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As parcerias público-privadas no sector da saúde em Portugal

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Academic year: 2021

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Jorge Abreu Simões é encarregado de missão da Estrutura de Mis-são Parcerias.Saúde.

Entregue em Novembro de 2004.

As parcerias público-privadas

no sector da saúde em Portugal

JORGE ABREU SIMÕES

As parcerias público-privadas constituem uma abordagem inovadora de gestão pública que visa a realização de infra--estruturas e a prestação de serviços públicos, numa lógica de optimização das performances dos sectores público e privado. Modernamente, um número crescente de países recorre à abordagem PPP para implementar políticas públicas e projectos públicos quer no domínio das obras públicas clássicas, quer do desenvolvimento dos serviços de tipo sócio-infra-estrutural, como os hospitais públicos e outras unidades de prestação de cuidados de saúde. Assim, em Portugal, no âmbito do SNS, as parcerias público-privadas constituem um novo mecanismo de provi-são e contratação da prestação dos cuidados públicos de saúde, abrangendo no nosso ordenamento jurídico tanto os cuidados diferenciados e especializados a nível hospitalar como os cuidados primários e cuidados continuados de saúde.

Entretanto, foi iniciado um programa governamental de parcerias público-privadas para o sector hospitalar que prevê o lançamento gradual de 10 novos hospitais até ao final de 2006. Este programa encontra-se em plena exe-cução, tendo sido adoptado um modelo de parceria reconhecidamente inovador para o sector da saúde. O modelo PPP para os novos hospitais baseia-se num con-trato de gestão cujo objecto envolve a cadeia de actividades que vai desde a concepção, construção, financiamento,

con-servação e exploração dos activos infra-estruturais até à gestão geral do hospital, incluindo a prestação de serviços clínicos por parte do operador privado.

Esta parceria é desenvolvida por duas entidades gestoras com objectos e horizontes contratuais diferenciados, sendo remuneradas por dois mecanismos de pagamento distintos.

Em Portugal, o sector hospitalar público constitui a principal rede de prestação de cuidados de saúde, absorvendo a fatia mais importante do financiamento público do Serviço Nacional de Saúde e contri-buindo, assim, com a factura mais significativa da despesa pública em saúde.

À semelhança de outros países europeus, os sucessi-vos governos procuraram desenvolver iniciativas reformistas, tendo em vista conferir maior eficiência, autonomia e responsabilidade às unidades hospitala-res com o propósito mais amplo de melhorar a per-formance do universo dos hospitais públicos, quer na óptica da obtenção de ganhos acrescidos de saúde, quer na perspectiva da melhor utilização dos fundos atribuídos ao sector, controlando o crescimento dos gastos públicos.

Desde o início dos anos 90, ao abrigo da Lei de Bases da Saúde e do Estatuto do SNS, foram toma-das várias iniciativas reformistas com incidência no sector hospitalar, mas na viragem da década (e do século) cresceu o reconhecimento geral de que as medidas até então equacionadas eram marcadas pelo excesso de timidez e evidenciavam um alcance

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prá-tico relativamente limitado. Com efeito, no sector hospitalar as experiências inovadoras de gestão e de financiamento não chegaram a ganhar suficiente expressão e «massa crítica» para conseguirem gerar os necessários efeitos estruturantes e de difusão e, consequentemente, operarem a mudança do pano-rama do sector.

Neste contexto, perante o reconhecido défice de implementação de medidas robustas de reforma, com a realização das eleições legislativas de 2002, em matéria de política pública de saúde, assistiu-se à convergência dos programas políticos dos três princi-pais partidos com representação parlamentar. As pro-postas políticas convergiam na necessidade de intro-duzir um novo impulso reformista no sentido de revitalizar e modernizar o SNS, conferindo-lhe maior eficiência e sustentabilidade financeira e aumentando a sua produtividade, performance e eficácia, em ter-mos de ganhos de saúde. Para o sector hospitalar, com cambiantes diferenciadas, previa-se o desenvol-vimento gradativo de uma reforma estrutural que operasse a transformação dos pilares burocrático--administrativos e da matriz monolítica em que assentava o modelo de gestão e financiamento da rede pública hospitalar.

Nesta linha, no âmbito da reforma estrutural do sec-tor hospitalar, duas importantes iniciativas eram espe-cialmente preconizadas: a introdução da abordagem das parcerias público-privadas, promovendo a parti-cipação do sector privado na gestão e financiamento de unidades hospitalares do SNS e a «empresarializa-ção» da gestão hospitalar, designadamente com a alteração das práticas públicas de gestão e financia-mento, bem como com a mudança do estatuto admi-nistrativo dos hospitais, introduzindo um estatuto de natureza empresarial, embora sob controlo accionista público, num número significativo de hospitais. Estas duas iniciativas tiveram a sua génese ainda no decorrer do mandato do XIV Governo Constitucio-nal, sendo protagonizadas pelo ministro da Saúde António Correia de Campos1. Na altura, a abrupta

interrupção do mandato governativo levou entretanto a eleições gerais e a uma viragem política. O novo governo de coligação, de inspiração política de

cen-tro-direita, deu continuidade às iniciativas anterior-mente desenhadas e sob a liderança do ministro da Saúde, Luís Filipe Pereira, iniciou-se a progressiva materialização do tríptico relançamento-aprofunda-mento-acabamento2. Mais recentemente, na linha de

continuidade do executivo anterior, o Programa do XVI Governo veio confirmar o compromisso político para com o desenvolvimento da reforma hospitalar e a consolidação destas duas iniciativas inovadoras. Assim, o programa de parcerias no sector da saúde foi enunciado e está hoje em plena implementação, centrado especialmente nos projectos modernização hospitalar.

1. As parcerias público-privadas no sector da saúde: um novo mecanismo

de provisão e contratação

de cuidados de saúde no âmbito do SNS No âmbito do SNS, as parcerias público-privadas constituem um novo mecanismo de provisão e con-tratação da prestação dos cuidados públicos de saúde, abrangendo no nosso ordenamento jurídico quer os cuidados diferenciados e especializados a nível hos-pitalar, quer os cuidados primários e cuidados conti-nuados de saúde.

Como novo mecanismo de provisão e prestação de cuidados públicos de saúde, as parcerias assentam na seguinte tríplice de vectores:

• Planeamento e financiamento públicos; • Investimento e gestão privados; • Controlo e titularidade públicos.

