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Guia de Estudos. I. Apresentação dos diretores. Senhores Delegados,

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Guia de Estudos CE

I. Apresentação dos diretores

Senhores Delegados,

Após meses de trabalho árduo, é com enorme satisfação que lhes damos as boas-vindas ao III MIRIN e, mais precisamente, ao Conselho Europeu.

Ao iniciar os esforços para realizar a terceira edição deste evento que já se tornou um sucesso, os organizadores depararam-se com uma importante questão: Como aumentar o modelo, abrangendo assim novos temas, sem perder a qualidade acadêmica? A resposta mostrou-se complicada, mas com o passar do tempo e o desenvolver de idéias, uma coisa ficou clara, o Conselho Europeu não poderia faltar.

O mundo do início do século XXI se mostra imerso em uma complexa teia de relações e compromissos. Dilemas, como Globalização vs. Nacionalismo, são enfrentados todos os dias na busca de um ambiente mais justo e democrático. O Velho Continente, berço da civilização ocidental, também se vê frente a esse problema, visto que, apesar de ter desenvolvido após a 2ª Guerra Mundial uma importante organização regional, não viu suas disparidades serem eliminadas.

Recentemente, os vetos franceses e holandeses à Constituição da União Européia, trouxeram à tona uma discussão importante: Deve-se enraizar o processo de integração continental, permitindo assim um fortalecimento da organização supranacional, ou terminá-lo, evitando assim que a soberania estatal seja afetada?

Com isso em mente, nos empenhamos para formular um tópico de discussão interessante para os senhores. Este é um tema atual e controverso que tem repercutido imensamente na imprensa brasileira e mundial. Torcemos para que gostem.

Esperamos que as discussões tenham inicio de forma embasada e respeitosa, lembrando que as diferenças entre os senhores podem ser as chaves para o inicio de grandes amizades. Estaremos disponíveis durante todo o tempo de preparação e estudo dos senhores para qualquer esclarecimento, para tanto, lhes fornecemos nossos e-mails.

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professor Diego Santos, cujo enorme conhecimento compartilharam conosco, ao Secretário-Geral Alvaro Soares, à Vice-Secretária Acadêmica Eizen Monteiro e aos senhores delegados que se interessaram e acreditaram em nosso trabalho e estão nesse momento participando do Conselho Europeu no III Modelo Intercolegial de Relações Internacionais.

Muito Obrigado,

Daniel Edler Duarte

Luis Fernando de Moraes y Blanco

II. Apresentação do Comitê

- Histórico de construção da União Européia

Sendo um processo de integração regional que se destaca dos demais pelo alto grau de integração alcançado, a União Européia coloca-se, no alvorecer do século XXI, como um ator fundamental do sistema internacional. Seu processo de construção, contudo, não foi simples. Passados 55 anos desde a ratificação do tratado que instituiu a Comunidade Européia do Carvão e do Aço, considerada o primeiro passo do processo de integração, ainda é possível identificar contradições inerentes ao cenário europeu. Tal fato evidencia-se em cada discussão a cerca da abrangência e do aprofundamento dos poderes desta instituição.

Os anos que sucederam a 2ª Grande Guerra foram demasiado importantes para a elaboração das bases da Comunidade Européia. Em um mundo bipolar, onde a “política de contenção” pautava a ações norte-americanas, a existência de países fortes no oeste europeu era de suma importância. É deste período o Plano Marshall que, com pesados financiamentos às nações aliadas, ajudou a reerguer as economias falidas da região. Assim sendo, os acordos firmados na época seguiam esta lógica: fortalecer os Estados para evitar perturbações sociais. O BENELUX, criado em 1944 (entrou em vigor apenas em 1947) é

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um exemplo desta tendência. Entretanto, apenas com a anteriormente citada CECA (1951) é que uma política comum para o continente pôde ser vislumbrada.

As experiências bem sucedidas até então incentivaram os países-membro a criar a Comunidade Econômica Européia (CEE) que, além de aumentar a cooperação funcional, visava à formulação de um mercado único. Neste mesmo período a preocupação com a energia nuclear levou à criação da Comunidade Européia de Energia Atômica (EURATOM), que impulsionou a pesquisa em uma área considerada fundamental na época. Os tratados que fizeram nascer ambas as instituições foram assinados na cidade de Roma em março de 1957, entrando em vigor apenas no ano seguinte. Graças aos esforços feitos, alcançou-se em 1968 uma união aduaneira. Porém a principal conquista foi a elaboração de uma Política Agrícola Comum (PAC), questão que traz controvérsias até os dias de hoje.

Apesar do rápido processo de integração, a década de 50 foi o cenário para o aprofundamento de uma das maiores contradições da Comunidade. O Presidente francês, Charles de Gaulle foi pivô de um movimento que defendia a manutenção da soberania estatal. Ficava clara, portanto, a dicotomia política: integração regional versus soberania nacional, intergovernamentalidade versus supranacionalidade. De Gaulle foi mais longe, exigia uma postura de liderança mundial do continente europeu e uma independência em relação aos Estados Unidos. Contudo, internamente não aceitava qualquer restrição à autonomia francesa. Seu projeto de uma confederação governamental, surgiu como alternativa a idéia de federação supranacional. Apenas em 1969, com um novo presidente, a França remodelou sua política em âmbito continental e passou a incentivar o projeto de união européia (Magnoli, 2000)

Durante a década de 60 o processo integracional europeu sofreu avanços, podendo ser citado, por exemplo, o Tratado de Fusão (1967) que unificou as três instituições existentes em uma. A Europa foi tornando-se mais apta a receber novos membros e, após intensas negociações, Reino Unido, Irlanda e Dinamarca foram incorporadas à Comunidade Européia em 1973. Na década de 80 a ampliação continuou: Grécia (1981), Portugal e Espanha (1984) tornaram-se Estados-Parte. Contudo, a despeito da ampliação, a integração econômica e social não evoluiu de maneira correlata.

