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Universidade do Minho Escola de Direito. Domínios da Rodovia Municipal

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Universidade do Minho

Escola de Direito

Anabela Gonçalves Meireles

abril de 2020

Responsabilidade Civil Extracontratual dos

Municípios por Culpa in Vigilando: em

Particular a Omissão de Deveres nos

Domínios da Rodovia Municipal

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Anabela Gonçalves Meireles

Responsabilidade Civil Extracontratual dos

Municípios por Culpa in Vigilando: em

Particular a Omissão de Deveres nos

Domínios da Rodovia Municipal

Trabalho efetuado sob a orientação da

Professora Doutora Isabel Celeste M. Fonseca

Dissertação de Mestrado

Mestrado em Direito Administrativo

Universidade do Minho

Escola de Direito

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Universidade do Minho

Escola de Direito

Anabela Gonçalves Meireles

Responsabilidade Civil Extracontratual dos Municípios por Culpa in Vigilando: em Particular a Omissão de Deveres nos Domínios da Rodovia Municipal

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DIREITOS DE AUTOR E CONDIÇÕES DE UTILIZAÇÃO DO TRABALHO POR TERCEIROS

Este é um trabalho académico que pode ser utilizado por terceiros desde que respeitadas as regras e boas práticas internacionalmente aceites, no que concerne aos direitos de autor e direitos conexos.

Assim, o presente trabalho pode ser utilizado nos termos previstos na licença abaixo indicada. Caso o utilizador necessite de permissão para poder fazer um uso do trabalho em condições não previstas no licenciamento indicado, deverá contactar o autor, através do RepositóriUM da Universidade do Minho.

Licença concedida aos utilizadores deste trabalho

Atribuição CC BY

(5)

AGRADECIMENTOS

A realização desta dissertação de Mestrado constitui mais uma vitória no meu percurso profissional. A vitória é minha mas partilho-a com todos aqueles que contribuíram para que eu a pudesse alcançar.

À Professora Doutora Isabel Celeste Monteiro Fonseca, primeiro por ter aceitado ser minha orientadora nesta dissertação de Mestrado, segundo, pela ajuda, disponibilidade e atenção prestada ao longo de todo este percurso.

Aos meus pais que são o pilar da minha vida, por tudo quanto têm feito por mim. Por me ajudarem a realizar todos os meus sonhos e, principalmente, pelo amor incondicional que me transmitem e por estarem sempre ao meu lado em todos os momentos da minha vida.

Ao meu noivo que é o meu porto seguro e o meu companheiro de todas as horas. Pela paciência demonstrada nos momentos mais difíceis. Pelo apoio na realização de todos os meus sonhos. Por acreditar mais em mim do que eu própria e pelo amor de todos os dias.

Aos meus irmãos, cunhados, afilhada e sobrinhos por sempre me levarem para a frente, mesmo quando a minha vontade era ficar parada. Por todo o apoio e amor que nos une.

Às amigas de longa data e aquelas que a vida profissional me trouxe recentemente, pela paciência e ajuda em todos os momentos.

A todos aqueles que não foram mencionados em especifico mas que, de alguma forma contribuíram e me acompanharam ao longo desta caminhada.

(6)

DECLARAÇÃO DE INTEGRIDADE

Declaro ter atuado com integridade na elaboração do presente trabalho académico e confirmo que não recorri à prática de plágio nem a qualquer forma de utilização indevida ou falsificação de informações ou resultados em nenhuma das etapas conducentes à sua elaboração.

(7)

Responsabilidade Civil Extracontratual dos Municípios por Culpa in Vigilando: em Particular a Omissão de Deveres nos Domínios da Rodovia Municipal

RESUMO

É do conhecimento geral que grande parte das vias públicas apresentam deficiências/irregularidades, umas provenientes da própria construção da via, outras decorrentes da falta de conservação, gestão e vigilância pelas entidades competentes.

Quando falamos em vias ou caminhos municipais, falamos em domínio público municipal, cuja administração pertence aos Municípios.

Apesar de pertencer à competência dos Municípios os deveres de gestão, manutenção, conservação, sinalização e vigilância das vias municipais, certo é que diariamente nos deparamos com derivados obstáculos nas vias, desde buracos não sinalizados a pedras levantadas dos passeios do que resulta, muitas vezes, a ocorrência de determinados acidentes e, consequentemente de danos para os particulares.

Os Tribunais Administrativos contam com variadíssimos processos de responsabilidade civil administrativa extracontratual por factos ilícitos, onde se peticiona o pagamento de indemnizações por danos decorrentes da omissão do dever de vigilância por parte dos Municípios.

Uma correta vigilância das vias ajudaria a evitar a ocorrência de grande parte dos sinistros, dado que se conseguiria, atempadamente, remover ou sinalizar determinados obstáculos de forma a que o condutor conseguisse adequar a sua condução aquelas circunstâncias.

Posto em causa o dever de vigilância verifica-se uma presunção de culpa leve por parte dos Municípios, os quais a poderão ilidir mediante prova em contrário, isto é, explicando as providências que em concreto foram levadas a cabo de forma a mostrar que foram cumpridas as exigências legalmente impostas.

Sucede que este dever de vigilância não se encontra definido na legislação, ou seja, o conceito/abrangência deste dever advém de interpretações levadas a cabo pela doutrina e pela jurisprudência resultando, assim, uma discrepância nas decisões judiciais, bem como, decisões injustas, nas maioria dos casos, para os particulares, quando se entenda, erradamente, que o Município consegui ilidir a presunção de culpa que sobre si recaía.

PALAVRAS-CHAVE: Responsabilidade civil administrativa; responsabilidade civil extracontratual dos

(8)

Extra-contractual Civil Liability of Municipalities for in Vigilante: Fault in Particular the Omission of Duties in the Fields of Municipal Highway

ABSTRACT

It’s general knowledge that most of the public roads have deficiencies / irregularities, other occurrences of the construction of the road itself, other threats of the lack of conservation, management and registration by the entities used.

When we talk about municipal roads or paths, we refer to the municipal public domain, whose administration belongs to the municipalities.

Despite the fact that the duties of management, maintenance, conservation, signaling and traffic on municipal roads belong to the competence of the Municipalities, it is certain that on a daily basis we come across with unmar, in the hours with roads with unmarked holes, fallen trees, stones raised from sidewalks, stones of personalized size in full lane and passage of animals, results, often, in some accidents and consequently damage to individuals.

The Administrative Courts have a wide range of administrative non-contractual civil liability proceedings for illegal acts, in which the payment of compensation for damages arising from the omission of the duty of vigilance by the Municipalities is petitioned.

In fact, a correct supervision would avoid way helps to avoid a large part of the claims, since it can be remotely reached, removes the damage or signals them making the driver aware of the danger situation and help him to adapt his driving to the case.

Call into question the duty of supervision verifies a presumption of a slight negligence on the part of the Municipalities, contrary, explaning the measures that in particular were carried out and periodically, to demonstrate that, effectively, the legal requirements imposed have been observed.

It happens that this duty of vigilance is not defined in the legislation, that is, the concept/range of this duty comes from interpretations carried out by the doctrine and the jurisprudence resulting, thus, a discrepancy in the judicial decisions, as well as, unjust decisions, in most cases, for the private individuals, when it is understood, mistakenly, that the Municipality managed to evade the presumption of guilt that fell upon it.

