic assets and failed financial institutions. In the case of this crisis the empirical evidence shows clearly that the most important precipitating factor was monetary policy. Interest rates were held too low for too long, remaining at one percent for several years into the expansion that began in 2001, and then rising very gradually. Rates stayed very low as housing price inflation went from single to double digits. This policy increased the demand for housing, increased housing price inflation, and encouraged a search for yields and excessive risk taking (Taylor, 2009, p. 01).

Mais especificamente, Taylor entende que a raiz do problema reside no desvio prolongado da taxa de juros de curto prazo em relação àquela definida pela regra que carrega seu nome, a “Regra de Taylor”. A regra de Taylor consiste em uma regra de política monetária que os bancos centrais deveriam seguir com base nas variações da inflação e no hiato da produção. O objetivo maior desta política é manter a taxa de inflação dentro do intervalo estabelecido pela autoridade monetária em termos da escolha de uma taxa nominal de juros e não de uma taxa de crescimento dos agregados monetários. Tal regra foi originalmente proposta em Taylor (1993, p. 202) conforme a seguinte equação:

19 Na macroeconomia mainstream dos últimos anos, fortemente associada ao “Novo Consenso Macroeconomico”, é valida a igualdade entre política monetária e política da taxa de juros, como seu único instrumento: “Monetary policy has not only become the major element in macroeconomic policy but has also been placed in a one instrument–one target framework with interest rate as the instrument and inflation as the target (…)” (Arestis & Sawyer 2008, p. 01).

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𝑖𝑡= 4 + 1,5(𝜋𝑡− 2) + 0,5𝑧𝑡

Onde, 𝑖𝑡 é a taxa de juros nominal de curto prazo (no caso estadunidense, a Fed fund rate), 𝜋𝑡 é a taxa efetiva de inflação e 𝑧𝑡 é o hiato de produto expresso em porcentagem como o desvio entre o produto efetivo e o produto potencial. Além disso, a regra assume uma meta de inflação de 2%, bem como uma taxa de juros real de também 2%. Ou seja, a regra de Taylor implicitamente assume que existe uma taxa natural de juros (ou taxa de equilíbrio não inflacionária) que o banco central deve ter como alvo a fim de atingir, simultaneamente, o pleno emprego e a estabilidade relativa de preços. Nota-se assim que o Fed, grosso modo, deve conduzir uma política monetária austera quando (𝜋𝑡 > 2) e/ou quando (𝑧𝑡> 0). Por essa razão, Taylor argumenta que, a partir do início dos anos 2000, o desvio sistemático das taxas de juros praticadas pelo Feddaquelas que seriam recomendáveis, caso se seguisse a regra de Taylor, incentivou o excesso de endividamento dos agentes econômicos, pois deslocou a taxa de juros de seu patamar de equilíbrio e a economia de sua trajetória de crescimento de longo prazo, gerando, como consequência, a formação da bolha no mercado imobiliário e a subsequente crise financeira. Caso a política monetária tivesse seguido as diretrizes propostas por sua regra, argumenta o autor, boa parte dos problemas provavelmente poderia ter sido evitada.

Taylor (2008), com o propósito de dar densidade empírica a seu argumento, realizou, conforme ilustrado no Gráfico 1, uma comparação entre a evolução da taxa de juros efetiva do período (linha azul do Gráfico 1) e a evolução de outra série, construída por ele, (linha preta do Gráfico 1), com base em uma estimativa de qual deveria ter sido a taxa de juros perseguida pelo Fed caso ele tivesse seguido a sua regra de política monetária. Segundo ele, a trajetória das duas taxas permite observar que, ao longo de praticamente todo o período, a taxa de juros determinada pelo Fed esteve abaixo daquela sugerida pela regra de Taylor, evidenciando que a condução da política monetária americana foi excessivamente frouxa.20 Em outras palavras, tal conclusão sugere que, se a autoridade monetária tivesse mantido as taxas de juros de curto prazo nos patamares indicados pela respectiva regra, ou seja, acima da efetivamente adotada pelo Fed, a expansão do mercado imobiliário americano teria sido bem mais moderada, e a crise poderia ter

20 O Fed, operando sob esta regra, teria iniciado um ciclo de aperto em 2002, com taxas de juros previstas para subir até o patamar de 7,25% até 2006. Usando simulações com dados do mercado imobiliário entre 2000 e 2006, Taylor (2007, 2008, 2009) argumenta ainda que este aperto teria evitado grande parte do boom imobiliário.

