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CASO DA SOBERANIA SOBRE PULAU LITIGAN E PULAU SIPADAN (INDONÉSIA/ MALÁSIA)

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CASO DA SOBERANIA SOBRE PULAU LITIGAN E PULAU SIPADAN (INDONÉSIA/ MALÁSIA)

Resumo da sentença de 17 de dezembro de 2002

Histórico do processo e conclusões das partes (parágrafo 1º ao 13)

Em 2 de novembro de 1998, a Indonésia e a Malásia notificaram ao Secretário da Corte um compromisso entre os dois Estados, assinado em Kuala Lumpur, em 31 de maio de 1997, e que entrou em vigor em 14 de maio de 1998. Nesse compromisso, eles pediram à Corte para determinar, com base nos tratados, acordos e qualquer outro elemento de prova produzido pelas partes, se a soberania sobre Pulau Ligitan e Pulau Sipadan pertence à República da Indonésia ou à Malásia.

Cada uma das partes depositou devidamente um memorial, um contra-memorial e uma réplica nos prazos fixados pela Corte.

Não contando a Corte com a presença de nenhum juiz da nacionalidade das partes, cada uma delas procedeu, no exercício do direito que lhe confere o parágrafo 3º do artigo 31 do Estatuto, à designação de um juiz ad hoc para figurar no caso: a Indonésia designou o Sr. Mohamed Shahabuddeen, e a Malásia o Sr. Christopher Gregory Weeramantry. Após a demissão do Sr. Shahabudden, a Indonésia designou o Sr. Thomas Franck para substituí-lo.

Em 13 de março de 2001, a República das Filipinas depositou na Secretaria da Corte um requerimento com fins de intervenção no caso, invocando o artigo 62 do Estatuto da Corte. Por sentença proferida em 23 de outubro de 2001, a Corte julgou que o requerimento das Filipinas não podia ser admitido.

Audiências públicas ocorreram de 3 a 12 de junho de 2002.

No processo oral, as conclusões abaixo foram apresentadas pelas partes: Pelo governo da Indonésia,

“Com base nas considerações de fato e de direito expostas nas peças processuais escritas da Indonésia e em seus pedidos, o governo da República da Indonésia pede respeitosamente à Corte para declarar e julgar que:

i) a soberania sobre Pulau Ligitan pertence à República da Indonésia; e ii) a soberania sobre Pulau Sipadan pertence à República da Indonésia.” Pelo governo da Malásia,

“O governo da Malásia pede respeitosamente à Corte para declarar e julgar que a soberania sobre Pulau Ligitan e Pulau Sipadan pertence à Malásia.”

O contexto geográfico (parágrafo 14)

Primeiramente, a Corte descreveu o contexto geográfico da controvérsia da seguinte maneira:

As ilhas de Ligitan e Sipadan (Pulau Ligitan e Pulau Sipadan), distantes uma da outra aproximadamente 15,5 milhas marítimas, estão situadas no mar de Célèbes, ao longo da costa nordeste da ilha de Bornéu. Ligitan é uma ilha de dimensão muito reduzida, encontrando-se na extremidade meridional de um grande recife em forma de estrela que se estende em direção sul a partir das ilhas de Danawan e de Si Amil. Suas coordenadas são 4° 09’ de latitude norte e 118° 53’ de longitude leste. A ilha se encontra a aproximadamente 21 milhas marítimas de Tanjung Tutop sobre a península de Semporna, território mais próximo da ilha de Bornéu. Constantemente emergida e essencialmente arenosa, Ligitan é uma ilha de vegetação baixa, sobre a qual se encontram algumas árvores. Ela não é habitada de forma permanente.

Apesar de maior que Ligitan, Sipadan é igualmente uma ilha de dimensão reduzida; sua superfície é de quase 0,13 quilômetros quadrados. Suas coordenadas são 4° 06’ de latitude norte e 118° 37’ de longitude leste. Ela se encontra a quinze milhas marítimas de Tanjung Tutop, e a 42 milhas marítimas da costa leste da ilha de Sebatik. Sipadan é uma ilha densamente arborizada, de origem vulcânica, que constitui o cume de uma montanha submarina de aproximadamente 600 a 700 metros de altura, ao redor da qual um atol de corais se formou. Ela não era habitada de forma permanente antes dos anos 1980, época de seu desenvolvimento como estação de turismo voltado para o mergulho.

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O contexto histórico (parágrafo 15 ao 31)

A Corte descreveu, em seguida, em linhas gerais, o contexto histórico complexo da controvérsia que opõe as partes.

Fundamentos das demandas das partes (parágrafos 32 e 33)

A Corte salientou que a Indonésia sustentou a título principal que sua soberania sobre as ilhas de Ligitan e Sipadan repousa sobre a convenção concluída em 20 de junho de 1891 pela Grã-Bretanha e os Países Baixos, a fim de “definir as fronteiras entre as possessões dos Países Baixos sobre a ilha de Bornéu e os Estados dessa ilha que [estavam] sob proteção britânica”. A Indonésia invocou igualmente uma série de effectivités, tanto holandesas como indonésias, que, segundo ela, viriam a confirmar seu título convencional. No curso do processo oral, a Indonésia aduziu, ainda, a título subsidiário, que se a Corte rejeitasse seu título fundado sobre a Convenção de 1891, a soberania sobre as ilhas em litígio ainda assim lhe pertenceria, pelo fato de que estas se encontrariam sob a autoridade do sultão de Bouloungan, do qual ela é sucessora.