KEY WORDS: Administrative civil liability; non-contratual administrative civil liability of Municipalities;

(9)

INDICE

INTRODUÇÃO ... 1

1.1. A RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA ... 3

1.2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL ADMINISTRATIVA EM PORTUGAL – BREVE DESENVOLVIMENTO ... 6

CAPITULO I ...10

MUNICÍPIOS – MUNDO DO PODER LOCAL ...10

1.3. NOTAS INTRODUTÓRIAS ...10

1.4. VIAS SOB JURISDIÇÃO/ADMINISTRAÇÃO DOS MUNICÍPIOS / RODOVIAS – REPARTIÇÃO DE TAREFAS ...12

1.4.1. DO PLANO RODOVIÁRIO NACIONAL ...13

1.4.2. DO NOVO ESTATUTO DAS ESTRADAS DA REDE RODOVIÁRIA NACIONAL - LEI N.º 34/2015 DE 27 DE ABRIL ...15

1.5. DESCENTRALIZAÇÃO DE COMPETEÊNCIAS AO NÍVEL DAS VIAS DE COMUNICAÇÃO: LEI N.º 50/2018, DE 16 DE AGOSTO E DECRETO-LEI N.º 100/2018 DE 28 DE NOVEMBRO ...16

1.6. REDE MUNICIPAL: CONCLUSÕES ...22

1.7. ATRIBUIÇÕES E COMPETÊNCIAS...23

1.7.1. DA LEI N.º 2110, DE 19 DE AGOSTO ...26

CAPÍTULO II ...29

RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DECORRENTE DA FUNÇÃO ADMINISTRATIVA POR FACTOS ILÍCITOS - REGIME PREVISTO NA LEI N.º 67/2007, DE 31 DE DEZEMBRO ...29

1.1. NOTAS INTRODUTÓRIAS ...29

1.2. RESPONSABILIDADE CIVIL ADMINISTRATIVA: MODALIDADES ...31

1.3. REGIME PREVISTO NA LEI N.º 67/2007, DE 31 DE DEZEMBRO ...32

1.3.1. RESPONSABILIDADE DECORRENTE DO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO ADMINISTRATIVA POR FACTO ILÍCITO ...33

1.3.2. ANÁLISE AOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL ADMINISTRATIVA POR FACTO ILÍCITO ...35

(10)

1.3.4. DANO ...45

1.3.5. NEXO DE CAUSALIDADE ...45

1.3.6. APLICAÇÃO DA RESPONSABILIDADE AOS MUNICIPIOS: BREVES CONCLUSÕES ...47

CAPITULO III ...48

CULPA IN VIGILANDO ...48

1.4. CONTRIBUTO DO CÓDIGO CIVIL E DA LEI N.º 67/2007, DE 31 DE PARA A DEFINIÇÃO DO DEVER DE VIGILÂNCIA ...50

1.5. CONTRIBUTO DA JURISPRUDÊNCIA ...51

1.5.1. JURISPRUDÊNCIA À LUZ DO REGIME ANTERIOR – DECRETO-LEI N.º 48 051, DE 22 DE NOVEMBRO DE 1967 ...52

1.5.2. JURISPRUDÊNCIA À LUZ DA LEI N.º 67/2007, DE 31 DE DEZEMBRO ...58

1.5.3. JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS JUDICIAIS ...62

1.6. BREVES CONCLUSÕES ...65

CONCLUSÃO ...68

BIBLIOGRAFIA ...72

(11)

ABREVIATURAS

CC – Código Civil CE – Código da Estrada

CRP – Constituição da República Portuguesa DL – Decreto–Lei

ETAF – Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais Pág - Página

RJAL – Regime Jurídico das Autarquias Locais

RRCEE – Regime Jurídico da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas

SS - Seguintes

STA – Supremo Tribunal Administrativo TAF – Tribunal Administrativo e Fiscal

(12)

INTRODUÇÃO

O tema da nossa dissertação de Mestrado aborda, essencialmente, a responsabilidade civil administrativa extracontratual dos Municípios por culpa in vigilando, das vias públicas.

Assim, entendemos por conveniente começar por referir que entre nós vigora o princípio do qual resulta que todo aquele que causar danos a outrem tem a obrigação de o indemnizar pelos danos sofridos.

Atualmente, este princípio da responsabilidade estende-se à Administração Pública como não poderia deixar de ser. Mas certo é que, durante anos, vigorou entre nós o princípio na irresponsabilidade do Estado – “The King can do no wrong”.

Ultrapassado este panorama, a Administração Pública passou a responder pelos danos causados aos particulares, no exercício das suas funções administrativa, político-legislativa e jurisdicional, cujo regime se encontra, atualmente previsto na Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro. De facto, só com este diploma legal é que vimos regulada a responsabilidade civil administrativa extracontratual pelos danos decorrentes de todas as funções da Administração, dado que o Decreto-Lei n.º 48 051 de 21 de novembro de 1967 (antecedente da Lei n.º 67/2007) apenas regulava a responsabilidade civil administrativa extracontratual pelos danos decorrentes da função administrativa.

A responsabilidade civil administrativa foi alvo de grandes evoluções e a verdade é que, ainda hoje, com o novo regime, não vemos resolvidos todos os problemas dos particulares de forma justa e equitativa.

Pensemos, agora, no caso concreto que constitui o objeto da nossa dissertação de Mestrado – Responsabilidade Civil Administrativa Extracontratual dos Municípios por culpa in vigilando das vias municipais - sobre este tema, que se integra na responsabilidade civil administrativa extracontratual por danos decorrentes da função administrativa, haverá muito a dizer. Vejamos:

Não é surpresa para ninguém que as vias municipais do nosso país apresentam determinadas deficiências e irregularidades, umas provenientes da própria construção, outras decorrentes da falta de conservação, gestão, manutenção, sinalização e fiscalização por parte das entidades competentes.

As estradas ou caminhos municipais pertencem ao domínio público municipal e, portanto, a sua administração é da competência dos Municípios, recaindo sobre estes os deveres de conservação, gestão, manutenção e vigilância das vias de comunicação (municipais).

(13)

Acresce que, os Municípios, conforme teremos oportunidade de analisar, podem também ter competências de gestão sobre outras vias que não se integrem na rede municipal mas que, devido à sua proximidade em relação aquelas, foi-lhes transferida essa competência.

Apesar de estarem legalmente previstos estes deveres, o certo é que diariamente nos deparamos, nas vias municipais, com obstáculos não sinalizados, designadamente: despressão (buraco), árvores caídas, pedras levantadas dos passeios, pedras de porte considerável em plena faixa de rodagem, lençóis de água, levantamento de tampas de saneamento e passagem de animais, do que resulta, muitas vezes, a ocorrência de determinados sinistros e, consequentemente, de danos para os particulares.

Os factos supramencionados resultam, como bem se compreende, de uma clara omissão dos deveres de gestão, conservação, manutenção e sinalização, os quais só poderão ser levados a cabo se, efetivamente, for cumprido o dever de vigilância.

São inúmeros os processos de responsabilidade civil administrativa extracontratual por omissão dos deveres de vigilância que correm termos nos Tribunais Administrativos, onde a parte demandante são os particulares e a parte demandada são os Municípios.

Quando posto em causa o dever de vigilância verifica-se uma presunção de culpa leve a favor do lesado, a qual poderá ser ilidida pelos Municípios, mediante prova em contrário, isto é, explicando as providências que em concreto foram levadas a cabo e com que periocidade, de forma a demonstrar que efetivamente foram cumpridas exigências legalmente impostas.

Assim, perguntamos: o que é afinal o dever de vigilância e onde é que o mesmo se encontra definido? Assim como, onde podemos encontrar definidos os critérios para aferição do cumprimento desse dever?

Perguntamos também: o que estará a falhar? Estarão os particulares a aproveitar este “benefício” que o legislador estabeleceu no que diz respeito à presunção de culpa dos Municípios, para obterem indemnizações por danos decorrentes de acidentes da sua própria responsabilidade? Ou, por sua vez, estarão, de facto, os Municípios a incumprir com os deveres a que se encontram adstritos em relação às vias municipais, invocando fundamentos que não permitem, de forma alguma ilidir a presunção de culpa que sobre si recai?

Pois bem, é a tudo isto que nos propomos responder com esta dissertação de Mestrado. Nesse sentido, entendemos pertinente, ainda em sede de introdução fazer um enquadramento constitucional da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, bem como uma breve abordagem à evolução história da responsabilidade civil administrativa.

(14)

Finda a secção destinada à introdução, iniciaremos o desenvolvimento do nosso trabalho cientifico, o qual será constituído por três capítulos: no primeiro capitulo dedicaremos a nossa atenção ao estudo das vias sob jurisdição do Município, bem como às atribuições e competências que aquele detém sobre aquelas vias.