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O Ato Único Europeu (1986), ao estabelecer metas e datas para a criação do mercado comum e gerar algumas reformas institucionais, teve um importante papel no fim da estagnação do processo em curso. A liberalização deu lugar a uma verdadeira integração econômica, permitindo a harmonização das políticas estatais de todo o continente.

A crise no Leste Europeu, capitaneada pela dissolução da URSS alçou a UE ao patamar de protagonista no cenário internacional. O apoio da organização para a transição democrática dos antigos satélites soviéticos foi necessário, evitando assim sérios problemas decorrentes da ruptura política. Neste contexto foi assinado o Tratado de Maastricht (1992) que criou uma nova instituição, a atual União Européia. Contudo, o problema de cessão de soberania voltou a agourar o processo de integração, levando a um desenho institucional inusitado, baseado em três pilares fundamentais: o primeiro pilar, o Pilar Comunitário, responsável por políticas comerciais, de cooperação e desenvolvimento, o segundo pilar, que consiste em uma política externa de segurança comum (PESC) e finalmente o terceiro pilar que corresponde a políticas de justiça e assuntos internos referentes à comunidade (imigração, asilo e etc). Uma importante conseqüência da assinatura e ratificação de tal tratado foi o Acordo de Schengen (1997) que permitiu a liberdade de circulação de pessoas dentro da UE (HERZ & HOFFMANN, 2004).

Atualmente a UE é uma organização composta de 25 Estados - Membros e já prevê a incorporação de Bulgária e Romênia em 2007. Discussões com Turquia e Croácia já foram iniciadas, sendo, portanto, provável que em futuro não tão distante a UE seja um gigante com 29 membros, uma renda per capita de US$ 28.144 e um PIB (produto interno bruto) de aproximadamente 13 trilhões de dólares.

- Desenho institucional da União Européia

Do ponto de vista decisório, a União Européia centra-se no chamado “triângulo institucional”, do qual fazem parte o Conselho da União Européia, o Parlamento Europeu e a Comissão Européia. Além disso, fazem parte do domínio institucional europeu outros cinco órgãos (o Banco Central Europeu, o Banco Europeu de investimento, o Comitê das Regiões, o Comitê Econômico e Social Europeu e o Provedor de Justiça Europeu) e as

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agências especializadas européias, criadas com a finalidade de suprir áreas científicas, técnicas e de gestão. A fim de melhor demonstrar as áreas cobertas pelo processo de integração europeu e possibilitar uma maior visualização com o papel exercido pelo Conselho Europeu, cabe apresentar as funções exercidas pelos órgãos do triângulo institucional europeu, na qual se centram as principais atividades da União.

A Comissão Européia é um órgão que se diferencia dos demais, pois os comissários que o constituem, apesar de serem originários dos âmbitos políticos de seus países de origem, não representam os interesses de um Estado-Membro individualmente, mas sim da União Européia como um todo, o que faz dessa comissão um órgão caracterizadamente supranacional. Suas principais funções são: apresentar propostas legislativas ao Parlamento e ao Conselho da União Européia, gerir e executar as políticas e o orçamento da UE, garantir, conjuntamente ao Tribunal de Justiça Europeu, a aplicação do direito comunitário e representar a UE em negociações no plano internacional. (Comunidades Européias, 2003)

O Parlamento Europeu, composto por deputados eleitos dentro de cada Estado-Membro, possui sedes na França, na Bélgica e em Luxemburgo (as plenárias mensais são conduzidas em Estraburgo, França). (Comunidades Européias, 2003) Dentre suas principais funções, o Parlamento comparte competências orçamentárias e legislativas com o Conselho da União Européia, além de exercer um papel de controle democrático sobre todas as instituições da EU, principalmente sobre a Comissão, e possuir poderes também no que diz respeito à aprovação ou rejeição das nomeações a membros da Comissão e no que diz respeito à adoção de uma moção de censura a este órgão. (Comunidades Européias, 2003)

Por último, o Conselho da União Européia, ou simplesmente Conselho, pode ser apresentado como o principal órgão de tomada de decisões no sistema institucional da União Européia. Sendo composto por um ministro de cada Estado-Membro (normalmente o ministro das relações exteriores, o que pode variar em razão da matéria a ser discutida), tem como objetivo a representação dos interesses de cada Estado-Membro considerado individualmente. Suas competências abrangem todos os três pilares comunitários. No que diz respeito ao primeiro pilar (o domínio comunitário) suas funções são: adotar os atos legislativos europeus, função que muitas vezes comparte com o Parlamento, celebrar acordos internacionais entre a União e Estados terceiros ou organizações internacionais

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(OIs), coordenar em linhas gerais as políticas economias dos Estados-Membros e aprovar o orçamento da EU, função que também comparte com o Parlamento. (Comunidades Européias, 2003) Já no que concerne ao segundo pilar (PESC), sua função é, a partir de diretrizes fixadas pelo Conselho Europeu, desenvolver essa Política Externa e de Segurança Comum. (Comunidades Européias, 2003) Finalmente, no que se refere ao terceiro pilar (Justiça e Assuntos Internos), trabalha na coordenação do processo de cooperação entre os tribunais e as forças policiais nacionais dos Estados-Membros em matéria penal. (Comunidades Européias, 2003)

Agora que os principais órgãos do sistema institucional europeu já foram apresentados, cabe ser apresentada uma descrição mais detalhada do fórum em que será debatida a questão da Carta Constitucional Européia, o Conselho Europeu.