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sido evitada ou ao menos limitada ao próprio mercado imobiliário, sem atingir proporções sistêmicas.

Gráfico 1 – Taxa de juros do Fed e taxa de juros estimada com base na Regra de Taylor (%)

Fonte: extraído de Taylor (2009)

Seguindo essa linha de pensamento, o período compreendido entre meados da década de 1980 e início dos anos 2000, conhecido como “Grande Moderação”, seria um exemplo de como a “adequada” condução da política monetária, teria sido capaz de gerar resultados tão positivos para a economia. Durante essas décadas, as taxas de juros e a condução da política monetária foram consistentes com a regra proposta, bem como os resultados macroeconômicos foram caracterizados por baixa inflação e baixa volatilidade das taxas de crescimento do produto agregado. Ou seja, ao fim e ao cabo, o ponto central do argumento refere-se às desmedidas intervenções discricionárias do Fed, que não seguiu a regra de Taylor (Taylor, 2008). Em suas palavras:

(…) the actual interest rate decisions fell well below what historical experience would suggest policy should be. It thus provides an empirical measure that monetary policy was too easy during this period, or too “loose fitting” as The Economist puts it. This was an unusually big deviation from the Taylor rule. There was no greater or more persistent deviation of actual Fed policy since the turbulent days of the 1970s. So there is clearly evidence that there were monetary excesses during the period leading up to the housing boom (Taylor, 2008, p. 02).

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In my view, if the Fed had followed, during the 2003-2005 period, the type of monetary policy that it had followed in much of the 1980s and 1990s we would have been able to avoid this crisis and recession. In my view much of the housing boom and bust and their ramifications would have been prevented (Taylor, 2009, p.04).

No entanto, e de certa forma justificando os erros cometidos pelo Fed, essa corrente entende que a mudança de rumo na condução da política monetária (redução das taxas de juros curtas) teria ocorrido, possivelmente, em resposta à crise das “dot com”21, que ameaçava a economia estadunidense com a possibilidade de recessão, similar à ocorrida no Japão na década de 199022. Apesar das boas intenções do Fed, o efeito prático de tal desvio teria sido o de provocar desequilíbrios na alocação de recursos privados e, consequentemente, a formação da bolha no mercado imobiliário que, em última instância, engendrou a crise financeira. O ciclo de preços em elevação gerado pela expansão do crédito se auto-alimenta ao permitir o sobre-endividamento dos agentes financeiros, das famílias e o refinanciamento das dívidas hipotecárias assim como a entrada de novos tomadores, mais frágeis financeiramente, no mercado imobiliário. Cumpre destacar que fica implícito no argumento desta corrente que, mesmo frente à ameaça de um quadro recessivo colocado pela crise das “dot com”, se o Fed tivesse aumentado a taxa de juros, a economia teria, ainda assim, se recuperado e evitado a formação da crise financeira de 2007/2008 (Taylor 2008, 2009).

Ademais, Taylor (2008), mesmo que de maneira bastante rápida e superficial, faz menção à irresponsabilidade das agências em classificar com notas elevadas títulos lastreados em recebíveis imobiliários duvidosos. As agências, responsáveis por avaliar a qualidade e o perfil de risco do pool de hipotecas a ser securitizado, subestimam os riscos envolvidos nessas operações, seja devido à falta de concorrência entre elas, seja pela falta de responsabilidade sobre os resultados de suas próprias avaliações, seja pela inerente dificuldade em avaliar e precificar o risco devido a sua complexidade. Como resultado, as agências de classificação de risco teriam errado na previsão do preço dos ativos e na avaliação de risco dos empréstimos que serviam de lastro para

21 A crise das “dot com” refere-se ao estouro da bolha de preços nos EUA no início dos anos 2000 das ações das novas empresas de tecnologia da informação e comunicação (TIC) baseadas na internet. .

