Lógica Proposicional – Parte 2
Nesta aula, vamos começar falando um pouco da tradução entre linguagem natural (lin-guagem verbal humana, tal como o Português) e fórmulas lógicas. Depois, veremos dois tipos de “leis” importantes que existem entre fórmulas lógicas.
1. Tradução entre Linguagem Natural e Lógica Proposicional
Como vimos na aula passada, os operadores lógicos “combinam” afirmações criando, assim, novas afirmações compostas. Vamos começar mostrando como essa combinação de afirmações é traduzida para a linguagem natural.Exemplo 1: Seja p a proposição “Maria aprende matemática discreta” e seja q a propo-sição “Maria sabe escrever bem”.
Nesse caso, o que a proposição p → q afirma?
o “Se Maria aprender matemática discreta, então ela vai conseguir escre-ver bem”
E o que a proposição q ↔ p representa?
o “Maria sabe escrever bem se e somente se ela aprendeu matemática dis-creta”
o A idéia é que ela sabe ambos ou não sabe nenhum. É quase o mesmo sentido que expressamos ao dizer: “Maria sabe escrever bem tanto quan-to sabe matemática discreta”.
E o que a proposição q → p representa? o Tente você mesmo...
1. Analise a frase e encontrar as afirmações básicas que são as mais simples (“me-nores”) que podem ser extraídas da frase. De preferência, as afirmações básicas tem duas características:
não tem outras afirmações “mais básicas” dentro delas, e estão na forma positiva (sem negação).
2. Use uma variável proposicional distinta para representar cada afirmação básica
encontrada.
3. Use os operadores lógicos para combinar as afirmações básicas progressivamen-te de modo a expressar exatamenprogressivamen-te o sentido da frase original.
Exemplo 2: “Você pode acessar a internet aqui se você for um hacker ou se não for novato”.
As afirmações mais simples que podemos retirar desta frase são: o “Você pode acessar a internet aqui” – usaremos a variável a
o “Você é um hacker” – usaremos a variável h
o “Você é novato” – usaremos a variável n
Agora precisamos combinar estas variáveis. A frase dada expressa um tipo de regra condicional (um “se-então”), logo usaremos uma implicação. Porém, a conclusão é a, que aparece no começo (e não no fim) da frase. Assim, a frase completa será algo assim: <condições> → a.
Além disso, são dadas duas condições, das quais basta que uma seja satisfeita. Por isso, a condição será representada como uma disjunção (“ou”). Uma das condições aparece negada na frase. A condição é h ( n).
Assim, a frase completa é representada pela proposição:
(h ( n)) → a
Observações:
proposi-ções lógicas que vimos não expressam o sentido de ordem temporal. Uma dica é pensar como se todas as afirmações estivessem no tempo presente.
2. Outro cuidado que você precisa ter é que a linguagem natural é muito ambígua. Assim, em alguns casos, uma mesma frase em português pode ser interpretada de várias maneiras na lógica. Por exemplo, é comum usarmos “se-então”, “ou” e “e” com significados distintos dos que a lógica proposicional assume. Também usamos outras palavras com o mesmo sentido dos operadores lógicos vistos. 3. No entanto, em textos matemáticos como este, os conectivos “ou”, “e” e “
se-então” têm precisamente o significado dos operadores lógicos vistos aqui. Por-tanto, ao ler este material, interprete-o logicamente.
Um objetivo do nosso estudo de lógica proposicional é entender argumentos envolven-do várias proposições, tal como esse:
Amanhã com certeza vai nevar ou chover.
Mas amanhã vai estar quente demais para nevar. Logo, amanhã vai chover.
A conclusão acima parece correta, diante das afirmações inicias, não parece? Mas como podemos explicar a validade desse argumento? Como as afirmações se interligam para permitir essa conclusão? Vejamos uma análise informal:
Veja que, a frase inicial tem duas afirmações básicas: o amanhã vai nevar – vamos representar por p o amanhã vai chover – vamos representar por q
Além disso, a frase afirma o “ou” das duas. Logo, esta frase é representada pela fórmula: p q .
A segunda frase nega que vai nevar. Logo, ela é representada por p .
A terceira (e última) frase pode, obviamente, ser representada pela proposição q
Mas o texto como um todo não é uma fórmula só. Ele está representando um processo de raciocínio pelo qual a partir das duas primeiras frases, ele concluiu a terceira.
Se soubermos que essas duas afirmações são verdadeiras: o p q
o p
Então, podemos concluir essa nova informação (que não tinha sido dada explici-tamente):
o q
Este tipo de regra é chamado na lógica matemática de regra de inferência. Na seção a seguir, vamos ver como provar que uma regra como esta é válida e vamos ver uma lista de regras mais usadas.
Depois, na segunda seção, veremos as leis de equivalência lógica, que são mais fortes do que as regras de inferência.
2. Consequência Lógica / Regras de Inferência Lógica
Informalmente, uma regra de inferência é uma “regra de raciocínio” ou uma “regra de argumentação” genérica, aplicável em qualquer situação.