- O Conselho Europeu

Criado em 1974, após proposta do francês Valéry Giscard d'Estaing, o Conselho Europeu não tinha, inicialmente, um vinculo com as demais instituições européias. Seu reconhecimento formal deu-se apenas com o Tratado de Maastricht, contudo discussões de suma importância para o continente já tinham como fórum de debate as reuniões periódicas do Conselho (http://europa.eu.int, acessado em 10/02/2006)

Este fórum de discussão é composto por Chefes de Estado e de Governo, assim como, por Ministros de Relações exteriores de cada membro e pelo Presidente da Comissão Européia. Segundo seu estatuto, deve haver no mínimo duas reuniões anuais, entretanto, geralmente são realizadas entre três e quatro neste espaço de tempo. A partir de 1993, passou a ter como principal função definir as políticas da União, contudo, diferentemente do Conselho da União Européia, suas deliberações não tem caráter assertivo, ou seja, são apenas declarações de interesses. Todas as reuniões realizadas devem emitir um documento, aprovado por consenso, no qual constem as conclusões tomadas e que são conhecidas como conclusões da presidência (http://europa.eu.int, acessado em 10/02/2006).

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Cabe ainda destacar que uma característica importante é a rotatividade da presidência. O país que estiver no cargo tem como competência cardinal pautar os temas a serem debatidos, além de coordenar suas ações. Vale ressaltar, que qualquer modificação nos Tratados da UE deve ser aprovada por este conselho em caráter extraordinário.

III. O projeto de elaboração da Constituição Européia

Em Laeken, em 2001, foi acordada pelo Conselho Europeu a Convocação da Convenção Européia, a ser presidida por Valéry Giscard d’Estaing e que reuniria representantes dos parlamentos nacionais, dos governos nacionais, da Comissão Européia e do Parlamento Europeu, com o objetivo de realizar uma discussão sobre o futuro da Europa e redigir uma Constituição para uma Europa que passaria a abrigar 25 membros. De fato, muito foi discutido sobre a necessidade real de estabelecimento de uma constituição européia. Nesse contexto, algumas razões para a necessidade de realizar-se esse avanço em termos constitucionais foram dadas, sendo que podemos apresentar três formas de legitimação desse discurso constitucional. (Skach, 2005) Primeiramente, existe a idéia de que uma Constituição Européia viria a resolver os problemas de déficit democrático das quais supostamente a UE sofre. Quanto a isso, cabe esclarecer que a UE sofre críticas por limitar a participação direta da população no campo decisório devido ao dato de que a população européia só participa diretamente na eleição da composição do parlamento europeu. Uma segunda razão que pode ser apresentada é a idéia de que uma constituição escrita tornaria menores os conflitos de competências e jurisdições entre os órgãos da UE, algo essencial em uma União Européia em expansão. Finalmente, existe o discurso de que uma constituição escrita seria importante simplesmente por garantir uma maior eficiência na aplicação das políticas européias. (Skach, 2005)

Dessa maneira, o texto desta Constituição, que não se trata de fato de uma constituição mas sim de um tratado cujo conteúdo apresenta temas constitucionais, como a repartição de competências entre os órgãos, foi apresentado no Conselho Europeu de Salônica, em 2003, sendo considerado base suficiente para o início dos trabalhos por parte

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de Conferência Intergovernamental (CIG) em outubro de 2003. Essa Conferência, composta pelos chefes de estado e de governo dos vinte e cinco Estados membros e os três países candidatos (Romênia, Bulgária e Turquia), realizou uma série de alterações textuais, principalmente no que dizia respeito ao aumento da utilização da maioria qualificada nos processos decisórios europeus. (http://europa.eu.int, acessado em 25/02/2006)

Assim, em 29 de outubro de 2004, os integrantes da CIG assinaram o Tratado que institui a Constituição Européia e, em 18 de junho de 2005, o adotaram por unanimidade, necessitando-se ainda a realização por parte de cada Estado membro do procedimento de ratificação a fim de permitir a entrada em vigor desse Tratado que se propõe a unificar os tratados referentes à UE, com exceção do tratado que constitui o Euratom (Comunidade Européia de Energia Atômica), e trazer inovações institucionais. Resumindo, algumas propostas importantes do Tratado Constitucional devem ser mencionadas: a União passaria a contar com um fundamento legal único, a Constituição; a UE passaria, pela primeira vez, a possuir personalidade jurídica, não havendo mais a necessidade de os acordos serem assinados pela “Comunidade Européia e seus Estados membros”; a população européia estaria dotada de um status de cidadania européia e estaria protegida por uma Carta dos Direitos Fundamentais; adotar-se-ia um quadro institucional renovado objetivando a obtenção de progressos na realização do espaço de liberdade, de segurança e de justiça, bem como na PESC, e na obtenção de uma maior democratização e transparência do sistema europeu; estariam estabelecidas as condições para que um Estado-Membro pudesse optar por deixar de ser um membro.