Por sua parte, a Malásia sustentou que adquiriu a soberania sobre as ilhas de Ligitan e Sipadan após uma série de alegadas transmissões do título, detido originalmente pelo antigo soberano, o sultão de Sulu, título que seria em seguida passado, sucessivamente, à Espanha, aos Estados Unidos, à Grã-Bretanha em nome do Estado de Bornéu do Norte, ao Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, e, finalmente, à própria Malásia. Ela afirmou que seu título fundado sobre essa série de instrumentos jurídicos foi confirmado por um certo número de effectivités britânicas e malásias sobre as referidas ilhas. Ela considerou, subsidiariamente, que, se a Corte chegasse à conclusão de que as ilhas em litígio haviam pertencido originariamente aos Países Baixos, suas effectivités teriam, de qualquer forma, suplantado tal título da Holanda.

A Convenção de 1891 entre a Grã-Bretanha e os Países Baixos (parágrafo 34 ao 92)

A Corte recordou que a Indonésia sustentou a título principal que a soberania sobre as ilhas de Ligitan e Sipadan lhe pertence em virtude da Convenção de 1891. A Indonésia considerou que, por “seus termos, seu contexto, seu objeto e sua finalidade, a referida Convenção fixou como linha de divisão entre as possessões respectivas das partes, na zona hoje em disputa, o paralelo 4o 10’ de latitude norte”. Ela especificou, a esse respeito, que sua posição não é de afirmar “que a linha convencional de 1891 visava igualmente, desde a origem, ser uma fronteira marítima … a leste da ilha de Sebatik, nem que ela o era de fato”, mas, sobretudo, “ver essa linha como uma linha de atribuição: os territórios, incluindo as ilhas situadas ao norte do paralelo 4o 10’ de latitude norte, seriam … considerados como britânicos, e aqueles situados ao sul como holandeses”. Estando as ilhas em litígio situadas ao sul desse paralelo, “disso decorreria que, em virtude da Convenção, o título sobre essas ilhas pertencia aos Países Baixos e que pertence hoje à Indonésia”.

Em apoio a sua reivindicação sobre as ilhas de Ligitan e Sipadan, a Indonésia invocou essencialmente o artigo IV da Convenção de 1891. Essa disposição lê-se como se segue:

“A partir do ponto situado a 4o 10’ de latitude norte sobre a costa oriental, a linha fronteiriça prossegue em direção leste, ao longo do mesmo paralelo, através da ilha de Sebittik; a parte da ilha situada ao norte do referido paralelo pertence sem reserva à British North Borneo Company e a parte situada ao sul do paralelo pertence, sem reserva, aos Países Baixos.”

As partes discordam quanto à interpretação a ser dada a essa disposição. • Interpretação da Convenção de 1891 (parágrafo 37 ao 92)

A Corte salientou que a Indonésia não é parte na Convenção de Viena de 23 de maio de 1969 sobre o Direito dos Tratados; ela relembrou, ainda, que, segundo o direito internacional costumeiro que encontrou sua expressão nos artigos 31 e 32 dessa Convenção:

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“um tratado deve ser interpretado de boa-fé segundo o sentido comum atribuível aos termos do tratado em seu contexto e à luz de seu objetivo e de sua finalidade. A interpretação deve ser fundada, antes de tudo, no próprio texto do tratado. Podem ser mencionados, a título complementar aos meios de interpretação, os trabalhos preparatórios e as circunstâncias nas quais o tratado foi concluído”.

A Corte relembrou que, no que concerne ao parágrafo 3º do artigo 31, teve a oportunidade de especificar que essa disposição reflete igualmente o direito costumeiro, no momento em que ela prevê que será levada em conta, ao mesmo tempo que o contexto, a conduta ulterior das partes no tratado, a saber, de “todo acordo ulterior” (alínea a)) e de “toda prática ulteriormente seguida” (alínea b)).

A Corte observou que a Indonésia não contestou que tais são as regras aplicáveis. • A redação do artigo IV (parágrafo 39 ao 43)

Tratando-se dos termos do artigo IV, a Indonésia sustentou que nada neste leva a pensar que a linha termina na costa oriental da ilha de Sebatik. Segundo a Malásia, o sentido natural e comum das palavras “através da ilha de Sebittik” é de designar, “em inglês e em holandês, uma linha que atravessa Sebatik da costa ocidental à costa oriental sem ir além”.

A Corte salientou que as partes diferem sobre o sentido que convém dar, na primeira frase do artigo IV da Convenção de 1891, à preposição “across” (em inglês) ou “over” (em holandês). Ela reconheceu que esse termo é ambíguo e que é suscetível de revestir o sentido que cada uma das partes lhe dá; uma linha fixada por tratado pode, com efeito, passar “através" de uma ilha e terminar sobre a costa desta, ou prosseguir além.

As partes igualmente discordam quanto ao sentido a dar à parte da frase segundo a qual “a linha fronteiriça prossegue em direção leste ao longo” do paralelo 4o 10’ de latitude norte. Na opinião da Corte, a expressão “prossegue” também carrega ambigüidade. O artigo I da Convenção definiu o ponto de partida da fronteira entre os dois Estados, seus artigos II e III descrevendo a forma pela qual essa fronteira prossegue de segmento em segmento. Conseqüentemente, o fato de que, segundo o artigo IV, essa “linha fronteiriça prossegue” ainda a partir da costa oriental de Bornéu, ao longo do paralelo 4o 10’ de latitude norte através da ilha de Sebatik, não implica necessariamente, contrariamente ao que sustentou a Indonésia, que ela deva prosseguir como linha de atribuição para além dessa ilha.

A Corte estimou, ainda, que a diferença de pontuação nas duas versões do artigo IV da Convenção de 1891 não serve para elucidar o sentido do texto quanto a um eventual prolongamento da linha em direção ao alto-mar, a leste da ilha de Sebatik.

A Corte observou que qualquer ambigüidade poderia ter sido evitada se a Convenção tivesse especificado de maneira expressa que o paralelo 4o 10’ de latitude norte constituiria, além da costa oriental de Sebatik, a linha divisória das ilhas sob soberania britânica e aquelas sob soberania holandesa. Nessas condições, o silêncio do texto não pode ser ignorado. Ele age em favor da tese malásia.