Por sua vez, no segundo capítulo faremos uma abordagem à responsabilidade civil extracontratual administrativa com base no regime previsto na Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, de forma a conseguirmos perceber onde é que a responsabilidade dos Municípios se insere. E, faremos, ainda, neste capítulo, uma análise aos pressupostos daquela responsabilidade.

Finalmente, no capítulo terceiro, último capítulo da nossa dissertação, iremos abordar a culpa in vigilando, sobre a qual teceremos algumas considerações gerais e, de seguida, traremos a análise de vários acórdãos de forma a percebermos que contributo a jurisprudência nos dá para definição do dever de vigilância, bem como dos critérios que são utilizados para aferir o cumprimento ou incumprimento daquele dever.

1.1. A RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA

Só com a Constituição de 1976 é que vimos regulado, pela primeira vez, em Portugal, o

princípio geral da responsabilidade do Estado e Demais Entidades Públicas1.

Nesse sentido, dispõe o artigo 22.º da Constituição da República Portuguesa, doravante

designada CRP: “ O Estado e demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma

solidária com os titulares do seus órgãos, funcionários ou agentes, por ações ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte a violação dos direitos,

liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.”2

O artigo transcrito constitui, assim, uma inovação em relação aos anteriores textos constitucionais, uma vez que, na CRP de 1822 estava prevista a responsabilidade pessoal exclusiva dos funcionários, tendo mais tarde, em 1826, passado a constar da Carta Constitucional, no artigo

145.º-27.º: “Os Empregados Públicos são estritamente responsáveis pelos abusos, e omissões, que

1 Na abordagem deste tema, socorremo-nos da obra de CANOTILHO, Gomes ; MOREIRA, Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa – Anotada -

3.ª edição revista , pág. 167

(15)

praticarem no exercício das suas Funções, e por não fazerem efectivamente responsáveis aos seus subalternos.”

Tal entendimento – responsabilidade pessoal do funcionário - manteve-se também no texto da CRP de 1838, tendo as Constituições de 1911 e 1933 deixado de fazer, em específico, referência à responsabilidade dos funcionários públicos.

Assim, só com a CRP de 1976, é que é dado o salto no sentido de se afastar o regime da

irresponsabilidade do Estado e da responsabilidade exclusiva do funcionário a título pessoal, marcando-se o início de uma nova era.

No que diz respeito aos destinatários do artigo 22.º, consideram GOMES CANOTILHO E VITAL

MOREIRA3 que os destinatários do disposto no artigo 22.º são o “Estado e demais entidades públicas”

– o que significa que aquela responsabilidade pode ser imputada a “todas as administrações (estadual, local, autónoma e institucional), sem excepção.”

Por sua vez, do lado dos sujeitos lesados, os destinatários daquela norma são todos aqueles que sofreram prejuízos causados, quer por ações, quer por omissões dos titulares dos órgãos, funcionários ou agentes do Estado e Demais Entidades Públicas.

Do artigo supramencionado resulta implícito o princípio da responsabilidade patrimonial direta do Estado e Demais Entidades Públicas, o qual se encontra, em termos de grau de importância e como princípio estruturante do Estado de Direito Democrático, ao lado dos princípios da legalidade, com

previsão legal no artigo 3.º e do princípio da judicialidade previsto no artigo 20.º ambos da CRP.4

Ainda a respeito do artigo 22.º da CRP, importa referir que em relação à natureza jurídica do

mesmo, existem duas teses: uma objetivista e outra subjetivista.5 Em relação à tese objetivista, os seus

defensores entendem que a norma constitui uma garantia institucional, não atribuindo direitos

subjetivos aos particulares6. Por sua vez, os defensores da tese subjetivista entendem que a

responsabilidade que resulta do artigo 22.º, corresponde a um direito fundamental de natureza análoga

aos direitos, liberdades e garantias.7

3 Ibidem, pág. 168

4 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado, Responsabilidade Civil Administrativa, Direito Administrativo Geral – Tomo III, Dom Quixote, Maio de

2008, pág.

5FONSECA, Isabel Celeste M., Direito Administrativo II - Roteiro Teórico-Prático, Elsa Uminho, 2019, pág. 280

6 VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos, Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 5.ª edição, Almedina, 2012, pág. 136. 7 CANOTILHO, Gomes; MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa anotada, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra editora, 2007, pág. 425.

(16)

Neste sentido, o Tribunal Constitucional8 veio qualificar o artigo 22.º da CRP como uma

garantia institucional, qualificação que teve por base a tese objetivista.

A este respeito e acompanhando a linha de pensamento de ISABEL FONSECA9 que, por sua

vez, se socorre dos ensinamentos de MELO ALEXANDRINO, o qual define garantias institucionais

como: “realidades jurídicas não subjetivadas ondem obtêm proteção, através de uma norma

constitucional, determinadas figuras típicas de um setor da realidade económica ou social.”

Com base naquela definição entende a Autora que não deverá ser aquela a natureza do artigo 22.º da CRP fundamentando: “ainda que se encontre fora do catálogo dos direitos fundamentais, a sua intencionalidade, estrutura e função, fazem inclinar, desde logo, para a tese subjetivista”.

Acrescenta ainda, “O artigo 22.º não depende da lei para poder ser invocado pelo lesado nem constitui uma norma programática. Admitindo que de garantia se possa tratar, porque “constitui uma garantia de liberdade e limitação do poder e postula uma atitude geral de respeito por parte das entidades públicas”, concluindo: “então poderá tratar-se de uma garantia de direito, nunca de uma mera garantia institucional”.

Finalmente, em relação ao alcance deste mesmo artigo, efetivamente, a responsabilidade das entidades públicas poderá resultar de qualquer ato lesivo dos direitos dos particulares, quer seja uma ação, quer seja uma omissão, sendo importante esclarecer que o direito à indemnização/reparação dos danos provocados, apesar da norma não o mencionar expressamente, não se limita à violação de posições subjetivas juridicamente protegidas, abrangendo, também, prejuízos causados,

independentemente de tal violação, como é o caso da responsabilidade pelo risco e por factos lícitos.10

Além disso, entende-se que a norma não diz respeito apenas à função administrativa, englobando também a função jurisdicional e político-legislativa, até porque, além de constar do próprio

artigo a palavra “funções” e não apenas “função”, a norma refere-se a vários elementos que nos

permitem chegar a este conclusão. Desde logo, pela conjugação da norma do artigo 22.º com o .º 5 do artigo 27.º (privação inconstitucional ou ilegal da liberdade (mesmo quando decretada por um juiz)) ou com o n.º 6 do artigo 29.º da Constituição (condenação injusta, por exemplo em caso erro judiciário), verificamos que está em causa a função jurisdicional. Mais a mais, a designação “titulares dos seus

8 Acórdão do Tribunal Constitucional, Processo n.º 236/04 de 13 de abril de 2004, disponível em www.dgsi.pt 9 FONSECA, Isabel Celeste M., Direito Administrativo II - Roteiro Teórico-Prático, Elsa Uminho, 2019.pág. 281 e 282 10 AMARAL, Diogo Freitas, Curso de Direito Administrativo, Volume II, 2.ª edição, Almedina, 2013, pág. 699

(17)

órgãos”, que consta no artigo 22.º, corresponde aos magistrados judiciais, titulares de órgãos de

soberania - os tribunais11.

Já em relação à função legislativa, refere CANOTILHO E VITAL MOREIRA12: “(...) não é

despropositado considerar que quem edita normas exerce uma função e tem o dever jurídico-funcional e jurídico-constitucional de observar as vinculações jurídicas próprias de um Estado de Direito (...). Por isso, no caso de prejuízos causados directamente por uma norma por uma norma inconstitucional (ou pelo não exercício de uma obrigação normativa) o Estado fica constituído no dever de indemnizar, cabendo à lei geral sobre a responsabilidade do Estado a definição dos pressupostos deste dever.”