O Tratado previa que após a ratificação e o depósito dos instrumentos de ratificação por todos os Estados signatários a entrada em vigor do Tratado Constitucional Europeu dar-se-ia no dia 1º de novembro de 20061. Todavia, um momento de crise foi instaurado após a realização da consulta popular para a ratificação do Tratado na França. A resposta adversa ao Tratado Constitucional Europeu por parte da população francesa passou a gerar incertezas quanto à viabilidade de manutenção do texto do Tratado, além de gerar dúvidas e

1 Cabe destacar que após sua ratificação, o texto do tratado poderia ser modificado, havendo, contudo, a

necessidade de um acordo unânime e da ratificação por todos os Estados-Membros dessa alteração. Como exceção, para alguns temas específicos, como o alargamento da votação por maioria qualificada, a modificação necessitaria apenas de um acordo por unanimidade no Conselho Europeu. (http://europa.eu.int/constitution, acessado em 25/02/2006)

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questionamentos sobre o futuro do processo integracional europeu caso não fosse possível a ratificação desse instrumento jurídico por todos os Estados Membros da União Européia. Completando o momento crítico, logo em seguida à consulta popular na França, a população holandesa também optou por se colocar contra a ratificação da Constituição Européia.

Em resposta a esses acontecimentos, o Conselho Europeu reunido em Bruxelas, em junho de 2005, emitiu declaração em que se acordou que “Os últimos acontecimentos não põem em causa a razão de ser da continuação dos processos de ratificação. Acordamos em que o calendário da ratificação em diversos Estados-Membros será adaptado, se necessário, à luz desses acontecimentos e em função das circunstâncias nesses Estados-Membros.” O Conselho Europeu também sinalizou o início de um período de reflexão e debate nos Estados-Membros envolvendo toda a sociedade civil a fim de sanar preocupações que possam estar existindo na sociedade européia e possam ter sido demonstradas pela não aceitação da ratificação do Tratado Constitucional na França e na Holanda. Além disso, nessa declaração o Conselho Europeu comprometeu-se a continuar discutindo a questão em 2006 a fim de apreciar o andamento dos debates nacionais e decidir como prosseguir em sua abordagem perante a Constituição.

IV. Principais pontos de discussão referentes ao processo de ratificação da Constituição Européia

Destacando-se o fato de que todos os Estados-Membros da UE assinaram o texto do Tratado Constitucional e de que muitas análises consideram que a não ratificação por parte de França e Holanda seria referente mais a um ambiente de incertezas e instabilidade econômico-social domésticas, não se pode omitir que alguns pontos estabelecidos no Tratado constitucional foram acordados com base em muita negociação e barganha política, sendo ainda bastante questionados. Nesse contexto, coloca-se de suma importância a apresentação de alguns temas sensíveis trazidos pela Constituição. Esses temas foram bastante abordados tanto pela opinião pública quanto pelas negociações propriamente ditas,

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uma vez que são responsáveis pelas grandes inovações e alterações na configuração atual da estrutura da UE.

Cabe destacar que uma característica do Tratado Constitucional Europeu é sua enorme extensão. Dessa maneira, os tópicos a serem apresentados a seguir são apenas uma seleção dos temas que podem ser considerados mais complexos e polêmicos, e que acabaram por demandar um grande esforço de negociação entre as partes a fim de alcançarem uma formatação minimamente aceitável e que pudesse permitir a assinatura do Tratado Constitucional por todas as representações estatais presentes na CIG.

- A cidadania Européia

O conceito de cidadania européia variou de forma significativa nos últimos 30 anos. O termo “cidadão europeu” vem sendo usado em análises e estudos acadêmicos desde a Conferência de Paris de 1972, todavia a cidadania européia de fato só surge com o Tratado de Maastricht. Assim, neste tratado o objetivo de estabelecimento de uma cidadania européia fica expresso quando se declara a necessidade de “aumentar a proteção dos direitos e interesses dos nacionais dos Estados-Membros”. (MANZELLA, s.a.) Ainda, estabelece expressamente uma cidadania da União, sendo que qualquer portador de nacionalidade de um Estado-Membro deve se considerado um cidadão da União. (MANZELLA, s.a.)

Somente no Tratado de Amsterdã é inserido expressamente que direitos dessa cidadania devem ser protegidos quando se afirma que a União tem como fundamentos os princípios de: “liberdade, democracia, respeito por liberdades humanas e fundamentais, e o Estado de Direito, princípios comuns aos Estados-Membros”. (MANZELLA, s.a.) A complementação da proteção dos cidadãos foi determinada com as seguintes garantias: o direito de todo cidadão de levar à jurisdição da Corte Européia de Justiça os atos de instituições européias considerados contrários aos direitos fundamentais; a possibilidade de aplicação de sanções a Estados-Membros que cometam de maneira séria e contínua violações dos princípios em que se baseia a União; e a implementação progressiva de uma

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área de liberdade, segurança e justiça através de um conjunto de medidas que buscam o controle das fronteiras externas, a cooperação legal em matéria civil e a livre movimentação de pessoas. (MANZELLA, s.a.)

Portanto, vale ressaltar que antes de qualquer projeto constitucional para a Europa, algumas garantias já eram estabelecidas expressamente aos cidadãos europeus, o que se pode considerar um embrião do que viria a ser o projeto de uma cidadania européia como estabelecida na Carta Constitucional. Além disso, quatro direitos específicos já eram reconhecidos a essa cidadania: a liberdade de circulação e de permanência em todo território da União; o direito de eleger e de ser eleito nas eleições municipais e nas eleições para o Parlamento Europeu no Estado-Membro de residência; a proteção por parte das autoridades diplomáticas e consulares de qualquer Estado-Membro se o país do qual a pessoa é nacional não se encontrar representado em um país terceiro; e o direito de petição e de recurso ao Provedor de Justiça Europeu.