• O contexto (parágrafo 44 ao 48)

Tendo resumido os argumentos das partes concernentes ao contexto da Convenção de 1891, a Corte constatou que o memorando explicativo anexo ao projeto de lei apresentado nos Estados Gerais dos Países Baixos, para ratificação dessa Convenção, que constitui o único documento relativo à convenção que foi publicado na época da conclusão desta, fornece indicações úteis sobre um certo número de pontos.

Primeiramente, esse memorando evoca o fato de que, quando das negociações prévias, a delegação britânica havia proposto que a linha fronteiriça se dirigisse para leste, a partir da costa oriental de Bornéu do Norte, passando entre as ilhas de Sebatik e Nunukan Leste. Quanto a Sebatik, o memorando explicou que a divisão da ilha havia sido convencionada sobre proposição do governo holandês e julgada necessária para permitir o acesso às regiões costeiras atribuídas às partes. O memorando não fez nenhuma alusão à atribuição de outras ilhas mais a leste e, em particular, não fez nenhuma menção a Ligitan e a Sipadan.

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Tratando-se do mapa anexo ao memorando explicativo, a Corte salientou que essa representa quatro linhas de cores diferentes, a fronteira finalmente convencionada sendo representada por uma linha vermelha. No mapa, a linha vermelha se estende ao mar ao longo do paralelo 4o 10’ de latitude norte até o sul da ilha de Maboul, essa extensão não tendo sido nem comentada no memorando, nem debatida pelo Parlamento Holandês. A Corte observou, ainda, que o mapa apenas representa um certo número de ilhas situadas a norte do paralelo 4o 10’; excluindo alguns recifes, nenhuma ilha aparece ao sul desse paralelo. Ela notou, por outro lado, que nenhum elemento do dossiê deixa pensar que Ligitan e Sipadan, ou outras ilhas como Maboul, teriam sido territórios em litígio entre a Grã-Bretanha e os Países Baixos na época da conclusão da Convenção. Na opinião da Corte, não se poderia acatar o argumento da Indonésia, segundo o qual a linha vermelha descrita no mapa teria sido prolongada a fim de regular qualquer controvérsia ao longo de Sebatik, tendo por conseqüência que Ligitan e Sipadan foram atribuídas aos Países Baixos.

A Corte não poderia mais acolher a tese da Indonésia relativa ao valor jurídico do mapa anexo ao memorando explicativo do governo holandês. A Corte observou que esse memorando explicativo e esse mapa jamais foram transmitidos pelo governo holandês ao governo britânico, mas somente foram endereçados a este por seu agente diplomático em Haia. O governo britânico não reagiu a essa transmissão interna. A Corte indicou, em seguida, que tal ausência de reação, com relação à linha que figurava no mapa anexo ao memorando, não poderia ser considerada como atribuindo a aquiescência à referida linha. A Corte concluiu, do que precede, que esse mapa não pode ser visto nem como um “acordo relacionado a um tratado e que ocorreu entre todas as partes na ocasião da conclusão de um tratado”, no sentido da alínea a) do parágrafo 2º do artigo 31 da Convenção de Viena, nem como um “instrumento estabelecido por uma parte … na ocasião da conclusão do tratado e aceito pelas outras partes como instrumento relacionado ao tratado”, no sentido da alínea b) do parágrafo 2º do artigo 31 da Convenção de Viena.

• O objeto e a finalidade da Convenção de 1891 (parágrafo 49 ao 51)

Após ter examinado os argumentos da Indonésia e da Malásia, a Corte considerou que o objeto e a finalidade da Convenção de 1891 eram delimitar as fronteiras entre as possessões das partes no interior da ilha de Bornéu, assim como resulta do preâmbulo da Convenção, que especifica que as partes estavam “desejosas de definir as fronteiras entre as possessões dos Países Baixos sobre a ilha de Bornéu e os Estados dessa ilha que estão sob proteção britânica” (grifo da Corte). Essa interpretação é, na opinião da Corte, confortada pela própria estrutura da Convenção de 1891. A Corte não encontrou na Convenção nenhum indício que levaria a pensar que as partes pretenderam delimitar a fronteira entre suas possessões a leste das ilhas de Bornéu e de Sebatik, e atribuir a uma ou a outra a soberania sobre outras ilhas além dessas.

A Corte chegou, pois, à conclusão de que o texto do artigo IV da Convenção de 1891, lido em seu contexto e à luz do objeto e da finalidade da Convenção, não poderiam ser interpretados como estabelecendo uma linha de atribuição da soberania sobre ilhas situadas em alto-mar, a leste da ilha de Sebatik.

Os meios complementares suscetíveis de confirmar a interpretação da Corte: os trabalhos preparatórios da Convenção de 1891 e as circunstâncias em torno de sua conclusão (parágrafo 53 ao 58)

Levando em conta o que precede, a Corte não considerou necessário invocar os meios complementares de interpretação, tais como os trabalhos preparatórios e as circunstâncias nas quais a Convenção de 1891 foi concluída, para determinar o sentido dessa Convenção; como nos outros casos, ela estimou poder recorrer a esses meios complementares, para neles buscar uma confirmação eventual da interpretação que deu ao texto da Convenção.

A Corte observou que, após a criação da BNBC, em maio de 1882, essa última se prevalecia de direitos que considerava ter adquirido de Alfred Dent e do Barão von Overbeck - que os haviam adquirido do Sultão de Sulu – sobre territórios situados na costa nordeste da ilha de Bornéu (no Estado de Tidoeng “até o rio Sibuco”); certos problemas ocorreram entre a companhia e os Países Baixos, estes pretendendo afirmar seus direitos sobre as possessões do Sultão de Bouloungan, “incluindo os territórios de Tidoeng” (os itálicos figuram no original). É nessas circunstâncias que a Grã-Bretanha e os Países Baixos estabeleceram em 1889 uma comissão mista, a fim de discutir as bases de um acordo suscetível de regular a controvérsia.