Finalmente, daquela norma jurídica constitucional resulta, além da obrigação de reparação dos danos provocados aos particulares no âmbito do exercício da atividade administrativa, a responsabilidade solidária, uma vez que o particular lesado poderá demandar o Estado, ou os funcionários e agentes, ou ambos em simultâneo.

Nesse sentido, o direito de regresso do Estado sobre os titulares do órgãos, funcionários e

agentes do Estado é também regulado pela CRP, constando do n.º 4 do artigo 271.º: “A lei regula ao

termos em que o Estado e as demais entidades públicas têm direito de regresso contra os titulares dos seus órgãos, funcionário e agentes.”

Em forma de conclusão verificamos que da CRP resultam quatro princípios respeitantes à responsabilidade da Administração Pública: o princípio da responsabilidade da Administração Pública como forma de proteção dos direitos fundamentais; o princípio do respeito pelos princípios da legalidade, justiça, imparcialidade, proporcionalidade, necessidade e igualdade; o princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos e, o princípio da responsabilidade da Administração Pública como princípio estruturante do Estado de Direito.

1.2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL ADMINISTRATIVA EM PORTUGAL – BREVE DESENVOLVIMENTO

A responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública nem sempre teve os contornos que assume nos dias de hoje. No entanto, apesar da evolução histórica que se fez sentir,

(18)

ainda assim, não vemos resolvidos de forma justa e equitativa todos os problemas com que muitos particulares se deparam por via de atos/omissões decorrentes da atividade administrativa.

Contudo, verificamos que, ao longo do tempo, tem sido feito um esforço, por parte dos doutrinários e legisladores, no sentido de se alterar a situação de irresponsabilidade do Estado e Demais Entidade Públicas como se experienciou outrora.

De facto, durante a época do Estado Absoluto não se previa a responsabilidade do poder público quando este causasse danos aos particulares, ou seja vigorava nesse tempo o princípio da

irresponsabilidade do Estado13 – “The King can do no wrong”.

Já no período do Estado de Polícia passou a aceitar-se a responsabilidade do Estado, mas apenas no que concerne às relações patrimoniais estabelecidas com os particulares, sendo que, nos restantes casos, apenas poderiam ser responsabilizados, ainda que em situações muito pontuais, os funcionários administrativos, a título pessoal, tal como decorre do artigo 14.º da Constituição de 1822.

Também na Carta Constitucional de 1826, do artigo 145.º-27.º constava: “Os Empregados

Públicos são estritamente responsáveis pelos abusos, e omissões, que praticarem no exercício da suas

Funções, e por não fazerem efectivamente responsáveis aos seus subalternos.14”

Neste sentido também o artigo 26.º da Constituição de 1838 previa: “os Empregados Públicos são responsáveis por todo o abuso e omissão pessoal no exercício de suas funções, ou por não fazer efetiva a responsabilidade de seus subalternos. Haverá contra eles ação popular por suborno, peita,

peculato ou concussão.”15

As Constituições que se seguiram, mormente a dos anos de 1911 e 1933, não fizeram menção, em especifico, à responsabilidade dos funcionários públicos pelos danos praticados no

exercício das suas funções, constando do artigo 3.º - 30.º da Constituição de 1911: “todo o cidadão

poderá apresentar aos poderes do Estado reclamações, queixas e petições, expor qualquer infracção da Constituição e, sem necessidade de prévia autorização, requerer perante a autoridade competente

efectiva responsabilidade dos infractores”16

13 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado, Responsabilidade Civil Administrativa, Direito Administrativo Geral – Tomo III, Dom Quixote, maio de

2008, pág.

14 Constituição de 1826 15 Constituição de 1838 16 Constituição de 1911

(19)

Por sua vez, a Constituição de 1933 dispunha, no artigo 8.º - 17.º: “o direito de reparação de toda a lesão efetiva conforme dispuser a lei, podendo esta, quanto a lesões de ordem moral,

prescrever que a reparação seja pecuniária.”17

Finalmente, no âmbito Constitucional foi consagrado, pela primeira vez, na Constituição de 1976, o princípio geral de responsabilidade direta do Estado e demais entidades públicas, marcando, assim, o início de uma nova era.

Assim, no plano infraconstitucional o Código Civil - Código de Seabra (1867) 18 regulava a

irresponsabilidade do Estado em relação aos danos que fossem provocados aos particulares no exercício da atividade de execução da lei, sendo que, quanto a danos provocados por atividades ilícitas, a responsabilidade era atribuída aos funcionários administrativos, a título pessoal.

Só nos anos 30 do século XX, vimos regulada a responsabilidade civil administrativa extracontratual por atos ilícitos de gestão pública, sendo feita, no ano de 1930, uma revisão ao Código Civil, passando a constar do mesmo a responsabilidade solidária do Estado em relação à obrigação de indemnização.

Já em 1936, e no seguimento das alterações anteriores, passou também a constar do Código Administrativo a responsabilidade civil das Autarquias Locais, proveniente de danos causados aos particulares, por via da prática de atos ilegais de gestão pública, os quais correspondiam às atribuições e competências daquelas. No entanto, manteve-se a responsabilidade a título pessoal, conforme artigos 310.º e 311.º do Código Administrativo de 1936 e artigos 366.º e 367.º do Código Administrativo de 1940.

Em 1966 foram consagradas, pela primeira vez, disposições relativas à responsabilidade civil

administrativa extracontratual por atos de gestão privada, conforme previsto nos artigos 500.º e 501.º

do CC, reservando-se, para lei especial, a disciplina do regime da responsabilidade civil administrativa extracontratual por atos de gestão pública, a qual veio a ser regulada, em diploma próprio, pelo DL n.º

48 05119, de 21 de novembro de 1967. Deste diploma constava apenas o regime da responsabilidade

civil decorrente do exercício da função administrativa, não abrangendo as funções jurisdicional e político-legislativa.

Assim, o DL 48 051 apresentava, essencialmente, quatro soluções, sendo elas: no caso de o dano ser causado por ato pessoal, a responsabilidade era atribuída, em exclusivo, ao funcionário que o

17 Constituição de 1933

18 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de, Responsabilidade Civil Administrativa, Direito Administrativo Geral – Tomo III, Dom Quixote, maio

de 2008, pág. 14

(20)

praticou; se o dano fosse causado por ato funcional doloso, a responsabilidade seria solidária entre o Estado e o funcionário; sendo o dano causado por ato funcional com negligência consciente, havia responsabilidade, em exclusivo, do Estado, com possibilidade de exercício do direito de regresso sobre o funcionário que o praticou; por fim, se o dano fosse causado por ato funcional com negligência inconsciente, havia responsabilidade exclusiva do Estado, sem direito de regresso sobre o funcionário.

Com a criação daquele Decreto-Lei, passou a existir alguma proteção para os particulares, sendo que, também em relação aos funcionários, estes foram salvaguardados pelos erros que praticassem no exercício das funções e por causa delas, com negligência inconsciente.

Apesar da evolução supradescrita, certo é que ainda assim, aquele diploma padecia de algumas insuficiências que foram, durante décadas, solucionadas pela mão da jurisprudência.

Acresce também que o DL 48 051, não correspondia, na íntegra, ao princípio da responsabilidade, enquanto princípio do Estado de Direito Democrático, uma vez que este abrange, além da função administrativa, as funções político-legislativas e jurisdicional, e aquele diploma apenas regulava a responsabilidade no âmbito da função administrativa.

Assim, durante a vigência do DL 48 051, foram muitos aqueles que se debruçaram sobre a necessidade de alterar o diploma em vigor.

Tal alteração veio a suceder com a Lei n.º 67/2007, já alterada pela Lei n.º 31/2008, de 17 de Julho, a qual revogou o DL 48 051.

Este diploma veio, finalmente, concretizar o princípio da responsabilidade do Estado bem

como o princípio do Estado de Direito Democrático20, nos termos do artigo 22.º da CRP.