Globalmente financiadas pelo SNS de acordo os seus princípios edificadores — universalidade, acessibili-dade, equidade e gratuitidade tendencial —, as parce-rias em saúde são obrigatoriamente precedidas de um procedimento de contracção pública e de uma avalia-ção prévia.

Esta nova modalidade de contratação pública de cui-dados de saúde deve ter um carácter competitivo e prever uma adequada afectação de riscos, atribuindo-os

1Na sequência da remodelação governamental de Julho de 2001 foram anunciados os primeiros hospitais a serem lançados em regime de parceria público-privada e em Setembro foi criada a Estrutura de Missão Parcerias.Saúde, junto do ministro da Saúde, com a missão de supervisionar e coordenar a preparação, lança-mento e condução dos concursos relativos aos projectos de parceria (Resolução do Conselho de Ministros n.o 162/2001, de 16 de Novembro); pouco tempo depois, através da Resolução do Conse-lho de Ministros n.o 41/2002, de 14 de Fevereiro, a coordenação da «empresarialização» da gestão hospitalar foi cometida à Estrutura de Missão Parcerias.Saúde.

2A iniciativa de «empresarialização» dos hospitais foi alargada, tendo 34 hospitais do sector público administrativo sido transfor-mados em 31 sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos num curto espaço de tempo. No decorrer do processo, a iniciativa passou a ser supervisionada por uma comissão de acom-panhamento criada para o efeito (Despacho n.o 24 828/2002, de 17 de Outubro, do ministro da Saúde), passando posteriormente a ser implementada através da Unidade de Missão de Hospitais SA (Resolução do Conselho de Ministros n.o 15/2003, de 17 de Janeiro). Em paralelo, a escala da abordagem e do programa de parcerias foi ampliada.

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às partes mais competentes para assegurarem a sua gestão da forma mais económica. A contratação deve ser ainda precedida de uma rigorosa preparação e avaliação prévia sobre a sua economia, eficiência e eficácia, de modo a demonstrar ganhos de valor para o erário público e satisfazer os requisitos decorrentes da respectiva comportabilidade financeira3.

As parcerias representam, pois, uma abordagem ino-vadora de gestão e financiamento de unidades públi-cas de saúde, pretendo associar, numa perspectiva de longo prazo, o que há de melhor no sector público e no sector privado. Do lado público, importa salientar o contributo do capital humano corporizado nos pro-fissionais de saúde e, no lado privado, merece espe-cial destaque a mobilização da sua capacidade de gestão e financiamento, bem como de assumir riscos. Em regra, uma parceria em saúde consubstancia-se numa associação duradoura entre um ente público do SNS e um operador do sector privado e/ou social, sendo materializada numa relação contratual de longo prazo com uma (ou mais) sociedades veículo de natureza comercial — enquanto entidade ges-tora —, cujo objecto exclusivo é o exercício do objecto ou objectos contratuais.

De um modo geral, as parcerias têm como fio condu-tor o duplo objectivo de garantirem ganhos de saúde para os utentes e de assegurarem ganhos de valor para o erário público, no mútuo benefício da

socie-dade e dos contribuintes. Assim, baseiam-se no duplo princípio de transferirem risco para os operadores privados e de incorporarem a eficiência do sector pri-vado no sector público.

2. O programa de parcerias público-privadas no sector da saúde

O programa governamental de parcerias público-pri-vadas prevê o lançamento gradual de 10 novas unida-des hospitalares do SNS até ao final de 2006. Toda-via, a carteira de projectos de parceria em preparação e implementação pela Estrutura de Missão Parce-rias.Saúde é mais abrangente, envolvendo também projectos não hospitalares, como é o caso do recém--lançado projecto do Centro de Atendimento do SNS. O programa de parcerias para o sector hospitalar é, naturalmente, o mais significativo e robusto, consti-tuindo um vector determinante da reforma estrutural do sector. Este programa visa prosseguir um núcleo importante de objectivos:

• A melhoria geral do acesso — e, em especial, dos níveis de comodidade — aos cuidados básicos e especializados de saúde por parte das populações das áreas beneficiadas;

• A melhoria da qualidade dos serviços prestados, em termos de padrões de atendimento e de acolhi-mento, bem como da sua necessária humaniza-ção;

• A construção de modernas unidades hospitalares, de acordo com uma lógica de investimento mais

racio-Quadro I

O programa PPP para o sector hospitalar

1.a vaga 2.a vaga (2001-2002) (2002) Sintra Novos hospitais Loures Évora Gaia

Cascais Vila Franca de Xira

Hospitais de substituição Póvoa/Vila do Conde

Braga

Algarve Guarda

3Conforme disposições aplicáveis da Lei n.o 91/2001, de 20 de Agosto (lei de enquadramento orçamental), e princípios normati-vos do Decreto-Lei n.o 86/2003, de 26 de Abril, e Decreto-Lei n.o 185/2002, de 20 de Agosto.

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nal e capaz de introduzir inovações infra-estruturais e técnicas susceptíveis de favorecerem a prestação dos serviços de saúde na óptica do utente; • A adopção de um modelo de gestão de natureza

empresarial, globalmente mais económico, efi-ciente e eficaz, baseado na transferência de riscos para os operadores privados.

Presentemente, o programa de parcerias para o sector hospitalar compreende o lançamento de 10 novos hospitais de raiz (green field projects), sendo 8 pro-jectos hospitalares de substituição.

A primeira vaga de hospitais PPP foi primeiramente anunciada em Julho de 2001 e posteriormente confir-mada em Maio de 2002 pelo governo recém-eleito. Em Julho de 2002, o novo governo anunciou o aprofunda-mento da abordagem das parcerias ao sector da saúde, apresentando uma segunda vaga de 5 hospitais PPP. A dimensão dos hospitais é naturalmente diferen-ciada. Em Braga será construído um hospital central e universitário e em Loulé o novo hospital central do Algarve. Por sua vez, os hospitais de Cascais, Vila Franca de Xira, Sintra, Guarda, Évora e Póvoa de Varzim/Vila do Conde terão uma dimensão entre as 200-400 camas. Na faixa entre as 400-600 camas situar-se-ão os novos hospitais de Loures e de Gaia. Em termos de investimento inicial em instalações e equipamentos, o programa pode ascender a mais mil milhões de euros, mas os encargos globais relativos aos 10 contratos de gestão com os operadores priva-dos podem ascender acima priva-dos 10 mil milhões de euros, em termos de valores nominais.