No entanto esse conjunto de direitos e garantias pareceu insuficiente. De acordo com Weiler, apesar de levar-se em conta que de fato os Estados europeus garantem de maneira bastante eficiente os direitos fundamentais de seus cidadãos, o advento da união econômica e monetária gerou a percepção de que o projeto da União Européia preocupava-se mais com o mercado do que com as pessoas. Daí o surgimento de fato da idéia de estabelecimento de uma cidadania européia e de certos direitos fundamentais para a proteção dessa cidadania. Cabe destacar que a grande inovação trazida pelo Tratado Constitucional Europeu no que concerne à questão da cidadania diz respeito ao fato de incorporar uma Carta de Direitos Fundamentais, o que corresponde à Parte 2 do Tratado.

Ainda, deve ser considerada uma questão de bastante relevância na discussão da questão da cidadania. No Tratado de Amsterdã é expresso que “A cidadania da União deve complementar e não substituir a cidadania nacional.” (MANZELLA, s.a.) Isto é de extrema relevância a partir do momento em que declara a cidadania nacional como algo que não garante por si só a abrangência da relação entre o indivíduo e a União, precisando ser complementada. (MANZELLA, s.a.) Como se pode imaginar, a polêmica em torno deste assunto é grande, uma vez que questiona a capacidade do Estado de cumprir uma função para a qual foi concebido.

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Nesse contexto, o Tratado Constitucional Europeu estabelece em seu texto artigos referentes à cidadania da União, a direitos fundamentais e a direitos de não-discriminação referentes a essa cidadania. Dessa maneira, coexistem uma cidadania européia juridicamente estabelecida e uma série de direitos elencados para a proteção de todo aquele que for um cidadão europeu. Cabe apenas destacar ainda que existem críticas quanto à aplicação uniforme desse sistema de proteção garantido via Constituição. Kochenov, por exemplo, destaca que as limitações aplicadas aos nacionais dos países do Leste Europeu que aderiram em 2004, demonstram que a cidadania européia como direito aos nacionais de todos os Estados-Membros da União pode ser criticada por não abranger à totalidade da União Européia. Ainda, em uma outra perspectiva mais direcionada à própria existência do termo “cidadão europeu”, autores como Antje Wiener realizam críticas, haja vista o fato de que não sendo a União Européia um Estado, a utilização do termo cidadão, que remete necessariamente a uma relação com o conceito Estado, é problemática.

- Repartição de Competências

Uma questão importante e sobre a qual a Constituição buscou estabelecer melhorias foi a questão de repartição de competências. Buscou-se tornar as competências da União Européia mais claras e, assim, a Constituição realiza uma classificação e uma enumeração dessas competências. Assim, são expressos no texto constitucional os âmbitos em que a UE é a única com possibilidade de ação (competências exclusivas2), os âmbitos nos quais podem agir tanto a União Européia quanto os Estados-Membros (competências

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Âmbitos em que a UE possui competências exclusivas: União Aduaneira, Competição (no mercado interno), Política Monetária para os Estados que adotaram o euro, Conservação dos recursos biológicos marinhos, e Política comercial comum. (Comunidades Européias, 2004)

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compartilhadas3) e os âmbitos nos quais a UE só pode agir de forma acessória e sem possibilidade de harmonização (ações de apoio, coordenação ou complementação4).

Cabe destacar que no que diz respeito ao tema de repartição de competências, que a Constituição busca reforçar três princípios: o princípio de atribuição de competências5, o princípio da subsidiariedade6e o princípio da proporcionalidade7. Segundo a Constituição, estes três princípios estão submetidos ao controle do Tribunal de Justiça Europeu, perante o qual podem ser objeto de recurso. Ainda, com a Constituição, os Parlamentos nacionais terão a possibilidade de analisar se as propostas da Comissão Européia respeitam o princípio da subsidiariedade.

- Inovações Institucionais

Uma série de inovações institucionais foi introduzida pelo texto da Constituição Européia. São propostas que visam tornar mais eficaz a atuação do sistema institucional europeu, buscando eliminar antigos problemas ou configurações obsoletas nos procedimentos dos órgãos europeus. Assim, podemos iniciar a apresentação dessas inovações institucionais com a extinção, através do Tratado Constitucional, do sistema de

3 Âmbitos em que a UE possui competências compartilhadas com os Estados-Membros: Mercado Interno,

Determinados aspectos da política social, Coesão Econômica, social e territorial, Agricultura e pesca, Proteção do meio-ambiente, Proteção do consumidor Transporte, Redes trans-europeas, Energia, Espaço de liberdade, segurança e justiça, Determinados aspectos de saúde pública, Determinados aspectos de investigação, o desenvolvimento tecnológico e o espaço, e Determinados aspectos de cooperação para o desenvolvimento e para a ajuda humanitária. (Comunidades Européias, 2004)

4 Âmbitos considerados como de ações de apoio, coordenação ou complementação: Proteção da saúde

humana, Indústria, Cultura, Turismo, Educação, juventude, esporte e formação profissional, Proteção Civil, e Cooperação Administrativa. Ademais, a União passa a ter competências em matéria de coordenação das políticas econômicas e de emprego dos Estados-Membros, assim como no que diz respeito à PESC, o que compreende uma política comum de defesa. (Comunidades Européias, 2004)