Além disso, a Lei n.º 67/2007 trouxe alterações significativas no que diz respeito ao regime substantivo da responsabilidade civil da Administração, aproximando o quadro legislativo da jurisprudência dos Tribunais Administrativos e, dando cumprimento à obrigação de transposição de

diretivas comunitárias em matéria de responsabilidade pré-contratual.21

20 MESQUITA RANGEL, Maria José, O Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas e o Direito da União

Europeia, Almedina, 2009, pág. 9

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CAPITULO I

MUNICÍPIOS – MUNDO DO PODER LOCAL

1.3. NOTAS INTRODUTÓRIAS

Como forma introdutória ao tema do presente capítulo começamos por referir que, conforme

dispõe o n.º 1 do artigo 6.º da CRP: “O Estado é unitário e respeita na sua organização e

funcionamento o regime autonómico insultar e os princípios da subsidiariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da Administração Pública.”

Acresce que, de acordo com o pensamento de ISABEL FONSECA, da junção do n.º 1 do artigo 6.º da CRP, que acabamos de transcrever no parágrafo anterior, com o artigo 267.º do mesmo diploma, verifica-se que a organização administrativa do nosso país integra, ao lado da Administração Pública do Estado, um setor de Administração Pública Autónoma, nele se incluindo as Regiões Autónomas da Madeira e Açores; as pessoas coletivas de natureza associativa, como as Ordens Profissionais e as pessoas coletivas de população e território que são as Regiões Administrativas, os

Municípios e as Freguesias.22

Ora, nesse sentido, e uma vez que as Autarquias Locais fazem parte da organização democrática do Estado, importa referir que aquelas são compostas pelo Município, pela Freguesia e pelas Regiões Administrativas, sendo que, no caso dos arquipélagos da Madeira e dos Açores as Autarquias são apenas constituídas pelo Município e pela Freguesia.

O Poder Local, a nível constitucional, encontra previsão legal no título VIII da Parte III – artigos 235.º e ss.

Para o nosso estudo, interessa-nos analisar o regime dos Municípios (sendo esta a categoria mais importante das Autarquias Locais) de forma a percebermos as suas atribuições/ competências no que diz respeito às vias de comunicação da rede municipal.

Começando pelas normas constitucionais, o Município encontra-se previsto nos artigos 249.º a 254.º da CRP, os quais se incluem no Capitulo III do Título VIII da Parte III daquele diploma, resultando do artigo 249.º que a criação ou extinção dos Municípios, bem como alteração da respetiva área é efetuada por lei precedendo consulta dos órgãos das Autarquias Locais abrangidas.

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Quanto à lei ordinária, os Municípios encontram consagração legal na Lei n.º 75/2013 -RJAL23.

Assim, relativamente à composição dos Municípios, resulta do artigo 250.º da CRP e do n.º 2 do artigo 5.º do RJAL, que os órgãos representativos do Município são a assembleia municipal e a câmara municipal, os quais encontram previsão legal: a assembleia municipal nos artigos 251.º da CRP e 24.º e ss do RJAL e a câmara municipal nos artigos 252.º da CRP e artigos 32.º e ss do RJAL.

No que diz respeito às atribuições/competências dos Municípios importa, primeiramente referir que a promoção e salvaguarda dos interesses próprios das respetivas populações, nos domínios previstos no n.º 2 do artigo 7.º e no n.º 2 do artigo 23.º do RJAL, constituem as atribuições das Autarquias Locais, as quais são levadas a cabo, através do exercício, pelos seus órgãos

representativos24, de competências, nomeadamente de consulta; planeamento; investimento; gestão;

licenciamento e controlo prévio e de fiscalização.

A prossecução daquelas atribuições e o exercício das competências deverá obedecer aos princípios da descentralização administrativa, da subsidiariedade, da complementaridade da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos dos cidadãos e, da intangibilidade das atribuições do Estado.

Para levar a cabo os interesses públicos da população de cada Autarquia Local, esta dispõe de património e finanças próprios e serviços municipais, serviços municipalizados e recursos humanos.

De entre as atribuições/competências das Autarquias Locais, a nós interessa-nos analisar aquelas que pertencem aos Municípios no âmbito do domínio público, precisamente no que diz respeito às vias de comunicação. Assim, na secção seguinte passamos a descrever os tipos de vias de comunicação e, posteriormente, analisámos as competências que os Municípios têm em relação às vias que pertencem à sua jurisdição.

23 Diploma que regula o Regime Jurídico das Autarquias Locais, o estatuto das entidades intermunicipais; o regime jurídico da transferência de

competências do Estado para as Autarquias Locais e para as Entidades Intermunicipais, assim como da delegação de competências do Estado nas Autarquias Locais e nas Entidades Intermunicipais e dos Municípios nas Entidades Intermunicipais e nas Freguesias regulando, ainda, o regime jurídico do Associativismo Autárquico.

24 A prossecução daquelas atribuições é levada a cabo pelos Municípios e pelas Freguesias, enquanto órgãos representativos das Autarquias Locais. As

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1.4. VIAS SOB JURISDIÇÃO/ADMINISTRAÇÃO DOS MUNICÍPIOS / RODOVIAS – REPARTIÇÃO DE TAREFAS

Como já referimos em sede de introdução, a nossa dissertação de Mestrado tem como principal objetivo a análise das competências e atribuições dos Municípios em relação às vias de comunicação e correspondente responsabilidade decorrente da omissão do dever de vigilância em relação às mesmas.

Assim, antes ainda de passarmos à analise das atribuições e competências dos Municípios em matéria de vias de comunicação importa, primeiramente, percebermos quais são as vias cuja titularidade e/ou administração pertence aos Municípios, uma vez que as vias pertencentes à rede municipal não se confundem com as vias pertencentes às Infrastruturas de Portugal, doravante

designada I.P25.

Quando falamos em vias de comunicação falamos, automaticamente, em trânsito o qual se verifica nas vias de domínio público do Estado, das Regiões Autónomas e das Autarquias Locais – conforme resulta do n.º 1 do artigo 2.º do CE. De referir que integram também as vias de domínio

público as vias de comunicação terrestre do domínio privado quando abertas ao trânsito público26, bem

como os caminhos que desde tempos imemoriais se encontram no uso direto e imediato de pessoas.27

Isto posto, para que consigamos perceber os tipos de vias de comunicação existentes e aquelas que efetivamente pertencem à administração / titularidade dos Municípios, torna-se necessário uma análise ao Plano Rodoviário Nacional, bem como ao Novo Estatuto da Rede Rodoviária Nacional e, como não poderia deixar de ser, uma análise ao recente diploma legal Lei-Quadro n.º 50 /2018 de 16 de agosto (estabelece o quadros da transferência de competências para as Autarquias Locais e para as

25A fusão entre a Rede Ferroviária Nacional – REFER, E.P.E e as Estradas de Portugal, S. A – EP,S.A surgiu com o objetivo de criar uma única empresa de gestão de infraestruturas de transportes em Portugal, numa visão integrada das infraestruturas ferroviárias e rodoviárias. Com a fusão destas duas empresas consegue, agora, atingir-se dois objetivos essenciais: a gestão integrada das redes ferroviária e rodoviária, potenciando a intermodalidade e a complementaridade entre os dois modos e o aproveitamento das sinergias e do know how de ambas as empresas conseguindo-se uma redução de encargos de funcionamento a nível operacional. O segundo objetivo prende-se com o facto de se ver assegurada a existência de um modelo de negócio financeiramente sustentável, tendo por base linhas de orientação estratégica sólidas, num quadro de modelo de financiamento da infraestrutura ferroviária e da infraestrutura rodoviária que desonera os contribuintes.

Esta fusão originou a incorporação da EP, S.A na REFER, E.P.E, transferindo-se as atribuições e competências daquela para esta, transformando-se, assim, a REFER, E.P.E numa sociedade anónima que passou a denominar-se Infrastrutura de Portugal, S.A, sendo extinta a EP, S.A.

26Salvo o que se encontrar regulado no âmbito de acordo celebrado entre o Estado, as Regiões Autónomas ou as Autarquias Locais e os proprietários dessas vias.

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entidades intermunicipais) e ao Decreto-Lei n.º 100/2018, de 28 de novembro (concretiza a transferência de competências para os órgãos municipais no domínio das vias de comunicação).