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O colapso das bolhas especulativas (forte aumento nos preços das ações, terras e imóveis) interrompeu o longo período de crescimento da economia japonesa no pós-guerra. Após apresentar elevadas taxas de crescimento até o início da década de 1990, na segunda metade da década, a economia estagnou, resultando na mais baixa taxa de crescimento entre os principais países desenvolvidos. Os impactos negativos da reversão do processo especulativo contribuíram para que os anos 1990 ficassem conhecidos como a “década perdida”. Para duas referências detalhadas sobre a crise japonesa dos anos 1990, ver Torres (1997) e Canuto (1999).

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as operações de securitização23, estimulado os agentes financeiros a assumirem posições mais agressivas, incluindo operações com empréstimos subprime.

Portanto, segundo o autor, o ciclo de alta (boom) e baixa (burst) do preço dos imóveis residenciais, que se desdobrou na crise financeira, pode ser explicado, em grande parte, pelos excessos monetários cometidos pelo Fed e seu impacto direto sobre a taxa de juros. Ou seja, a crise financeira não poderia ser entendida como resultado de qualquer falha inerente dos mercados ou falta de regulação, mas, sim, como fruto da adoção de uma política monetária demasiadamente expansionista no início da década, especialmente entre os anos de 2002 e 2005, com a preservação da policy rate pelo Fed, em patamares reais negativos (Taylor, 2009).24 Ademais, como detalhado na próxima seção, a crise financeira teria se aprofundado em decorrência da falta de percepção adequada do governo sobre a verdadeira natureza da crise, que a teria diagnosticado como uma simples crise de liquidez, sem perceber a extensão dos problemas que o sistema financeiro americano estava enfrentando.

1.3 - Erro de Diagnóstico e Aprofundamento da Crise

Uma vez constatados os mecanismos e principais fatores que explicariam a origem da crise financeira dos EUA, Taylor (2008, 2009, 2010) apresenta uma interpretação sobre os motivos

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Em linha com a definição proposta por Carvalho et alli (2007), o termo securitização (derivado da palavra inglesa securities, que significa título financeiro) se refere ao processo iniciado e intensificado nos EUA na década de 1980 no qual as instituições financeiras progressivamente mudaram seu padrão de atuação aprofundando a captação de recursos por meio dos mercados de capitais. Em outras palavras, a obtenção de recursos (financiamento) anteriormente realizada nos mercados de crédito, em especial por meio de empréstimos bancários, perde gradualmente espaço para a captação via emissão de papéis (securities) negociados e vendidos no mercado financeiro. De uma forma mais precisa, este processo pode ser dividido em dois tipos distintos: (i) securitização primária que corresponde à colocação direta de papéis (títulos de propriedade como ações, ou de dívida, como bônus, debêntures e commercial papers) em substituição às operações de crédito tradicionais; (ii) securitização secundária, que representa os processos nos quais as obrigações inicialmente geradas na forma de crédito são transformadas em papéis negociáveis no mercado de capitais (a operação de crédito continua sendo realizada, mas o intermediário que contrata o crédito não o mantém em seu balanço). Ou seja, o processo de securitização não se refere apenas à transformação de créditos (recebíveis) em ativos negociáveis à vista (títulos) nos mercados financeiros, mas a um movimento mais amplo relacionado à mudança do modelo clássico de intermediação financeira no qual os bancos comerciais dominavam o mercado de crédito. Portanto, conforme Carvalho et alli (2007, p. 290; itálico no original) “securitização (...) descreve um processo de desintermediação financeira, em que cada vez mais bancos mudam seu padrão de atuação, deixando de ser intermediários de crédito para se tornarem corretores e promotores de negócios.” 24 Taylor, em um artigo intitulado de “How Government Created the Financial Crises”, publicado no Wall Street Jornal em fevereiro de 2009, deixa bastante clara sua confiança na estabilidade inerente dos mercados: “Many are calling for a 9/11 – type commission to investigate the financial crises. Any such investigation should not rule out government itself as a major culprit. My research shows that government actions and interventions – not any inherent failure or instability of the private economy – caused, prolonged and dramatically worsened the crises.