Na lógica proposicional, uma regra de inferência costuma ser representada assim (onde
P1, P2, ..., Pn, e Q podem ser fórmulas):
Q
P
P
P
n
...
2 1
As premissas são as proposições que você assume que são verdadeiras de ante-mão (porque tem certeza delas, provavelmente).
premissas da regra
A conclusão é uma proposição que é conseqüência das premissas – ela deve ser verdadeira sempre que as premissas forem todas verdadeiras. (Geralmente, es-tamos interessados em conclusões novas, não conhecidas antes).
O símbolo pode ser lido como “portanto” ou “logo”
Exemplo 1: Regra Silogismo Disjuntivo:
Esta é a regra que demos no exemplo informal na introdução desta nota de aula.
Exemplo 2: Regra Modus Ponens:
Podemos usá-la assim: se soubermos que (p→q) é verdade e que p é verdade, podemos concluir que q também é verdade
Veremos, agora, como usar as regras de inferência para descobrir (inferir) novas in-formações. Primeiro, vamos ver como usá-las para justificar a validade lógica de alguns argumentos informais textuais.
Exemplo 3: Justificativa lógica para o argumento informal abaixo:
“Se você é aluno da UFRPE, você pode se cadastrar na biblioteca.” “Você é aluno da UFRPE.”
“Logo, concluímos que você pode se cadastrar na biblioteca!”
Para representar o raciocínio acima formalmente, vamos usar as seguintes variá-veis proposicionais:
o a : Você é aluno
o b : Você pode se cadastrar na biblioteca
o a
Usando a regra Modus Ponens (trocando p por a e q por b), concluímos:
o b
Veja que esta proposição corresponde justamente à conclusão do argumento in-formal (textual) inicial. Por isso, o argumento inin-formal original está correto.
Você também pode usar uma regra de inferência substituindo (mentalmente) as variá-veis da regra (p e q, por exemplo) por fórmulas quaisquer. Veja o exemplo dado a se-guir.
Exemplo 4: Uso da regra de inferência trocando as variáveis por fórmulas. Considere estas premissas:
c (a → b)
c
Vamos usar a regra Silogismo Disjuntivo para inferir uma nova fórmula proposi-cional.
Para isso considere que o p da regra é substituído por c e que o q da regra é substituído por (a → b).
Assim, concluímos a fórmula:
a → b
Para explicar o que justifica a validade de uma regra de inferência, vamos usar o concei-to abaixo, para fórmulas lógicas P e Q.
Definição: Dizemos que Q é conseqüência lógica de P sse (se e somente se):
P Q é verdade em todos os casos (para quaisquer valores das variáveis en-volvidas)1.
Em uma regra de inferência válida, a conclusão é uma conseqüência lógica da conjun-ção das premissas. Ou seja, considerando o esquema genérico de regra de inferência
dado no início desta seção 2, a regra é válida se Q é consequência lógica de P1 P2 ... Pn.
Assim, podemos provar que uma regra de inferência é válida assim: 1. Construa a tabela-verdade da fórmula (P1 P2 ... Pn) Q 2. Verifique se ela é verdadeira em todas as linhas.
Exemplo 5: Provar a regra Modus Ponens
Precisamos provar que q (conclusão) é conseqüência lógica de (p q) p (con-junção das premissas).
Para isso, vamos verificar a tabela-verdade de ((p q) p) q.
p q p → q (p q) p q ((p q) p) q
0 0 1 0 0 1*
0 1 1 0 1 1*
1 0 0 0 0 1*
1 1 1 1 1 1
(* - verdade por vacuidade)
A fórmula é verdadeira em todas as linhas, logo a regra de inferência é válida!
As oito regras de inferência mais importantes foram listadas em um arquivo à parte, disponível no site da disciplina. Consulte!
3. Leis de Equivalência Lógica
Nas leis de equivalência lógica, que vemos nesta seção, isso é sempre possível. Se P for
logicamente equivalente a Q, então podemos partir de P para concluir Q ou vice-versa. Representamos essa relação de equivalência lógica assim:
P Q
Definição: Dizemos que P e Q são logicamente equivalentes sse (se e somente se):
P Q é verdade em todos os casos (para quaisquer valores das variáveis en-volvidas).
Isso equivale a dizer que P e Q valor-verdade igual em todas as situações possíveis (pa-ra quaisquer valores das variáveis). Por isso, podemos provar que P e Q são logicamen-te equivalenlogicamen-tes de duas formas:
1. Construa a tabela-verdade de P Q. Confira se esta fórmula é verdade em todas as linhas.
2. Ou construa uma tabela-verdade única para P e Q. Confira se os valores de P
e Q são idênticos em cada linha.
Exemplo: Provar a equivalência (p → q) ≡ (( p) q)
p q p p → q ( p) q
0 0 1 1 1
0 1 1 1 1
1 0 0 0 0
1 1 0 1 1
Veja que as colunas de (p → q) e de (( p) q) são idênticas. Isso prova que es-sas duas fórmulas são equivalentes.
As equivalências lógicas mais importantes foram listadas em um arquivo à parte, dispo-nível no site da disciplina. Consulte!