1.4.1. DO PLANO RODOVIÁRIO NACIONAL

O Plano Rodoviário Nacional encontra-se regulado pelo Decreto-Lei n.º 222/9828, de 17 de

julho, definindo e classificando a rede rodoviária nacional do continente, a qual é constituída pela rede nacional fundamental e pela rede nacional complementar, conforme dispõe o artigo 1.º daquele diploma, dele constando também a relação entre aquelas redes e ainda a rede de autoestradas, bem como estradas nacionais e regionais.

De referir que o Plano em análise apenas se refere à rede nacional Continental, não se incluindo nele as Regiões Autónomas, dispondo estas de diploma próprio nesta matéria.

Assim, nos termos do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 222/98 integram a rede nacional fundamental os itinerários principais (IP), ou seja, as vias de comunicação de maior interesse nacional, os quais servem de base de apoio a toda a rede rodoviária nacional, e asseguram a ligação entre os centros urbanos com influência supradistrital e destes com os principais portos, aeroportos e fronteiras.

Por sua vez, dispõe o artigo 4.º do mesmo diploma, que a rede nacional complementar integra os itinerários complementares (IC), ou seja aquelas vias que no plano rodoviário nacional estabelecem as ligações de maior interesse regional e as principais vias envolventes e de acesso nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. Integra também as estradas nacionais (EN), assegurando a ligação entre a rede nacional fundamental e os centros urbanos de influência concelhia ou supraconcelhia, mas infradistrital.

Importa referir que nos itinerários principais – IP’S - (pertencentes à rede nacional fundamental), assim como nos itinerários complementares – IC’S – (pertencentes à rede nacional complementar), é proibida a circulação de peões, velocípedes e veículos de tração animal.

A rede nacional de autoestradas, encontra-se prevista no artigo 5.º do Plano Rodoviário Nacional do qual resulta que a mesma é formada pelos elementos da rede rodoviária nacional especificamente projetados e construídos para o tráfego motorizado, que não servem as propriedades, sendo também nesta rede proibida a circulação de peões, animais, veículos de tração animal,

28 Com as alterações introduzidas pela Lei n.º 98/99, de 26 de Julho, pela Declaração de retificação n.º 19-D/98 e pelo DL n.º 182/2003, de 16 de

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ciclomotores e triciclos de cilindrada não superior a 50 cm3 ,veículos agrícolas, comboios turísticos,

assim como veículos insuscetíveis de atingirem velocidade superior a 60km/h, conforme previsto no artigo 72.º do CE.

Consta, ainda, do artigo 8.º do mesmo diploma que, sempre que em cidades médias se justifique, devem prever-se circulares e vias de penetração no tecido urbano, as quais integrarão a

Rede Rodoviária Nacional em condições a acordar entre a Infraestruturas de Portugal29 e as Autarquias

Locais.

Por sua vez, as estradas regionais (ER) encontram-se previstas no artigo 12.º do mesmo Decreto-Lei, tratando-se de vias de interesse supra-municipal e complementares à Rede Rodoviária Nacional, que visam o desenvolvimento e serventia das zonas fronteiriças, costeiras e outras de interesse turístico, bem como a ligação entre agrupamentos de concelhos constituindo unidades territoriais e, ainda a continuidade de estradas regionais nas mesmas condições de circulação e segurança.

Finalmente e, para nós o mais relevante sobre a Rede Municipal, prevê o artigo 13.º do mesmo Decreto-Lei que todas as estradas não incluídas no Plano Rodoviário Nacional pertencerão às redes municipais, através da celebração de protocolos entre as I.P e as Câmaras Municipais e após intervenções de conservação que as reponham em bom estado de utilização ou, em alternativa, mediante acordo equitativo com a respetiva Autarquia.

Poderá também integrar a Rede Municipal, as estradas regionais (ER) nas condições supramencionadas e mediante despacho do Ministro da Tutela do Setor Rodoviário.

De referir que as Redes Municipais são reguladas por diploma próprio – Lei n.º 2110, de 19 de Agosto de 1961, pelo novo Estatuto das Estradas da Rede Nacional Rodoviária e pelas disposições constantes do Decreto-Lei n.º 222/98, nomeadamente, dos referidos artigos 13.º e 14.º.

29O diploma em análise encontra-se desatualizado em alguns aspetos, nomeadamente no que diz respeito a entidades que atualmente se encontram extintas e substituídas por outras, como é o caso da Junta Autónoma, que consta ainda do referido diploma mas que, no entanto, corresponde, atualmente, à Infraestruturas de Portugal, S.A.

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1.4.2. DO NOVO ESTATUTO DAS ESTRADAS DA REDE RODOVIÁRIA NACIONAL - LEI N.º 34/2015 DE 27 DE ABRIL

Por sua vez, o Novo Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional encontra-se regulado

pela Lei n.º 34/2015, de 27 de Abril30 resultando do artigo 1.º que este regulamento estabelece as

regras que visam a proteção da estrada e sua zona envolvente, fixando também as condições de segurança e circulação dos seus utilizadores e as de exercício das atividades relacionadas com a sua gestão, exploração e conservação. Por outro lado, estabelece, também o regime jurídico dos bens que integram o domínio público rodoviário do Estado e o regime sancionatório aplicável aos comportamentos lesivos daqueles bens ou direito com eles conexos e também às situações de incumprimento.

As disposições previstas no referido Estatuto aplicam-se a todas as Estradas que integram a Rede Rodoviária Nacional, às Estradada regionais (ER) e às Estradada Nacionais (EN) desclassificadas que ainda não tenham sido entregues aos Municípios.

Como já referimos, a Rede Rodoviária Nacional, não integra as vias municipais, no entanto, existem determinadas vias que apesar de numa fase inicial pertenceram à I.P poderão, eventualmente, vir a pertencer à rede municipal, conforme resulta de algumas disposições do Estatuto as quais passamos a analisar.

Resulta do artigo 9.º do Estatuto que quando seja construída uma variante, esta construção opera a desclassificação do troço da estrada que aquela substitui sendo que, nestes casos, se o troço desclassificado se mantiver afeto à função rodoviária, deve o mesmo ser entregue ao Município,

procedendo-se, nestes casos, à transferência da titularidade daquela via para o Município respetivo31.

Esta mutação dominial opera-se através da celebração de acordo entre a administração rodoviária e o Município, conforme dispõe o artigo 40.º do Estatuto e que vai de encontro às recentes alterações legislativas, nesta matéria, trazidas pela Lei n.º 50/2018 e concretizadas pelo Decreto-Lei n.º 100/2018, que analisaremos na secção seguinte.

30Doravante designado Estatuto

31Quando o Município não indique que o troço substituído pela variante construída mantém interesse para a função rodoviária municipal, o terreno onde aquela se encontra inserida deve ser desafetado do domínio público do Estado, tendo a I.P o dever de promover a respetiva desafetação.

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Importa referir que aquela mutação dominial está sujeita a prévia autorização da assembleia

municipal, após aprovação pelo IMT, I.P32., sujeito ainda a homologação do membro do Governo

responsável pela área das infraestruturas.

A mutação dominial dos bens de domínio público tem como consequência a transferência da titularidade daqueles, passado a entidade destinatária, no caso falamos dos Municípios, a ser detentor dos poderes e deveres sobre aqueles bens.

Cumpre-nos ainda referir que Estatuto estabelece que os troços de estradas nacionais que se encontram dentro das sedes de conselho ou de centros urbanos de influência concelhia ou

supraconcelhia podem ficar a cargo dos respetivos Municípios mediante acordos de gestão a

estabelecer com a administração rodoviária, a homologar pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, das infraestruturas rodoviárias e das Autarquias Locais e sujeito a publicação no Diário da República.

Concluímos, desde logo, que nos casos de acordos de gestão não se opera uma transferência

de titularidade, mas apenas uma transferência de competências a nível de gestão daquelas vias33.