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A comissão mista se reuniu três vezes e se consagrou, quase exclusivamente, a questões sobre a zona litigiosa na costa nordeste da ilha de Bornéu. Apenas na última reunião, que aconteceu em 27 de julho de 1889, foi que a delegação britânica propôs que a fronteira passasse entre as ilhas de Sebatik e de Nanoukan Leste. Os Países Baixos haviam rejeitado a proposição britânica. A própria idéia de uma divisão da ilha de Sebatik ao longo do paralelo 4o 10’ de latitude norte só foi introduzida posteriormente. Em uma carta de 2 de fevereiro de 1891, os Países Baixos procederam a essa divisão.

No curso das negociações, as partes utilizaram diversos croquis para ilustrar suas opiniões e suas proposições. A Corte estimou que não se poderia deduzir o que quer que seja do comprimento das linhas que aparecem sobre esses croquis.

A Corte concluiu que os trabalhos preparatórios da Convenção e as circunstâncias nas quais ela foi concluída não podem ser vistos como suporte da tese da Indonésia, segundo a qual as partes na referida Convenção se entenderam não somente sobre o traçado da fronteira terrestre, mas igualmente sobre uma linha de atribuição que se prolonga além da costa leste de Sebatik.

• A prática ulterior (parágrafo 59 ao 80)

A Corte constatou que as relações entre os Países Baixos e o Sultanato de Bouloungan haviam sido fixadas por uma série de contratos concluídos entre eles. Os contratos de 12 de novembro de 1850 e 2 de junho de 1878 especificavam os limites do Sultanato. Esses limites se estendiam ao norte da fronteira terrestre que foi finalmente aceita em 1891 pelos Países Baixos e a Grã-Bretanha. Foi por isso que os Países Baixos consultaram o Sultão, antes de concluir a Convenção com a Grã-Bretanha; eles se encontravam na obrigação de modificar em 1893 o contrato de 1878, a fim de considerar a delimitação ocorrida em 1891. O novo texto especificava que as ilhas de Tarakan e de Nanoukan e a parte da ilha de Sebatik situada ao sul da linha fronteiriça pertenciam ao Bouloungan, assim como “pequenas ilhas conexas às ilhas supramencionadas, ainda que estejam situadas ao sul da linha fronteiriça”. A Corte notou que essas três ilhas são rodeadas de numerosas ilhas menores, que podem ser consideradas como “conexas” geograficamente com estas. Ela estimou, em contrapartida, que tal não poderia ser o caso de Ligitan e Sipadan, situadas a uma distância de mais de 40 milhas marítimas dessas três ilhas.

A Corte relembrou que a Convenção de 1891 continha uma disposição prevendo a possibilidade para as partes, no futuro, de definir mais precisamente o traçado da linha fronteiriça. Com efeito, o artigo V dessa Convenção estipula que “o traçado exato da linha fronteiriça, tal como ela está descrita nos quatro artigos precedentes, será definido ulteriormente de comum acordo, nos momentos que os governos holandês e britânico julgarem oportunos”.

O primeiro desses acordos é aquele que a Grã Bretanha e os Países Baixos concluíram em Londres, em 28 de setembro de 1915, concernente à “fronteira entre o Estado de Bornéu do Norte e as possessões holandesas em Bornéu”. Pelo Acordo de 1915, os dois Estados aprovaram e confirmaram um relatório conjunto, incorporado ao referido Acordo, assim como o mapa anexo a ele, que haviam estabelecido por uma comissão mista. Os comissários começaram seus trabalhos sobre a costa leste de Sebatik e tentaram, como o recorda o preâmbulo do acordo, “delimitar sobre esses locais a fronteira” convencionada em 1891, procedendo de leste a oeste. A Corte estimou que a missão efetuada pelos comissários não era uma missão de simples demarcação, as partes tendo devidamente se dedicado a especificar um traçado que, tendo em vista a redação assaz geral da Convenção de 1891 e o comprimento considerável da linha, só podia ser impreciso. Na opinião da Corte, a vontade das partes de especificar a delimitação operada em 1891 e a natureza complementar das operações de demarcação tornam-se claras quando de um exame atento do texto do acordo. Este indica, assim, que “onde a configuração do terreno não oferecia limite natural conforme as disposições do Acordo de Fronteira de 20 de junho de 1891, [os comissários] erigiram os limites seguintes”. Por outro lado, a Corte constatou que o traçado da linha finalmente fixado no Acordo de 1915 não corresponde inteiramente àquele da Convenção de 1891.

Assim, a Corte não acolheu o argumento da Indonésia segundo o qual o Acordo de 1915 era exclusivamente um acordo de demarcação. Ela não aceitou também a conclusão da Indonésia de que, levando

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em conta a própria natureza desse acordo, as partes não tinham que se preocupar, neste, com o traçado da linha em direção ao alto-mar, a leste da ilha de Sebatik.

Após ter examinado o título e o preâmbulo do Acordo de 1915, bem como os termos do relatório conjunto da comissão, a Corte concluiu que o Acordo de 1915 visava a priori o conjunto da fronteira “entre o território holandês e o Estado de Bornéu do Norte britânico”, e que os comissários haviam cumprido sua tarefa partindo da extremidade leste de Sebatik. Na opinião da Corte, se a fronteira, de uma forma ou de outra, prosseguia a leste de Sebatik, poder-se-ia esperar que ao menos se fizesse menção no Acordo. A Corte considerou que o exame desse mapa anexado ao Acordo de 1915 vem reforçar a leitura que ela fez desse último.