5 “A União só pode agir dentro dos limites das competências que lhe atribuem os Estados-Membros na

Constituição, e tem como objeto atingir os objetivos que ela mesma estabelece.” (Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa apud Comunidades Européias, 2004)

6 “Naqueles âmbitos que não sejam de sua competência exclusiva, a União intervirá unicamente na medida

em que os objetivos da ação pretendida não possam ser alcançados de maneira suficiente por parte dos Estados-Membros bem no âmbito central, bem no âmbito regional,ou local, mas que possam ser conseguidos de forma mais eficaz graças à dimensão ou aos efeitos da ação contemplada no âmbito da União.” (Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa apud Comunidades Européias, 2004)

7 “A União só poderá intervir se a ação pretendida não excede daquilo que resulte necessário para alcançar os

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pilares. Embora os procedimentos específicos nas áreas de política externa, de segurança e de defesa sejam mantidos, os três pilares seriam reunidos com o advento da Constituição. (http://europa.eu.int/constitution, acessado em 25/02/2006)

No que diz respeito à Comissão Européia, a Constituição reconhece suas funções de quase monopólio de iniciativa legislativa e sua função executiva e de representação externa, exceto no que se refere à PESC. (http://europa.eu.int/constitution, acessado em 25/02/2006) A principal inovação quanto a esse órgão diz respeito a sua composição. Atualmente, apesar de não representarem os interesses de seu Estado de procedência, existe um comissário para cada Estado-Membro. A CIG decidiu pela manutenção desse sistema de composição da Comissão até 2014, sendo que a partir daí o número de comissários será reduzido a dois terços do número de Estados-Membros que serão escolhidos segundo o sistema de rotação paritária, algo anteriormente estabelecido no Tratado de Nice. (LEHMANN & SCHUNZ, 2005)

De acordo com a Constituição, o Parlamento Europeu também sofreria modificações. Primeiramente, seu papel legislativo deveria ser ressaltado e novas competências também seriam aumentadas nas áreas orçamentária, de controle político e de consulta. (LEHMANN & SCHUNZ, 2005) Além disso, o Parlamento Europeu passaria a eleger o Presidente da Comissão Européia, além de aprovar a composição de toda a Comissão. (LEHMANN & SCHUNZ, 2005) Cabe destacar ainda que, no que concerne a composição do próprio Parlamento, a Constituição, segundo a CIG, fixa em 750 o número máximo de euro-deputados. Estes 750 assentos serão distribuídos com um mínimo de 6 e um máximo de 96 assentos por Estado-Membro, contudo o número exato de lugares atribuídos a cada Estado-Membro será determinado no futuro, mais especificamente antes das eleições européias de 2009. (http://europa.eu.int/constitution, acessado em 25/02/2006)

Uma inovação institucional bastante importante trazida pela Constituição Européia diz respeito ao Conselho Europeu. Deve-se recordar que atualmente o Conselho Europeu se encontra fora do triângulo institucional europeu. Isso é alterado com a Constituição que consagra o Conselho Europeu como uma instituição européia independente, distinta do Conselho da União Européia. Ademais, o Conselho Europeu passaria a ter um presidente que coexistiria com a presidência semestral do Conselho da União Européia, que agora

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passaria a ser composta por uma equipe presidencial composta de três Estados-Membros e que somente não atua no que concerne ao Conselho Relex (configuração do Conselho para a discussão de assuntos que dizem respeito às relações exteriores). (http://europa.eu.int/constitution, acessado em 25/02/2006) Ainda, deve ser mencionado que a Constituição dispõe que esse sistema de rotação paritária para a presidência do Conselho poderia ser alterado no futuro por decisão do Conselho Europeu deliberando por maioria qualificada. (http://europa.eu.int/constitution, acessado em 25/02/2006)

Aliás, por último é importante destacar o tema da maioria qualificada, uma vez que a Constituição modifica o sistema de maioria qualificada a ser utilizado nas decisões do Conselho da União Européia. Com a Constituição, uma proposta só poderá ser aprovada se contar com a aprovação de 55% dos Estados-Membros que representem ao menos 65% da população européia. (http://europa.eu.int/constitution, acessado em 25/02/2006)A isso, adiciona-se a questão da minoria de bloqueio. A fim de evitar que três Estados-Membros possam sozinhos bloquear uma decisão do Conselho por serem dotados de grandes populações (recorda-se que o número de votos que cada Estado-Membro possui no Conselho é proporcional ao tamanho de sua população), a minoria de bloqueio ficaria constituída por pelo menos quatro Estados-Membros. (http://europa.eu.int/constitution, acessado em 25/02/2006) Ainda, está previsto que pelo menos ¾ de uma minoria de bloqueio possam solicitar que não se proceda uma votação para que os debates acerca de uma determinada questão polêmica sejam prolongados a fim de que uma base de acordo mais ampla seja alcançada. (http://europa.eu.int/constitution, acessado em 25/02/2006)

- Representação Externa da União

Talvez o tema mais polêmico abordado pelo Tratado Constitucional diz respeito a suas disposições acerca da Representação Externa da União. Um problema destacado em Laeken dizia respeito à falta de consistência e coerência da política externa da União. (LEHMANN & SCHUNZ, 2005) Cabe destacar que o sistema de presidência rotativa entre os Estados-Membros fazia com que não houvesse uma uniformidade na política externa da União, uma vez que não havia um sentido de busca de continuidade por parte dos

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Membros em relação ao perfil de condução dos negócios externos realizado pelas presidências anteriores. Ademais há o questionamento de que a coordenação das funções do Alto Representante para a PESC e da Comissão Européia não era ideal e prejudicava a realização de uma condução coesa das relações exteriores da União. (LEHMANN & SCHUNZ, 2005) Nesse contexto, a Constituição buscou sanar esses problemas.