A concepção e implementação do programa de par-cerias é conduzida a nível central, tendo a supervisão da preparação dos projectos e a coordenação dos res-pectivos processos concursais sido cometidas à Estrutura de Missão Parcerias.Saúde4.

Dois concursos para projectos hospitalares foram já lançados e espera-se que no final do próximo ano tenham sido lançados mais 4-5 concursos. Os con-cursos dos novos hospitais de Loures e de Cascais foram aprovados e lançados sensivelmente com seis meses de diferença, mas o ritmo de implementação deverá ser agora acelerado.

O primeiro concurso relativo ao hospital de Loures encontra-se, até ao final do ano, em fase de avaliação das propostas dos concorrentes, tendo apresentado proposta quatro consórcios5. Após a conclusão desta

fase segue-se um período negocial, primeiro com dois concorrentes, e depois com um concorrente (preferred bidder), que será anunciado eventualmente em Março. A adjudicação do contrato deverá ocorrer durante o 2.o semestre.

O prazo de apresentação de propostas para o novo hospital de Cascais foi fixado em 28 de Fevereiro do próximo ano, devendo a adjudicação do contrato ter lugar no início de 2007.

Em paralelo à implementação do programa de parce-rias para o sector hospitalar, estão em preparação ou em concurso outros projectos inovadores de parceria. Assim, em Maio passado foi lançado a concurso, em regime PPP, o futuro Centro de Atendimento do SNS. O contrato tem uma duração de quatro anos, prorrogá-vel por mais um ano, e contempla como objecto a concepção, projecto, instalação, financiamento, explo-ração e transferência para a entidade pública contra-tante do Centro de Atendimento do SNS, prevendo-se que seja adjudicado até ao final do ano corrente. O futuro Centro de Atendimento entrará em fase operacional no último trimestre de 2005, prestando três gamas de serviços à escala nacional:

• Triagem, aconselhamento e encaminhamento, disponibilizando, para tal, o acesso a um profis-sional de saúde que avalia o nível de risco dos sintomas descritos, presta aconselhamento e, se necessário, encaminha o doente para a estrutura de cuidados de saúde mais apropriada;

• Assistência em saúde pública, disponibilizando o acesso a um profissional de saúde para esclareci-mento de questões e apoio em matérias de saúde pública;

4Pela Resolução do Conselho de Ministros n.o 102/2004, de 21 de Julho, foi entretanto renovado o mandato desta Estrutura de Missão e prorrogado até Agosto de 2008 o seu prazo de vigência. 5O consórcio «Construção, Gestão de Hospitais» é constituído pelas seguintes entidades: FCC Construcción, SA, Ramalho Rosa — Cobetar, Sociedade de Construções, SA, CasaisInvest — Gestão de

Participações Sociais, SGPS, SA, Eusébiospar SGPS, SA, F.D.O. — SGPS, SA, Construções Gabriel A. S. Couto, SA, Santa Casa da Misericórdia do Porto; o consórcio «CONSIS» é formado pelas seguintes entidades: Espírito Santo Saúde — SGPS, SA, Hospitais da Arrábida — Gaia, SA, Cliria — Hospital Privado de Aveiro, SA, Espírito Santo — Unidades de Saúde e de Apoio à Terceira Idade, SA, Asklepios Internacional GmbH, Asklepios Kliniken GmbH, Mota-Engil, Ambiente e Serviços, SGPS, SA, Mota-Engil, Engenha-ria e Construção, SA, OPCA — Obras Públicas e Cimento Armado, SA, DALKIA — Energia e Serviços, SA, Banco Espírito Santo, SA; o consórcio «Hospitais Privados de Portugal/Teixeira Duarte» inte-gra as seguintes entidades: HPP — Hospitais Privados de Portugal, SGPS, SA, Hospitais Privados de Portugal, HPP Norte, SA, Hospi-tais Privados de Portugal, HPP Centro, SA, HospiHospi-tais Privados de Portugal, HPP Sul, SA, Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial, SA, Teixeira Duarte — Engenharia e Construções, SA; o consórcio «ESCALA LOURES» é constituído pelas seguintes entidades: José de Mello Saúde, SGPS, SA, ISU — Estabelecimentos de Saúde e Assistência, SA, S.G.H.D. — Sociedade Gestora do Hospital das Descobertas, SA, Somague Concessões e Serviços, SA, Somague Engenharia, SA, EDIFER — Construções Pires Coelhos & Fer-nandes, SA, EDIFER — Investimentos, SGPS, SA, BCP Investi-mento — Banco Comercial Português de InvestiInvesti-mento, SA.

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Informação de saúde, permitindo o acesso rápido e fácil a informação geral relacionada com a pres-tação de serviços de saúde.

O Centro de Atendimento do SNS integrará, numa única plataforma multicanal, os actuais serviços de atendimento telefónico existentes no SNS, como sendo o serviço de orientação pediátrica, Saúde 24 e o serviço de atendimento Linha de Saúde Pública. Com um horizonte temporal relativamente reduzido, o contrato PPP do Centro de Atendimento do SNS não deixa de ser um projecto de parceria significa-tivo, uma vez que associa a contratação do forneci-mento da plataforma tecnológica à prestação do pró-prio serviço de atendimento, desde o seu arranque até à entrada em fase de cruzeiro.

3. Da concepção à implementação da abordagem PPP

A introdução da abordagem das parcerias público--privadas requer a existência de enquadramento legal apropriado à participação do sector privado na pres-tação dos serviços públicos em causa, bem como a regulamentação dos procedimentos de contratação pública mais adequados.

Assim, num primeiro tempo, o trabalho da Estrutura de Missão foi centrado na elaboração das peças legis-lativas necessárias à definição do quadro legal das par-cerias em saúde. Em Agosto de 2002, o Governo esta-beleceu, desde logo, o regime jurídico das parcerias em saúde, com gestão e financiamentos privados6.

Este quadro legal é marcadamente «habilitante», incidindo sobre a recém-criada rede nacional de prestação de cuidados de saúde, compreendendo a tripla rede dos cuidados primários, cuidados hospita-lares e cuidados continuados. De acordo com o nor-mativo em apreço, o contrato de gestão constitui a matriz dos instrumentos contratuais, assumindo a natureza de técnica concessória numa lógica de con-trato de serviço público. Dentro das possíveis tipo-logias contratuais, são ainda expressamente previstas mais duas formas: o contrato de prestação de servi-ços e o contrato de colaboração.

