O SENADO FEDERAL DO BRASIL: CASA FEDERATIVA OU INSTITUIÇÃO NACIONAL?
Milton de Souza Mendonça Sobrinho1
Resumo2
Este estudo pretende analisar a funcionalidade política do Senado Federal do Brasil. A partir da análise de suas prerrogativas constitucionalmente estabelecidas pela Carta de 1988 e do comportamento do Senado diante de situações que exigem sua participação, procura-se verificar em que medida suas ações privilegiam a defesa dos interesses da União e em que medida o mesmo age de forma a defender os interesses dos estados. Trata-se, portanto, de averiguar na prática se o Senado tem funcionado como uma instituição de caráter nacional ou como uma casa federativa, justificativa pela qual foi criada e pela qual é composta.
Palavras-chave: Senado Federal, federalismo, bicameralismo.
1. Identificação do Problema de Pesquisa
O tema deste estudo refere-se à análise da atuação do Senado Federal do Brasil no pós-Constituinte, período 1988-2008, especificamente no que concerne à própria produção e apreciação legislativa vista por meio do contraste entre demandas federativas e nacionais.
1 Graduando em Ciências Sociais (Modalidade: Bacharelado) pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás (FCS/UFG).
O ponto de partida do estudo será a análise das disposições normativas que regulamentam o funcionamento do Senado enquanto instituição, tais como, atribuições constitucionais, normas regimentais e características organizacionais.
Em seguida, pretende-se averiguar por meio da análise dos Projetos de Lei Ordinária (PL) e dos resultados das votações dos mesmos, em que medida as proposições (de caráter federativo ou nacional) e as apreciações (para aprovação ou rejeição) dos PLs por parte dos senadores privilegiam a defesa dos interesses da União ou se os mesmos agem de forma a defender os interesses dos estados da federação ao qual estão vinculados. Trata-se, portanto, de verificar se o Senado tem funcionado como uma instituição de caráter nacional ou como uma casa federativa.
2. Justificativa do Problema
Este problema de pesquisa surgiu de uma inquietação suscitada com a leitura da tese de doutorado em Ciência Política do professor e pesquisador do CEBRAP Pedro Robson Pereira Neiva (2004)3. O estudo de Neiva (2004) introduz um elemento crítico na interpretação dos poderes e do papel dos senados em países federativos. A existência de um senado forte independe da adoção de um arranjo federativo, senão do sistema de governo. O autor (idem, 2004) questiona então se os senados não seriam uma salvaguarda dos interesses da União ao invés de ser uma compensação federativa. Alguns autores são chamados para o debate (SHARMAN, 1987; SWIFT, 1999) e postulam contribuições acerca do Senado norte-americano afirmando que este, antes de ser considerado uma casa federativa, é uma instituição nacional.
A intenção, portanto, é refletir e analisar esta questão tendo como objeto privilegiado de estudo o Senado brasileiro. O período 1988-2008 estabelecido como recorte temporal da pesquisa cobre as duas primeiras décadas desde o retorno à democracia. O estudo abarcará, portanto, a produção e a apreciação legislativa do
3A referida tese de doutorado é intitulada “Estudo Comparado de Câmaras Altas: Os Poderes e o Papel dos Senados em Sistemas Presidencialistas”. A tese foi defendida em 2004 no Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro – IUPERJ.
Senado nos vinte anos subsequentes a Promulgação da Constituição Federal de 1988 contrapondo as dimensões federativa e nacional.
3. Enunciação dos Objetivos
O estudo que este pré-projeto busca encaminhar pretende partir da análise dos pressupostos normativos que balizam o funcionamento do Senado enquanto instituição, no entanto, também se aterá a atuação e ao comportamento dos senadores enquanto parlamentares na proposição e apreciação de Projetos de Lei Ordinária e suas respectivas votações no período de 1988-2008. Para tanto, os objetivos que se seguem são os que vão conduzir a pesquisa visando dar condições de responder ao problema já enunciado:
a) Analisar as atribuições e prerrogativas constitucionalmente estabelecidas pela Carta de 1988 ao Senado brasileiro;
b) Analisar os dispositivos regimentais que asseguram a organização interna e a dinâmica do processo legislativo realizado no Senado;
c) Examinar os Projetos de Lei Ordinária de origem no Senado, enquadrando em dimensões federativas e nacionais. Para tanto, utilizar-se-á o arcabouço de análise proposto por Amorim Neto e Santos (2002) que enquadra a produção legislativa em categorias como individual, local, regional, setorial ou nacional; d) Verificar a apreciação dos PLs nas comissões e no Plenário, por meio das
aprovações ou rejeições dos mesmos.