A Corte considerou, ainda, que um debate, evocado pela Indonésia, que aconteceu no seio da administração holandesa, de 1922 a 1926, quanto à possibilidade de levantar junto ao governo britânico a questão da delimitação do mar territorial ao longo da costa leste da ilha de Sebatik, dá a entender que, nos anos vinte, as autoridades holandesas mais bem informadas não consideravam que havia sido combinado em 1891 um prolongamento, no mar, da linha traçada sobre o território ao longo do paralelo 4o 10’de latitude norte.

A Corte considerou, enfim, que não poderia tirar nenhuma conclusão, para fins de interpretação do artigo IV da Convenção de 1891, da prática das partes em matéria de outorga de concessões petrolíferas.

Tendo em vista o que precede, a Corte considerou que o exame da prática ulterior das partes na Convenção de 1891 confirma as conclusões às quais ela chegou no parágrafo 52 de sua sentença quanto à interpretação do artigo IV dessa Convenção.

Os mapas (parágrafo 81 ao 91)

A Corte ressaltou que nenhum mapa aceito pelas partes foi anexado à Convenção de 1891, que exprimisse oficialmente a vontade da Grã-Bretanha e dos Países Baixos quanto ao prolongamento da linha fronteiriça em direção ao alto-mar, a leste de Sebatik, como linha de atribuição.

Ela notou que, no curso do processo, as partes se referiram mais particularmente a dois mapas, a saber: o mapa que acompanha o memorando explicativo que o governo holandês havia juntado ao projeto de lei apresentado aos Estados Gerais para ratificação da Convenção de 1891, e o mapa anexado ao Acordo de 1915. A Corte já se pronunciou sobre o valor jurídico desses mapas (ver parágrafos 47, 48 e 72 da sentença).

Após ter examinado os outros mapas produzidos pelas partes, a Corte constatou que, no total, com exceção do mapa anexado ao Acordo de 1915 (ver acima), o material cartográfico submetido pelas partes não permite chegar a conclusões no que concerne à interpretação do artigo IV da Convenção de 1891.

A Corte chegou, em definitivo, à conclusão de que o artigo IV, interpretado em seu contexto e à luz da finalidade e do objeto da Convenção, fixa a fronteira entre as duas partes até a extremidade oriental da ilha de Sebatik e não estabelece nenhuma linha de atribuição mais a leste. Essa conclusão é acolhida tanto pelos trabalhos preparatórios quanto pela conduta ulterior das partes na Convenção de 1891.

A questão da sucessão do título (parágrafo 93 ao 125)

A Corte examinou, em seguida, a questão de saber se a Indonésia ou a Malásia se tornaram detentoras de um título sobre Ligitan e Sipadan por via de sucessão. A Corte recordou que a Indonésia afirmou, na segunda rodada de pedidos, que, mesmo se a Corte descartasse sua reivindicação sobre as ilhas em litígio fundada na Convenção de 1891, ela deveria conservar ao menos o título sobre essas ilhas como sucessora dos Países Baixos, que as haviam adquirido por contratos concluídos com o Sultão do Bouloungan,

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detentor originário do título. A Malásia sustentou, por sua vez, que Ligitan e Sipadan jamais fizeram parte das possessões do Sultão do Bouloungan.

A Corte ressaltou que já examinou os diferentes contratos de vassalagem concluídos entre os Países Baixos e o Sultão do Bouloungan quando se dirigiu sobre a questão da Convenção de 1891. Ela relembrou que, nos termos do Contrato de 1878, as ilhas pertencentes ao Sultão estão indicadas como sendo “Terekkan [Tarakan], Nanoekan [Nanoukan] e Sebittikh [Sebatik], bem como as ilhotas que a elas pertencem”. Essa lista, tal como emendada em 1893, menciona em termos similares as três ilhas e as ilhotas próximas, levando em conta a partilha de Sebatik, resultante da Convenção de 1891. A Corte relembrou, ainda, já ter observado que a parte da frase “as ilhotas que a elas pertencem” só pode ser interpretada como designando as pequenas ilhas situadas na vizinhança imediata das três ilhas nomeadas, e não ilhas situadas a uma distância de mais de 40 milhas marítimas. A Corte não poderia, então, acolher a tese da Indonésia, segundo a qual essa última teria herdado dos Países Baixos o título sobre as ilhas em litígio por meio de contratos que fazem figurar o Sultanato do Bouloungan, tal como nele é definido, nas Índias Holandesas.

Depois a Corte recordou que a Malásia pretendia ter adquirido a soberania sobre as ilhas de Ligitan e Sipadan após uma série de transmissões alegadas do título detido, originariamente, pelo antigo soberano, o Sultão de Sulu, título que seria passado, sucessivamente, à Espanha, aos Estados Unidos, à Grã-Bretanha – em nome do Conde do Estado de Bornéu do Norte -, ao Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, e, finalmente, à Malásia. A Malásia afirmou que é em virtude dessa “cadeia de sucessão do título” que ela mesma adquiriu um título convencional sobre Ligitan e Sipadan.

A Corte ressaltou, desde o início, que as ilhas em litígio não são nomeadamente citadas em nenhum dos instrumentos jurídicos internacionais que a Malásia produziu para demonstrar as transmissões sucessivas do título alegadas. Ela constatou, ainda, que as duas ilhas não foram incluídas na concessão de 22 de janeiro de 1878, pela qual o Sultão de Sulu cedia a Alfred Dent e ao Barão von Overbeck todos os seus direitos e poderes sobre o conjunto de suas possessões em Bornéu, incluindo as ilhas situadas no limite de 3 léguas marítimas a partir da costa, fato não contestado pelas partes. Enfim, a Corte constatou que, se as partes sustentam que as ilhas de Ligitan e Sipadan não constituíam terrae nullius durante o período pertinente para fins do presente caso, elas o fazem sobre a base de raciocínios diametralmente opostos, cada uma pretendendo dispor de um título sobre essas ilhas.