O quadro legal aprovado é razoavelmente flexível, permitindo a combinação diversa de diferentes ele-mentos, em termos de «geometria variável». No âmbito dos contratos de gestão, é possível, por exem-plo, desenhar diferentes configurações:

• Envolvendo a concepção, construção, financia-mento e manutenção de uma nova infra-estrutura

de saúde (de uma nova unidade hospitalar ou de substituição, de um centro de saúde ou de uma unidade de cuidados continuados);

• Abrangendo a concepção, construção, financia-mento e manutenção de uma nova infra-estrutura de saúde, bem como a gestão e exploração dessa unidade de saúde, incluindo a prestação de servi-ços clínicos (de uma nova unidade hospitalar ou de substituição, de um centro de saúde ou de uma unidade de cuidados continuados);

• Compreendendo apenas a concepção, constru-ção, financiamento e manutenção dos elementos infra-estruturais numa intervenção de renovação e reabilitação de uma unidade de saúde já exis-tente (por exemplo, de uma unidade hospitalar degradada carecida de renovação e moderniza-ção);

• Envolvendo a gestão de uma unidade ou de um conjunto de unidades de saúde existentes integra-das no SNS, incluindo a prestação dos respectivos serviços de saúde (por exemplo, de uma unidade hospitalar, ou de um conjunto de centros de saúde de uma determinada área, ou de um conjunto de unidades de cuidados continuados da rede criada numa dada área);

• Combinando a gestão de uma ou mais unidades existentes com a concepção, construção, financia-mento e manutenção de uma ou mais novas infra--estruturas de saúde, incluindo a respectiva gestão e prestação de serviços clínicos (por exemplo, um cluster de centros de saúde novos e existente numa dada área, um cluster de unidades de cuida-dos continuacuida-dos novos e existente numa dada área, um centro hospitalar com um cluster de centros de saúde novos e existente na sua área de atracção/influência);

• Incidindo sobre projectos de tipo discreto, tendo por base a gestão e financiamento de elementos ou partes funcionalmente autónomas de unidades de saúde ou ainda serviços de apoio directo e indirecto à prestação de cuidados de saúde. Atendendo à multiplicidade de formatos que as par-cerias podem revestir, foi consagrada uma metodolo-gia legislativa baseada na regulamentação, através de decreto regulamentar, de cada caderno de encargos--tipo, estabelecendo o modelo de parceria mais ade-quado para cada possível figurino, bem como o res-pectivo procedimento prévio à contratação.

Em sequência, procedeu-se à regulamentação do pro-cedimento concursal standard aplicável às parcerias celebradas sob a forma de contratos de gestão, no âmbito dos cuidados hospitalares7.

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Entretanto, o Governo aprovou, por iniciativa do Ministério das Finanças, um diploma-quadro sobre normas transversais especialmente aplicáveis às par-cerias público-privadas8. O diploma em apreço tem

por objecto regulamentar a intervenção do Estado na definição, concepção, preparação, concurso, adjudi-cação, alteração, fiscalização e acompanhamento glo-bal das parcerias público-privadas, consagrando uma metodologia de preparação e avaliação ex ante dos projectos de parceria em articulação com o Ministé-rio das Finanças9, e estabelece os pressupostos e

con-dições prévias que hão-de ser verificados para efeitos da respectiva aprovação.

Paralelamente, foi desenvolvida e publicada a regula-mentação do caderno de encargos-tipo que consubs-tancia o modelo PPP para o desenvolvimento de novas unidades hospitalares, bem como para a gestão de unidades existentes10. Assim, esta regulamentação

abrange os contratos de gestão que tenham por objecto:

• As actividades de concepção, construção, finan-ciamento, conservação, gestão e exploração de uma nova unidade hospitalar, envolvendo (ou não) a responsabilidade de prestação de serviços clínicos;

• As actividades de gestão e financiamento privado que envolvam a responsabilidade pela realização das prestações de saúde numa unidade hospitalar já existente;

• As actividades de financiamento privado e gestão ou exploração de partes funcionalmente autóno-mas de um estabelecimento hospitalar.

Em sequência, seguindo o figurino das entidades reguladoras independentes já existentes, foi criada a Entidade Reguladora da Saúde, com atribuições abrangentes, cobrindo a rede do SNS e a medicina privada, dirigidas sobretudo à defesa dos direitos dos utentes e dos princípios da prestação do serviço público: universalidade e igualdade no acesso, segu-rança e qualidade das prestações11.

Deste modo, o ciclo preparação de um enquadra-mento legal adequado ao desenvolvienquadra-mento de parce-rias em saúde encontra-se praticamente concluído, sem embargo de se ter de prever o seu aperfeiçoa-mento contínuo.

4. O modelo de parceria público-privada para os novos hospitais

De há uns anos a esta parte, a nível mundial, as expe-riências de parcerias com o sector privado no âmbito dos sistemas públicos de saúde eram relativamente limitadas. Este panorama está hoje em profunda mutação em várias áreas do globo, prevendo-se que a abordagem PPP se alargue sucessivamente aos sis-temas nacionais de saúde de vários países em todos os continentes.

Assim, durante os anos 90 emergiram basicamente três modelos diferenciados, em termos de diferentes ângulos: grau de envolvimento do sector privado, grau de transferência de risco para o operador pri-vado, amplitude do objecto contratual, mecanismos de pagamento e mecânica de funcionamento da par-ceria e do contrato:

• O modelo do Reino Unido12, baseado na prestação,

por parte do operador privado, de um package de serviços que compreende os serviços infra-estrutu-rais e os serviços de hard e soft facillity manage-ment13. Deste modo, o operador privado não é

res-ponsável pela prestação de cuidados de saúde nem pela gestão hospitalar e clínica.

O «contrato de concessão» centra-se, assim, na concepção, construção, financiamento up front dos novos activos infra-estruturais ou renovados, incluindo a manutenção desses activos e os servi-ços de apoio e logísticos durante o período do contrato. A duração típica deste tipo de contratos situa-se em 25 ou 30 anos, sendo os referidos activos reversíveis para o SNS no respectivo termo.