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que levaram à sua propagação e a seu prolongamento, procurando entender como a crise do segmento subprime, mercado relativamente pequeno em volume financeiro, se comparado com o sistema financeiro dos EUA como um todo, transformou-se em uma crise financeira de grande magnitude. Segundo o autor, a crise financeira teria apresentado seus primeiros sinais em agosto de 2007 no mercado de empréstimos interbancários com a drástica elevação das taxas de juros do mercado monetário (ou seja, o financiamento de curto prazo no mercado interbancário tornou-se mais difícil e caro), pois os problemas no segmento subprime teriam rapidamente contaminado os demais segmentos do mercado financeiro dos EUA.25

Para tanto, considera que a crise financeira estadunidense, ao longo de seus primeiros meses, foi diagnosticada equivocadamente como um problema de liquidez, ao invés de um problema de exposição das empresas do sistema financeiro ao risco de contrapartes. Por essa razão, argumenta que as políticas governamentais não teriam abordado o problema de forma assertiva e eficiente, ou seja, ao invés de mitigarem o problema, teriam permitido sua expansão e prolongamento ao longo do tempo26.

In this paper I have provided empirical evidence that government actions and interventions caused, prolonged, and worsened the financial crisis. They caused it by deviating from historical precedents and principles for setting interest rates, which had worked well for 20 years. They prolonged it by misdiagnosing the problems in the bank credit markets and thereby responding inappropriately by focusing on liquidity rather than risk. They made it worse by providing support for certain financial institutions and their creditors but not others in an ad hoc way without a clear and understandable framework. While other factors were certainly at play, these government actions should be first on the list of answers to the question of what went wrong (Taylor, 2008, p. 10).

25 “The financial crisis began to flare up in the interbank loan markets in August 2007 but the severe financial panic did not start until September 2008. Based on equity price movements and interbank borrowing rates, the panic period lasted through October 2008. It spread rapidly around the world, turning the recession into a great recession.” (Taylor, 2013, p.03)

26 Como tradicionalmente definido, o risco de crédito diz respeito à possibilidade de ocorrência de perdas associadas ao não cumprimento pelo tomador ou contraparte de suas obrigações financeiras nos termos e prazos pactuados, gerando inadimplência ou atraso na liquidação de suas obrigações, resultando, consequentemente, perda financeira para a parte credora. Ademais, o risco de contraparte diz respeito à possibilidade de que a contraparte de um negócio não cumpra suas obrigações contratuais. Esta não deixa de ser um risco de crédito, porém, pode existir sem que ocorra uma relação de financiamento/empréstimo, como por exemplo, obrigações relativas à liquidação de operações que envolvam a negociação de ativos financeiros, incluindo aquelas relativas à liquidação de instrumentos financeiros derivativos. Por sua vez, risco de liquidez é definido como o risco associado à possibilidade de o tomador não possuir recursos financeiros suficientes na data prevista para honrar seus compromissos, em razão de descasamento entre fluxos de pagamentos e recebimentos seja: (i) pela dificuldade em negociar rapidamente ativos ou posições que possua, por falta de preço ou de liquidez de mercado; (ii) pela dificuldade para obter funding ou financiamento de sua posição de caixa (Banco Central do Brasil, 2009 – Resolução n. 003721 < https://www3.bcb.gov.br/normativo/detalharNormativo.do?N=109034287&method=detalharNormativo>)

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Para que não restem dúvidas, é importante destacar mais uma passagem deste mesmo artigo de 2008, que transmite a interpretação do autor sobre a natureza da crise financeira e o grave equívoco das autoridades governamentais sobre o diagnóstico e tratamento adequado para enfrentá-la. Para Taylor (2008), não se trataria de um problema provisório de gerenciamento de liquidez, mas das incertezas sobre a efetiva situação dos balanços das instituições financeiras e sua possibilidade de não pagar ou honrar as obrigações assumidas; isso levou a um congelamento dos mercados interbancários, expresso em spreads extremamente elevados.

Diagnosing the reason for the increased spreads was essential, of course, for determining what type of policy response was necessary. If it was a liquidity problem then providing more liquidity by making discount window borrowing easier or opening new windows or facilities would be appropriate. But if the issue was counterparty risk then a direct focus on the quality and transparency of the bank’s balance sheets would be appropriate, either by requiring more transparency, dealing directly with the increasing number of mortgage defaults as housing prices fell, or looking for ways to bring more capital into the banks and other financial institutions (…) the market turmoil in the interbank market was not a liquidity problem of the kind that could be alleviated simply by central bank liquidity tools. Rather it was inherently a counterparty risk issue, which linked back to the underlying cause of the financial crisis. This was not a situation like the Great Depression where just printing money or providing liquidity was the solution; rather it was due to fundamental problems in the financial sector relating to risk which linked back to the underlying cause of the financial crisis (Taylor, 2008, p. 10).