1.5. DESCENTRALIZAÇÃO DE COMPETEÊNCIAS AO NÍVEL DAS VIAS DE COMUNICAÇÃO: LEI N.º 50/2018, DE 16 DE AGOSTO E DECRETO-LEI N.º 100/2018 DE 28 DE NOVEMBRO

Apesar de tudo quanto já se encontrava estabelecido quer no Plano Rodoviário Nacional quer

no Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional (Lei n.º 34/2015), a Lei-Quadro n.º 50/201834

veio estabelecer o quadro da transferência de competências, a vários níveis, do Estado para as Autarquias locais e para as Entidades Intermunicipais as quais, até então, não lhes pertenciam.

Este quadro de transferência de competências tem como principal finalidade, a concretização da Constituição da República Portuguesa, da Carta Europeia da Autonomia Local e do próprio RJAL, através da concretização dos princípios constitucionais da subsidiariedade, descentralização e

32Cuja denominação se encontra definida na alínea V) do artigo 3.º do Estatuto: “Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P., com atribuições em matéria de regulamentação técnica, coordenação, fiscalização e planeamento no âmbito do sector rodoviário.”

33 Sobre esta diferença entre simples administração e titularidade falaremos em secção própria.

34 De referir que as disposições constantes deste diploma legal não abrange as atribuições e competências das Regiões Autónomas, uma vez que a transferência de atribuições e competências para as Autarquias Locais nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira é regulada por diploma próprio, mediante iniciativa das respetivas assembleias legislativas.

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Autonomia Local, que visam, essencialmente a salvaguarda dos interesses legítimos dos utentes, bem como a integridade dos espaços.

Este novo diploma legal de transferência de competências para as Autarquias Locais é deveras ambicioso pois abarca um conjunto alargado de funções que englobam as áreas da educação, ação social, saúde, proteção civil, cultura, património, habitação, áreas portuário-marítimas e áreas urbanas de desenvolvimento turístico e económico não afetas à atividade portuária, praias marítimas, fluviais e lacustres, informação cadastral, gestão florestal e áreas protegidas, transportes e vias de comunicação, estruturas de atendimento ao cidadão, policiamento de proximidade, proteção e saúde animal, segurança dos alimentos, segurança contra incêndios, estacionamento público e, modalidades afins de jogos de fortuna e azar.

No artigo 2.º do diploma em análise constam os princípios e garantias sobre os quais se devem reger esta transferência de competências. Desde logo, no momento da transferência de competências esta deverá será pensada para a Autarquia que se mostre, de acordo com a sua natureza, mais adequada e capaz de exercer a competência que se visa transferir; apesar destas transferências, deverá manter-se a autonomia administrativa, financeira, patrimonial e organizativa das Autarquias Locais; é também garantida a qualidade no acesso aos serviços públicos, assim como a eficiência e eficácia da gestão pública. A coesão territorial e a garantia de universalidade e da igualdade de oportunidades no aceso ao serviço pública e a garantia da transferência para as Autarquias Locais dos recursos financeiros, humanos e patrimoniais adequados, considerando os atualmente aplicados nos serviços e competências descentralizadas são também garantias revistas naquele artigo.

Transferir competências significa também acarretar com um maior número de despesas para o

exercício daquelas. Nesse sentido, o artigo 5.º da Lei nº 50/201835 refere que o regime financeiro das

Autarquias Locais passa a prever recursos financeiros a atribuir às entidades que receberão as novas competências, sendo considerado o acréscimo de despesas em que estas incorrem pelo exercício das competências, bem como o acréscimo de receita que decorra do referido exercício. De facto, sem recursos financeiros, as Autarquias Locais e as Entidades Intermunicipais não poderão executar as novas competências, caindo por terra os objetivos previstos com a nova Lei e saindo a população prejudicada, uma vez que os serviços não lhes serão prestados.

A nível de gestão e transferência de recursos financeiros, importa salientar que os bens móveis e imóveis afetos a áreas cujas competências são transferidas para as Autarquias Locais ou para as

35 Com a entrada em vigor da Lei-Quadro n.º 50/2018, surgiu a Lei n.º 51/2018 a qual procede à alteração da Lei das Finanças Locais e do Código do

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Entidades Intermunicipais passam a ser geridos pelas mesmas, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 50/2018.

Tal como é necessário um acréscimo de recursos financeiros para fazer face às novas competências que as Autarquias e as Entidades Intermunicpais passam a ter a seu cargo, será de igual forma necessário um acréscimo a nível de recursos humanos. Assim, dispõe o artigo 8.º da Lei n.º 50/2018 que os diplomas setoriais a que se refere o n.º 1 do artigo 4.º do mesmo diploma, estabelecem, quando necessário, os mecanismos e termos da transição dos recursos humanos afetos ao seu exercício.

Findas as considerações gerais sobre a Lei n.º 50/2018 importa agora passarmos à análise da área que releva para a nossa dissertação e que se encontra abrangida por este quadro de transferência de atribuições e competências.

Uma vez que o nosso estudo diz respeito à culpa in vigilando dos Municípios relativamente às vias de comunicação a ele pertencentes, interessa-nos analisar as alterações que se deram nesta sede. Esta matéria vem regulada no artigo 21.º do diploma legal, constando da epígrafe do referido artigo – “Transportes e vias de comunicação”, o qual dispõe, em matéria de vias de comunicação, o seguinte:

“1 - Sem prejuízo das competências das entidades intermunicipais, é competência dos órgãos municipais a gestão de todas as estradas nos perímetros urbanos e dos equipamentos e infraestruturas neles integradas, salvo:

a) Os troços de estrada explorados em regime de concessão ou subconcessão à data da entrada em vigor da presente lei, durante o período em que se mantiver essa exploração;

b) Os troços de estradas ou estradas que integram um itinerário principal ou um itinerário complementar;

c) O canal técnico rodoviário, como definido na alínea j) do artigo 3.º do Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional, existente à data da entrada em vigor da presente lei.

2 - A transferência dos troços de estradas localizados nos perímetros urbanos e dos equipamentos e infraestruturas neles integrados, bem como das estradas desclassificadas pelo Plano Rodoviário Nacional e dos troços substituídos por variantes é efetuada por mutação dominial nos termos do decreto-lei previsto no n.º 1 do artigo 4.º, passando a integrar o domínio público municipal. (...)”

Deste artigo resulta que os Municípios passam a ter, entre outras competências, o dever de gestão dos troços de estradas, equipamentos e infraestruturas neles integrados, localizados nos

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perímetros urbanos, bem como dos troços de estradas desclassificadas pelo Plano Rodoviário Nacional e dos troços substituídos por variantes não entregues através de mutação dominial por acordo entre a I.P e o Município e dos respetivos equipamentos.

Acresce que, além da transferência de poderes de gestão, o novo diploma prevê também que possa verificar-se uma transferência de titularidade através de mutação dominial de rodovias, sendo para tal necessário que haja acordo, sob forma de contrato administrativo entre a I.P e o Município, resultando, assim, um alargamento da rede municipal.

Assim, a Lei-Quadro n.º 50/2018 é, a nosso ver, muito ambiciosa deixando no ar muitas dúvidas e incertezas relativas à sua aplicação. Destacamos a questão dos recursos financeiros e dos recursos humanos os quais terão que ser adequados para que os Municípios possam dar cumprimento às novas competências. É certo que o aumento das atribuições e competências dos Municípios exige o aumento dos meios para o efetivo cumprimento daquelas sob pena de, uma vez mais, serem os particulares a sofrer com aquele incumprimento.

1.1.1.1. Decreto Lei n.º 100/2018 – Transferência de competências no domínio das vias de comunicação

O Decreto-Lei n.º 100/2018, de 28 de novembro veio concretizar, no termos do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 50/2018, a transferência das competências da Administração Central para os órgãos municipais no domínio das vias de comunicação.

Tendo em conta que o Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional tem como objetivo garantir um correto e eficiente funcionamento do setor rodoviário, salvaguardando uma melhor articulação entre todos os agentes em presença, de forma a garantir uma maior proteção da estrada e zona envolvente, potenciando condições de segurança e circulação para todos os seus utilizadores, assegurando também condições para a execução de construção, gestão, exploração e conservação daquelas, entendeu o legislador que o cumprimento destes objetivos poderia ser assegurado, de forma mais eficiente, pelos Municípios, uma vez que estes têm revelado um bom desempenho na administração das estradas sob a sua gestão, dada a sua relação de proximidade entre o próprio Município e o domínio público, no caso, as vias de comunicação.