O mecanismo de pagamento baseia-se na disponi-bilidade dos serviços contratados, de acordo com os princípios no hospital, no fee e pagamento 100% variável (com eventuais deduções devidas por falhas de performance);

• O modelo do estado de Vitória, na Austrália14,

envolvendo a contratação dos serviços clínicos e

8Decreto-Lei n.o 86/2003 de 26 de Abril.

9Despacho Normativo n.o 35/2003, de 25 de Julho de 2003, da ministra de Estado e das Finanças.

10Decreto-Regulamentar n.o 14/2003, de 30 de Junho. 11Decreto-Lei n.o 309/2003, de 10 de Dezembro.

12No Reino Unido, até 2003, foram assinados 25 contratos relati-vos a projectos hospitalares, encontrando-se 19 contratos já em fase operacional e 39 novos projectos em pleno processo concursal.

13Os serviços logísticos e de apoio directo e indirecto à prestação de cuidados são geralmente agrupados em duas categorias, hard

facillities management (HFM) e soft facillities management (SFM).

Os serviços de HFM compreendem, por exemplo, o estacionamento, a jardinagem e manutenção de espaços verdes, a manutenção do edifício e de redes, a recolha e disposição de resíduos. Os serviços de SFM englobam, por exemplo, a higiene e limpeza, a lavandaria, a alimentação, a segurança de pessoas e bens, a portaria. 14Contrato de concessão do Hospital de Latrobe (1996) e contrato de concessão do Hospital de Mildura (1999).

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o desenvolvimento das infra-estruturas hospitala-res pelo operador privado, mas sem prever a sua reversibilidade para o sector público no termo do contrato. A duração dos contratos situava-se entre os 15-20 anos, sendo o mecanismo de pagamento baseado no sistema de financiamento por GDHs e no casemix;

• O modelo da Autonomia Regional de Valência (Espanha)15, assente num contrato do tipo

conces-são administrativa, abrangendo a concepção, construção, financiamento da nova unidade hos-pitalar e a prestação dos serviços clínicos por um período de 10 anos (renovável até 15 anos) e prevendo a transferência da unidade hospitalar para o sector público no termo do contrato. O res-pectivo mecanismo de pagamento estruturado numa componente estritamente capitativa para as prestações de saúde relativas à população prote-gida e uma componente não capitativa (ou factu-rada) para as prestações de saúde relativas a pes-soas fora da população protegida definida. Deste elenco, o modelo do Reino Unido é aquele que tem ganho maior aceitação universal. Ao não abran-ger a gestão clínica por parte do operador privado, o modelo deixa o core business do hospital na esfera pública, tornando o modelo relativamente atractivo para as ordens profissionais, sindicatos, construtores e instituições financeiras, embora por diferentes razões. Assim, outros países estão a adoptar o modelo britânico, como é o caso do Canadá, Japão, Itália e África do Sul. Na Austrália, o modelo inglês também é utilizado em vários estados, inclusive mais recentemente no de Vitória. Em Espanha prevê-se que o modelo anglo-saxónico seja aplicado aos 8 hospitais a construir na região de Madrid.

Neste panorama, o modelo português emerge como um quarto figurino, com uma abordagem avançada e inovadora.

O nosso modelo PPP para os novos hospitais do SNS baseia-se num contrato de gestão cujo objecto envolve a cadeia de actividades que vai desde a con-cepção, construção, financiamento, conservação e exploração dos activos infra-estruturais até à gestão geral do hospital, incluindo a prestação de serviços clínicos16.

Por sua vez, a parceria concretiza-se e desenvolve-se através de duas entidades gestoras com responsabili-dades diferentes e delimitadas, num quadro de arti-culação e complementaridade.

Com objectos contratuais e vocações operativas dife-renciados, as duas entidades gestoras têm horizontes contratuais diferenciados, sendo remuneradas por dois mecanismos de pagamento distintos, gerando dois fluxos de pagamento independentes, de modo a permitirem uma adequada transferência de riscos para o parceiro privado, bem como a sua afectação apropriada entre as duas entidades operadoras. Deste modo, o modelo PPP assenta no binómio «um concurso público-um contrato de gestão», mas é implementado através de duas sociedades gestoras: • Uma sociedade gestora — a entidade gestora do

estabelecimento hospitalar — assume a gestão geral do estabelecimento hospitalar e a prestação dos serviços clínicos durante um prazo de 10 anos, prorrogável de acordo com a observação de um conjunto de condições objectivas;

• A outra sociedade gestora — a entidade gestora do edifício hospitalar — assume a prestação dos serviços infra-estruturais durante um período con-tratual previsível de 30 anos, sendo responsável pela concepção, construção e manutenção do edi-fício e infra-estruturas hospitalares, bem como pelas actividades de hard facillities management. Dentro desta configuração estrutural, o soft facillities management foi primacialmente afecto à entidade gestora do estabelecimento hospitalar, enquanto o hard facillities management está na esfera de respon-sabilidade da entidade gestora do edifício hospitalar. Para assegurar uma adequada transferência de riscos foi desenhado um mecanismo de pagamento, tendo em conta as características específicas de cada opera-ção, de modo a estabelecer fluxos de pagamento dis-tintos da parte da entidade pública contratante para as duas sociedades gestoras.

Para a entidade gestora do edifício hospitalar foi adoptado um mecanismo de pagamento baseado na disponibilidade do conjunto de serviços contratuali-zados, com penalizações e deduções ao pagamento relacionadas com falhas de serviço e de qualidade. No tocante à entidade gestora do estabelecimento hospitalar, o respectivo pagamento pela entidade pública contratante é baseado na produção clínica, por grandes linhas de actividade clínica (urgência, internamento, ambulatório), de acordo com uma tabela de preços específica, definida no âmbito do processo concursal, contemplando igualmente um sistema de penalizações e deduções ao pagamento por incumprimento.

15Contrato do Hospital de La Ribera, em Alzira (1996); mais recen-temente o modelo evoluiu para a integração da prestação dos cuida-dos primários: contrato Alzira II e contrato de Torrevieja (2003). 16Em Portugal, a primeira e única experiência de gestão privada de um hospital público datava de 1995, altura em que foi lançado um concurso para a gestão privada do Hospital Fernando da Fonseca, na Amadora; o contrato incide apenas sobre a gestão geral e clínica do hospital, tendo a construção sido financiada por fundos públicos e contratada em moldes tradicionais.