A Corte examinou, para começar, se Ligitan e Sipadan faziam parte ou não das possessões do Sultão de Sulu. Em todos os documentos pertinentes, o Sultanato de Sulu é invariavelmente descrito como sendo formado por “todo o arquipélago de Sulu e suas dependências”. Esses documentos não permitem, contudo, estabelecer se Ligitan e Sipadan, que estão situadas a uma distância considerável da ilha principal de Sulu, fazem ou não parte das dependências do Sultanato. A Corte citou igualmente a alegação da Malásia, segundo a qual haveriam existido vínculos de aliança entre o Sultão de Sulu e os Bajau Laut, que habitavam as ilhas ao longo da costa de Bornéu e teriam, ocasionalmente, freqüentado as duas ilhas inabitadas. A Corte entendeu que tais vínculos podem realmente ter existido, mas que eles não são suficientes, por si sós, para provar que o Sultão de Sulu reivindicou o título territorial sobre essas duas pequenas ilhas ou as incluiu nas suas possessões. Ademais, nada prova que o Sultão havia exercido uma autoridade efetiva sobre Ligitan e Sipadan.

Quanto à transmissão alegada à Espanha do título sobre Ligitan e Sipadan, a Corte ressaltou que nos termos do protocolo de 22 de julho de 1878 confirmando as bases da paz e da capitulação concluída entre a Espanha e o Sultão de Sulu, esse último cedeu, incontestavelmente, “o arquipélago de Sulu e … suas dependências” aos espanhóis. Mas a Corte concluiu que nada provava que a Espanha havia considerado que esse protocolo concernia a Ligitan e Sipadan. A Corte observou, ainda, que é incontestável que o Sultão de Sulu havia renunciado, em proveito da Espanha, a seus direitos soberanos sobre todas as suas possessões, perdendo, dessa forma, qualquer título que poderia deter sobre as ilhas além do limite das 3 léguas marítimas ao longo da costa de Bornéu do Norte. Dessa forma, a Corte considerou que o único Estado que teria podido reivindicar Ligitan e Sipadan era a Espanha, em virtude dos instrumentos concernentes, mas que não há nenhuma evidência de que ela o tenha feito. A Corte constatou, ainda, que, na época, nem a Grã-Bretanha, em nome do Estado de Bornéu do Norte, nem os Países Baixos reivindicaram Ligitan e Sipadan, quer explícita, quer implicitamente.

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A próxima etapa seguindo a cadeia de transmissão do título é constituída pelo tratado hispano-americano de 7 de novembro de 1900, pelo qual a Espanha “renunci[ava], em proveito dos Estados Unidos, a todo título e reivindicação de título … sobre todas as ilhas que fazem parte do arquipélago das Filipinas” e não entrando no campo de aplicação do Tratado de Paz de 10 de dezembro de 1898. A Corte ressaltou, primeiramente, que, mesmo se, como concordam as partes, Ligitan e Sipadan não entrassem no campo de aplicação do Tratado de Paz de 1898, as únicas ilhas que, no Tratado de 1900, foram mencionadas como tendo sido cedidas aos Estados Unidos pela Espanha são Cagayan Sulu, Sibutu e suas dependências. A Espanha renunciou, por esse tratado, a qualquer pretensão que ela poderia ter sobre Ligitan e Sipadan ou outras ilhas situadas além do limite fixado a 3 léguas marítimas da costa de Bornéu do Norte. Os eventos posteriores mostram que mesmo os Estados Unidos não sabiam precisamente quais eram as ilhas sobre as quais tinham adquirido título em virtude do Tratado de 1900. Um acordo provisório entre a Grã-Bretanha e os Estados Unidos foi concluído em 1907 por uma troca de notas. Essa troca de notas, que não ocasionou nenhuma transferência de soberania, especificava que a BNBC continuaria a administrar as ilhas situadas a mais de 3 léguas marítimas da costa de Bornéu do Norte, mas a questão de saber a qual das partes pertenciam as ilhas não foi resolvida.

Esse acordo provisório durou até 2 de janeiro de 1930, data na qual a Grã-Bretanha e os Estados Unidos concluíram uma Convenção que traçava uma linha separando, de um lado, as ilhas pertencentes ao arquipélago das Filipinas e, de outro, as ilhas pertencentes ao Estado de Bornéu do Norte. O artigo III dessa Convenção dispunha que todas as ilhas situadas ao sul e a oeste da linha pertenciam ao Estado do Bornéu do Norte. A partir de um ponto situado no extremo nordeste de Ligitan e de Sipadan, a linha se dirigia de uma parte para o norte e da outra parte para leste. A Convenção não designou nenhuma ilha pelo seu nome, com exceção das ilhas Turtle e Mangsee, declaradas como se encontrando sob a soberania dos Estados Unidos. Concluindo a Convenção de 1930, os Estados Unidos renunciavam a qualquer reivindicação que poderiam ter sobre Ligitan e Sipadan e sobre as ilhas vizinhas. Mas a Corte não poderia concluir, nem da troca de notas de 1907, nem da Convenção de 1930, nem de nenhum documento emanado da administração dos Estados Unidos entre essas duas datas, que esses últimos reivindicaram a soberania sobre essas ilhas. Não se poderia, então, afirmar com alguma certeza que, pela Convenção de 1930, os Estados Unidos teriam, como o pretende a Malásia, transferido à Grã-Bretanha o título sobre Ligitan e Sipadan. De outro lado, a Corte não deixou de observar que a Grã-Bretanha considerava que, em virtude da Convenção de 1930, ela tinha adquirido, em nome da BNBC, o título sobre todas as ilhas situadas além da zona das 3 léguas marítimas que haviam sido administradas pela companhia, à exceção das ilhas Turtle e Mangsee. Ela nunca formulou anteriormente reivindicação oficial sobre nenhuma das ilhas situadas além da zona das 3 léguas marítimas. Saber se esse título, no caso de Ligitan e Sipadan e das ilhas vizinhas, foi efetivamente adquirido em virtude da Convenção de 1930 é menos pertinente que o fato de que a posição adotada pela Grã-Bretanha quanto ao efeito dessa Convenção não foi contestado por nenhum outro Estado.