De fato, as grandes inovações que poderiam vir a ser implantadas com a ratificação da Constituição por todos os Estados-Membros concernem principalmente ao papel renovado atribuído ao Conselho Europeu e à criação do cargo de Ministro das Relações Exteriores da UE. Isso ocorre porque os grandes responsáveis pela condução da política externa da União passariam a ser o supracitado ministro e o presidente do Conselho Europeu.

O Ministro das Relações Exteriores da UE seria eleito pelo Conselho Europeu, decidindo por maioria qualificada, havendo a necessidade também da anuência do presidente da Comissão Européia. (LEHMANN & SCHUNZ, 2005) Esse Ministro conciliaria os cargos de comando do Conselho de Relações Exteriores e de Vice-presidência da Comissão. (LEHMANN & SCHUNZ, 2005) Ademais, e principalmente, teria a competência de conduzir a política externa da União de maneira geral (LEHMANN & SCHUNZ, 2005), sendo auxiliado pelo Serviço de Ação Externa Europeu, uma espécie de corpo diplomático da União Européia. Por outro lado, o presidente do Conselho Europeu, a ser eleito pelo próprio Conselho Europeu por maioria qualificada, teria o papel de presidir esta instituição, composta pelos chefes de governo ou estado dos Estados-Membros, do Presidente da Comissão Européia e do Ministro das Relações Exteriores da UE. (ALLEN, 2005) Ainda, esse presidente teria a competência de condução da representação externa da UE no que diz respeito à PESC, com a ressalva de não poder ultrapassar os poderes do Ministro das Relações Exteriores da UE. (ALLEN, 2005)

Nesse contexto, é possível compreender porque muitos analistas criticam as prescrições do Tratado Constitucional Europeu no que diz respeito à questão da representação externa. Apesar de buscar uma condução dos negócios estrangeiros mais efetiva, abre-se o precedente para conflito de competências entre o presidente do Conselho Europeu e o Ministro das Relações Exteriores da UE. Ainda, cabe destacar que apesar de

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não haver sido estabelecido no Tratado Constitucional Europeu nenhuma função de representação externa ao presidente da Comissão Européia, tanto o presidente do Conselho Europeu como o Ministro das Relações Exteriores da UE devem se reportar a esse presidente da Comissão, que possivelmente buscaria obter algum tipo de poder de ação quanto à condução dessa representação externa, o que prejudicaria ainda mais a idéia fundamental desse grupo de alterações institucionais que visam a maior coerência nas relações externas da União. (ALLEN, 2005)

Finalmente, uma outra crítica possível concerne ao fato de que o suposto Ministro das Relações Exteriores da UE seria responsável por conduzir o Comitê de Política e Segurança, além de uma série de grupos relacionados ao processo de evolução da PESC e da PESD (Política Européia de Segurança e Defesa). Ainda, seria o Vice-presidente da Comissão Européia, responsável pela condução dos aspectos de relações exteriores sob competência da Comissão Européia. Todavia, ainda existiriam outros comissários encarregados por outras questões relativas às relações externas como Comércio, Desenvolvimento e Alargamento. Portanto, cria-se a possibilidade de falta de coordenação da política externa da União tanto dentro da Comissão Européia, quanto entre esta Comissão Européia e o Conselho Europeu. (ALLEN, 2005)

V. Posição dos Estados-membros sobre a Constituição Européia

Ao contrário do que se possa imaginar, o conturbado processo de ratificação da Constituição Européia não começou quando o Parlamento da República da Lituânia aprovou tal documento. Anos antes de tal acontecimento, de importantes negociações sobre o assunto já eram realizadas. As discussões iniciadas na cidade de Laeken em 2001, terminaram em outubro de 2004 e, após os 25 Chefes de Estado chegarem a um consenso sobre o conteúdo de tal Constituição, esta foi apresentada ao povo europeu e ao mundo. Contudo, algumas questões, como as apresentadas anteriormente, ainda geravam receio

Apesar de todos os problemas, a população européia, em sua maioria, apoiava o processo de integração continental. Conseqüentemente, entre o final de 2004 e maio de 2005, nove países ratificaram o projeto constitucional. Enquanto Hungria, Eslovênia,

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Grécia, Lituânia, Áustria, Alemanha, Itália e Eslováquia o aprovaram por via parlamentar, apenas o Reino da Espanha realizou um plebiscito.

Entretanto, ao seguir o modelo espanhol, o governo francês não teve força suficiente para convencer sua população das vantagens vindouras da organização8. No dia 29 de maio de 2005 o povo foi às urnas e deu seu veto à Constituição. A influência política do resultado do plebiscito francês foi imediata. Líderes dos demais 25 países declararam sua surpresa, gerando uma apreensão a cerca do futuro da União. Neste contexto, o veto holandês, ocorrido dias depois, demonstrou que o descontentamento com o documento redigido era grande.

O impacto do veto de dois importantes países foi forte, mas apesar de poucos governos, a partir de então, decidirem se arriscar em um referendo popular, o processo de ratificação continuou. Os Parlamentos da Letônia, do Chipre e de Malta aprovaram a Constituição sem grandes problemas, assim como o povo de Luxemburgo, que já havia aprovado parlamentarmente).