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O modelo PPP baseado em duas sociedades gestoras na fase de parceria propriamente dita requer natural-mente uma boa articulação e complementaridade das actuações das duas entidades gestoras durante essa fase, sendo para o efeito requerido a estas um instru-mento regulador adequado da sua interacção e res-pectivas interfaces, bem como a assunção de uma responsabilidade subsidiária, nos termos legalmente previstos.

O modelo PPP descrito é aplicável quer aos esque-mas PPP relativos a novos hospitais, quer aos projec-tos que visem desenvolver hospitais de substituição. Conforme ilustra a Figura 1, neste tipo de projectos, o operador privado seleccionado assume também a gestão geral e clínica do hospital existente a substi-tuir durante o período em que decorre a construção do novo hospital. A responsabilidade da transferência das operações da velha unidade hospitalar para a nova é do operador privado, sendo as instalações do hospital substituído, em regra, desactivadas.

O modelo PPP para o desenvolvimento dos novos hospitais assenta, assim, num contrato de gestão de carácter duradouro com um parceiro de natureza pri-vada, seleccionado no âmbito de um processo

concursal público e competitivo. Aos concorrentes é expressamente exigida a apresentação de propostas integradas que assegurem uma orientação centrada nas necessidades do utente, em linha com os requisi-tos de desempenho decorrentes das exigências da operação clínica e da gestão hospitalar.

5. O procedimento concursal standard para os projectos PPP

O recurso a parcerias com o sector privado no âmbito do SNS pressupõe que cada projecto PPP seja vanta-joso na óptica do interesse público. Assim, cada pro-jecto PPP deve ser comportável e sustentável, em ter-mos orçamentais, e deve traduzir-se em ganhos de valor para o erário público. Nesta perspectiva, o par-ceiro privado deve ser seleccionado no âmbito de um processo concursal transparente e competitivo e, no contexto do processo, importa manter um elevado grau de concorrência, até o mais tarde possível, de forma a favorecer a obtenção de ganhos de valor para o erário público. Por outro lado, o processo concursal típico de um projecto PPP é, em regra, longo e complexo e, por

Figura 1

O modelo genérico PPP para unidades hospitalares (Portugal)

Objecto 2

Concepção, construção, financiamento, conservação e exploração do novo edifício hospitalar

Objecto 1

Prestação de cuidados de saúde através do estabelecimento hospitalar existente

e do novo hospital

Pagamento pela disponibilidade com deduções por falhas de desempenho

Pagamento por actividade clínica (GDHs, casemix) com deduções por falhas de desempenho

Sogest edifício hospitalar Sogest estabelecimento hospitalar

Concepção, construção e manutenção das novas instalações hospitalares,

hard facilities management e equipamento fixo pesado

Gestão novo hospital, gestão serviços clínicos, soft facilities management

e equipamento móvel Gestão

hospitalar existente

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conseguinte, oneroso, quer para os concorrentes, quer para as entidades públicas contratantes.

Assim, se é desejável que em cada processo concur-sal participe um número suficiente de concorrentes para que exista a necessária tensão competitiva, importa reconhecer que apenas um dos concorrentes será, no final, seleccionado e que os restantes concor-rentes terão de suportar os respectivos custos de pro-posta sem terem hipótese de os ressarcirem no âmbito do concurso.

No desenho do procedimento concursal a adoptar para os projectos de parceria em saúde teve-se em linha de conta a necessidade de estruturar um pro-cesso competitivo nas suas sucessivas fases, sem que isso se traduzisse em custos desmesurados para os concorrentes. Por outro lado, procurou-se regulamen-tar um procedimento standard adaptável a uma variada gama de projectos de parceria.

O programa de procedimento respeita, no essencial, a tramitação tradicional em matéria de contratação pública, mas atende às especificidades da contratação sob a forma de parceria17.

O procedimento pode compreender uma fase prévia de qualificação à apresentação de propostas e uma fase negocial subsequente à avaliação das propostas. O

pro-cedimento base de concurso comporta o faseamento de sete elementos: anúncio/apresentação de propostas, acto público, qualificação, selecção de propostas, negocia-ção, adjudicação e formação do contrato18.

No caso do primeiro concurso PPP relativo ao hospi-tal de Loures foi tomada a opção de não contemplar uma fase de pré-qualificação de modo favorecer uma ampla participação dos operadores privados interes-sados.

A fase do anúncio corresponde à publicitação da intenção de contratar e à apresentação de propostas pelos potenciais concorrentes. No acto público pro-cede-se à abertura das propostas e à verificação da idoneidade dos concorrentes a partir dos requisitos de idoneidade identificados no concurso. O objectivo da qualificação é a avaliação dos concorrentes de acordo com os critérios de capacidade técnica e económico-financeira previamente anunciados. A selecção das propostas corresponde à fase em que as propostas são apreciadas, tendo em conta os critérios de selecção, com vista à sua hierarquização, para definir os dois concorrentes que serão admitidos a negociação. A fase de negociação desdobra-se em dois momentos distintos. No primeiro, os concorrentes são

convida-17Decreto Regulamentar n.o 10/2003, de 28 de Abril.

18Atendendo ao valor que o contrato pode assumir, há que assegu-rar o visto do Tribunal de Contas.

Figura 2

Calendário indicativo do procedimento concursal relativo ao hospital de Loures

Anúncio (DR + JOCE)

Apresentação de propostas

Selecção dois concorrentes

Concorrente preferido

Adjudicação do contrato

Contrato e fecho financeiro 6 meses 5 meses 2-4 meses 6-8 meses 1 mês 0 meses 6 meses 11 meses 13-15 meses 21-23 meses 24 meses 8 de Janeiro 12 de Julho Dezembro ? ? ? Preparação de propostas Avaliação de propostas Fase negociação (dois concorrentes) Fase negociação (um concorrente) Formação do contrato

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dos a melhorarem as respectivas propostas, o que acontece num período de negociação separada, mas simultânea, entre os concorrentes. Após este período será seleccionado o concorrente que apresentou a melhor proposta para continuar as negociações com vista à elaboração da minuta de contrato de gestão. De seguida, há lugar à adjudicação, que corresponde ao acto que aceita a proposta do concorrente classi-ficado em primeiro lugar e compreende a aprovação da minuta negociada. Finalmente, a fase de formação do contrato determina as formalidades a cumprir com vista à celebração do contrato de gestão.