O Estado do Bornéu do Norte foi transformado em colônia em 1946. Posteriormente, o governo do Reino Unido, em virtude do artigo IV do Acordo de 9 de julho de 1963, aceitou tomar “todas as medidas apropriadas em seu poder para fazer adotar, pelo Parlamento do Reino Unido, uma lei consagrando a renúncia pela Sua Majestade Britânica … a sua soberania e a sua jurisdição … sobre o Bornéu Setentrional, Sarawak e Singapura” em favor da Malásia.

Em 1969, a Indonésia contestou o título da Malásia sobre Ligitan e Sipadan, e afirmou deter um título sobre as duas ilhas em virtude da Convenção de 1891.

Levando em conta o que precede, a Corte concluiu que não poderia aceitar a tese da Malásia segundo a qual existiria uma transmissão ininterrupta do título desde seu pretenso detentor originário, o Sultão de Sulu, até a Malásia, seu detentor atual. Não foi estabelecido com certeza que Ligitan e Sipadan faziam parte das possessões do Sultão de Sulu e que um dos pretensos detentores do título, que lhe teria sucedido, teria detido um título convencional sobre essas duas ilhas. A Corte não poderia, conseqüentemente, concluir que a Malásia herdou um título convencional de seu predecessor, o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte.

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A Corte examinou, em seguida, se os elementos de prova fornecidos pelas partes no que concerne às effectivités invocadas por essas podem levá-la a determinar - como foi pedido no compromisso - a quem pertence a soberania sobre Ligitan e Sipadan.

A Corte salientou que ambas as partes aduzem que as effectivités sobre as quais elas se apóiam somente confirmam um título convencional. A título subsidiário, a Malásia afirmou ter adquirido um título sobre Ligitan e Sipadan por uma possessão e uma administração pacíficas e contínua dessas, sem protesto por parte da Indonésia ou de seus predecessores no título.

Tendo concluído que nenhuma das duas partes detinha um título convencional sobre Ligitan e Sipadan, a Corte procedeu, em seguida, ao exame da questão das effectivités de maneira independente e distinta.

Ela constatou que, em apoio a seus argumentos relativos às effectivités, a Indonésia invocou as patrulhas efetuadas na região por navios da marinha real dos Países Baixos, as atividades da marinha indonésia, assim como aquelas dos pescadores indonésios. Ela notou, igualmente, que a Indonésia, evocando sua lei no 4, relativa às águas indonésias, promulgada em 18 de fevereiro de 1960, em virtude da qual são definidas suas linhas de base arquipelágicas, reconheceu que, na época, ela não utilizou Ligitan ou Sipadan como pontos de base para o traçado das linhas de base e a definição de suas águas arquipelágicas e de seu mar territorial, mas fez valer que isso não poderia ser interpretado como mostrando que ela considerava as ilhas como não-pertencentes ao seu território.

Tratando das suas effectivités relativas às ilhas de Ligitan e Sipadan, a Malásia evocou a regulamentação da captura das tartarugas e a coleta de seus ovos; ela declarou que essa coleta havia constituído a atividade econômica mais importante em Sipadan durante vários anos. Ela se apoiou também na criação, em 1933, de uma reserva ornitológica em Sipadan. Ela salientou, ainda, que as autoridades coloniais do Bornéu do Norte britânico construíram faróis nas ilhas de Ligitan e Sipadan no início dos anos sessenta, os quais existem até hoje e são mantidos pelas autoridades malásias.

A Corte recordou, primeiramente, o que indicou a Corte Permanente de Justiça Internacional no caso do Status Jurídico da Groelândia Oriental (Dinamarca v. Noruega), a saber, que:

“uma pretensão de soberania fundada, não sobre algum ato ou título em particular, tal como um tratado de cessão, mas simplesmente sobre um exercício contínuo da autoridade, implica dois elementos cuja existência, para cada um, deve ser demonstrada: a intenção e a vontade de agir na qualidade de soberano e alguma manifestação ou exercício efetivo dessa autoridade.

Uma outra circunstância, que deve ser considerada por todo tribunal, ao dirimir uma questão de soberania sobre um território particular, é a medida na qual a soberania é igualmente reivindicada por uma outra Potência.”

A Corte Permanente prosseguiu nestes termos:

“É impossível examinar decisões tomadas nos casos visando à soberania territorial sem observar que, em inúmeros casos, o tribunal não exigiu numerosas manifestações de um exercício de direitos soberanos, contanto que o outro Estado na causa não pudesse fazer valer uma pretensão superior. Tal é particularmente verdadeiro nas reivindicações de soberania sobre territórios situados em países pouco povoados ou não ocupados por habitantes permanentes.”(C.P.J.I. série A/B n° 53, p. 45-46.) A Corte ressaltou, em particular, que no caso de pequenas ilhas muito pequenas inabitadas ou habitadas de forma não permanente - tais como Ligitan e Sipadan, cuja importância econômica era, ao menos até uma data recente, modesta - as effectivités são geralmente pouco numerosas.

A Corte ainda fez observar que não poderia levar em consideração atos que foram produzidos após a data na qual a controvérsia entre as partes se cristalizou, a menos que essas atividades não constituam a continuação normal de atividades anteriores e não tenham ocorrido para melhorar a posição jurídica das partes

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que as invocam. A Corte procedeu, dessa forma, essencialmente ao exame das effectivités datando do período anterior a 1969, ano em que as partes formularam pretensões opostas sobre Ligitan e Sipadan.