A classificação desenvolvida por Amorim Neto e Santos (2002) que distribui as proposições legislativas conforme a sua abrangência é amplamente aceita pela literatura e servirá como viés definidor para o enquadramento dos PLs produzidos no Senado em dimensão federativa e dimensão nacional. É importante mencionar que a categoria federativa não está posta na classificação original de Amorim Neto e Santos (2002), no entanto, considerar-se-á a mesma em virtude da problemática para qual a pesquisa está voltada. Tal procedimento de incremento da categoria federativa foi igualmente empregado em estudo similar empreendido por Araújo (2008).
4. Metodologia
O referencial teórico-metodológico que orientará e embasará a pesquisa é o neo-institucionalismo, paradigma preponderante na Ciência Política contemporânea. O neo-institucionalismo reivindica que as instituições constrangem/restringem e moldam/estruturam o comportamento dos atores políticos, influenciando preponderantemente a formação das identidades individuais e coletivas bem como as preferências políticas (NORGAARD, 1996 apud PERES, 2008). De acordo com Pierson (1996 apud PERES, 2008), “o surgimento do novo institucionalismo na Ciência Política reflete um renovado interesse pelo próprio modo como arranjos relativamente estáveis e rotineiros estruturam o comportamento político” (idem, 1996: 152 apud PERES, 2008: 63). Por conseguinte, analisar as normas e incentivos institucionais para a atuação dos senadores na proposição e apreciação dos PLs é condição importante para melhor apreender a dinâmica e o funcionamento do Senado brasileiro seja como casa federativa ou como instituição nacional.
O fato de considerar apenas os PLs de origem no Senado é estratégico tendo em vista que sua apreciação pode ser feita sem o perigo do constrangimento que há em outras proposições de origem diversa que iniciam sua tramitação obrigatoriamente na Câmara dos Deputados, pois como já mencionado as eventuais modificações que o Senado viesse a fazer em PLs que não fossem oriundos de lá, poderia ser revertido quando retornasse para a discussão e votação na Câmara dos Deputados (Art. 61, § 2º e Art. 64, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988).
Adotar-se-á como procedimento metodológico inicial um amplo levantamento e revisão da literatura que trata do tema deste trabalho. Em um segundo momento, obter-se-á junto ao Processamento de Dados do Senado Federal (PRODASEN)4os PLs produzidos no Senado entre 1988-2008 bem como suas votações nas comissões permanentes e no Plenário da Casa. Posteriormente, far-se-á uma pesquisa seguida de análise documental para organizar todo o material em compilações de um banco de dados próprio para esta pesquisa.
4Processamento de Dados do Senado Federal (PRODASEN) é o órgão responsável pelo processamento de dados do Congresso Nacional.
Referências Bibliográficas
AMORIM NETO, O.; SANTOS, F. A produção legislativa no Congresso: entre a paróquia e a Nação. In: VIANNA, L. W. (Org.). A democracia e os três poderes no Brasil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002. p. 91-139.
ARAÚJO, P. M. A Câmara Alta no Presidencialismo brasileiro: o desempenho legislativo do Senado entre 1989 e 2000. In: LEMOS, L. B. (Org.). O Senado Federal Brasileiro no
Pós-Constituinte. Brasília: Senado Federal/Unilegis, 2008. p. 203-236.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais nos1/1992 a 67/2010, pelo Decreto Legislativo nº 186/2008 e pelas Emendas Constitucionais de Revisão nos1 a 6/1994. 34. ed. Brasília: Câmaras dos Deputados, Edições Câmara, 2011. 103 p.
NEIVA, P. R. P. Estudo comparado de câmaras altas: Os poderes e o papel dos senados em sistemas presidencialistas. 2004. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, IUPERJ, Rio de Janeiro, 2004.
NORGAARD, S. Rediscovering reasonable rationality in institutional analysis. European Journal of Political Research, 1996, p. 31-57.
PERES, P. S. Comportamento ou instituições? A evolução histórica do
neo-institucionalismo da ciência política. Revista Brasileira de Ciências Sociais – RBCS, São Paulo, v. 23, n. 68, p. 53-72, 2008.
PIERSON, P. The new politics of the welfare State. World Politics, 1996, p. 143-179. SHARMAN, C. Second chambers. In: BAKVIS, H.; CHANDLER, W. M. (Editors).
Federalism and the role of the State. University of Toronto Press, 1987. p. 83-100.