A fase que apresenta maior originalidade é a corres-pondente à fase de negociação, que, no procedimento adoptado, se desdobra em dois tempos distintos. Num primeiro momento, os concorrentes que apre-sentaram as duas melhores propostas estão em com-petição e num segundo momento procede-se à nego-ciação apenas com o melhor concorrente dos aspectos deixados em aberto nas propostas, pro-curando ainda melhorar os aspectos acessórios do contrato.

De notar que, no âmbito de cada concurso, o Estado reserva-se o direito de extinguir o procedimento concursal ou de não adjudicar o contrato de gestão, caso o valor global actual líquido dos pagamentos anuais a efectuar pelo Estado, nos termos da melhor proposta privada, seja superior ao valor do custo público comparável (CPC)19.

Por sua vez, em cada concurso, a comissão de avalia-ção das propostas tem, entre as suas incumbências, não só a avaliação do mérito relativo das propostas, como também a avaliação dos riscos e encargos em que incorre o parceiro público. Este tipo de avaliação decorre das disposições da lei de enquadramento orçamental relativas à avaliação prévia de projectos de parceria público-privada20.

6. Gestão dos contratos PPP

e acompanhamento e avaliação global das parcerias

Uma parceria público-privada consubstancia-se numa relação contratual duradoura entre um ente público e um operador privado, tendo em vista a prestação de um serviço público ao longo do período contratual. Aqui reside a sua essência, não se confundindo com o mero processo de selecção do operador privado.

Para que o ente público retire plenamente os benefí-cios esperados da parceria importa assegurar mais do que um simples acompanhamento da execução con-tratual. De facto, o que está em causa é a gestão do contrato por parte da entidade pública contratante, numa postura pró-activa, gerindo efectiva e dinami-camente a parceria. No ciclo do projecto de parceria, a fase de gestão contratual constitui a verdadeira pedra-de-toque da qual depende o seu sucesso e o benefício mútuo para a entidade púbica contratante e o operador privado.

No que concerne ao acompanhamento e controlo da execução do objecto da parceria público-privada, esta função incumbe ao parceiro público — enquanto entidade pública contratante —, cabendo-lhe garantir que sejam alcançados os fins de interesse público subjacentes à parceria21. Nos concursos em curso

prevê-se que o contrato de gestão seja celebrado pela entidade pública que venha a ser designada pelo ministro da Saúde, cabendo-lhe exercer a função de contract manager do lado público.

No entanto, o quadro normativo regulamenta já alguns elementos do dispositivo de gestão contratual/ acompanhamento dos projectos de parceria. Por exemplo, para os projectos hospitalares em curso prevê-se que a entidade pública contratante designe uma comissão de acompanhamento permanente que funcionará ligada à nova unidade hospitalar22. Esta

comissão de acompanhamento, que representa uma extensão in loco e permanente da entidade pública contratante, será designada na sequência da adjudica-ção do contrato de gestão, sendo recomendável que o seu núcleo duro seja constituído pelos elementos da entidade pública contratante que estiveram envolvi-dos no processo concursal, sobretudo na fase de negociação com o operador privado.

As principais competências da comissão de acompa-nhamento permanente são as seguintes: verificar o cumprimento das obrigações das entidades gestoras, quer principais, quer acessórias; assegurar a ligação quotidiana entre as entidades gestoras e a entidade pública contratante; proceder à elaboração de relató-rios periódicos sobre a actividade do hospital, a enviar à entidade pública contratante. A referida comissão tem direito de acesso irrestrito e contínuo a toda a documentação e a todos os registos relativos a quaisquer operações relacionadas com as actividades objecto do contrato de gestão, obrigando-se as enti-dades gestoras a diligenciarem no sentido de criarem e manterem os sistemas de informação requeridos. Reconhecendo que uma parceria deste tipo se con-cretiza numa relação contratual densa, complexa e 19O custo público comparável (CPC) corresponde a uma estimativa

do custo provável do contrato relativo ao projecto, caso este fosse desenvolvido pelo sector público, em moldes tradicionais, sendo determinado inicialmente durante a fase de preparação e avaliação prévia e sujeito a refinamento durante o próprio concurso. 20Artigo 16.o, n.o 2, da lei de enquadramento orçamental.

21Artigo 5.o do Decreto-Lei n.o 86/2003, de 26 de Abril. 22Artigo 61.o do Decreto Regulamentar n.o 14/2003, de 30 de Junho.

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exigente, envolvendo um amplo campo e potencial de litigação, prevê-se também o estabelecimento, após a adjudicação do contrato de gestão, de uma comissão conjunta ao longo do período de vigência do contrato23.

Esta comissão conjunta terá uma composição trian-gular, sendo constituída por representantes da enti-dade pública contratante, pela entienti-dade gestora do edifício e pela entidade gestora do estabelecimento. Compete, designadamente, à comissão conjunta intervir na elaboração das propostas cuja adopção se traduza na modificação do contrato de gestão, ou dos termos concretos da sua execução, nomeadamente as propostas de fixação da produção prevista, de revisão de especificações de serviços de apoio e de realiza-ção de alterações substanciais ao edifício, acompa-nhar a execução corrente das actividades objecto do contrato de gestão e propor a adopção de medidas tendo em vista a melhoria no desempenho das activi-dades objecto do contrato de gestão.

No entanto, os poderes da comissão conjunta estão circunscritos à elaboração de recomendações às par-tes, não lhe cabendo tomar decisões relativas à exe-cução, modificação ou extinção do contrato de ges-tão. No desempenho das suas funções, a comissão conjunta tem direito de acesso a toda a documenta-ção e a todos os registos relativos a quaisquer opera-ções relacionadas com as actividades objecto do con-trato de gestão.

Uma outra dimensão crucial para acompanhar e avaliar a performance clínica e não clínica do ope-rador PPP é a sua relação com o universo dos utentes e os seus diversos segmentos. Para além do dispositivo sectorial consubstanciado na Entidade Reguladora da Saúde a nível micro de cada parceria hospitalar, a entidade pública contratante tem a faculdade de designar um delegado do utente24. Este

delegado terá por missão a recolha de todas as quei-xas, sugestões e reclamações dos utentes, compe-tindo-lhe emitir recomendações e diligenciar junto das entidades gestoras a tomada de providências para resolução dos problemas de funcionamento global e, em particular, dos serviços e instalações hospitalares. O delegado do utente será nomeado em sequência da entrada em funcionamento dos serviços hospitalares.