A Corte ressaltou, por outro lado, que somente pode considerar essas atividades como manifestação pertinente da autoridade na medida em que não há nenhuma dúvida de que elas têm relação específica com as ilhas em litígio tomadas como tais. As regulamentações ou atos administrativos de natureza geral só podem, assim, ser considerados como effectivités relativas à Ligitan e à Sipadan se é manifesto em seus termos ou seus efeitos que eles concerniam essas duas ilhas.

Examinando, em seguida, as effectivités invocadas pela Indonésia, a Corte começou por observar que nenhuma dentre elas tinha um caráter legislativo ou regulamentar. Ela não poderia ignorar o fato de que a lei indonésia n° 4, de 8 de fevereiro de 1960, definindo as linhas de base arquipelágicas da Indonésia, e o mapa que a acompanha, não mencionam nem indicam Ligitan e Sipadan como pontos de base ou pontos de inflexão pertinentes.

Quanto a uma presença contínua da marinha holandesa e da marinha indonésia nas redondezas de Ligitan e Sipadan, tal como invocado pela Indonésia, na opinião da Corte, nem o relatório do comandante do Lynx, nem qualquer outro documento apresentado pela Indonésia sobre a vigilância e as atividades de patrulha da marinha holandesa ou indonésia permitem concluir que as autoridades marítimas consideravam Ligitan e Sipadan, bem como as águas ao redor, como estando sob a soberania dos Países Baixos ou da Indonésia.

A Corte observou, enfim, que as atividades de pessoas privadas como a dos pescadores indonésios não poderiam ser consideradas como effectivités se elas não se fundassem sobre uma regulamentação oficial ou não estivessem sob o controle da autoridade pública. A Corte concluiu que as atividades das quais se prevalece a Indonésia não constituem atos de soberania refletindo a intenção ou a vontade de agir nessa qualidade.

Quanto às effectivités invocadas pela Malásia, a Corte ressaltou, primeiramente, que, pela Convenção de 1930, os Estados Unidos renunciaram a qualquer reivindicação que poderiam ter sobre Ligitan e Sipadan e que nenhum outro Estado cometeu, à época, ato de soberania sobre essas ilhas nem se opôs a que o Estado do Bornéu do Norte continuasse a administrá-las. A Corte observou que as atividades anteriores à conclusão dessa Convenção não poderiam ser consideradas como atos a título de soberano, na medida em que a Grã Bretanha não reivindicava a soberania, em nome do Estado do Bornéu do Norte, sobre as ilhas situadas além do limite das 3 léguas marítimas. Tendo, contudo, a Grã Bretanha reconhecido à BNBC o direito de administrar as ilhas, posição oficialmente reconhecida pelos Estados Unidos após 1907, essas atividades administrativas não poderiam ser mais ignoradas.

Tanto as medidas tomadas para regulamentar e limitar a coleta de ovos de tartaruga quanto a criação de uma reserva ornitológica, invocadas pela Malásia como provas de tal administração efetiva das ilhas, devem, na opinião da Corte, ser consideradas como manifestações de autoridade regulamentar e administrativa sobre um território mencionado por seu nome.

A Corte observou que a construção e a exploração de faróis e de auxílios à navegação não são geralmente considerados como uma manifestação da autoridade estatal. A Corte recordou, entretanto, que, na sua sentença sobre o caso da Delimitação Marítima e Questões Territoriais entre Catar e Bahrein (Catar v. Bahrein), ela declarou o que segue:

“Certas categorias de atividades invocadas por Bahrein, tais como a perfuração de poços artesianos, poderiam, por si, ser consideradas como discutíveis como atos realizados a título de soberano. A construção de auxílios à navegação, em contrapartida, pode ser juridicamente pertinente no caso de ilhas muito pequenas. No caso em tela, levando em conta o tamanho de Qit’at Jaradah, as atividades exercidas por Bahrein sobre essa ilha podem ser consideradas como suficientes para fundamentar sua reivindicação segundo a qual esta se encontra sob sua soberania.” (Sentença, mérito, C.I.J. Recueil 2001, parágrafo 197).

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A Corte notou que, se as atividades invocadas pela Malásia, tanto em seu próprio nome quanto como Estado sucessor da Grã-Bretanha, são modestas em número, elas apresentam um caráter variado e compreendem atos legislativos, administrativos e quasi-judiciários. Elas cobrem um período considerável e apresentam uma estrutura que revela a intenção de exercer funções estatais com relação às duas ilhas, no contexto da administração de um conjunto mais vasto de ilhas.

A Corte não poderia ignorar o fato de que, à época em que essas atividades aconteceram, nem a Indonésia, nem seu predecessor, os Países Baixos, jamais exprimiram desacordo nem protestaram. A Corte ressaltou, a esse propósito, que as autoridades indonésias nem mesmo relembraram, em 1962 e 1963, às autoridades da colônia do Bornéu do Norte, ou à Malásia, após sua independência, que os faróis então construídos o tinham sido sobre um território que elas viam como indonésio; mesmo se elas considerassem esses faróis como simplesmente destinados à segurança da navegação em uma zona que se revestia de uma importância particular para a navegação nas águas situadas no alto-mar do Bornéu do Norte, tal atitude não é habitual. Levando em conta o conjunto de circunstâncias do caso, e vistos em particular os elementos de prova fornecidos pelas partes, a Corte concluiu que a Malásia detém um título sobre Ligitan e Sipadan, com base nas effectivités mencionadas acima.

O texto integral do dispositivo lê-se como se segue: “Por esses motivos,

A Corte,

Por dezesseis votos a um,

Entende que a soberania sobre Pulau Ligitan e Pulau Sipadan pertence à Malásia.

A FAVOR: Presidente Guillaume; Vice-Presidente Shi; juízes Oda, Ranjeva, Herczegh, Fleischhauer, Koroma, Vereshchetin, Higgins, Parra-Aranguren, Kooijmans, Rezek, Al-Khasawneh, Buergenthal, Elaraby; juiz ad hoc Weeramantry;

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