Como pode ser percebido, a elevação das taxas de empréstimo interbancário e os desequilíbrios nos mercados financeiros, segundo Taylor (2008), não estariam relacionados essencialmente à falta de liquidez, mas a uma questão mais profunda acerca da administração de riscos de contraparte – isto é, o risco entendido como a possibilidade de não cumprimento, por determinada contraparte, de obrigações relativas à liquidação de operações que envolvam negociação de ativos financeiros, incluindo aquelas relativas à liquidação de instrumentos financeiros estruturados sobre recebíveis imobiliários – e ao papel desempenhado pelo processo de securitização que, além de tornar os produtos e as operações financeiras mais opacas e complexas – ao vincularem diferentes segmentos do mercado financeiro estadunidense –, foi responsável pela transmissão das perdas no momento da elevação da inadimplência no mercado de hipotecas subprime. A falta de transparência sobre a situação patrimonial de diversas instituições financeiras e a dúvida sobre a sua capacidade de honrar suas obrigações previamente contratadas está na raiz das causas da crise financeira que estoura em meados de 2008. E, ademais, as autoridades governamentais falham em perceber que foi o risco nos balanços das instituições financeiras, e não a falta de liquidez (que na verdade é consequência e não causa dos

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problemas) o cerne da crise financeira desde o seu início, ou seja, a crise se aprofundou em função do caráter hesitante do governo, que a teria diagnosticado como uma simples crise de liquidez, sem perceber a extensão dos problemas dos bancos, o que piorou a situação.27

Doravante, cumpre destacar, segundo Taylor, quais foram as principais medidas28 adotadas pelas autoridades governamentais e quais foram seus impactos, uma vez que as prescrições de “tratamentos” foram equivocadas e acabaram, segundo o autor, agravando e prolongando a crise. Para tanto, o autor elenca três medidas de políticas adotadas entre os anos de 2007 e 2008 com o propósito de ilustrar que o “tratamento” não foi adequado e a crise se desdobrou até sua fase mais aguda, iniciada em meados de 2008, quais sejam:

(i) Cuts in Interest Rates: a terceira resposta de política econômica à crise financeira foi a redução acentuada da taxa de juros de curto prazo (Fed funds rate) no primeiro semestre da crise. A meta da taxa de juros passou de 5,25%, quando a crise começou, em agosto de 2007, para 2% em abril de 2008. No entanto, apesar de admitir ser difícil avaliar em toda sua profundidade os impactos dessa redução, argumenta que seus impactos mais notórios teriam sido a depreciação do valor do dólar e a elevação do preço do petróleo. E, por fim, argumenta mais uma vez que a medida adotada não atinge o ponto central da questão (Taylor, 2008).

(ii) Term Auction Facility (TAF): em dezembro de 2007, com o propósito de gerar maior liquidez, o Fed criou o TAF, facilidade promovida pela autoridade monetária aos bancos, que poderiam evitar a janela de redesconto obtendo recursos diretamente de fundos criados pelo Fed, já que a política de redução da taxa de redesconto não estava tendo o efeito esperado. Seu principal objetivo era o de reduzir os spreads nos mercados de empréstimo interbancários e estimular o fluxo de crédito. Em outras palavras, existia o propósito de aumentar a oferta de liquidez no mercado para que

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Taylor, para explicar seu argumento de forma didática, faz uma analogia com um jogo de cartas bastante difundido nos EUA, a saber: “The idea that counterparty risk was the reason for the increased spreads made sense because it corresponded to the Queen of Spades theory and other reasons for uncertainty about banks’ balance sheets. At the time however, many traders and monetary officials thought it was mainly a liquidity problem” (Taylor 2008, p.10). 28Para dois estudos detalhados sobre a atuação do Fed antes e depois do estouro da bolha imobiliária, ver Bullio at alli (2009) e Ferrara & Carvalho (2014).

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