No esquema da parceria, o desempenho das entida-des gestoras no exercício das actividaentida-des objecto do contrato de gestão está sujeito a avaliação regular e periódica, a efectuar nas datas e nos termos previstos no contrato de gestão25. Esta avaliação é, por

exem-plo, um elemento essencial para basear a eventual decisão de prorrogação do contrato de gestão26.

Por outro lado, no quadro da parceria, as duas enti-dades gestoras são socieenti-dades anónimas, actuando por conta própria e com meios próprios, na qualidade de «concessionárias» de um serviço público. As entidades gestoras, como sociedades anónimas, estão obrigadas a elaborar os documentos de presta-ção de contas genericamente previstos para este tipo societário, nos termos do Código das Sociedades Comerciais e do Plano Oficial de Contabilidade, ou seja, relatório de gestão, balanço, demonstrações de resultados e respectivos anexos. Estes documentos de prestação de contas são também a base para o cum-primento das respectivas obrigações declaratórias fis-cais para efeitos de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas. O caderno de encargos-tipo prevê também a entrega dos relatórios e contas anuais das entidades gestoras à entidade pública contratante. Finalmente, em relação à fiscalização geral das par-cerias, os poderes de fiscalização e controlo da exe-cução das parcerias serão exercidos por entidade ou serviço a indicar pelo ministro das Finanças, para as matérias económicas e financeiras27, e pelo ministro

da Saúde, para as demais. No tocante ao acompanha-mento global das parcerias em saúde incumbe aos ministros das Finanças e da Saúde, procederem ao acompanhamento permanente das parcerias, com o objectivo de avaliarem os seus custos e riscos e me-lhorarem o processo de constituição de novas parce-rias, diligenciando quer no sentido de assegurarem uma adequada colaboração entre as entidades de acompanhamento das parcerias, quer de uma eficaz divulgação dos conhecimentos adquiridos28.

No âmbito do Ministério da Saúde, o acompanha-mento e a avaliação global das parcerias a nível sectorial foram recentemente cometidos à Estrutura de Missão Parcerias.Saúde.

7. Perspectivas para o pós-2006

No final de 2006 espera-se que os projectos inseri-dos no 1.o programa de parcerias para o sector

hos-pitalar estejam lançados, com os respectivos concur-sos a decorrerem. Se assim suceder, é possível que, até ao fim de 2008, os contratos de gestão relativos aos 10 hospitais do programa estejam todos adjudi-cados. De acordo com a programação prevista, a

23Artigo 69.o do Decreto Regulamentar n.o 14/2003, de 30 de Junho. 24Artigo 70.o, ibid.

25Artigo 68.o, ibid.

26Artigo 23.o, ibid.

27Decreto-Lei n.o 86/2003, de 26 de Abril, e Despacho Normativo n.o 35/2003, de 25 de Julho de 2003, da ministra de Estado e das Finanças.

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entrada em funcionamento dos novos hospitais observar-se-á a partir do início de 2008 e todos os 10 novos hospitais deverão estar em fase operacio-nal até ao fim de 2010, concluindo um vasto e com-plexo programa de reforma e investimento iniciado no início da década.

Será no período de 2008-2009 que os utentes irão ter os primeiros contactos com os novos serviços hospi-talares e a opinião pública vai ter a percepção da qualidade dos serviços prestados em termos de qua-lidade de atendimento e internamento. Será igual-mente um tempo de novas oportunidades para os profissionais de saúde. Será também nesse período que iremos assistir ao culminar do complexo pro-cesso de mudança estrutural agora encetado. Desde logo, 7 dos novos 10 hospitais deverão entrar em operação nesse período. Por sua vez, 5 desses hospitais configuram projectos de substituição, pelo que nessa altura será necessário proceder à transfe-rência das operações e do pessoal para os modernos hospitais construídos, ao mesmo tempo que se terão de desactivar as actuais instalações hospitalares, cuja aptidão funcional se encontrará praticamente esgo-tada.

Nesse período, no arco norte da cidade de Lisboa, entrarão em funcionamento 4 novas unidades hospi-talares, sendo 2 unidades de substituição (Cascais e Vila Franca de Xira) e as restantes 2 unidades repre-sentando novos hospitais (Loures e Sintra). Assim, irá observar-se o efeito conjugado da abertura, quase em simultâneo, destes hospitais no conjunto da rede hospitalar implantada na malha urbana da cidade de Lisboa, que, actualmente, compreende 12 unidades hospitalares.

Cerca de metade destes hospitais são do tipo «socie-dades anónimas», sendo a outra metade constituída por hospitais ainda inseridos no sector público admi-nistrativo. O impacto da abertura das 4 novas unida-des sobre os hospitais sediados em Lisboa será dife-renciado. O novo hospital de Loures será aquele que irá gerar um impacto mais significativo, afectando a actividade de um núcleo de cerca de 5 hospitais. Esta situação incontornável constitui uma oportuni-dade estratégica para operar o reordenamento da oferta de cuidados hospitalares na região de Lisboa, ajustando e racionalizando funções e capacidades. Neste contexto, o período de 2005-2007 terá de ser sabiamente aproveitado para planear antecipada-mente a gestão e controlo das mudanças preconiza-das e que irão ocorrer durante o triénio de 2008--2010.

O período pós-2006 será, pois, um tempo de elevada exigência a nível da tomada de decisão e da gestão da mudança, representando seguramente o culminar da reforma estrutural em curso para o sector hospitalar.

Abstract

PUBLIC-PRIVATE PARTNERSHIPS IN PORTUGUESE HEALTHCARE

Public-private partnerships (PPP) is an innovative approach by the state towards the construction and fulfilment of public services based on both public and private sector performance optimization. Nowadays, a growing number of countries are making use of the PPP approach in order to implement public policies and projects in public works that used to be executed according to a classical approach, including the development of social-infrastructural services like public hospitals and other healthcare units.

PPPs in Portugal concerning NHS are a new mechanism to provide and contract healthcare services covering, in our legal framework, both accute and specialized care at hospitals as well as primary and continued care.

Presently, a PPP government sponsored program has started with the goal of gradually launching 10 new hospitals until the end of 2006. This program is now on its way, using a partner-ship model that can be considered quite innovative in the health sector. This PPP model is based on a management con-tract which covers not only the conception, construction, fi-nancing, maintenance and operation of infrastructural assets but also hospital management, including clinical services pro-vided by the private operator.

Such a role is developed by two management companies with different contractual objects and time horizons, as well as dis-tinct payment mechanisms.

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