Todavia, em julho de 2005, o medo de futuros vetos levou os líderes da UE à decisão de suspender temporariamente o processo de ratificação. Segundo a proposta enviada por José Sócrates, Primeiro-Ministro português, e apoiada pela Polônia, pela Espanha e pela Áustria, os países que ainda não haviam passado por tal processo deveriam adiá-lo até que seus governos pudessem garantir que seus habitantes estivessem aptos a fazer uma escolha consciente a cerca do assunto. Nas palavras do Ministro irlandês de Relações Exteriores, Dermot Ahern, era necessário realizar uma “pausa para reflexão”. Uma posição mais radical foi tomada pelo Premier dinamarquês, Anders Fogh Rasmussen. Segundo ele, o processo deveria ser cancelado, já que a Europa ”claramente não estava preparada para aprovar a nova Constituição”. A votação na Dinamarca, que deveria ocorrer em setembro de 2005, foi, contudo, apenas adiada.

Suécia e Finlândia adiaram indefinidamente seus pleitos. A Estônia, apesar de também adiá-lo, rapidamente estabeleceu uma data nos primeiros meses de 2006 para a tomada de decisão. O momento conturbado levou a Bélgica a fazer o mesmo, no entanto, já houve a votação e o resultado saído do Parlamento foi positivo. A República Tcheca, além

8 Apesar da entusiasmada declaração de d´Estaing: “a Alemanha e a França são os países fundadores da UE e,

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de adiar, modificou a maneira como este será julgado9. A Irlanda ainda não marcou data para o referendo popular. Já a Polônia, Portugal e o Reino Unido que também devem realizar referendos, adiaram indefinidamente o dia em que o povo irá decidir se a Constituição Européia será uma realidade ou um projeto fadado ao fracasso.

VI. Sugestões para discussão

Ao longo do guia buscou-se apresentar a problemática em torno do Tratado Constitucional Europeu, assim como suprir os delegados com informações básicas necessárias para o início da preparação para a realização de debates frutíferos acerca do tema. Contudo, cabe mais uma vez destacar que a complexidade do tema não poderia ser totalmente abrangida através do recorte temático aqui executado. É importante enfatizar que outros pontos sensíveis existem no debate acerca desse importante e bastante complexo tratado.

Nesse contexto, fica expresso que os temas enfatizados ao longo do guia são apenas subtópicos que podem ser debatidos pelos delegados. Aos delegados é garantida liberdade para conduzir a agenda de discussão da maneira que decidirem, preferencialmente respeitando os limites do tema e o discurso dos Estados-Membros que representam.

De qualquer maneira, cabe lembrar que atualmente a postura da UE é a de que se vive um período de reflexão que não põe em causa a continuidade dos processos de ratificação do Tratado Constitucional por parte dos Estados-Membros. Além disso, cabe ressaltar que a atual presidência austríaca da UE comprometeu-se em voltar a discutir os problemas concernentes à ratificação do Tratado.

É nesse contexto que apresentamos as opções apresentadas por Richard Whitman em relação ao Tratado Constitucional. Segundo esse autor, quatro opções podem ser seguidas: proceder com a ratificação, o que significa que os Estados-Membros que ainda não ratificaram o Tratado continuariam a adotar os procedimentos necessários a esse fim, inclusive França e Holanda que realizariam outra tentativa de ratificá-lo; suspender o processo de ratificação, garantindo um maior tempo para a reflexão aos cidadãos europeus

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acerca do Tratado; realização de uma nova versão do Tratado, eliminando questões problemáticas que possam ser consideradas empecilhos à ratificação do Tratado por todos os Estados-Membros, mas buscando manter sua essência e efetividade, o que o autor chama de um “treaty lite”; recomeçar o processo de elaboração do Tratado Constitucional, buscando realizar a tarefa de implementar uma Constituição para a Europa de maneira distinta e mais viável. (WHITMAN, 2005) Esta é apenas uma sugestão de opções que podem servir de início para a condução do resto dos debates, outras opções podem ser livremente apresentadas. A partir dessa escolha inicial, a qual já é por si só extremamente complexa, outras respostas deverão ser dadas ao longo dos debates. Por exemplo, caso decida-se pela confecção de um “treaty lite”, o que deve ser alterado no texto do Tratado para que esta nova versão possa ser aceita? Ou se, por exemplo, for decidido o reinício do processo de confecção de uma Carta Constitucional Européia, quais foram as falhas do projeto anterior? Como esse novo processo deve ser concebido? Ou, como último exemplo, caso seja decidido o prosseguimento nos processos de ratificação do Tratado da maneira como se encontra hoje, o que fazer para que se obtenha sucesso em sua implementação? Além disso, outras perguntas a serem respondidas podem ser apresentadas ao longo dos debates. O desenlace das discussões pode ser concebido de infinitas maneiras e só depende do grau de preparação e de empenho a ser apresentado pelos delegados ao longo das discussões.

VII. Bibliografia

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- MANZELLA, Andrea. After Amsterdan: the Constitutional Identity of the European Union.

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- http://europa.eu.int/european_council/index_pt.htm (site de pesquisa sobre os órgãos da

União Européia).

- http://europa.eu.int/constitution/index_pt.htm (site sobre o Tratado Constitucional

Europeu).

VIII. Anexo – Status de ratificação do Tratado Constitucional nos Estados-Membros10

10 Verde – países que já ratificaram; Vermelho – países que disseram “não”; Azul – países que ainda não

Referências

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