Assim, a transferência de novas competências para os Municípios tem em vista assegurar uma gestão, exploração e conservação mais eficaz das vias rodoviárias ainda não integradas no domínio

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público municipal, e daquelas que apesar de não ser transferida a titularidade para o respetivo Município, transfere-se, pelo menos, as competências de gestão.

Assim, nos termos do artigo 2.º deste Decreto-Lei os Municípios passam a ter competência para gerir:

a) “Os troços de estradas e dos equipamentos e infraestruturas neles integradas, localizados nos perímetros urbanos” .

b) “Os troços de estradas desclassificadas pelo Plano Rodoviário Nacional e os troços substituídos por variantes ainda não entregues através de mutação dominial por acordo entre a Infraestruturas de Portugal, S. A. (doravante designada por IP) e o respetivo município”.

Sendo também transferida para os Municípios: “(...) a titularidade dos troços e dos

equipamentos e infraestruturas referidos no número anterior, através de mutação dominial por acordo entre a IP e o respetivo município, conforme previsto no artigo 40.º do Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional, aprovado em anexo à Lei n.º 34/2015, de 27 de abril, na sua redação atual, passando a integrar o domínio público municipal.”

A transferência destas competências para os Municípios abrange a zona de estrada36 incluindo

o subsolo, ficando excluídos da transferência os troços de estrada explorados em regime de concessão

ou subconcessão37 à data da entrada em vigor do presente Decreto-Lei e durante o período em que se

mantiver essa exploração. Ficam, ainda, excluídos da transferência os troços de estradas ou mesmo estradas que integram um itinerário principal ou um itinerário complementar; bem como o canal

técnico rodoviário.38

Importa ainda referir que quando cesse a concessão ou subconcessão dos troços de estradas e equipamentos localizados em perímetros urbanos, e não sejam aqueles sujeitos a renovação, renegociação ou celebração de nova conceção, podem os mesmos ser integrados no domínio municipal, igualmente através de mutação dominial, por acordo entre a I.P e o respetivo Município.

36Cuja definição se encontra prevista na al. uu) do artigo 3.º do Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional: “o terreno ocupado pela estrada e seus elementos funcionais, abrangendo a faixa de rodagem, as bermas, as obras de arte, as obras hidráulicas, as obras de contenção, os túneis, as valetas, os separadores, as banquetas, os taludes, os passeios e as vias coletoras”.

37Os troços de estrada explorados pela I.P não se encontra abrangido por esta exclusão.

38Definição prevista na al. j) do artigo 3.º do Estatuto: “a infraestrutura de alojamento, que não seja propriedade privada, instalada no subsolo da zona da estrada, em obras de arte ou túneis, constituída por rede de tubagens, condutas, câmaras de visita, dispositivos e respetivos acessórios, destinada à instalação de cabos de comunicações eletrónicas, equipamentos ou quaisquer recursos de redes de comunicações, bem como dispositivos de derivação, juntas ou outros equipamentos necessários à transmissão de comunicações eletróncias naquelas redes.”

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A mutação dominial poderá também verificar-se em relação aos troços de estrada localizados

em perímetro urbano39 que seja sede ou concelho ou, não o sendo, desde que reúnam

cumulativamente quatro requisitos nos termos do n.º 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei, a saber:

“a) Atravessamento de zona urbana consolidada em que se verifica dinâmica autónoma e existência de outros arruamentos paralelos ao troço de estrada objeto de mutação dominial, com ocupação marginal em ambos os lados, numa extensão não inferior a 500 metros;

b) Inexistência de espaço marginal entre a faixa de rodagem da estrada e o edificado;

c) Utilização local da estrada como suporte da relação humana, social e económica, que se equipara ou prevalece sobre a utilização pelo tráfego de atravessamento;

d) A excisão do troço de estrada da rede rodoviária nacional não compromete os modelos operacionais e de gestão”.

Finalmente, podem ser também objeto de acordo de mutação dominial entre a I.P e o Município os troços de estradas desclassificadas pelo Plano Rodoviário Nacional, bem como os troços substituídos por variantes ainda não entregues ao Município, o que resulta do artigo 6.º do Decreto-Lei que vai também de encontro ao disposto no artigo 9.º do Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional.

Assim, este Decreto-Lei prevê a transferência de poderes de gestão e concebe que possa existir mutação dominial de rodovias, sendo para tal necessário que haja acordo, através de contrato administrativo celebrado entre a I.P e o Município, podendo verificar-se, caso a caso, a alteração da titularidade dos troços e dos equipamentos e infraestruturas neles integrados através daquele mecanismo, passando a titularidade a pertencer ao Município onde se situam.

Nos casos em que não se dê a mutação dominial ou seja, nos casos em que não haja transferência de titularidade, mas apenas transferência de competências a nível de gestão, esta transferência não inclui a manutenção, conservação e reparação da zona da estrada.

Estas novas competências dos Municípios serão levadas a cabo pela câmara municipal, sendo da competência da assembleia municipal a aprovação do projeto de transferência acordado com a I.P.

concluímos, assim, que este quadro normativo de transferência de competências para os órgãos municipais é por um lado apercetível, mas por outro deixa margem para dúvidas e incertezas.

39Dispõe o n.º 3 do artigo 5.º do DL: “(...) entende-se por perímetro urbano a área identificada na Carta de Uso e Ocupação de Solo, publicada pela Direção-Geral do Território, correspondentes às classes identificadas no respetivo relatório técnico com a numeração e denominação seguintes: 1.1 tecido urbano; 1.2.1 indústria, comércio e equipamentos gerais; 1.3.3 áreas em Construção; e 1.4.1 espaços verdes urbanos”.

(33)

O aumento significativo de competências para os Municípios acarreta esforços a nível financeiro e humano por parte deles e se, por um lado os Municípios têm revelado um papel essencial na administração das estradas sob a sua gestão, uma vez que se encontram mais próximos das vias de comunicação que o envolvem, o que lhes permite ter uma maior perceção dos problemas existentes e uma maior capacidade para resolução dos mesmos, por outro lado é também visível para todos que os Tribunais Administrativos contam, diariamente, com processos, em que a parte demandada é o próprio Município e a parte demandante são os particulares que invocam danos provocados por omissões ilícitas daquela entidade pública, nomeadamente, no que diz respeito à omissão do dever de vigilância.

Bem sabemos que por mais eficaz que seja determinada entidade, não é possível evitar a ocorrência de todos os sinistros, nem é possível ao Município prever e conseguir prevenir todos os riscos para os utentes que utilizam as vias municipais. Esta transferência de competências é efetivamente dotada de boas intenções mas, bem sabemos que só poderá ser levada a cabo se os recursos financeiros e humanos forem adequados, o que nos suscita algumas dúvidas.

1.6. REDE MUNICIPAL: CONCLUSÕES

Depois de abordadas todas as questões e analisados todos os diplomas legais que entendemos ser pertinentes para determinar quais as vias públicas da competência dos Municípios, chegamos ao momento de tecermos as nossas conclusões.

Começamos por referir que o domínio público municipal “inclui as estradas, os caminhos

municipais, as ruas, as praças, os jardins, os espaços verdes, os sistemas de abastecimento de água e saneamento básico de um concelho, entre outros. Os bens que fazem parte do domínio público

municipal não podem ser vendidos nem usados para fins privados.”40

Assim, as estradas municipais são aquelas de interesse supramunicipal e complementares à

Rede Rodoviária Nacional que asseguram uma ou várias funções: o desenvolvimento e serventia das

zonas fronteiriças, costeiras e outras de interesse turístico; a ligação entre agrupamentos de concelhos constituindo unidades territoriais e a continuidade de estradas regionais nas mesmas condições de circulação e segurança.

Referências

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